Pretuguês
Uma categoria política-linguística Amefricana
Palavras-chave:
Pretuguês, Amefricanidade, Contato Linguístico, RaciolinguísticaResumo
O presente trabalho tem por objetivo propor que Pretuguês (Gonzalez, 1983, 1988) extrapola a noção conceitual, pois atua como uma categoria política-linguística. Para tanto, lanço mão da perspectiva teórica de base transdisciplinar Raciolinguística (Charity-Hudley, 2013, 2016; Alim; Rickford; Ball, 2016), sob as óticas da Linguística Histórica (Mattos e Silva, 2000, 2004) e da Historiografia Linguística Transatlântica (Coelho; Santos, 2022). Conforme tratamento qualitativo, realizado através da técnica de contextualização dos dados extraídos de fontes bibliográficas, foi possível concluir que Pretuguês atua como uma categoria de análise (Cerqueira, 2024), uma vez que tensiona sob prima político traços linguísticos – rotacismo, apócope de /R/ final, inserção das formas a gente e você no paradigma pronominal e redução dos padrões de concordância nominal e verbal – cuja avaliação pode ser tanto de emancipação (Cerqueira, 2020, 2022), quanto de estigmatização (Cerqueira, 2022, 2023).
Downloads
Referências
ABOH, E. The emergence of hybrid grammar: language contact, change and creation. Cambridge: Cambridge University Press, 2015.
AKOTIRENTE SANTOS, C. A. S. O que é interseccionalidade? Belo Horizonte: Letramento, 2018.
ALBUQUERQUE, W. O jogo da dissimulação: abolição e cidadania negra no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
ALIM, H. S.; RICKFORD, J. R.; BALL, A. F. (Org.). Raciolinguistics: how language shapes our ideas about race. Oxford; New York: Oxford University Press, 2016.
AVELAR, R.; GALVES, C. O papel das línguas africanas na emergência da gramática do português brasileiro. Linguística, v. 30, p. 241-288, 2014.
BANIWA, G. S. L. O Índio do Brasil: o que você precisa saber sobre os povos indígenas no Brasil de hoje. Brasília: Secad; Unesco, 2006.
BERTH, J. O que é empoderamento? Belo Horizonte: Editora Letramento, 2018.
BISPO, A. N. Colonização, quilombos: modos e significações. Brasília: INCTI; UnB, 2015.
CARNEIRO, A. S. A construção do outro como não-ser como fundamento do ser. 2005. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005.
CARNEIRO, A. S. Escritos de uma vida. São Paulo: Pólen Livros, 2019.
CARNEIRO, A. S. Racismo, sexismo e desigualdade no Brasil. São Paulo: Selo Negro, 2011. CARVALHO, D. S. A domesticação da gramática de gênero. São Paulo: Pontes, 2021.
CERQUEIRA, F. O. Lélia Gonzalez e o Pretuguês: do racismo e sexismo ao epistemicídio. In: CARVALHO, D. S.; LIMA, P. E. (Org.). Língua(gem) e sexualidade: perspectivas do século XXI. Salvador: Edufba, 2022. p. 15-38.
CERQUEIRA, F. O. Norma padrão e norma dita culta: confusão sistêmica entre instrumento linguístico e amostra de variação. Porto das Letras, v. 9, n. 2, p. 458-477, 2023.
CERQUEIRA, F. O. O pretuguês como comunidade de prática: concordância e identidade racial. Traços de Linguagem, Cáceres, v. 4, n. 1, p. 75-88, 2020.
CERQUEIRA, F. O. Pretuguês. In: LANDULFO, C.; MATOS, D. (Org.). Suleando conceitos em linguagens: decolonialidades e epistemologias outras. v. 2. Campinas: Pontes, 2024. p. 219-227.
CERQUEIRA, F. O.; CARVALHO, D. S. Racializando língua ou Linguificando raça? Trabalhos em Linguística Aplicada, v. 61, n. 2, p. 455-466, 2022.
CERQUEIRA, F. O.; FONTANA, L. S.; MODESTO, R. Repense e a urgente demanda negrolinguística.
Cadernos de Linguagem e Sociedade, n. 23, v. 2, p. 199-216, 2022.
CHARITY-HUDLEY, A. H. Language and racialization. In: GARÍCA, O.; FLORES, N.; SPOTTI, M. (Org.). The Oxford Handbook of Language and Society. Oxford: Oxford University Press, 2016. p. 1-25.
CHARITY-HUDLEY, A. H. Sociolinguistic and social activism. In: BAYLEY, R.; CAMERON, R.; LUCAS, C. (Org.). The Oxford Handbook of Sociolinguistics. Oxford: Oxford University Press, 2013. p. 1-22.
CHAVES, T. V.; CESTARI, M. J.; FRANÇA, G. Todo mundo fala pretuguês, principalmente quem não fala. Conexão Letras, Porto Alegre, v. 18, n. 29, p. 1-24, 2023.
COELHO, O.; SANTOS, E. P. Macedo Soares, Amélia Mingas e a Histografia Linguística Transatlântica. Cadernos de Estudos Linguísticos. Campinas, v. 64, p. 1-22, 2022.
COLLINS, P. H. Black feminist thought: knowledge, conciousness and the politics of empowerment. Nova York: Routledge, 2000.
DANTAS, L. T. F. Filosofia desde África: perspectivas descoloniais. 2018. Tese (Doutorado em Filosofia) – Faculdade de Ciências Humanas, Universidade Federal do Paraná, 2018.
DASCAL, M.; BORGES NETO, J. De que trata a linguística afinal? In: BORGES NETO, J. Ensaios de Filosofia da Linguística. São Paulo: Parábola, 2004. p. 31-65.
DAVIS, A. Mulheres, Raça e Classe. Trad. Heci Regina Candiani. São Paulo: Boitempo, 2016 [1981].
DEGRAFF, M. Toward racial justice in linguistics: the case of Creole studies. Language, v. 96, n. 4, p. 292-306, 2020.
DIOP, C. A. Civilização ou barbárie. Trad. César Sobrinho. Companhia das Letras: São Paulo, 2025 [1981].
FANON, F. Os condenados da terra. Trad. José Laurênio de Melo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968 [1961].
FREITAG, R. K. A quarta onda: ativismo sociolinguístico no Brasil. Fórum Linguístico, v. 20, n. 3, p. 9.401-9.419, 2023.
FREYRE, G. Casa grande e senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. Recife: Global, 2003 [1933].
GALVES, C. M. C. Periodização e competição de gramáticas: o caso do português médio. In: LOBO, T. et al. (Org.). Rosae: linguística histórica, história da línguas e outras histórias. Salvador: Edufba, 2012. p. 65-74.
GALVES, C. M. C.; KATO, M. A.; ROBERTS, I. O português brasileiro: uma segunda viagem diacrônica. Campinas: Editora Unicamp, 2019.
GILROY, P. O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência. Trad. Cid Knipel Moreira. São Paulo: Editora 34, 2001 [1993].
GONZALEZ, L. A categoria político-cultural de amefricanidade. Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, n. 92-93, p. 69-82, 1988.
GONZALEZ, L. A mulher negra na sociedade brasileira: uma abordagem político-econômica. In: GONZALEZ, L. Por um feminismo afro-latino-americano: ensaios, intervenções e diálogos. Org. Flavia Rios e Márcia Lima. Rio de Janeiro: Zahar, 2020 [1979]. p. 49-64.
GONZALEZ, L. Cultura, etnicidade e trabalho: efeitos linguísticos e políticos da exploração da mulher. In: Annual Meeting of the Latin American Studies Association, Pittsburgh, 5-7 abr. 1979a.
GONZALEZ, L. Racismo e sexismo na cultura brasileira. Ciências Sociais Hoje, p. 223-244, 1983.
GONZALEZ, Lélia. Por um feminismo afro-latino-americano: ensaios, intervenções e diálogos. Org. Flavia Rios e Márcia Lima. Rio de Janeiro: Zahar, 2020.
GUERREIRO RAMOS, A. Patologia social do branco brasileiro. Jornal do Comércio, 1955.
GUY, G. R. A questão da crioulização no português do Brasil. In: ZILLES, A. M. S. (Org.). Estudos de variação lingüística e no Cone Sul. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2005. p. 15-38.
GUY, G. R. Linguistic variation in Brazilian Portuguese: aspects of phonology, sintax and language history. 1981. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Pennsylvania, Pennsylvania, 1981.
HALL, S. Da diáspora: identidade e mediações culturais. Org. Liv Sovik. Trad. Adelaine Resende et al. Belo Horizonte: Editora UFMG; Brasília: Representação da Unesco no Brasil, 2003.
HOLM, J. Popular Brazilian Portuguese; a semi-creole. In: D’ANDRADE, E.; KIHM, A. (Orgs.). Actas do Colóquio sobre Crioulos de Base Lexical Portuguesa. Lisboa: Colibri. 1992. p. 37-66.
HOOKS, Bell. Ensinando a transgredir: educação como prática de liberdade. Trad. Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: Martins Fontes, 2013 [1994].
ILARI, R. Linguística Românica. São Paulo: Editora Ática, 1999.
LEMOS, C. E. S; MOURA, S. A.; BÊTA, T. E. L. Os vícios de pronunciação: prescrição para a família senhorial sobre os perigos de africanização da Língua Portuguesa (1856-1858). In: PEROBELLI, R. et al. (Org.). Estudos Linguísticos e direitos humanos: linguagem, interação e comunicação. v. 3. São Carlos: Pedro & João, 2025. p. 179-205.
LUCCHESI, D. E. R. A transmissão linguística irregular. In: LUCCHESI, D.; BAXTER, A.; RIBEIRO, I. O português afro-brasileiro. Salvador: Edufba, 2009. p. 41-74.
LUCCHESI, D. E. R. Língua e sociedades partidas: a polarização sociolinguística do Brasil. São Paulo: Contexto, 2015.
LUCCHESI, D. E. R. O conceito de transmissão lingüística irregular e o processo de formação do português do Brasil. In: RONCARATI, C.; ABRAÇADO, J. (Org.). Português brasileiro: contato lingüístico, heterogeneidade e história. Rio de Janeiro: Letras, 2003. p. 272-284.
LUCCHESI, D. E. R. Parâmetros Sociolinguísticos do Português Brasileiro. Revista da Abralin, v. 5, n. 1-2, p. 83-112, 2006.
LUCCHESI, D. E. R. Variação e norma: elementos para uma caracterização sociolinguística do português do Brasil. Revista Internacional de Língua Portuguesa, n. 12, p. 17-28, 2001.
MACEDO, H. O “pretoguês” de José Luandino Vieira. Alfa, n. 36, p. 109-122, 1992.
MATIAS, A. R.; PINTO, P. F. “Pretoguês/pretuguês”: breves notas sobre o papel do racismo na construção histórica de um não lugar de fala. Cadernos MICAR: Textos para a 7ª edição da Mostra Internacional de Cinema Anti-racista, SOS Racismo, p. 13-20, 2020.
MATTOS E SILVA, R. V. Ensaios para uma sociohistória do português brasileiro. São Paulo: Contexto, 2004.
MATTOS E SILVA, R. V. Uma interpretação para a generalizada difusão da língua portuguesa no território brasileiro. Gravatá, n. 9, p. 11-27, 2000.
MBEMBE, Achille. Necropolítica. São Paulo: n-1 edições, 2018.
MINGAS, A. O pretuguês, o português em/de Angola: “é problema que estamos com ele”.
MODESTO, R. Uma história das ideias linguísticas no Brasil: o debate sociolinguístico em torno do conceito de Transmissão Linguística Irregular. Crônicas e Controvérsias. Línguas e Instrumentos linguísticos, n. 36, p. 89-118, 2015.
MOREIRA, A. Racismo recreativo. São Paulo: Selo Sueli Carneiro; Pólen, 2019. MOURA, Clóvis. História do negro brasileiro. São Paulo: Editora Ática, 1992.
MUFWENE, S. Pidgin and Creole Languages. In: SMERLSER, N. J.; BALTES, P. B. (Ed.) International encyclopedia of the social and behavioral sciences. [S. l.]: Elsevier, 2002.
MUNANGA K. Rediscutindo a mestiçagem no Brasil: identidade nacional versus identidade negra. Petrópolis: Vozes, 1999.
NARO, A.; SCHERRE, M. Origens do português brasileiro. São Paulo: Parábola, 2007.
NARO, A.; SCHERRE, M. Sobre as origens do português popular doo Brasil. D.E.L.T.A., v. 9, n. Especial, p. 437-454, 1993.
NASCIMENTO, B. O conceito de quilombo e a resistência cultural negra. In: NASCIMENTO, B. (Org.). Beatriz Nascimento, quilombola e intelectual: possibilidades nos dias da destruição. Diáspora Africana: Filhos da África, 2018 [1985].
NEGRÃO, E.; VIOTTI, E. Em busca de uma história linguística. Rev. Est. Ling., Belo Horizonte, v. 20, n. 2, p. 309-342, 2012.
NJINGA e SEPÉ: Revista Internacional de Culturas, Línguas Africanas e Brasileiras. n. 1, v. 1, p. 25-37, 2021.
PUGLIESE, P. Pretuguês: analisi di un concetto tra razzismo linguistico e rivendicazione identitaria. 2025. 129 f. Dissertação (Mestrado em Lingua e Cultura Italiane per Stranieri) – Corso di Laurea Magistrale in Lingua e Cultura Intaliane per Stranieri, Università di Bologna, Bologna, 2025.
ROBERTS, I.; KATO, M. O português brasileiro: uma viagem diacrônica – homenagem a Fernando Tarallo. São Paulo: Contexto, 1993.
ROCHA, S. Eugenia no Brasil: análise do discurso ‘científico’ no Boletim de Eugenia: 1929-1933. 2010. 100 f. Tese (Doutorado em História da Ciência) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2010.
ROSA, J.; FLORES, N. Unsettling race and language: toward a raciolinguistic perspective. Language in Society, n. 46, v. 5, p. 621-647, 2017.
SANTOS, S. O. S. Pretuguês: mandingas linguísticas em “quero ver dendê”, de mestre Boa Voz. Estudos Linguísticos e Literários, n. 78, p. 489-517, 2024.
SAPIR, E. Language – an introduction to the study of speech. New York: Harcourt, Brace & World, Inc, 1949 [1921].
SAUSSURE, F. Curso de Linguística Geral. Org. Charles Bally e Albert Sechehaye. Trad. Antônio Chelini, José Paulo Paes e Izidoro Blikstein. São Paulo: Cultrix, 2012 [1916].
SEVCENKO, Nicolau. Pindorama revisitada. São Paulo: Fundação Peirópolis, 2000.
SILVA NETO, S. Introdução In: SILVA NETO, S. Histórias da língua portuguesa. 4. ed. Rio de Janeiro: Presença, 1986 [1957]. p. 13-54.
SODRÉ, Muniz. O fascismo da cor: uma radiografia do racismo nacional. Petrópolis: Vozes, 2023.
SOUZA, A. S. Que dizem as cantigas de escárnio e maldizer galego-portuguesas sobre negr-? desafios para a história de uma palavra. Signum, v. 20, n. 2, p. 71-94, 2019.
STEPAN, N. L. Eugenia no Brasil, 1917-1940. In: HOCHMAN, G.; ARMUS, D. (Org.). Cuidar, controlar, curar: ensaios históricos sobre saúde e doença na América Latina e Caribe. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2004. p. 330-391.
SWIGGERS, Pierre. A historiografia da linguística: objeto, objetivos, organização. Confluência, Rio de Janeiro, n. 44-45, p. 39-59, 2013.
THOMASON, S. G.; KAUFMAN, T. Language contact, creolization, and genetic linguistics. Berkeley: University of California Press, 1988.
WIREDU, K. Descolonização conceitual na filosofia africana. Ibadan: Hope Publications, 1995.