"Como fala?": construindo repertórios linguísticos em contexto de mobilidade estudantil transnacional
DOI:
https://doi.org/10.34019/1982-2243.2021.v25.35927Resumo
Este artigo pretende discutir experiências e práticas situadas da globalização contemporânea, analisando a construção de repertórios linguísticos na interação com estudantes em mobilidade transnacional numa universidade do centro-oeste brasileiro. Para tanto, parto da noção de repertório enquanto conjunto de recursos semióticos fragmentados (BLOMMAERT; BACKUS, 2011) que indiciam itinerários de vida, numa análise crítica de contextos superdiversos (VERTOVEC, 2007) que desafia a concepção de língua enquanto sistema de fronteiras nitidamente demarcadas. A análise apresenta a construção de repertórios emergindo na/da própria interação, num deslocamento do repertório enquanto inventário de recursos para o processo de (re)construção de práticas linguísticas e o que elas performam em termos de relações de poder. Os dados analisados foram gerados em 2017 numa etnografia multissituada de abordagem biográfica (KEATING, 2015), por meio de duas oficinas da linha da vida com grupos de estudantes migrantes, oportunizando a criação de narrativas multimodais orais e escritas sobre suas trajetórias. O material empírico evidencia uma construção performativa de repertórios ao mesmo tempo situada, pois combina e depende dos recursos disponíveis e compartilháveis durante a interação, e negociada, pois emerge das/nas disputas e colaborações que estabelecem sentidos comuns para aquilo que se diz. A análise também mostra como essa construção aponta pertencimentos e diferenças num espaço social marcado pela distribuição desigual de recursos. Assim, ao invés de representar um ponto de acumulação da história de vida de um indivíduo, o repertório emerge como “espaço de potencialidades e restrições” (BUSCH, 2012, 2015, 2017), indicando como usos criativos da língua intersectam com padrões normativos ligados de regimes de diferenciação e exclusão. Trata-se de um olhar em direção à potencialidade do trabalho etnográfico capaz de apreender a construção de sentidos locais para experiências não-locais de mobilidade, num mundo em constante transformação e atravessado por hierarquizações ideologicamente informadas.
Palavras-chave: repertórios linguísticos; migração estudantil; linha da vida.