v. 26 n. 1 (2022): O lugar da oralidade em sala de aula: práticas de ensino escola à universidade
Durante muitos anos, o ensino de línguas concentrou-se, sobretudo, no ensino da leitura e da escrita. As capacidades de comunicação oral estariam reservadas à aprendizagem realizada, desde cedo, no seio familiar e com as demais crianças, e caracterizar-se-iam por uma natureza espontânea e informal. Porém, e nos últimos 30 anos, tem já o ensino do oral vindo a assumir (também) um papel fundamental no centro das preocupações didáticas, no campo da educação, ao ser este objeto considerado como um domínio determinante para o sucesso do aluno nas suas mais diversas esferas de ação, como a académica, a profissional e a pessoal. Destacam-se, para esta relevante inflexão, os trabalhos de L. A. Marcuschi (1996, 2001, 2003) e do Grupo de Genebra (DOLZ-MESTRE, ERARD, SCHNEUWLY, 1995; DOLZ, SCHNEUWLY, 1998/2017; DOLZ-MESTRE, 2015, 2017; DOLZ, DUPONT, 2017), com marcantes repercussões a nível quer da própria linguística do texto quer da sociolinguística. Deixa de haver uma preocupação em distinguir as modalidades escrita e oral, passando mesmo a existir quer um determinado consenso sobre a insuficiência de uma inflexível distinção entre estas quer, e sobretudo, uma necessidade de articulação entre ambas.
O interesse por um trabalho explícito em torno do oral é já hoje, de facto, uma realidade a poder ser cientificamente comprovada, a nível internacional. Nos mais diferentes países, e com os mais distintos contextos, assiste-se a uma evidente demanda de dispositivos concretos para um desenvolvimento da compreensão e da produção de textos orais. A comparação dos contextos e das inovações nos diferentes países, como no Brasil e em Portugal, principalmente, mas também em contraste com outras línguas diferentes do português e em outros países, assume, assim, um interesse ainda maior. Com efeito, têm sido já muito importantes todos os esforços feitos neste campo, quer no Brasil quer em Portugal. No Brasil, diferentes pesquisas foram realizadas no que se refere às propostas de interação por gêneros orais dos livros didáticos, nas práticas de ensino e na formação do professor (LEAL, GOIS, 2012; BUENO, COSTA-HÜBES, 2015; MAGALHÃES, CRISTOVÃO, 2018; MAGALHÃES, BUENO, COSTA-MACIEL, 2021), sobretudo na última década. Em Portugal, tem-se igualmente assistido a um considerável esforço, também mais notório nos últimos anos, para demonstrar a importância de reinvindicar o devido espaço ao ensino da oralidade, em todos os níveis de ensino (NRA, 2006; SIM-SIM, SILVA, NUNES, 2008; MARQUES, 2010; PINTO, 2010). Porém, há ainda um significativo caminho a percorrer, no sentido de (continuar a) desenvolver os trabalhos já levados a cabo, e explorando novas vias de trabalho e de investigação, em prol de um ensino o mais profícuo possível da oralidade, no espaço da sala de aula.
Afinal, constitui-se o oral como uma ferramenta essencial de comunicação, não só estando presente na maioria das situações de interação como também contribuindo para o desenvolvimento quer da escrita quer do pensamento. No entanto, e apesar desta relevância atribuída ao ensino oral, tanto em teoria quanto nos próprios textos programáticos oficiais, a realidade não deixa de traduzir que há ainda um considerável caminho a ser percorrido, para que possa o oral assumir o lugar devido, nas nossas salas de aula, nos mais diferentes níveis de ensino.
Ora, este nosso dossiê, intitulado, precisamente, «O lugar da oralidade em sala de aula: práticas de ensino da escola à universidade», visa reunir contribuições que não só se detenham sobre esta problemática como também auxiliem na progressão do trabalho que tem então vindo a ser realizado neste campo científico.