v. 26 n. 2 (2020): Dossiê - Patrimônio e Relações Internacionais
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Considerações historiográficas sobre corporativismo, cidadania regulada e a história da assistência à saúde no Brasil: dádiva ou direito? (1930-1964)

José Roberto Franco Reis
Casa de Oswaldo Cruz - COC/FIOCRUZ
Biografia

Publicado 2020-09-10 — Atualizado em 2021-04-30

Versões

Palavras-chave

  • Cidadania regulada,
  • Assistência à saúde,
  • História e historiografia da saúde

Como Citar

Reis, José Roberto Franco. (2020) 2021. “Considerações historiográficas Sobre Corporativismo, Cidadania Regulada E a história Da Assistência à Saúde No Brasil: Dádiva Ou Direito? (1930-1964)”. Locus: Revista De História 26 (2):407-33. https://doi.org/10.34019/2594-8296.2020.v26.29761.

Resumo

De modo geral, os estudiosos da história da saúde observam uma cisão deste campo entre a assistência médica individual, dependente dos Institutos de Previdência (IAPs), criados nos anos 1930, e vinculados ao Ministério do Trabalho Indústria e Comércio (MTIC), e a saúde pública, dedicada, em geral, mas não só, às ações sanitárias contra epidemias e endemias que grassavam largamente no país, subordinada ao Ministério da Educação e Saúde Pública (MESP), criado à mesma época. Desta maneira, teríamos, de um lado, a saúde pública como fruto de iniciativas governamentais voltadas ao conjunto da população, com uma estrutura universalizada de serviços, não usufruído, porém, como um direito; e, de outro, a assistência médica individualizada, cuja inclusão, por intermédio da estrutura corporativista dos IAPs, apresentaria um caráter fragmentário, segmentado e seletivo, portanto, não universalista e não inclusivo, nos termos da chamada “cidadania regulada”, de acordo com conceito cunhado pelo cientista político Wanderley Guilherme dos Santos. Nosso objetivo, neste artigo, é problematizar, à luz da literatura histórica mais recente, essa interpretação convencional do processo de estruturação da assistência à saúde no Brasil, que tende a caracterizá-la não como um processo de luta por direito de cidadania e sim como outorga ou dádiva governamental, conforme os objetivos políticos e ideológicos do primeiro Governo Vargas. Nesse sentido, pretendemos demonstrar como tanto a “cidadania regulada” quanto o “corporativismo” se constituíram, desde o início, em arranjos atravessados, em larga medida, por disputas e contradições que lhe conferiam certo grau de flexibilidade e permeabilidade para absorver as demandas por direitos oriundas do mundo do trabalho.

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