V. 25 Nº 2 | JUL/DEZ 2025  
Dossiê  
Fundamentos  
históricos, teórico-  
metodológicos e ético-  
políticos do Serviço  
Social  
e-ISSN 1980-8518  
e-ISSN 1980-8518  
Revista da Faculdade de Serviço Social - UFJF  
Programa de Pós-Graduação em Serviço Social  
Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil  
R E V I S TA  
Revista de Serviço Social  
Programa de Pós-Graduação em Serviço Social  
Curso de Graduação em Serviço Social  
Universidade Federal de Juiz de Fora  
ISSN 1980-8518  
DOSSIÊ:  
Fundamentos históricos,  
teórico-metodológicos e ético-  
políticos do Serviço Social  
VOLUME 25  
NÚMERO 2  
JULHO/DEZEMBRO  
ANO 2025  
EXPEDIENTE  
FOCO E ESCOPO  
CONSELHO EDITORIAL  
A revista Libertas, criada em 2001, é uma  
publicação semestral da Faculdade de Serviço  
Social e do Programa de Pós-Graduação em  
Serviço Social da Universidade Federal de Juiz de  
Fora. Seu objetivo é estimular o intercâmbio da  
produção intelectual, de conteúdo crítico,  
produzida a partir de pesquisas empíricas e  
teóricas, no âmbito brasileiro e internacional,  
sobre temas atuais e relevantes da área do  
Serviço Social e das Ciências Sociais e Humanas,  
com as quais mantem interlocução.  
Alcina Maria de Castro Martins, Instituto  
Superior Miguel Torga, Portugal; Carina Berta  
Moljo, Universidade Federal de Juiz de Fora,  
Brasil; Caterine Reginensi, Ecole Nacionale  
Superieure Agronomique de Toulouse, França ;  
Elizete Menegat, Universidade Federal de Juiz de  
Fora, Brasil; Íris Maria de Oliveira, Universidade  
Federal do Rio Grande do Norte, Brasil; José  
Paulo Netto, Universidade Federal do Rio de  
Janeiro, Brasil; Margarita Rozas Pagaza,  
Universidad Nacional de La Plata, Argentina;  
Maria Aparecida Tardim Cassab, Universidade  
Federal de Juiz de Fora, Brasil; Maria Beatriz  
Abramides, Pontifícia, Universidade Católica de  
São Paulo, Brasil; Maria Patricia Fernandes Kelly,  
Princeton University, EUA; Maria Rosangela  
Batistoni, Universidade Federal de São Paulo,  
Brasil; Marilda Vilella Iamamoto, Universidade  
Estadual do Rio de Janeiro, Brasil; Nicolas Bautes,  
Universite de Caen Normandie, França; Olga  
Mercedes Paez, Universidad Nacional de  
Córdoba, Argentina; Roberto Orlando Zampani,  
Universidad Nacional de Rosário, Argentina;  
Rosangela Nair Carvalho Barbosa, Universidade  
Estadual do Rio de Janeiro; Brasil; Silvia  
Fernandes Soto, Universidad Nacional de Tandil,  
COMISSÃO EDITORIAL  
Drª. Alexandra Aparecida Leite Toffanetto Seabra  
Eiras, Faculdade de Serviço Social, Universidade  
Federal de Juiz de Fora, Brasil. Editora-chefe.  
Drª. Isaura Gomes de Carvalho Aquino,  
Faculdade de Serviço Social, Universidade  
Federal de Juiz de Fora, Brasil. Editora-adjunta.  
Dr. Bruno Bruziguessi Bueno, Faculdade de  
Serviço Social, Universidade Federal de Juiz de  
Fora, Brasil. Editor-adjunto.  
Luciano Cardoso de Souza, Faculdade de Serviço  
Social, Universidade Federal de Juiz de Fora,  
Brasil. Editor-executivo.  
Argentina;  
Xabier  
Arrizabalo  
Montoro,  
Universidad Complutense de Madri, Espanha.  
AVALIADORES  
Adriana Ramos [UFF, Niterói, RJ/Brasil];  
da Silva [UFAL, Maceió, AL/Brasil]; Fábio da Silva  
Calleia [UFJF, Juiz de Fora, MG/Brasil]; Fátima  
Grave Ortiz [UFRJ, Rio de Janeiro, RJ/Brasil];  
Fernanda Picinin Moreira [UFJF, Juiz de Fora,  
MG/Brasil]; Francine Helfreich Coutinho dos  
Santos [UFF, Niterói, RJ/Brasil]; Franqueline  
Terto dos Santos [UFAL, Maceió, AL/Brasil];  
Glaucia Lelis Alves [UFRJ, Rio de Janeiro,  
RJ/Brasil]; Graziela Scheffer [UERJ, Rio de  
Janeiro/Brasil]; Gustavo Fagundes [UFJF, Juiz de  
Fora, MG/Brasil]; Haline Fernanda Canelada  
[UEL, Londrina, PR/Brasil]; Hiago Trindade de  
Lira Silva [UFCG, Campina Grande, PB/Brasil];  
Jamerson Murillo Anunciação de Souza [UFPE,  
Recife, PE/Brasil]; Jeovana Batista de Sousa  
Nunes [UFPB, João Pessoa, PB/Brasil]; Jéssica  
Ribeiro Duboc [UFRJ, Rio de Janeiro, RJ/Brasil];  
Jhony Zigato [UFVJM, Montes Claros,  
MG/Brasil]; José Amilton de Almeida [UERJ, Rio  
de Janeiro/Brasil]; José Fernando Siqueira da  
Silva [UNESP, Franca, SP/Brasil]; Joseane  
Barbosa de Lima [UFJF, Juiz de Fora, MG/Brasil];  
Josiane Soares Santos [UFRN, Natal, RN/Brasil];  
Juan Retana Jimenez [UFF, Rio das Ostras,  
RJ/Brasil]; Juliana Fiuza Cislaghi [UERJ, Rio de  
Janeiro/Brasil]; Juliana Menezes Mendes  
Maurício [UERJ, Rio de Janeiro/Brasil]; Juliana  
Thimóteo Nazareno Mendes [UFF, Campos dos  
Goytacazes, RJ/Brasil]; Julvan Moreira de  
Oliveira [UFJF, Juiz de Fora, MG/Brasil];  
Kathiuscia Aparecida Freitas Pereira Coelho  
[UEL, Londrina, PR/Brasil]; Larissa Dahmer  
Pereira [UFF, Niterói, RJ/Brasil]; Laryssa Gabriella  
Gonçalves dos Santos [UFRJ, Rio de Janeiro,  
RJ/Brasil]; Leonardo Nogueira Alves [UFOP, Ouro  
Preto, MG/Brasil]; Lesliane Caputi [UFTM,  
Uberaba, MG/Brasil]; Luana Siqueira [UFRJ, Rio  
de Janeiro, RJ/Brasil]; Lucas Bezerra de Araújo  
[UFAL, Maceió, AL/Brasil]; Luciana Gonçalves  
Pereira de Paula [UFJF, Juiz de Fora, MG/Brasil];  
Luzia Amélia Ferreira [UFJF, Juiz de Fora,  
Adrianyce A. Silva de Sousa [UFF, Niterói,  
RJ/Brasil]; Adriene dos Santos Sá [FIOCRUZ, Rio  
de Janeiro, RJ/Brasil]; Alessandra Ximenes da  
Silva [UEPB, Campina Grande, PA/Brasil];  
Alexandre Aranha Arbia [UFJF, Juiz de Fora,  
MG/Brasil]; Álvaro de Azeredo Quelhas [UFJF,  
Juiz de Fora, MG/Brasil]; Ana Claudia de Jesus  
Barreto [UFF, Campos dos Goytacazes,  
RJ/Brasil]; Ana Cristina Oliveira de Oliveira [UFF,  
Niterói, RJ/Brasil]; Ana Lívia Adriano [UFF,  
Niterói, RJ/Brasil]; Ana Luiza Avelar [UFJF, Juiz de  
Fora, MG/Brasil]; Andrea Kelmer de Barros  
[UFVJM, Montes Claros, MG/Brasil]; Antoniana  
Dias Defilippo Bigogno [UFF, Rio das Ostras,  
RJ/Brasil]; Bruna Carolina Silva dos Reis [UFSCar,  
São Carlos, SP/Brasil]; Bruna Figueiredo Oliveira  
[UFJF, Juiz de Fora, MG/Brasil]; Bruno José  
Oliveira [UNIRIO, Rio de Janeiro, RJ/Brasil];  
Carlos Antonio de Souza Moraes [UFF, Niterói,  
RJ/Brasil]; Carolina Quemel Nogueira Pinto  
[UFRJ, Rio de Janeiro, RJ/Brasil]; Charles Toniolo  
de Sousa [UFRJ, Rio de Janeiro, RJ/Brasil];  
Cláudia Correia Coelho [UFRGS, Porto Alegre,  
RS/Brasil]; Cláudia Mônica dos Santos [UFJF, Juiz  
de Fora, MG/Brasil]; Claudio Henrique Miranda  
Horst [UFOP, Ouro Preto, MG/Brasil]; Cristiane  
Nobre [UFV, Viçosa, MG/Brasil]; Cristiane Silva  
Tomaz [UFOP, Ouro Preto, MG/Brasil]; Daniela  
Leonel de Paula Mendes [UFJF, Juiz de Fora,  
MG/Brasil]; Davi Machado Perez [UFOP, Ouro  
Preto, MG/Brasil]; Dayana Christina Ramos de  
Souza Juliano [UFRJ, Rio de Janeiro, RJ/Brasil];  
Eblin Joseph Farage [UFF, Niterói, RJ/Brasil];  
Ednéia Alves de Oliveira [UFJF, Juiz de Fora,  
MG/Brasil]; Elaene Alves [UnB, Brasília,  
DF/Brasil]; Elziane Olina Dourado [UERJ, Rio de  
Janeiro/Brasil]; Érika Alves Martins [UFJF, Juiz de  
Fora, MG/Brasil]; Estela Saleh da Cunha [UFJF,  
Juiz de Fora, MG/Brasil]; Evelyne Medeiros  
Pereira [UFPE, Recife, PE/Brasil]; Everton Melo  
MG/Brasil]; Mara Kátia de Oliveira Nascimento  
[UFRN, Natal, RN/Brasil]; Marcelo Braz Moraes  
dos Reis [UFRN, Natal, RN/Brasil]; Maria de  
Fátima Valentim Pessanha [UERJ, Rio de  
Janeiro/Brasil]; Maria Fernanda Escurra [UERJ,  
Rio de Janeiro/Brasil]; Maria Lúcia Duriguetto  
[UFJF, Juiz de Fora, MG/Brasil]; Maria Lucia  
Teixeira Garcia [UFES, Vitória, ES/Brasil]; Maria  
Rosângela Batistoni [UNIFESP, São Paulo,  
SP/Brasil]; Marina Monteiro de Castro e Castro  
[UFJF, Juiz de Fora, MG/Brasil]; Michelle  
Capuchinho [UFJF, Juiz de Fora, MG/Brasil];  
Milena Carlos de Lacerda [UERJ, Rio de  
Janeiro/Brasil]; Mônica Paulino de Lanes [UFES,  
Vitória, ES/Brasil]; Monica Simone Pereira Olivar  
[CESTEH, Rio de Janeiro, RJ/Brasil]; Nanci Lagioto  
Hespanhol Simões [UFJF, Juiz de Fora,  
MG/Brasil]; Natália Perdomo dos Santos [UERJ,  
Rio de Janeiro/Brasil]; Nayara de Holanda Vieira  
[UFPI, Teresina, PI/Brasil]; Neusa Cavalcante  
Lima [UFF, Campos dos Goytacazes, RJ/Brasil];  
Nicole Alves Espada Pontes [UFPE, Recife,  
PE/Brasil]; Nikolas Corrent [UNIOESTE, Cascavel,  
PR/Brasil]; Patricia da Silva Coutinho [UFJF, Juiz  
de Fora, MG/Brasil]; Rafaela Barbosa de Oliveira  
Henriques [UFF, Niterói, RJ/Brasil]; Renata de  
Oliveira Cardoso [UFF, Rio das Ostras, RJ/Brasil];  
Renata dos Santos Alencar [UFPA, Belém,  
PA/Brasil]; Renata Gomes da Costa [UNIRIO, Rio  
de Janeiro, RJ/Brasil]; Renato Veloso [UERJ, Rio  
de Janeiro/Brasil]; Robson Roberto da Silva [UFF,  
Niterói, RJ/Brasil]; Rodriane de Oliveira Souza  
[UERJ, Rio de Janeiro/Brasil]; Rodrigo Fernandes  
Ribeiro [UFOP, Ouro Preto, MG/Brasil]; Rodrigo  
José Teixeira [UFF, Rio das Ostras, RJ/Brasil];  
Ronaldo Vielmi Fortes [UFJF, Juiz de Fora,  
MG/Brasil]; Rosangela Gonzaga [UFF, Niterói,  
RJ/Brasil]; Rubens Luiz Rodrigues [UFJF, Juiz de  
Fora, MG/Brasil]; Sabrina Pereira Paiva [UFJF,  
Juiz de Fora, MG/Brasil]; Samuel Francisco  
Rabelo [UFS, São Cristóvão, SE/Brasil]; Sandra de  
Faria [PUC/GO, Goiânia, GO/Brasil]; Sandra  
Regina Vaz da Silva [UFF, Niterói, RJ/Brasil];  
Sandra Rodrigues dos Santos [UFJF, Juiz de Fora,  
MG/Brasil]; Sebastião Donizeti Silva [Unesp, São  
Paulo, SP/Brasil]; Sofia Laurentino Barbosa  
Pereira [UFPI, Teresina, PI/Brasil]; Susana Maria  
Maia [UFF, Rio das Ostras, RJ/Brasil]; Tânia Maria  
Ramos de Godoi Diniz [UNIFESP, Santos,  
SP/Brasil]; Tatiana Brettas [UFRJ, Rio de Janeiro,  
RJ/Brasil]; Tatiana Dahmer Pereira [UFF, Niterói,  
RJ/Brasil]; Teresa Rodrigues da Silva [ISSSL,  
Lisboa/Portugal]; Thaís Luiz Vargas [UFRJ, Rio de  
Janeiro, RJ/Brasil]; Thaisa Teixeira Closs [PUC/RS,  
Porto Alegre, RS/Brasil]; Vanessa Follmann  
Jurgenfeld [UNESP, Marília, SP/Brasil]; Vânia  
Noeli Ferreira de Assunção [UFF, Rio das Ostras,  
RJ/Brasil]; Vera Núbia Santos [UFS, São  
Cristóvão, SE/Brasil]; Vicente de Paula Faleiros  
[UnB, Brasília, DF/Brasil]; Victor Miranda Elias  
[IBC, Rio de Janeiro, RJ/Brasil]; Virgínia Alves  
Carrara [UFOP, Ouro Preto, MG/Brasil]; Viviane  
Sousa Pereira [UFJF, Juiz de Fora, MG/Brasil];  
Yolanda Guerra [UFRJ, Rio de Janeiro, RJ/Brasil].  
Universidade Federal de Juiz de Fora  
Faculdade de Serviço Social  
Programa de Pós-graduação em Serviço Social  
Editores:  
Alexandra Aparecida Leite Toffanetto Seabra Eiras (editora-chefe);  
Isaura Gomes de Carvalho Aquino (editora-adjunta);  
Bruno Bruziguessi Bueno (editor-adjunto);  
Luciano Cardoso de Souza (editor-executivo).  
Editor de Leiaute:  
Luciano Cardoso de Souza.  
IMAGENS DA CAPA E CONTRACAPA: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil, 2023.  
ARTE CAPA E CONTRACAPA: Luciano Cardoso de Souza.  
Juiz de Fora/MG, dezembro, 2025.  
FICHA CATALOGRÁFICA  
Libertas / Universidade Federal de Juiz de Fora, Programa de Pós-graduação em Serviço Social,  
Curso de graduação em Serviço Social. n. 1 (abril, 2001) .  
Juiz de Fora, ano 2025 –  
v. 25, n. 2.  
Semestral  
Resumo em português e inglês  
Vinculada ao Programa de Pós-graduação em Serviço Social e ao Curso de Graduação em  
Serviço Social.  
Versão online ISSN 1980-8518  
1. Serviço Social. 2. Periódico. I. Universidade Federal de Juiz de Fora, Programa de Pós-Graduação em  
Serviço Social. II. Universidade Federal de Juiz de Fora, Curso de Graduação em Serviço Social.  
Diretórios e indexadores:  
Sumário  
X
Editorial  
Dossiê temático:  
Fundamentos históricos, teórico-metodológicos e  
ético-políticos do Serviço Social  
Capitalismo dependente e Serviço Social: 555  
resistência, lutas e construções  
Eduardo Henrique Moraes Santos  
Mariana Teodoro de Sousa  
Yve Matayoshi Galvão  
Lesliane Caputi  
Elementos para pensar o trabalho profissional de 573  
assistentes sociais pela perspectiva da totalidade social  
Lorena Ferreira Portes  
Melissa Ferreira Portes  
Evelyn Secco Faquin  
Fundamentos do Serviço Social: a “questão social” 595  
no centro do debate  
Ana Carolina do Nascimento Rodrigues  
Trabalho Social uma definição em disputa: 611  
breve revisão do debate de lutas e resistências  
Débora Holanda Leite Menezes  
Camila Andrade Moura Cardoso  
Jullie Doria Freitas  
Internacionalização sob critérios hegemônicos: 633  
reflexões sobre a área de Serviço Social no CAPES-Print  
Rafael Vieira Teixeira  
Janaina Lopes do Nascimento Duarte  
Serviço Social, transformações no trabalho e desafios ético-políticos: 654  
uma análise comparativa Brasil-Itália  
Salyanna de Souza Silva  
Gisele Caroline Ribeiro Anselmo  
Francesca Cubeddu  
La formación de Trabajo Social en el proceso de modernización y 672  
construcción democrática en España  
Miguel Angel Oliver  
Virgínia Alves Carrara  
Rosana MatosSilveira  
Allana Alcântara Guimarães  
30 años de debates sobre instrumentalidad: reflexiones desde la 695  
experiencia docente e investigativa del Trabajo Social en Costa Rica  
Freddy Esquivel Corella  
Diferentes abordagens sobre fundamentos do Serviço Social e a 717  
necessidade deste debate  
Ana Clara Serpa Cardoso  
Érica Aparecida dos Santos Francisco  
Luciana Gonçalves Pereira de Paula  
Os fundamentos do serviço social como pressuposto 740  
para a construção do projeto de trabalho  
Claudio Henrique Miranda Horst  
Tecnologias de informação e comunicação e assistência social: 758  
inflexões no Serviço Social  
Vinícius Paulino Lopes da Silva  
Demandas e desafios no atendimento socioassistencial 782  
a jovens na Amazônia Marajoara  
Raquel Correia de Oliveira  
Roselene de Souza Portela  
A atuação do assistente social na saúde frente à disputa de 806  
hegemonias: uma análise gramsciana  
Joseane Barbosa de Lima  
“Ainda estou aqui”: análise do Ciclo de Memórias 827  
Serviço Social na Ditadura Civil-Militar  
Graziela Scheffer  
Karla da Silva Apolinario  
Sara Beatriz Silva de Oliveira  
Tema Livre  
Ideología y ciencia en el interior de las 848  
relaciones de producción capitalistas  
Álvaro Laine Menéndez  
Acidentes de trabalho e (des)proteção social no Brasil 862  
Reginaldo Ghiraldelli  
Thais Pereira Carvalho  
A importância das políticas públicas para a primeira infância enquanto 886  
estratégia voltada à redução da mortalidade infantil no estado do Piauí  
Geysa Elane Rodrigues de Carvalho Sá  
Edna Maria Goulart Joazeiro  
Somos o futuro do Brasil? 906  
O Programa Pé-de-Meia e a Agenda 2030 da ONU  
Eduardo Cechin da Silva  
Rosilaine Coradini Guilherme  
A educação em saúde na atenção primária 931  
e o papel do assistente social  
Iza Maria Pereira  
Francisca Felícia Campos Paiva de Lima  
Jean Carlos Dantas de Oliveira  
Relato de Experiência  
Serviço social e gestão de unidades acadêmicas 947  
na perspectiva da gestão democrática  
Francine Helfreich Coutinho dos Santos  
Planejamento reprodutivo na Atenção Primária à Saúde: 968  
um relato de experiência  
Waleska Matheus Rosa  
Entrevista  
“Mas é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre”: 987  
entrevista com a Assistente Social Luiza Erundina de Sousa  
Maria Lúcia Duriguetto  
Maria Beatriz Costa Abramides  
Maria Rosângela Batistoni  
Resenha  
DEPAULIS, Alain. Naissance de la transdisciplinarité. 1006  
Paris: Éditions L’Harmattan, 2024.  
Interpenetrabilidade epistêmica como modelo contemporâneo de  
construção do conhecimento: reflexões a partir de Alain Depaulis  
Fábio Luiz Nunes  
Editorial  
Fundamentos históricos, teórico-metodológicos  
e ético-políticos do Serviço Social  
Nesta edição da Libertas nos dedicamos ao tema dos fundamentos do Serviço Social,  
enraizados na inserção histórica da profissão inscrita na divisão social e técnica do trabalho, na  
particularidade da sociedade capitalista. Os fundamentos da profissão incluem a produção de  
conhecimento caracterizada pelas pesquisas peculiares à área de Serviço Social, bem como a  
interlocução contínua com as áreas de ciências humanas e sociais. Conforme explicitamos na  
ementa para este dossiê, nesta temática estão incluídos os estudos e pesquisas que tratam das  
dimensões teórico-metodológicas, ético-políticas e técnico-operativas do Serviço Social, além  
de produções que abordam as demandas e perfis dos sujeitos que utilizam os serviços sociais;  
as relações estabelecidas entre assistentes sociais e as lutas/movimentos sociais na mediação  
com as políticas sociais; e as formas de organização da profissão.  
Apresentamos às/aos leitoras/es um conjunto instigante de artigos que abordam os  
fundamentos do Serviço Social de modos distintos, na particularidade de inserções históricas,  
institucionais, situadas, inclusive, em diferentes países. Afirma-se, assim, um debate teórico  
plural no campo crítico.  
Tratando-se de uma revista que tem recebido parte da produção de discentes e docentes  
vinculados à pós-graduação no Brasil, é relevante identificar algumas características peculiares.  
Na particularidade brasileira, a interlocução com este tema tem se estabelecido pela apropriação  
de matrizes críticas, com destaque às perspectivas inspiradas na teoria social marxista. Este  
campo de produção e debate tem estimulado formulações que contribuem para o exercício  
profissional, sobretudo para a análise da realidade – nas expressões da questão social –  
mediadas pelas requisições institucionais e demandas sociais a serem respondidas pelas/os  
assistentes sociais. É mister reconhecer a contribuição destas produções para a formulação de  
estratégias profissionais e posicionamentos ético-políticos alinhados a perspectivas  
emancipatórias, em estreita relação com a ressignificação e/ou criação de modos de operar a  
partir de referências e posicionamentos histórico-críticos, impactando na dimensão técnico-  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.51190  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 19/12/2025  
Aprovado em: 19/12/2025  
Editorial  
operativa da profissão.  
Organizamos o sumário com a apresentação inicial de três artigos cujas abordagens  
situam a profissão na particularidade da sociedade capitalista, distinguindo a inserção periférica  
de países latino-americanos e a centralidade da questão social para a compreensão das políticas  
sociais e do Serviço Social. Abrimos com o artigo “Capitalismo dependente e Serviço Social:  
resistência, lutas e construções”, escrito por Eduardo Henrique Moraes Santos, Mariana  
Teodoro de Sousa, Yve Matayoshi Galvão e Lesliane Caputi. O artigo proporciona refletir sobre  
o trabalho de assistentes sociais no contexto do capitalismo dependente brasileiro, “marcado  
pela precarização e superexploração do trabalho” e traz elementos para entender os desafios e  
estratégias coletivas de resistência e luta dos assistentes sociais no Brasil. “Essas estratégias,  
em articulação com as entidades representativas da categoria, fortalecem as condições  
cotidianas de trabalho no contexto brasileiro bem como a luta em defesa dos direitos do  
conjunto da classe trabalhadora”. E concluem, “em um contexto marcado pela desigualdade,  
pela precarização e pela superexploração da força de trabalho, o Serviço Social, ao atuar de  
forma crítica e comprometida, contribui para questionar e expor as contradições do capitalismo  
dependente e para a construção de alternativas que promovam uma sociedade mais justa e  
equitativa”. Na sequência, Lorena Ferreira Portes, Melissa Ferreira Portes e Evelyn Secco  
Faquin apresentam os “Elementos para pensar o trabalho profissional de assistentes sociais  
pela perspectiva da totalidade social”. O artigo analisa o trabalho profissional, “destacando a  
compreensão das políticas sociais como campo mediador”, distinguindo os objetivos postos  
pelas políticas sociais e os objetivos profissionais. Assim, as autoras apresentam elementos para  
o “enfrentamento do traço praticista que desemboca na forma de compreender o trabalho e  
planejar as ações profissionais”, defendendo a incorporação de uma “postura dialógica,  
educativa e de formação permanente”. Entre outros resultados, o artigo possibilitou “aprofundar  
a reflexão sobre a dimensão técnico-operativa no Serviço Social, que não pode ser analisada de  
forma desarticulada das demais dimensões do trabalho profissional — teórico-metodológica e  
ético-política —, tampouco apartada da realidade concreta”. Por sua vez, Ana Carolina do  
Nascimento Rodrigues escreve sobre os “Fundamentos do Serviço Social: a “questão social”  
no centro do debate”. Trata-se de um debate teórico-conceitual, realizado através de revisão  
bibliográfica, no qual a questão social é “compreendida a partir da Lei Geral da Acumulação  
Capitalista” e analisada na “formação sócio-histórica brasileira” e nas “transformações  
societárias que alteram as suas expressões na atualidade”. A autora conclui: “o que se apresenta  
como inequívoco é que este fenômeno [questão social] e todo o processo que ele desencadeia  
numa fase específica do capitalismo criam a necessidade e, por isso, a condição para a  
XI  
Fundamentos históricos, teórico-metodológicos e ético-políticos do Serviço Social  
existência do Serviço Social”.  
O segundo conjunto é composto por cinco artigos que tratam do Serviço Social em uma  
perspectiva internacional ou situado em distintos países (Brasil, Itália, Espanha e Costa Rica).  
As autoras Débora Holanda Leite Menezes, Camila Andrade Moura Cardoso e Jullie Doria  
Freitas abordam as definições de Serviço Social e o debate no âmbito da FITS (Federação  
Internacional de Trabalho Social). O artigo escrito por elas, intitulado “Trabalho Social uma  
definição em disputa: breve revisão do debate de lutas e resistências” “realiza uma crítica  
à definição mundial do Trabalho Social formulada pela FITS em 2000, destacando suas  
limitações teóricas, políticas e práticas no contexto da atuação profissional” e os debates no  
âmbito latino-americano que ensejaram alguns avanços na definição de 2014. Já os autores  
Rafael Vieira Teixeira e Janaína Lopes do Nascimento Duarte escrevem sobre  
a “Internacionalização sob critérios hegemônicos: reflexões sobre a área de Serviço Social  
no CAPES-Print”, artigo no qual apresentam os resultados da pesquisa na área de serviço  
social junto aos programas de pós-graduação no Brasil, tendo como foco o CAPES-Print. O  
objetivo foi “analisar o acúmulo da área frente aos critérios e prioridades do Programa CAPES-  
Print”. Os autores concluem que “as análises apresentadas sobre a internacionalização da área  
de Serviço Social no CAPES-Print indicam que os critérios do Programa prevalecem no sentido  
de direcionar os trabalhos de cooperação internacional, sob a perspectiva hegemônica de  
internacionalização”. Porém, a área de Serviço Social “tende a conectar-se estrategicamente a  
princípios construídos pelo acúmulo coletivo da profissão, no sentido da solidariedade latino-  
americana e entre países de economia dependente, principalmente os de idioma lusófono”. As  
autoras Salyanna de Souza Silva; Gisele Caroline Ribeiro Anselmo e Francesca Cubeddu  
apresentam o artigo “Serviço Social, transformações no trabalho e desafios ético-políticos:  
uma análise comparativa Brasil-Itália” no qual expõem “as diferenças entre Brasil e Itália  
no que se refere aos processos de precarização e flexibilização das relações laborais sob a égide  
do neoliberalismo”. As autoras destacam o “crescimento de um processo de ‘externalização dos  
serviços sociais’ a nível mundial”, e que “nessa dinâmica, embora os/as profissionais sejam  
contratados/as pelo Estado, os vínculos e atribuições estão cada vez mais subordinados às  
organizações sociais, evidenciando o tensionamento entre a lógica mercantil e o projeto ético-  
político da profissão”. E concluem, “se na Itália, graças à adoção de pacto fordista- keynesiano  
e da força do movimento sindical operário, o mercado de trabalho contou com maior proteção  
social; no Brasil, ao contrário, a precarização, a informalidade e a flexibilização sempre  
estiveram presentes nos elementos estruturantes da relação capital–trabalho”. Seguimos com a  
análise da formação em Serviço Social, na Espanha. Os autores Miguel Angel Oliver Perelló,  
XII  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. X-XVIII, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Editorial  
Virgínia Alves Carrara, Rosana Matos–Silveira e Allana Alcântara Guimarães subscrevem o  
artigo “La formación de Trabajo Social en el proceso de modernización y construcción  
democrática en España”, destacando que na década de 1980 “os cursos de Serviço Social na  
Espanha foram reconhecidos como Diplomaturas e passaram a ser oferecidos pelas  
universidades. Seguindo as Diretrizes do Real Decreto 1850/1981, as universidades públicas  
aprovaram currículos, que foram posteriormente homologados pelo Conselho de  
Universidades. Estas alterações se processam dentro do contexto histórico de mudança na  
Espanha, com a criação e desenvolvimento dos serviços sociais, na aprovação de várias leis  
regionais sobre serviços sociais e na realização de congressos profissionais sobre a disciplina  
que refletiram os interesses e preocupações dos assistentes sociais durante aqueles anos”. Para  
os autores, os resultados [deste estudo] destacam os novos perfis profissionais que se  
pretendeu com a Diplomatura, de carácter mais técnico e com uma formação voltada para a  
intervenção social e não para a investigação”. Fechando este conjunto, apresentamos a análise  
de Freddy Esquivel Corella sobre o debate da instrumentalidade no Serviço Social em Costa  
Rica. O artigo intitulado “30 años de debates sobre instrumentalidad: reflexiones desde la  
experiencia docente e investigativa del Trabajo social en Costa Rica” retoma o debate sobre  
a instrumentalidade “que alcançou 30 anos de maturidade, expandindo-se no Serviço Social da  
América Latina, repercutindo nos processos formativos, de pesquisa e de reprodução do  
exercício profissional”. Na Costa Rica, “como no restante da América Central”, o debate  
“adquiriu um lugar fundamental que teve de enfrentar determinadas condições intelectuais,  
acadêmicas, políticas e éticas que desafiam o rigor, a profundidade e a fundamentação analítica  
inaugurados com a obra-prima da professora Dra. Yolanda Demetrio Guerra, em 1995”. Em  
síntese, o autor afirma que “a delimitação explicativa dos objetos de pesquisa, auxiliada pelo  
debate sobre instrumentalidade, direciona em grande parte a formulação dos problemas de  
investigação saturados de profundos referenciais que interrogam a razão, a consciência, os  
meios, os fins, a sustentação ético-política, o projeto profissional, a sociedade e suas  
legalidades, assim como as margens de manobra imediatas e mediatas”.  
XIII  
O terceiro conjunto, composto por seis artigos, dedica-se ao debate teórico-conceitual  
dos fundamentos do Serviço Social desde a produção acadêmica referenciada no Brasil. Parte  
dos artigos abordam as dimensões teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa do  
Serviço Social, em estreita relação com as requisições e demandas postas às/aos assistentes  
sociais em diferentes espaços sócio-ocupacionais, na relação com as/os usuárias/os. As autoras  
Ana Clara Serpa Cardoso, Érica Aparecida dos Santos Francisco e Luciana Gonçalves Pereira  
de Paula expõem “Diferentes abordagens sobre fundamentos do Serviço Social e a  
Fundamentos históricos, teórico-metodológicos e ético-políticos do Serviço Social  
necessidade deste debate”. O artigo propõe “reflexões sobre a necessidade da aproximação  
e/ou retorno ao debate dos fundamentos da profissão, procurando demonstrar como eles se  
fazem imprescindíveis para a compreensão do [seu] significado social” e tecem considerações  
sobre a “importância do avanço em estudos, pesquisas e produções sobre os fundamentos do  
Serviço Social”. Ao final da análise, elas destacam que “o debate sobre os fundamentos do  
Serviço Social – consensualmente hegemônico em meio a nossa categoria profissional –  
encontra, de fato, muitas convergências. Mas, também esconde/revela a existência de diferentes  
abordagens sobre o tema. Essas diferentes abordagens, nem sempre são facilmente percebidas,  
pois não se revelam de maneira tão explícita e imediata. A sua captura exige um mergulho mais  
profundo nos estudos desses fundamentos da profissão”. Claudio Henrique Miranda Horst  
apresenta “Os fundamentos do serviço social como pressuposto para a construção do  
projeto de trabalho”. O artigo tem como objetivo “recuperar os fundamentos históricos e  
teóricos do Serviço Social brasileiro com vistas a contribuir para a construção do projeto de  
trabalho de assistentes sociais nos diversos espaços sócio-ocupacionais”. O autor dedica-se aos  
conteúdos que perpassam a elaboração de um projeto de trabalho profissional, sendo que a  
“ênfase escolhida para aprofundamento foi em torno (...) [da] concepção de profissão; o  
objeto/matéria de trabalho; os objetivos do trabalho; os valores ético-políticos e as atribuições  
e competências profissionais”. Ao final, considera que “o projeto de trabalho não é um mero  
instrumento ou um manual. Deve condensar limites e possibilidades, sendo assim, articular os  
elementos institucionais e os compromissos profissionais. E deve ser um instrumento de  
constante avaliação”. O autor Vinícius Paulino Lopes da Silva apresenta o artigo sobre as  
“Tecnologias de informação e comunicação e assistência social: inflexões no Serviço  
Social” visando “contribuir no debate crítico sobre a intensificação do uso das tecnologias de  
informação e comunicação (TICs) pelo Estado na PAS [Política de Assistência Social],  
evidenciando suas implicações no âmbito dos direitos sociais e no âmbito profissional no  
Brasil”. Ao final, o autor reitera que as “tecnologias sob o crivo do capital financeiro”  
prometem “performar a automatização das respostas profissionais e facilitar os processos de  
trabalho”, mas elas “de forma alguma” suprimem a necessidade de uma formação continuada  
que considere a unidade das dimensões “teórico-metodológica, ético-política e técnico-  
operativa, político-pedagógica e interventiva”, mantendo o compromisso com a qualidade nos  
serviços prestados às/aos usuárias/os. Ainda na área da assistência social, as autoras Raquel  
Correia de Oliveira e Roselene de Souza Portela expõem as “Demandas e desafios no  
atendimento socioassistencial a jovens na Amazônia Marajoara”. O artigo analisa “as  
demandas das juventudes e as dificuldades para sua inserção como sujeitos de direito nos  
XIV  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. X-XVIII, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Editorial  
programas, serviços e projetos desenvolvidos pelos Centros de Referência da Assistência Social  
de Breves, no Marajó/PA”. Por sua vez, “os resultados evidenciam a urgência da participação  
juvenil no planejamento das ações - atualmente centralizado na gestão municipal - e a  
necessidade de um trabalho intersetorial que amplie o acesso às políticas sociais”. As autoras  
indicam a necessidade do conhecimento “das particularidades socioculturais da região” para  
avançar nas “restrições de acesso aos programas, serviços e projetos”. Já o artigo de Joseane  
Barbosa de Lima aborda “A atuação do assistente social na saúde frente à disputa de  
hegemonias: uma análise gramsciana”, que tem como objetivo “analisar o exercício  
profissional do assistente social no campo da saúde pública, à luz do pensamento de Antônio  
Gramsci e dos fundamentos do Projeto Ético-Político do Serviço Social”. A autora recolhe as  
contribuições do pensamento gramsciano apropriados no Serviço Social desde os anos de 1980,  
contexto em que “a profissão redefine sua direção social, assumindo um compromisso ético-  
político com a emancipação humana e com a construção de uma ordem social pautada na  
justiça, na equidade e na universalização dos direitos. Ao articular teoria e prática, ética e  
política, o projeto profissional adquire um caráter pedagógico, com potencial transformador,  
afirmando-se como crítica à ordem vigente e como força promotora de novas formas de  
organização e consciência coletiva”. A partir desses fundamentos ético-políticos, o artigo  
“examina a atuação do assistente social na saúde como espaço permeado por contradições,  
disputas de projetos societários, resistência e afirmação de práticas contra-hegemônicas. Essa  
análise se insere no contexto das ofensivas neoliberais e ultraconservadoras que vêm incidindo  
sobre o Sistema Único de Saúde (SUS) e os direitos sociais, tensionando o trabalho profissional  
e os princípios que o orientam” e busca “fortalecer o posicionamento crítico dos/das assistentes  
sociais frente às disputas ideológicas contemporâneas, reafirmando o compromisso da profissão  
com as lutas da classe trabalhadora pela transformação social”. Concluímos este conjunto com  
o artigo intitulado “Ainda estou aqui”: análise do Ciclo de Memórias do Serviço Social na  
Ditadura, escrito por Graziela Scheffer, Karla da Silva Apolinario e Sara Beatriz Silva de  
Oliveira, que apresenta o resultado da ação extensionista denominada “Ciclo de Memórias  
Serviço Social na Ditadura Civil-Militar", que “foram realizadas no formato de ciclo de debates  
por meio de depoimentos de estudantes, docentes e profissionais cujas experiências formativas  
e/ou profissionais ocorreram no período ditatorial”. Este artigo analisa seis depoimentos  
realizados na ação, entendidos como “importante estratégia pedagógica de resgate das  
memórias coletivas acerca das formas das resistências profissionais na ditadura civil-militar. A  
memória profissional foi uma estratégia pedagógica de sensibilização da consciência histórica  
junto ao segmento acadêmico”, haja vista que mesmo “passados 40 anos da ditadura civil-  
XV  
Fundamentos históricos, teórico-metodológicos e ético-políticos do Serviço Social  
militar, ainda persistem as heranças autoritárias que se evidenciam na polarização social no  
cenário político brasileiro”.  
Seguindo a publicação dos artigos em fluxo contínuo, a Libertas apresenta a seção Tema  
Livre com importantes contribuições acerca de temas que versam sobre a teoria social, as  
transformações no mundo do trabalho e as políticas sociais. Abrimos a seção com o artigo de  
Álvaro Laine Menéndez, “Ideología y ciencia en el interior de las relaciones de producción  
capitalistas”, que propõe uma série de reflexões em torno do conceito de ideologia, indicando  
ser mais apropriado, no campo do desenvolvimento de uma questão epistemológica em torno  
deste tema, se pensar a relação “ideologia-sociedade” juntamente com a relação “ideologia-  
conhecimento”. Destacamos também o artigo de Reginaldo Ghiraldelli e Thais Pereira  
Carvalho, “Acidentes de trabalho e (des)proteção social no Brasil”, que objetiva analisar a  
intensificação dos acidentes de trabalho no Brasil a partir das transformações no mundo do  
trabalho e o desmantelamento da política social, utilizando indicadores referentes ao período  
de 2015 a 2024, destacando as diversas modalidades de precarização do trabalho e as diversas  
mudanças na legislação trabalhista. Na sequência, temos dois artigos que discutem, por uma  
perspectiva crítica, objetivos diferentes estabelecidos pela chamada Agenda 2030 da ONU. O  
primeiro é de autoria de Geysa Elane Rodrigues de Carvalho Sá e Edna Maria Goulart Joazeiro,  
intitulado “A importância das políticas públicas para a primeira infância enquanto  
estratégia voltada à redução da mortalidade infantil no estado do Piauí”, busca analisar os  
impactos das políticas da área da saúde voltadas para primeira infância (crianças de 0 a 6 anos)  
com intuito de reduzir a taxa de mortalidade infantil no estado do Piauí, destacando a meta 3.2  
que integra os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da ONU, que  
estabelece a eliminação de óbitos evitáveis de recém-nascidos e menores de 5 anos até 2030. O  
segundo, é o artigo “Somos o futuro do Brasil? O Programa Pé-de-Meia e a Agenda 2030  
da ONU”, escrito por Eduardo Cechin da Silva e Rosilaine Coradini Guilherme, que propõe  
uma caracterização do Programa Pé-de-Meia, compreendido como um “incentivo financeiro-  
educacional, em formato de poupança, para estudantes em tempo integral da rede pública de  
ensino médio”, e estabelece relação com dois objetivos preconizados na Agenda 2030 da ONU  
que tratam da “educação de qualidade” e “trabalho decente e crescimento econômico”. A partir  
dessa análise os autores evidenciam o caráter de focalização e seletividade do programa,  
característico dos programas de transferência de renda próprios do receituário neoliberal. Para  
fechar a seção, temos o artigo de Iza Maria Pereira; Francisca Felícia Campos Paiva de Lima e  
Jean Carlos Dantas de Oliveira, “A educação em saúde na atenção primária e o papel do  
assistente social”, que tem como objetivo fazer uma discussão sobre o papel dos assistentes  
XVI  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. X-XVIII, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Editorial  
sociais na educação em saúde na atenção primária, destacando a necessidade de ampliar a  
compreensão sobre a importância desses profissionais para a “promoção de práticas coletivas e  
democráticas, fundamentais para assegurar o acesso dos usuários aos serviços de saúde,  
especialmente no SUS”, permitindo a ampliação de “ações estratégicas” vinculadas “à gestão  
de políticas públicas, ao controle social, ao exercício da cidadania e à qualificação do SUS”.  
Neste número publicamos dois artigos, no formato de relato de experiência. O primeiro,  
escrito por Francine Helfreich Coutinho dos Santos, “Serviço Social e gestão de unidades  
acadêmicas na perspectiva da gestão democrática”, trata sobre “os desafios colocados na  
gestão de unidades acadêmicas, subjacente à experiência na direção da Escola de Serviço Social  
de uma Universidade Pública, onde se problematizam os dilemas e estratégias construídos para  
a realização da gestão democrática que reitera a defesa da universidade pública ancorada, ainda,  
no projeto ético político do Serviço Social”. O segundo texto, de autoria de Waleska Matheus  
Rosa, sistematiza as ações no âmbito do “Planejamento reprodutivo na Atenção Primária à  
Saúde: um relato de experiência”, “a partir da atuação enquanto assistente social residente  
em uma Unidade Básica de Saúde”. A autora buscou compreender “como as diretrizes dos  
direitos reprodutivos/planejamento reprodutivo são incorporadas e executadas na prática pela  
Atenção Primária à Saúde, bem como identificar quais as contribuições que a residência  
multiprofissional pode oferecer nas ações de planejamento reprodutivo no cenário de prática”.  
A entrevista “Mas é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre”,  
realizada com a assistente social Luíza Erundina de Sousa, sintetiza a sua trajetória no Serviço  
Social (1967-1981), na qual se destaca o compromisso ético-político com os usuários e as  
iniciativas de organização da categoria. A entrevista foi realizada por Maria Lúcia Duriguetto,  
Maria Beatriz Costa Abramides e Maria Rosângela Batistoni, que reconhecem na trajetória de  
Erundina, uma conjugação da ação profissional comprometida nas e com as lutas sociais,  
aspectos que formaram um grupo de profissionais naquele período.  
XVII  
Fechando este número da Libertas, apresentamos a resenha elaborada por Fábio Luiz  
Nunes sobre o livro de Alain Depaulis, Naissance de la transdisciplinarité (Éditions  
L'Harmattan, 2024), ainda sem tradução para a língua portuguesa. A resenha, intitulada  
“Interpenetrabilidade epistêmica como modelo contemporâneo de construção do  
conhecimento: reflexões a partir de Alain Depaulis” expõe o desenvolvimento dos capítulos,  
além de destacar os principais argumentos do livro, acrescentando-se os comentários críticos  
feitos pelo resenhista.  
Os fundamentos históricos do Serviço Social estão permeados pelas lutas sociais, na  
relação de unidade e antagonismo entre capital e trabalho, contradição peculiar à sociedade  
Fundamentos históricos, teórico-metodológicos e ético-políticos do Serviço Social  
capitalista. E como expressar a atualidade dessas lutas em forma de imagem? Chegamos, assim,  
à capa e à contracapa desta edição. A escolha das imagens1 que compõem este número da  
Libertas dialoga com as lutas sociais atuais, dentre as quais a luta indígena em defesa do  
território para os povos originários, como também a luta pela propriedade coletiva da terra, seu  
uso social, como tem defendido, historicamente, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem  
Terra. A força desses movimentos provém, em grande medida, de milhares de mulheres que  
insistem e persistem na luta pela vida, ainda que sobrevivendo em condições difíceis. Assim,  
as imagens expressam o protagonismo feminino, a força e a resistência, através de cores  
vibrantes que assinalam a garra e a vitalidade necessárias a todas/os que desejam construir uma  
sociedade justa. E, para esta sociedade existir, é necessário enfrentar as barreiras impostas pelo  
capitalismo, as quais ameaçam a vida em todas as suas formas.  
Ao final deste Editorial expressamos nossa gratidão à Isaura Gomes de Carvalho Aquino  
pelo trabalho realizado e por suas contribuições na Comissão Editorial da Libertas (2022-2025),  
dessa convivência permanecem os saberes e aprendizados compartilhados, além do espaço para  
um possível regresso.  
Juiz de Fora, 23 de dezembro de 2025.  
XVIII  
Alexandra A. L. T. S. Eiras, Bruno Bruziguessi, Luciano Cardoso de Souza.  
1 As belas imagens da capa e contracapa foram registradas pelo fotojornalista Fabio Rodrigues-Pozzebom, da  
Agência Brasil, na III Marcha das Mulheres Indígenas, ocorrida em Brasília em setembro de 2023. Nesta edição  
do encontro – promovido pela Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade  
(ANMIGA) –, o tema central foi “Mulheres Biomas em Defesa da Biodiversidade através das raízes ancestrais”,  
congregando a luta por igualdade de gênero, segurança, garantia de direitos e da preservação da cultura dos povos  
originários, assim como a demarcação de terras e a defesa da biodiversidade.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. X-XVIII, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Capitalismo dependente e Serviço Social:  
resistência, lutas e construções  
Dependent Capitalism and Social Work:  
resistance, struggles and constructions  
Eduardo Henrique Moraes Santos*  
Mariana Teodoro de Sousa**  
Yve Matayoshi Galvão***  
Lesliane Caputi****  
Resumo: Este artigo oferece reflexões sobre o  
trabalho de assistentes sociais no contexto do  
capitalismo dependente brasileiro, marcado  
Abstract: The work brings reflections on the  
expressions of social workers' work in the  
context of Brazilian dependent capitalism,  
addressing aspects such as precariousness and  
overexploitation, aiming to express in  
professional work the resistance strategies  
adopted by professionals, from a critical-  
dialectic perspective. This is a theoretical essay,  
anchored in the critical approach of the Marxist  
pela precarização  
e
superexploração do  
trabalho. Trata-se de um ensaio teórico  
fundamentado na abordagem crítica da tradição  
marxista, com base em revisão bibliográfica e  
análise documental. Como resultado, observa-  
se que assistentes sociais enfrentam desafios  
significativos e constroem, de maneira coletiva  
e politicamente articulada, estratégias de  
resistência e luta que se alinham ao projeto  
ético-político hegemônico da profissão. Essas  
estratégias, em articulação com as entidades  
representativas da categoria, fortalecem as  
condições cotidianas de trabalho no contexto  
brasileiro bem como a luta em defesa dos  
direitos do conjunto da classe trabalhadora.  
tradition and carried out through  
a
bibliographical review and documentary  
analysis. As a point of arrival, social workers  
face challenges and collectively and politically  
build strategies of resistance and struggles  
aligned with the hegemonic ethical-political  
project of the profession, in confrontation with  
entities in the category, building insights to  
strengthen everyday working conditions. in the  
Brazilian context.  
Palavras-chaves: Serviço Social; Capitalismo  
Keywords: Social Service; Dependent  
dependente; Projeto ético-político.  
capitalism; Ethical-political project.  
* Universidade Federal do ABC. E-mail: santos.hm.eduardo@gmail.com  
** Universidade Estadual Paulista. E-mail: teodoro.sousa@unesp.br  
*** Universidade Federal do Triângulo Mineiro. E-mail: yve.galvao@gmail.com  
**** Universidade Federal do Triângulo Mineiro. E-mail: lesliane.caputi@uftm.edu.br  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.48350  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 15/04/2025  
Aprovado em: 06/08/2025  
Eduardo Henrique Moraes Santos; Mariana Teodoro de Sousa; Yve Matayoshi Galvão; Lesliane Caputi  
Introdução  
As profundas raízes da desigualdade no Brasil, marcadas pela dependência econômica  
e política histórica, moldam o cotidiano de milhões de trabalhadoras/es brasileiras/os e desafiam  
as fronteiras do Serviço Social no país. A subordinação da economia brasileira aos interesses  
das economias centrais restringe as possibilidades de desenvolvimento autônomo,  
aprofundando desigualdades e intensificando as expressões da questão social. Nesse cenário, a  
atuação de assistentes sociais se insere em um contexto amplo de refilantropização e  
plaformização das políticas sociais, ampliação da superexploração da força de trabalho e  
crescente limitação ao acesso nos serviços públicos.  
Este artigo, sob luz do referencial marxista acerca do capitalismo dependente, investiga  
as relações que envolvem e moldam o Serviço Social brasileiro frente às ofensivas políticas  
neoliberais considerando, o desenvolvimento histórico e o significado social da profissão na  
perspectiva crítica, logo, marxista, para discutir as possibilidades de lutas e resistência no atual  
cenário marcado pela subordinação econômica, plataformização e neoliberalização da vida.  
A inserção do Brasil no sistema capitalista global é marcada pela dependência estrutural  
e pela subordinação aos interesses dos países centrais. Concebido dentro das abordagens críticas  
da Teoria Marxista da Dependência, o capitalismo dependente brasileiro caracteriza-se pela  
superexploração da força de trabalho, pela subordinação aos fluxos de capital e pela  
desigualdade estrutural, configurando uma economia periférica cujos recursos e riquezas são  
direcionados a fortalecer a acumulação de capital nas economias centrais (Marini, 2005).  
Destarte, as contradições sociais se intensificam, aprofundando desigualdades e  
limitando a capacidade de transformação social do país, tanto em nível nacional quanto  
internacional. Esses aspectos estruturais da dependência também exercem influência sobre as  
políticas sociais e públicas, bem como sobre o exercício de profissões que lidam com as  
expressões da questão social, fruto do conflito entre capital e trabalho, entre as quais se destaca  
o Serviço Social (Netto, 2001).  
556  
Enquanto profissão inserida na divisão de gênero, racial e sociotécnica do trabalho, o  
Serviço Social sofre os rebatimentos estruturais e conjunturais do modo de (re)produção social,  
especialmente das relações de dependência econômica e dos processos de subordinação que  
marcam a economia brasileira. Sua trajetória no país tem origem em um contexto conservador,  
vinculado ao desenvolvimento das políticas sociais estatais na década de 1930. No entanto, foi  
a partir da década de 1970, em meio às lutas e resistências contra a ditadura militar e empresarial  
na América Latina, que a profissão passou a se articular com os movimentos sociais da classe  
trabalhadora, impulsionando a construção de uma perspectiva histórico-crítica (Netto, 2001).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 555-572, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Capitalismo dependente e Serviço Social: resistência, lutas e construções  
Esse processo culminou na formulação do Projeto Ético-Político do Serviço Social, consolidado  
a partir do denominado Congresso da Virada (1979).  
Esse projeto profissional está ancorado em uma proposta societária que defende a  
“ruptura com o conservadorismo, travando batalha anticapitalista na direção de uma sociedade  
igualitária e libertária, comum a todos os indivíduos sociais” (Caputi; Tabosa; Paula, 2021, p.  
43). Seu eixo ético fundamental é a liberdade, associada aos princípios de democracia,  
ampliação e consolidação da cidadania e defesa intransigente dos direitos humanos, o que  
implica necessariamente o respeito à diversidade.  
No entanto, as contradições geradas pelo capitalismo dependente e pela ofensiva  
neoliberal impõem desafios constantes ao Serviço Social. “No cenário da complexa dinâmica  
de forças entre Estado e sociedade civil, as políticas públicas e sociais são marcadas por  
negociações, ajustes, lutas e concessões políticas” (Duarte, 2021, p. 28). Alinhado ao seu  
projeto crítico, o Serviço Social não tem se furtado ao debate e à resistência diante dos  
sucessivos ataques às políticas públicas e sociais. Esse processo se intensificou nos últimos  
anos, especialmente no contexto do aprofundamento da agenda neoliberal no Brasil. Entre 2017  
e 2022, sob um governo de extrema direita, houve um ataque frontal à ciência, à natureza  
pública das instituições e aos serviços e políticas sociais como um todo, em um movimento que  
persiste e exige vigilância e resistência contínuas.  
557  
Muitas são as estratégias de resistência, as lutas e as construções promovidas pelo  
Serviço Social no Brasil no contexto do capitalismo dependente, e no compêndio das reflexões  
deste artigo, destacam-se algumas pautadas no sentido da práxis transformadora, conectadas à  
defesa do Projeto Ético-Político da profissão como direção ética para a construção de práticas  
comprometidas com a justiça social e com a emancipação humana.  
O estudo busca compreender as condições concretas de trabalho das/os assistentes  
sociais e as estratégias desenvolvidas para resistir às restrições impostas pela dependência. Para  
isso, fundamenta-se em uma revisão bibliográfica que mobiliza as principais produções sobre  
o capitalismo dependente, bem como sobre a trajetória e o desenvolvimento do Serviço Social  
no Brasil. Além disso, analisa documentos institucionais e normativos da profissão,  
possibilitando uma abordagem crítica sobre os desafios e possibilidades do exercício  
profissional nesse contexto.  
Isto é, este ensaio visa contribuir para o debate sobre o papel do Serviço Social na  
construção de práticas que, ao mesmo tempo em que buscam responder às demandas  
institucionais, reforcem sua formação e visão crítica diante do compromisso com a defesa dos  
direitos sociais e com a promoção de uma cidadania, assumindo um papel relevante na luta  
Eduardo Henrique Moraes Santos; Mariana Teodoro de Sousa; Yve Matayoshi Galvão; Lesliane Caputi  
contra as desigualdades estruturais produzidas pela lógica do capitalismo dependente.  
Capitalismo dependente e as políticas sociais  
O conceito de capitalismo dependente constitui uma categoria analítica essencial para  
compreender as particularidades do desenvolvimento econômico e social na América Latina,  
com ênfase no contexto brasileiro abordado neste artigo. Trata-se de um sistema de produção e  
acumulação estruturado pela subordinação aos interesses do capital internacional, no qual a  
divisão internacional do trabalho impõe especializações produtivas que limitam a capacidade  
das economias periféricas de promover seu próprio desenvolvimento (Osório, 2017).  
No Brasil, essa dependência se expressa historicamente na estrutura econômica e social  
desde o período colonial, intensificando-se com o processo de industrialização dependente  
iniciado na década de 1930 e consolidado durante o regime militar. Esse modelo econômico se  
organiza em função do mercado externo, priorizando setores voltados à exportação, como a  
agroindústria e a mineração, em detrimento de investimentos em áreas estratégicas para o  
desenvolvimento social e tecnológico interno.  
Nessa lógica, “a produção não depende, para sua realização, da capacidade interna de  
consumo” (Marini, 2005, p. 132), o que significa que o crescimento econômico pode ocorrer  
sem necessariamente resultar em melhorias nas condições de vida da população local. Isso  
ocorre porque o processo de realização do valor se efetiva nas economias centrais, perpetuando  
um desenvolvimento econômico subordinado, em que os recursos e riquezas gerados no país  
são desviados para atender à demanda externa.  
558  
Esse modelo de acumulação no capitalismo dependente dá origem a uma forma  
específica de exploração, identificada por Marini (2005) como superexploração da força de  
trabalho. Esse conceito se refere a um processo no qual a acumulação do capital não se dá  
apenas por meio da exploração convencional da força de trabalho, mas por mecanismos que  
intensificam a extração de mais-valia de maneira particular. Para Luce (2012), essa exploração  
ocorre de três formas principais: i) pelo aumento da intensidade do trabalho, ampliando a  
produção de mais-valia relativa; ii) pela extensão da jornada de trabalho, elevando a produção  
de mais-valia absoluta; e iii) pela remuneração da força de trabalho abaixo de seu valor,  
impossibilitando a reprodução plena do trabalhador.  
É fundamental destacar que a superexploração não se confunde com pobreza absoluta,  
mas sim com a impossibilidade de suprir integralmente tanto as necessidades básicas (como  
alimentação, saúde e educação) quanto às necessidades sociais (como acesso a tecnologias e  
produções culturais de seu próprio tempo histórico). Além disso, a superexploração resulta no  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 555-572, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Capitalismo dependente e Serviço Social: resistência, lutas e construções  
desgaste precoce da força de trabalho, decorrente da intensificação da jornada laboral e das  
condições degradantes de trabalho impostas às populações das economias dependentes (Marini,  
2014).  
Embora as regiões dependentes permaneçam econômica e politicamente subordinadas,  
a superexploração da classe trabalhadora garante a manutenção dos privilégios das classes  
dominantes locais e internacionais, perpetuando esse padrão de subordinação. Nesse sentido, a  
superexploração não apenas intensifica a extração de mais-valia, mas também potencializa a  
lucratividade e a acumulação do capital nas economias centrais, consolidando a posição  
periférica da América Latina no sistema-mundo capitalista.  
As consequências desse processo, agravadas pela diluição da proteção social,  
materializam-se em uma profunda desigualdade estrutural e na precarização das condições de  
vida da maioria da população. O acesso restrito a direitos fundamentais, como saúde, educação  
e segurança social, amplia a vulnerabilidade da classe trabalhadora, expondo-a a formas cada  
vez mais intensas de exploração e exclusão social.  
[...] por bilhões de homens e mulheres dependentes de forma exclusiva do  
trabalho para sobreviver e encontrar, cada vez mais, situações instáveis,  
precárias, ou vivenciando diretamente o flagelo do desemprego; [...] aqueles  
que se mantêm empregados presenciam a corrosão dos seus direitos,  
consequência da lógica destrutiva do capital […] novas modalidades de  
trabalho informal, intermitente, precarizado, “flexível”, depauperando ainda  
mais os níveis de remuneração daqueles que se mantêm trabalhando (Antunes,  
2018, p. 26 apud Camargo, 2021, p. 492-493).  
559  
Essa reorganização do trabalho, ancorada na reprimarização das economias latino-  
americanas, impõe impactos profundos sobre as políticas sociais. À medida que o Estado  
enfrenta restrições orçamentárias e crescentes pressões para se adequar às demandas do capital  
internacional, intensifica-se a disputa pelo fundo público e limita as possibilidades de  
investimento em proteção social. A adoção de políticas de austeridade, amplamente incentivada  
e intensificada nas últimas décadas por organismos como o Fundo Monetário Internacional  
(FMI) e Banco Mundial, resulta em cortes sucessivos nos investimentos sociais, agravando a  
precarização das condições de vida da classe trabalhadora e impondo sua subjugação à  
superexploração como condição de sobrevivência (Brettas, 2017).  
Essas dinâmicas têm implicações diretas na luta de classes e, consequentemente, nas  
respostas do Estado às expressões da questão social. A reconfiguração das políticas sociais  
ocorre por meio da implementação de programas e projetos alinhados aos processos de  
reestruturação produtiva, consolidando um modelo de gestão social orientado pela lógica do  
ajuste fiscal permanente (Brettas, 2017). Esse movimento tem como marco a contrarreforma do  
Eduardo Henrique Moraes Santos; Mariana Teodoro de Sousa; Yve Matayoshi Galvão; Lesliane Caputi  
Estado brasileiro iniciada na década de 1990, que estabeleceu as bases para a retração do papel  
estatal na garantia de direitos e para a intensificação da privatização e mercantilização dos  
serviços públicos.  
Ao gerir as expressões da questão social por meio de políticas sociais moldadas pela  
lógica neoliberal, o capital mantém um discurso moralizante sobre o comportamento da classe  
trabalhadora, instituindo uma relação de controle social1 que combina consenso e coerção. Esse  
controle se materializa nas condicionalidades impostas para o acesso às políticas sociais,  
restringindo a concepção de direitos e submetendo os sujeitos às exigências do capital (Souza,  
2010).  
A questão do controle social na dinâmica do capital torna-se evidente nas concepções  
de subsunção formal e subsunção real do trabalho ao capital (Marx, 1978 apud Souza, 2010).  
Nessa perspectiva, a subordinação do trabalho ao capital se renova continuamente,  
intensificando a extração do trabalho excedente. Esse processo pode se manifestar de diferentes  
formas, desde a configuração de um Estado de Bem-Estar Social até a desregulamentação  
neoliberal, conforme as necessidades do capital e a correlação de forças entre as classes em  
cada conjuntura histórica.  
Entretanto, nos países da periferia do sistema, especialmente na América Latina,  
historicamente marcada por uma inserção subordinada na divisão internacional do trabalho,  
prevalece um padrão de proteção social limitado, seletivo e focalizado, que se constitui como  
expressão das contradições do capitalismo dependente.  
560  
O ciclo do capital latino-americano impõe condicionantes estruturais em todo processo  
produtivo e reprodutivo, neste sentido, a proteção social carrega em sua institucionalização e  
disposição orçamentária as contradições ineretes ao desenvolvimento desigual e combinado,  
acentuadas pelas variáveis do tempo histórico.  
Esta particularidade estrutural evidência a disparidade nos níveis de proteção social e  
degradação da força de trabalho consolidadas entre os trabalhadores do norte e sul global.  
Assim, apesar de o capitalismo central ter experimentado seus anos de ouro através do  
intervencionismo keynesiano, tal realidade não se aplica em Nuestra América.  
1
“Na esfera política o controle social se expressa para regular a relação entre indivíduo e sociedade, ou seja, a  
relação entre as classes. Nessa esfera, o Estado mantém uma relação de complementaridade com a economia, com  
a base material, e exerce o controle sobre a sociedade, em particular, sobre o trabalho para diminuir os efeitos das  
desigualdades sociais, em face do agravamento da questão social no capitalismo dos monopólios e visando evitar  
os conflitos sociais entre as classes. No que se refere aquela relação de complementaridade, o Estado interfere na  
dinâmica da economia tanto na fase reguladora do capitalismo em que prevalece uma política keynesiana, quanto  
como restringe sua intervenção econômica e reduz direitos e benefícios sociais aos cidadãos, no momento em que  
predominam alternativas de desenvolvimento baseados no neoliberalismo” (Souza, 2010, p. 05).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 555-572, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Capitalismo dependente e Serviço Social: resistência, lutas e construções  
Nesse contexto, as políticas sociais, ainda que apresentem traços de universalização em  
momentos pontuais, são, em grande medida, determinadas por condicionantes externos e  
restrições fiscais impostas pela lógica de transferência de valor ao capital internacional,  
reproduzindo mecanismos de regulação social compatíveis com as exigências do capital em sua  
fase contemporânea.  
Esta condição impacta diretamente o exercício profissional do Assistente Social, desde  
a constituição da profissão até os desafios cotidianos, como observaremos a seguir.  
Serviço Social no capitalismo dependente  
O Serviço Social se legitima e se desenvolve como profissão no interior da divisão  
social, técnica, racial e de gênero do trabalho, tendo como pano de fundo as contradições e o  
desenvolvimento do capitalismo industrial monopolista (Iamamoto, 2007). Esses processos são  
apreendidos sob a ótica da luta de classes, evidenciando que a profissão atua diretamente nas  
políticas sociais e no enfrentamento das consequências da intensificação da superexploração do  
trabalho. No cotidiano, essa atuação se traduz no aumento da demanda por serviços sociais e  
na escassez de recursos para atender às famílias em situação de vulnerabilidade, colocando  
as/os assistentes sociais em uma posição de mediação entre as exigências do capital e as  
necessidades da classe trabalhadora.  
561  
Portanto, é nessa estrutura de exploração e subordinação que se configuram tanto os  
desafios diários da profissão quanto as estratégias de resistência. Aprofundando a análise da  
superexploração da força de trabalho e da dependência tecnológica e financeira do país, torna-  
se possível compreender as políticas sociais não como conquistas isoladas, mas como parte de  
um processo contraditório de controle e manutenção da ordem social. Ao intervir nas expressões  
da questão social, o Serviço Social é diretamente impactado por essas contradições (Netto,  
2001), encontrando-se na linha de frente das tensões entre a reprodução de um sistema  
dependente e a luta pela garantia de direitos e pela construção de um projeto societário que  
rompa com essa lógica de subordinação estrutural.  
Nesse sentido, o Serviço Social sofre diretamente os impactos do capitalismo  
dependente, como a intensificação da superexploração – resultante da permanente tentativa do  
capital de reduzir o valor da força de trabalho –, das crises urbanas, ambientais e econômicas  
cíclicas.  
Essas crises repercutem diretamente na vida da classe trabalhadora e,  
consequentemente, no Serviço Social, uma vez que a profissão não apenas atende a essa  
população, mas também se insere e se constrói enquanto parte dessa classe, engajada na defesa  
de suas lutas.  
Eduardo Henrique Moraes Santos; Mariana Teodoro de Sousa; Yve Matayoshi Galvão; Lesliane Caputi  
A/o assistente social é um/a trabalhador/a assalariado/a, com autonomia relativa, e a  
profissão, regulamentada pela Lei Federal nº 8.662/1993, configura-se como uma área de  
conhecimento das ciências sociais aplicadas. No Brasil, o Serviço Social se insere no campo  
das profissões liberais, embora sua prática esteja indissociavelmente vinculada às dinâmicas do  
trabalho assalariado e à reprodução das relações capitalistas. Sendo historicamente situado no  
contexto da complexificação dessas relações, o saber-fazer profissional do Serviço Social  
estrutura-se a partir das mediações entre capital e trabalho, constituindo sua base material e  
teórica. Esse processo se materializa no enfrentamento dos desafios impostos pela  
reestruturação produtiva e pelo aprofundamento da lógica neoliberal, que redefine as condições  
de trabalho e os limites da intervenção profissional (Iamamoto, 2007).  
A institucionalização e a legitimação do Serviço Social no Brasil estão historicamente  
vinculadas à expansão das políticas sociais, inicialmente pautadas por um caráter  
assistencialista e conservador. No entanto, a partir das décadas de 1970 e 1980, a profissão  
passou por uma reorientação crítica impulsionada pelo Movimento de Reconceituação, em um  
cenário marcado pelo processo de redemocratização do país e pelo fortalecimento das bases  
teóricas marxistas no campo do Serviço Social (Netto, 2001). Esse movimento culminou na  
formulação do Projeto Ético-Político do Serviço Social (PEP), que propõe uma atuação voltada  
para a emancipação e a justiça social, reafirmando o compromisso da profissão com a classe  
trabalhadora e com a transformação das condições estruturais que perpetuam a desigualdade.  
Contudo, a tentativa de consolidar uma atuação crítica encontra barreiras estruturais que  
desafiam a intervenção profissional e exigem estratégias de resistência e enfrentamento. Em  
primeiro lugar, é fundamental considerar a relação de compra e venda da força de trabalho  
dos/as assistentes sociais, mediada pelas determinações do assalariamento. Essa condição  
evidencia as limitações e contradições inerentes ao exercício profissional no contexto do  
capitalismo (Iamamoto, 2007).  
562  
O vínculo contratual e assalariado insere o/a assistente social sob a autoridade  
organizacional, submetendo-o/a às diretrizes institucionais que, muitas vezes, entram em  
conflito com as perspectivas e objetivos críticos do PEP. Além disso, a superexploração do  
trabalho se manifesta por meio de salários rebaixados, ampliação das demandas profissionais,  
intensificação e diversificação das requisições do capital – como a incorporação das  
Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) e a plataformização das políticas sociais  
(Guerra, 2023) –, além da flexibilização dos vínculos empregatícios, contratos temporários e  
terceirização, todos respaldados pelas contrarreformas trabalhistas que regulamentam a  
informalidade e a precarização do trabalho.  
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Capitalismo dependente e Serviço Social: resistência, lutas e construções  
Essas condições são evidenciadas pelos dados do Conselho Federal de Serviço Social  
(CFESS, 2024), que apontam que 31,16% dos/as assistentes sociais no Brasil recebem até R$  
2 mil e outros 32,21% recebem até R$ 3 mil, valores inferiores à renda média nacional (Pnad,  
2022). Além disso, 45% desses/as profissionais são contratados/as sem concurso público, o que  
reforça a instabilidade e a desproteção trabalhista. Destaca-se ainda que a profissão é  
predominantemente exercida por mulheres, o que insere o Serviço Social em um contexto de  
dupla exploração, na medida em que a precarização do trabalho se articula com as  
desigualdades de gênero (CFESS, 2024).  
O Serviço Social, por ser uma profissão predominantemente composta por  
mulheres negras, assim como seu público atendido, está intrinsecamente  
vinculado a todas as expressões de desigualdade social advindas do sistema  
capitalista, como as violências contra as mulheres, a precarização no mundo  
do trabalho, o desemprego, o trabalho desvalorizado e não remunerado e todas  
as opressões, explorações, desvalorizações e subalternidades conferidas às  
mulheres (CFESS, 2024, n.p.).  
Esse processo acentua a exploração e os adoecimentos da classe trabalhadora,  
compondo a nova morfologia do mundo do trabalho, cujas contradições foram intensificadas e  
tornadas mais visíveis com o aprofundamento da dependência. Como ressaltam Raichelis et al.  
(2022, p. 23), essa "nova-velha morfologia do trabalho" aprofunda os desafios já presentes no  
cotidiano profissional dos/as assistentes sociais, evidenciando a necessidade de fortalecer  
estratégias coletivas de resistência frente às ofensivas neoliberais e à precarização das políticas  
sociais.  
563  
Por outro lado, a presença de legislações trabalhistas e normas organizacionais cria uma  
esfera de regulação e proteção que também oferece condições mínimas de dignidade ao trabalho  
profissional, como limites para a jornada e o direito trabalhistas. No entanto, no contexto do  
capitalismo dependente e das políticas de austeridade, esses direitos são frequentemente  
ameaçados por tentativas de flexibilização trabalhista e precarização das condições de trabalho.  
[...] a precarização do trabalho não é uma fatalidade, como muitos(as) querem  
fazer crer, mas uma estratégia do padrão de acumulação capitalista em tempos  
de mundialização neoliberal, tanto no centro quanto na periferia dependente.  
Trata-se de um poderoso mecanismo de reorganização do trabalho no contexto  
do capitalismo hegemonizado pelas finanças, que combina flexibilização,  
terceirização e informalidade do trabalho como partes inseparáveis do léxico  
e da pragmática da empresa corporativa global (Antunes, 2020, p. 11).  
Essa conjuntura intensifica os desafios cotidianos dos/as assistentes sociais, que  
enfrentam uma dupla pressão em seu exercício profissional. De um lado, há a exigência  
institucional de adaptação à lógica de produtividade e controle, que impõe a adesão a uma  
racionalidade instrumental e mercadológica, subordinando o trabalho social a métricas  
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quantitativas e metas gerenciais. De outro, persiste o compromisso com uma prática  
profissional ético-política, orientada pelo acesso a direitos, pela defesa intransigente da  
democracia, pela superação de todas as formas de preconceito e opressão e pelo princípio da  
liberdade como valor ético central. Assim, o exercício profissional se estrutura como um espaço  
de disputa, articulando-se com os movimentos da classe trabalhadora na construção de uma  
outra ordem societária, antirracista, anticapacitista e, necessariamente, anticapitalista.  
O neoliberalismo impõe às políticas sociais métodos de gestão voltados ao controle  
burocrático e à obtenção de resultados quantitativos, desconsiderando a complexidade das  
demandas sociais. Esse modelo de funcionamento fragmenta os serviços e dificulta a construção  
de vínculos de confiança e apoio entre os/as assistentes sociais e os/as usuários/as. Nos espaços  
sócio-ocupacionais, o Serviço Social vê-se pressionado a adequar-se a essa lógica, que reduz a  
multiplicidade das expressões da questão social a números e indicadores, fragilizando a  
intervenção profissional e desconsiderando as reais necessidades da população atendida.  
Além disso, no contexto do capitalismo dependente, o Serviço Social enfrenta o desafio  
de atuar em um cenário de profundas desigualdades regionais e sociais, estruturadas pela lógica  
da dependência econômica. O Brasil, inserido nessa dinâmica, apresenta um sistema  
socioeconômico altamente desigual, no qual os serviços e políticas sociais são distribuídos de  
forma desproporcional entre as diferentes regiões e classes sociais, limitando o acesso da  
população trabalhadora aos direitos fundamentais e reforçando a lógica seletiva e restritiva do  
Estado neoliberal.  
564  
Atualmente, observamos uma crescente exponencial e agravante do  
contingente populacional em situação de vulnerabilidade em suas mais  
diversas faces. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística  
(IBGE, 2022), cerca de 35,9 milhões de pessoas estão em trabalhos informais;  
64,6% na margem da pobreza; 28,1 milhões em situação de rua e 33,1 milhões  
em insegurança alimentar (Sousa, 2023, p. 41).  
Diante desse contexto, amparados pelo Projeto Ético-Político do Serviço Social (PEP),  
pela Lei de Regulamentação da Profissão e pelo Código de Ética Profissional, os/as assistentes  
sociais desempenham um papel central na defesa e garantia de acesso aos direitos sociais,  
enfrentando as contradições do capitalismo dependente e da exploração de classe. Esse  
compromisso ético-político está em sintonia com a perspectiva latino-americana do Serviço  
Social, que, conforme a definição adotada na Assembleia Geral da Federação Internacional de  
Trabalhadores Sociais (FITS) em 2014, propõe uma atuação crítica e transformadora, voltada à  
construção de uma sociedade mais justa e igualitária.  
O Serviço Social/Trabalho Social é uma profissão que se insere no âmbito das  
relações entre sujeitos sociais e entre estes o Estado nos diversos contextos  
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sócio-históricos de atuação profissional. Desenvolve uma práxis social e um  
conjunto de ações de natureza socioeducativa, que incidem na reprodução  
material e social da vida, em uma perspectiva de transformação social  
comprometida com a democracia e com o enfrentamento das desigualdades  
sociais, fortalecendo a autonomia, a participação e o exercício da cidadania,  
na defesa e na conquista dos direitos humanos e da justiça social (CFESS,  
2012c, n.p.)2.  
Logo, torna-se evidente a vinculação do Serviço Social com os processos sociais que  
atravessam diversas instituições da sociedade e impactam diretamente as condições de vida da  
classe trabalhadora. Os/as assistentes sociais, enquanto trabalhadoras/es, também estão  
inseridos nesse contexto de exploração, submetidos/as à sobrecarga, superexploração e outras  
formas de precarização laboral. O processo de reestruturação produtiva tem provocado  
alterações profundas nas requisições profissionais, tornando-as mais simplificadas, polivalentes  
e destituídas de especificidade, em um movimento de desprofissionalização que reduz a  
necessidade de especialização e amplia a realização de atividades indevidas ou inadequadas  
(Guerra, 2023).  
Estes aspectos, acentuados pelas (contra)reformas trabalhistas  
e
previdenciárias, tendem a prejudicar tanto o acesso a itens básicos como  
também os serviços inerentes à subsistência humana, comprometendo  
continuamente a vida dos trabalhadores. Tais condicionamentos afetam sua  
saúde mental e física e contribuem para o surgimento de doenças consideradas  
contemporâneas, mas que sãaso intrínsecas à superexploração do trabalho no  
contexto do capitalismo dependente (Lira; Gurgel; Amaral, 2020).  
565  
Essa dinâmica se expressa no esgotamento prematuro da força físico-psíquica dos/as  
trabalhadores/as, “associado à remuneração da força de trabalho abaixo de seu valor real,  
sustentando a dependência e a reconfiguração do papel do Estado na reprodução das relações  
capitalistas” (Luce, 2012, p. 122). Nesse cenário de extrema precarização, os/as assistentes  
sociais são impactados/as por um modelo de trabalho que subordina sua autonomia às  
exigências do mercado, limitando sua capacidade de atuação crítica e reforçando uma lógica  
instrumental alinhada aos interesses do capital.  
Dessa forma, a categoria profissional sofre as consequências da nova morfologia do  
mundo do trabalho, que atravessam a totalidade da classe trabalhadora. Enquanto profissionais  
capacitados/as para intervir nas expressões da questão social, os/as assistentes sociais enfrentam  
a diluição de seus meios de trabalho e a intensificação das demandas sociais, sendo  
desafiados/as a operar entre as exigências institucionais que sustentam a superexploração e seu  
compromisso ético-político com a transformação social. Esse contexto de tensões reforça a  
2A escolha pela proposta latino-americana de definição do Serviço Social, em detrimento da versão aprovada pela  
FITS, fundamenta-se na compreensão das especificidades históricas, sociais e econômicas da América Latina, que  
demandam uma perspectiva crítica e transformadora alinhada à realidade regional.  
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necessidade de um exercício profissional que vá além do atendimento imediato e emergencial,  
exigindo uma postura crítica que reconheça as particularidades sócio-históricas brasileiras e  
que questione as raízes estruturais da desigualdade.  
Mesmo diante desse cenário adverso, assistentes sociais constroem e sustentam práticas  
de resistência no cotidiano profissional, reafirmando seu compromisso ético-político com a  
classe trabalhadora.  
Estratégias de resistências e lutas no Serviço Social  
No contexto do capitalismo dependente brasileiro, as estratégias de resistência e luta no  
Serviço Social tornam-se fundamentais para que os/as profissionais enfrentem as pressões  
neoliberais e atuem na defesa dos direitos da população em situação de desproteção social. A  
categoria profissional encontra-se inserida em um ambiente marcado pela precarização das  
políticas sociais e pela redução sistemática de investimentos em áreas essenciais como saúde,  
educação e assistência social. Diante desse cenário, torna-se imperativo que os/as assistentes  
sociais construam uma práxis crítica e transformadora, que tenha um teor transformador da  
realidade e na defesa de uma sociabilidade livre de relações de opressão.  
Essa atuação exige, ainda, a apropriação contínua dos debates mercadológicos e  
institucionais, não como forma de adesão à lógica do capital, mas como estratégia para a  
obstrução de seus mecanismos de dominação e para a construção de alternativas que fortaleçam  
a autonomia e a garantia de direitos da classe trabalhadora.  
566  
Nesse processo, permeado por conflitos inerentes à condição de trabalhadores  
assalariados – como a necessidade de preservação do vínculo empregatício – e ancorado em  
uma bagagem teórico-metodológica e técnico-operativa orientada por perspectivas ético-  
políticas, os/as assistentes sociais buscam construir redes de resistência e defesa dos direitos  
sociais. Para isso, estabelecem conexões com outras categorias profissionais, associações e  
movimentos sociais, promovendo articulações coletivas que fortalecem a luta contra as  
contradições impostas pelas estruturas de exploração e desigualdade características do  
capitalismo dependente.  
A partir desse contexto, delimita-se a apropriação do Projeto Ético-Político (PEP) como  
um eixo fundamental para o fortalecimento da resistência profissional no Serviço Social. Essa  
apropriação se materializa na esfera jurídico-política da profissão e nas formas político-  
organizativas da categoria, manifestando-se na participação ativa nos conselhos e associações  
profissionais, bem como na produção e sistematização coletiva de conhecimento na área. Esses  
pilares são essenciais para consolidar estratégias sólidas e articuladas de resistência,  
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Capitalismo dependente e Serviço Social: resistência, lutas e construções  
possibilitando uma atuação que transcende o atendimento imediato, promovendo uma  
intervenção crítica e comprometida com a transformação das condições sociais e a defesa dos  
direitos da classe trabalhadora.  
Nesse sentido, destaca-se o papel estratégico dos Núcleos de Assistentes Sociais (NAS),  
vinculados às seccionais dos Conselhos Regionais de Serviço Social (CRESS). Esses núcleos  
funcionam como espaços de debate, representação e construção coletiva da categoria,  
permitindo que as particularidades locais e regionais sejam consideradas na formulação de  
estratégias de luta. Dessa forma, impulsionam mobilizações específicas, aprofundam o  
engajamento em questões pontuais e ampliam o campo de formação política e profissional  
dos/as assistentes sociais.  
Além disso, os NAS oferecem ambientes de troca e compartilhamento de experiências,  
fortalecendo redes de apoio e consolidando a identidade coletiva da profissão. Esse processo é  
essencial para sustentar a resistência frente aos ataques às políticas sociais e para reafirmar o  
compromisso da categoria com os princípios ético-políticos do Serviço Social, garantindo que  
a luta por direitos e pela emancipação da classe trabalhadora permaneça como um elemento  
central no exercício profissional.  
Entre os inúmeros desafios enfrentados pelo Serviço Social, exige-se a articulação e  
fortalecimento de trincheiras coletivas, especialmente na esfera política, em defesa dos direitos  
da classe trabalhadora. Um exemplo emblemático desse processo de mobilização coletiva é a  
defesa da jornada de 30 horas semanais para assistentes sociais, regulamentada pela Lei nº  
12.317/2010, cuja implementação e manutenção demandam vigilância permanente e esforços  
contínuos.  
567  
Da mesma forma, a articulação com movimentos sociais também se consolida como  
uma estratégia indispensável, permitindo que suas ações ultrapassem o âmbito institucional e  
se conectem a lutas mais amplas, como a reforma urbana e agrária, a defesa da moradia digna,  
a igualdade de gênero e raça, e a proteção dos direitos da população LGBTQIA+. Esse  
engajamento político não apenas fortalece a capacidade de influenciar a formulação e  
implementação de políticas públicas, mas também possibilita a denúncia de violações de  
direitos e a promoção de debates sobre a importância das políticas sociais.  
A resistência cotidiana envolve, ainda, a criação de espaços de escuta e acolhimento que  
respeitem a singularidade das demandas de sujeitos atendidos com base nos valores éticos  
centrais da profissão. Em um contexto em que as políticas sociais são pressionadas por uma  
lógica de mercado e por exigências de produtividade, assistentes sociais encontram na  
construção de vínculos com usuárias/os uma forma de resistência à desumanização dos  
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atendimentos. Por meio de práticas que promovem o acolhimento, a escuta qualificada e o  
fortalecimento da autonomia de sujeitos, as/os assistentes sociais reafirmam o compromisso  
com o valor da vida humana e com outra lógica de sociabilidade.  
Ademais, a formação crítica e a educação permanente constituem elementos centrais na  
estratégia de resistência do Serviço Social, além de representarem um compromisso ético com  
o aprimoramento intelectual e profissional. No contexto do capitalismo imperialista, a educação  
desempenha um papel fundamental na reprodução das relações de dependência econômica e  
tecnológica, moldando a força de trabalho para a estrutura produtiva capitalista. No entanto,  
essa função é multifacetada e contraditória, pois também possibilita a formação crítica e a  
produção de conhecimento pela própria classe trabalhadora, ampliando sua capacidade de  
compreensão e enfrentamento das contradições estruturais (Santos, 2024).  
Ao Serviço Social, o processo de formação e atualização de conhecimentos, ao  
incorporar referenciais teóricos críticos, capacita os/as assistentes sociais a compreenderem o  
papel das estruturas econômicas e políticas na produção e reprodução das desigualdades sociais.  
Essa qualificação possibilita uma atuação mais consciente e fundamentada, que reconhece as  
particularidades do capitalismo dependente e as estratégias necessárias para resistir às ofensivas  
neoliberais, como coloca Iamamoto (2022, p. 179):  
A formação profissional possibilita aos assistentes sociais compreender  
criticamente as tendências do atual estágio da expansão capitalista e suas  
repercussões na alteração das funções tradicionalmente atribuídas à profissão  
e no tipo de capacitação requerida pela "modernização" da produção e pelas  
novas formas de gestão da força de trabalho; que dê conta dos processos que  
estão produzindo alterações nas condições de vida e de trabalho da população  
que é alvo dos serviços profissionais, assim como das novas demandas dos  
empregadores na esfera empresarial.  
568  
Dessa forma, a perspectiva de uma educação ininterrupta não apenas aprofunda os  
parâmetros investigativos da profissão, mas também amplia a compreensão dos processos de  
reestruturação do capital. Ou seja, tal projeto pedagógico fomenta o desenvolvimento de  
análises críticas sobre os campos sócio-ocupacionais e suas respostas às demandas impostas  
pela racionalidade neoliberal.  
Nesse sentido, por meio de cursos, comissões técnicas, políticas de formação  
promovidas pelo conjunto CFESS-CRESS, congressos, seminários, rodas de conversa, o  
Projeto ABEPSS Itinerante e boletins informativos, a categoria constrói espaços permanentes  
de debate e atualização profissional. Essas iniciativas adotam diferentes estratégias pedagógicas  
e didáticas, enriquecendo a formação e promovendo discussões críticas sobre os temas centrais  
da profissão, sempre ancoradas em uma perspectiva de resistência.  
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Capitalismo dependente e Serviço Social: resistência, lutas e construções  
A educação permanente capacita a categoria a desenvolver respostas críticas às  
limitações institucionais e aos processos de precarização, fornecendo ferramentas para que  
os/as assistentes sociais possam atuar com autonomia intelectual diante das ofensivas do capital.  
No entanto, é imprescindível que essa formação crítica permaneça ancorada nas trincheiras de  
luta, cultivando um senso crítico que muitas vezes é negligenciado, inclusive durante a  
formação profissional, precarizada pelo avanço da mercantilização da educação e da vida.  
Mesmo que a pressão por ceder seja constante, é necessário manter uma postura radical e firme  
na busca por uma sociabilidade mais justa e livre de explorações.  
Diante das (re)configurações e da precarização do mundo do trabalho, é fundamental  
desenvolver e manter um olhar crítico e atento às demandas institucionais associadas ao  
capitalismo dependente, especialmente no que concerne a requisições indevidas ou  
inadequadas, que desrespeitam o que estabelece a Lei nº 8.662/1993, de Regulamentação da  
Profissão. Reconhecer esses impactos é essencial para que possamos fortalecer uma prática  
profissional que, além de crítica, esteja ancorada na defesa dos princípios ético-políticos do  
Serviço Social, que forja inclusive o trabalho coletivo e o respeito ao pluralismo de perspectivas  
democráticas, o que não se confunde com ecletismo.  
Aproximações conclusivas  
569  
Desvendar as múltiplas determinações que constituem nossa sociabilidade, marcada  
pelo antagonismo estrutural entre capital e trabalho, permite uma compreensão crítica da  
totalidade social em sua forma mais contraditória. As economias centrais e dependentes, partes  
interdependentes de um mesmo sistema capitalista, expressam conflitos e oposições que, de  
forma dialética, impulsionam processos de mudança e transformação social.  
Dentro das dinâmicas do capital, surge uma antítese que impõe consequências adversas  
aos trabalhadores, como a precarização das condições de vida, o adoecimento e o desgaste  
laboral, sintomas de um sistema baseado na superexploração, amplamente perceptível no  
cenário brasileiro. Essa superexploração opera como um mecanismo de rentabilidade e  
acumulação imperialista, impondo o que, quem e como produzir, desconsiderando as  
necessidades reais da sociedade. Esse modelo perpetua o desenvolvimento do  
subdesenvolvimento das economias dependentes, ampliando as desproteções sociais.  
Essa natureza integra a formação sócio-histórica do Brasil, revelando o caráter primário-  
exportador da economia e o poder político exercido pelos latifundiários na dinâmica de  
cooperação antagônica que sustenta a divisão internacional do trabalho sob o imperialismo.  
Nesse contexto, o capitalismo dependente particulariza o significado da questão social e suas  
Eduardo Henrique Moraes Santos; Mariana Teodoro de Sousa; Yve Matayoshi Galvão; Lesliane Caputi  
expressões na realidade brasileira, requerendo uma análise que ultrapasse compreensões  
genéricas e abstratas desse conceito.  
A questão social, sendo o fundamento básico da existência do Serviço Social e sua razão  
de ser, demanda uma compreensão aprofundada das dinâmicas de dependência para que as/os  
assistentes sociais possam identificar os desafios e explorar as possibilidades de resistência e  
transformação no contexto brasileiro. Essa análise é indispensável para que o exercício  
profissional seja crítico e engajado com a realidade concreta, fundamentando-se em um  
entendimento preciso das contradições e desigualdades que marcam o capitalismo dependente  
no Brasil.  
Dessa forma, o Serviço Social no Brasil encontra-se em uma posição desafiadora, mas  
também estratégica. A profissão, ao mesmo tempo em que enfrenta limitações estruturais, é  
impulsionada pelo compromisso ético-político com a emancipação social, o que lhe confere um  
papel de resistência e de luta por direitos. Em um contexto marcado pela desigualdade, pela  
precarização e pela superexploração da força de trabalho, o Serviço Social, ao atuar de forma  
crítica e comprometida, contribui para questionar e expor as contradições do capitalismo  
dependente e para a construção de alternativas que promovam uma sociedade mais justa e  
equitativa.  
Para enfrentar essas barreiras, o Serviço Social brasileiro deve fortalecer sua formação  
básica e sua educação permanente crítica, bem como intensificar a articulação com movimentos  
sociais e demais lutas populares. É essencial incluir o debate sobre o capitalismo dependente  
nas leituras e no cotidiano profissional de assistentes sociais, ampliando a compreensão das  
expressões da questão social à luz da realidade sócio-histórica brasileira.  
570  
Através dessas estratégias de resistência e enfrentamento, assistentes sociais podem  
aprofundar a análise das relações entre as condições sociais concretas e as determinações  
econômicas e políticas que as sustentam, promovendo uma atuação mais consciente, crítica e  
engajada com as demandas sociais e com as lutas da classe trabalhadora.  
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Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 555-572, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Elementos para pensar o trabalho profissional  
de assistentes sociais pela perspectiva da  
totalidade social  
Elements for thinking about the professional work  
of social workers from the perspective of social totality  
Lorena Ferreira Portes*  
Melissa Ferreira Portes**  
Evelyn Secco Faquin***  
Resumo: Este artigo é resultado de trajetória  
profissional e acadêmica de docentes da área da  
formação e do trabalho profissional em Serviço  
Social. A partir de uma revisão bibliográfica,  
objetiva-se contribuir, à luz da totalidade social,  
com as discussões sobre a problemática do  
Abstract: This article is the result of the  
professional and academic trajectories of  
professors in the field of training and  
professional work in Social Work. Based on a  
literature review, the aim is to contribute, in  
light of the social totality, to discussions on the  
problems of professional work, highlighting the  
understanding of social policies as a mediating  
field for the work of social workers and the  
necessary distinction and mediation between  
social policy objectives and professional  
objectives; and addressing the practicist trait  
that leads to the way we understand work and  
plan professional actions. To this end, a  
dialogical, educational, and ongoing training  
approach is necessary, not exclusively. This  
approach will not be an individual endeavor, but  
requires the strengthening of collective debates,  
the political reorganization of the professional  
category, and an intense process of professional  
qualification.  
trabalho  
profissional,  
destacando  
a
compreensão das políticas sociais como campo  
mediador do trabalho de assistentes sociais e a  
necessária distinção e mediação entre objetivos  
das políticas sociais e objetivos profissionais; e  
o enfrentamento do traço praticista que  
desemboca na forma de compreender o trabalho  
e planejar as ações profissionais. Para tanto, é  
necessária, não exclusivamente, uma postura  
dialógica, educativa e de formação permanente.  
Esse enfrentamento não será obra individual e  
requer o fortalecimento dos debates coletivos,  
da reorganização política da categoria  
profissional  
e
de intenso processo de  
qualificação profissional.  
Palavras-chaves: Serviço Social; Trabalho  
profissional; Totalidade social; Objetivos  
profissionais; Praticismo.  
Keywords: Social Work; Professional Work;  
Social Totality; Professional Objectives;  
Practicality.  
* Universidade Estadual de Londrina. E-mail: lorenafportes@gmail.com  
** Universidade Estadual de Londrina. E-mail: melissaportes2010@gmail.com  
*** Universidade Estadual de Londrina. E-mail: evelynsecco@uel.br  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.49629  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 29/07/2025  
Aprovado em: 08/12/2025  
Lorena Ferreira Portes; Melissa Ferreira Portes; Evelyn Secco Faquin  
Introdução  
O temário proposto para esta edição da revista Libertas sobre os fundamentos históricos,  
teórico-metodológicos e ético-políticos do Serviço Social no Brasil e em outros países assume  
extrema relevância diante do contexto econômico, político, social e ambiental no qual o mundo  
se encontra na atualidade. A lógica do capital e seu interesse por uma reprodução ampliada  
acometem os mais diversificados campos da vida social. Como uma das expressões dessa lógica  
perversa, exploradora e opressora, encontra-se o massacre de trabalhadores com uma política  
regressiva de direitos sociais, de intensificação e precarização das condições de trabalho, de  
afrouxamento dos direitos trabalhistas e flexibilização das regulamentações até então vigentes.  
Ao lado desse massacre, como mais um dos ataques do presente, tem-se uma política de  
devastação ambiental. Enquanto vendedores/as da sua força de trabalho, portanto, investidos/as  
pelo estatuto de assalariamento e do subjugo decorrente, os/as assistentes sociais não devem  
ficar alheios/as às transformações societárias em curso, às alterações acarretadas nas políticas  
sociais e no mercado de trabalho, que impactam o trabalho profissional e as condições de  
trabalho dos/as profissionais de Serviço Social.  
A atenção para as demandas e requisições do momento histórico em que vivemos, seja  
da sociedade de uma maneira mais ampla, seja nos âmbitos da formação e do trabalho  
profissional, exige um conjunto de conhecimentos teóricos, políticos e técnicos que,  
articulados, processados, mediados e reafirmados, podem contribuir para uma análise mais rica,  
crítica e aprofundada da realidade social e profissional, bem como apontar caminhos e  
estratégias para aprimorar e redirecionar a intervenção profissional nos distintos espaços sócio-  
ocupacionais em que se encontram os/as assistentes sociais no Brasil.  
574  
Por isso, a ênfase no debate dos fundamentos da profissão é tarefa premente e coloca-  
se como um desafio necessário. Assim, este artigo tem a finalidade de reforçar o debate sobre  
a problemática do trabalho profissional, enfatizando a sua fundamental apreensão pela  
perspectiva da totalidade social, resistindo a análises fragmentadas, idealistas e endogenistas,  
rechaçando uma postura presa ao imediatismo, meramente instrumental e “supostamente”  
técnica do trabalho profissional.  
Partindo da trajetória profissional e acadêmica das autoras, na docência na graduação e  
na pós-graduação na área do Serviço Social, considerando coordenação e participação em  
projetos de ensino e pesquisa sobre a formação e o trabalho profissional, desenvolvimento de  
cursos de capacitação e aprimoramento profissional para assistentes sociais, supervisores/as de  
campo, disciplinas ministradas, orientações de trabalho de conclusão de curso, iniciação  
científica, mestrado e doutorado, acompanhamento de estágios supervisionados, entre outras  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 573-594, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Elementos para pensar o trabalho profissional de assistentes sociais pela perspectiva da totalidade social  
atribuições, apresentamos uma síntese das reflexões construídas durante o percurso profissional  
e formativo, buscando elucidar questões que perpassam dois elementos considerados fulcrais,  
quais sejam: a) a compreensão das políticas sociais como campo mediador do trabalho de  
assistentes sociais e a necessária particularidade e mediação entre objetivos das políticas sociais  
e objetivos profissionais; b) o enfrentamento de um traço ainda pertinente no trabalho de  
assistentes sociais que reforça uma herança praticista e empirista, desembocando na forma de  
compreender o trabalho e planejar as ações profissionais.  
Em relação aos procedimentos metodológicos, o artigo é de natureza qualitativa  
utilizando-se da revisão de bibliográfica. Para a revisão, contamos com autores/as que são  
consideradas/os de relevância no debate e que possuem larga trajetória em suas pesquisas e  
problematizações sobre a temática em questão. Esse recurso metodológico é essencial, tendo  
em vista a pesquisa ser um trabalho de construção e reconstrução que se fundamenta em “[...]  
uma linguagem baseada em conceitos, proposições, hipóteses, métodos e técnicas, [...] processo  
de trabalho em espiral” (Minayo, 2009, p. 26). Nesse sentido, Lima e Mioto (2007, p. 40)  
indicam a necessidade de revisão crítica dos conceitos já existentes “[...] a fim de que sejam  
incorporados ou superados criticamente pelo pesquisador”. O artigo está divido em duas  
seções, seguidas das considerações finais. A primeira busca analisar o trabalho de assistentes  
sociais a partir da categoria totalidade social e a segunda busca problematizar continuísmos e  
enfrentamentos urgentes do trabalho profissional.  
575  
Analisando o trabalho dos/as assistentes sociais à luz da totalidade social  
A compreensão do trabalho dos/as assistentes sociais brasileiros/as, na segunda década  
do século XXI, requer retomar premissas analíticas fundamentais que não recaiam em aspectos  
endogenistas, idealistas e fragmentados da realidade, mas que percorram um caminho à luz da  
totalidade social. Sendo assim, a análise calcada na crítica da economia política é condição  
basilar.  
Em tempos de renúncia da totalidade social condenada como totalitarismo, de rechaço  
à universalidade em prol de localismos e particularismos, de negação da classe social pela  
substituição de novos sujeitos coletivos, a demarcação do debate sobre o trabalho profissional,  
situado histórica, política e economicamente, é elemento urgente e contundente contra  
tendências epistemológicas e idealistas que teimam em ignorar e negligenciar (teórica e  
politicamente) a explicitação das contradições sociais oriundas do modo de produção  
capitalista, escamoteando o fato de que são produtos das relações de produção e reprodução  
capitalistas. Assim, a apreensão da categoria trabalho é despida das múltiplas determinações  
Lorena Ferreira Portes; Melissa Ferreira Portes; Evelyn Secco Faquin  
que se interpõem na produção material e no conjunto das totalidades que compõe os diferentes  
momentos da vida social.  
Estas tendências expressam-se em um conjunto muito diversificado e heterogêneo, mas  
que, ao final, colocam-se como respostas à considerada crise da modernidade, buscando  
explicar as transformações societárias no campo econômico, político e social, como  
desdobramentos de um novo tempo, ou melhor, de um novo espírito do tempo. Encontra-se  
nesse largo leque de tendências, o pensamento pós-moderno que dirige suas críticas, sobretudo,  
ao legado marxiano e à anulação de possibilidades revolucionárias e emancipatórias. Ao negar  
a crítica da economia política elaborada por Marx e Engels, os pós-modernos negam a história  
e as lutas de classes. Pleiteiam o fim da sociedade industrial, o fim das classes sociais e a morte  
do marxismo (o que não se coloca como novidade).  
Na contramão dessa direção, buscamos compreender e problematizar o trabalho, em  
especial o trabalho realizado por assistentes sociais, na perspectiva da totalidade social. A teoria  
social crítica de Marx, tendo “O Capital” como sua obra síntese e madura, é construída a partir  
de uma intepretação da realidade pelo prisma da totalidade social. O que isso quer dizer? Ao ter  
por objeto de investigação o modo de produção capitalista, Marx elucidou os fundamentos que  
sustentam essa relação social e histórica, contraditória e passível de transformações. Desvendou  
a lei econômica da sociedade burguesa, ou seja, “as leis do nascimento, desenvolvimento e  
morte do modo de produção capitalista” (Gorender, 2013, p. 36).  
576  
Compreender como a sociedade está estruturada, como, a partir da produção social, se  
ergue um aparato político, ideológico e jurídico, requer uma análise das múltiplas  
determinações que incidem sobre o real. Dessa maneira, para que possamos entender de forma  
aprofundada e mais próxima do real as transformações sociais, econômicas e políticas que  
demarcam os tempos atuais, é preciso partir de uma análise que privilegie o conjunto de  
determinações que estão embutidas na realidade concreta, condenando explicações  
deterministas e economicistas, mas, também, explicações idealistas, especulativas,  
reducionistas e fragmentadas.  
Valemo-nos das ponderações feitas por Netto (2011a), ao enfatizar que, para Marx, a  
sociedade burguesa é uma totalidade concreta. Não é um todo constituído por partes que são  
integradas funcionalmente. É uma totalidade concreta, inclusiva e macroscópica, de máxima  
complexidade, constituída por totalidades de menor complexidade. Como há totalidades mais  
determinantes que outras, cabe analisar cada um dos complexos constitutivos das totalidades,  
esclarecendo as tendências operantes em cada uma das totalidades, que são articuladas.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 573-594, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Elementos para pensar o trabalho profissional de assistentes sociais pela perspectiva da totalidade social  
Portanto, abarcar uma análise pela totalidade social implica em considerar as contradições  
presentes nesse conjunto de complexos de totalidades.  
O real é constituído por uma totalidade prenhe de determinações que não se dão a  
conhecer de modo imediato. Essa totalidade é conectada por totalidades menos complexas, ou  
como explicou Lukács, a totalidade social é um complexo que implica em um conjunto  
articulado de complexos, quer dizer, um complexo de complexos. Nas palavras do autor, “todo  
‘elemento’, toda parte, é também aqui um todo; o ‘elemento’ é sempre um complexo com  
propriedades concretas, qualitativamente específicas, um complexo de forças e relações  
diversas que agem em conjunto”. No entanto, pontua Lukács, “essa complexidade não elimina  
o caráter de ‘elemento’: as autênticas categorias econômicas são – precisamente em sua  
complexidade e processualidade, cada uma a seu modo e cada uma em seu posto – algo  
efetivamente ‘último’, algo que ainda pode ser analisado, mas não ulteriormente decomposto  
na realidade” (Lukács, 2012, p. 307).  
Diante desses apontamentos, reforçamos que a sociedade burguesa – como uma  
totalidade concreta – impõe um caminho investigativo que deve considerar a totalidade não  
como uma soma de partes isoladas e fragmentadas, mas como um todo orgânico e articulado,  
reconhecendo que as totalidades menos complexas não devem ser consideradas simples. O que  
deve ser reconhecido é a distinção em relação ao grau de complexidade e como se evidenciam  
as articulações e mediações com o “momento predominante” que podem resultar, como em  
relações subordinantes e/ou subordinadas.  
577  
Aqui é preciso enfatizar que esse “momento predominante”, permeado por contradições  
e mediações, não exclui ou desconsidera os elementos menos complexos, pois estes compõem  
a realidade concreta. É somente o conhecimento dessas conexões que permitirá uma apreensão  
concreta da realidade concreta. Chasin, citado por Tonet (2016, p. 143), é contundente ao  
afirmar que “o conceito de totalidade é absolutamente decisivo”, pois, “em última análise o  
método dialético é a pretensão de reproduzir na cabeça a totalidade do objeto inquirido. E do  
ponto de vista da dialética só a totalidade contém e revela a verdade. Fora da totalidade não há  
verdade” (Chasin apud Tonet, 2016, p. 143).  
Sendo assim, é preciso distinguir o que é da ordem do pensamento e o que é da ordem  
do real. A realidade é rica, pois é constituída por múltiplas determinações, por uma riqueza  
categorial que lhe é inerente. Assim, para construir o caminho de apropriação dessas múltiplas  
determinações, é preciso um movimento de abstração dessa realidade. O exercício intelectivo  
é fundamental para que se possa captar a lógica do real, sua totalidade concreta, saltando da  
imediaticidade, da aparência fenomênica para alcançar a verdade. Para isso, é preciso desvendar  
Lorena Ferreira Portes; Melissa Ferreira Portes; Evelyn Secco Faquin  
o processo histórico e social que deu origem aos fatos que compõem a realidade e explicitar as  
relações entre os processos ocorrentes em cada totalidade constitutiva da sociedade na sua  
pluralidade e diversidade, partindo da totalidade macroscópica que é a sociedade burguesa.  
Como explicou Marx, no texto Introdução, de 1857,  
o concreto é concreto porque é a síntese de múltiplas determinações, portanto,  
unidade da diversidade. Por essa razão, o concreto aparece no pensamento  
como processo de síntese, como resultado, não como ponto de partida efetivo  
e, em consequência, também o ponto de partida da intuição e da representação  
(Marx, 2011, p. 54).  
O autor continua reforçando que, “na primeira via, a representação plena foi volatizada  
em uma determinação abstrata; na segunda, as determinações abstratas levam à reprodução do  
concreto por meio do pensamento” (Marx, 2011, p. 54). Portanto, o real não é resultado do  
pensamento, do movimento da abstração em si, pois o “método de ascender do abstrato ao  
concreto é somente o modo do pensamento de apropriar-se do concreto, de reproduzi-lo como  
um concreto mental. Mas de forma alguma é o processo de gênese do próprio concreto”. Nessa  
perspectiva, Marx afirma que  
o todo como um todo de pensamentos, tal como aparece na cabeça, é um  
produto da cabeça pensante que se apropria do mundo do único modo que lhe  
é possível, um modo que é diferente de sua apropriação artística, religiosa e  
prático-mental. O sujeito real, como antes, continua a existir em sua  
autonomia fora da cabeça [...]. Por isso, também no método teórico o sujeito,  
a sociedade, tem de estar continuamente presente como pressuposto da  
representação (Marx, 2011, p. 55).  
578  
Toda essa exposição é para defender o que Marx explicou sobre a totalidade concreta –  
a moderna sociedade burguesa. Diz Marx que, “como em geral em toda ciência histórica e  
social, no curso das categorias econômicas é preciso ter presente que o sujeito, aqui a moderna  
sociedade burguesa, é dado tanto na realidade como na cabeça” (Marx, 2011, p. 59). Afirma,  
ainda, que “as categorias expressam formas de ser, determinações de existência” (Marx, 2011,  
p. 59). Para não falsear a realidade, é preciso considerar que, “em todas as formas de sociedade,  
é uma determinada produção e suas correspondentes relações que estabelecem a posição e a  
influência das demais produções e suas respectivas relações”. Dessa forma, é “uma iluminação  
universal em que todas as demais cores estão imersas e que as modifica em sua particularidade.  
É um éter particular que determina o peso específico de toda existência que nele se manifesta”  
(Marx, 2011, p. 59).  
No movimento de perseguir as múltiplas determinações que incidem sobre o real, é  
preciso compreender que só se atinge tal finalidade – de modo aproximativo – considerando  
que as mediações existem no próprio real. Isso quer dizer que a categoria da mediação é  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 573-594, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Elementos para pensar o trabalho profissional de assistentes sociais pela perspectiva da totalidade social  
constitutiva do real, não sendo uma criação do sujeito que apreende a realidade. Nesse sentido,  
Netto (2011a, p. 57) explica que, no movimento de “descobrir as relações entre os processos  
ocorrentes nas totalidades constituídas tomadas na sua diversidade e entre elas e a totalidade  
inclusiva que é a sociedade burguesa”, é preciso enfatizar que “tais relações nunca são diretas;  
elas são mediadas não apenas pelos distintos níveis de complexidade, mas, sobretudo, pela  
estrutura peculiar de cada totalidade” (Netto, 2011a, p. 57). Assim, “sem os sistemas de  
mediação (internas e externas) que articulam tais totalidades, a totalidade concreta que é a  
sociedade burguesa seria uma totalidade indiferenciada – e a indiferenciação cancelaria o  
caráter do concreto, já determinado como ‘unidade na diversidade’” (Netto, 2011a, p. 57-58).  
A partir dessas considerações, retomamos o debate sobre o trabalho profissional de  
assistentes sociais. Primeiramente é preciso reforçar que, distante de uma análise corporativista  
e endógena da profissão, o debate sobre o Serviço Social situa-se no campo da produção e da  
reprodução social no modo de produção capitalista. O/A assistente social compõe o trabalho  
coletivo e abstrato, ocupando um determinado lugar na divisão social e técnica do trabalho. O  
estatuto de assalariamento impõe aos profissionais as exigências e requisições do mercado de  
trabalho e do Estado, orientadas pela dinâmica da luta de classes. Os/as assistentes sociais,  
assim como os/as demais trabalhadores/as, estão submetidos às interferências e incidências do  
assalariamento, às consequências da exploração do trabalho, da extração do mais-valor, da  
precarização e intensificação do trabalho, do ataque aos direitos trabalhistas, portanto, das  
condições materiais e objetivas que se interpõem na esfera do trabalho e que se estende às  
demais dimensões da vida social.  
579  
Diante do exposto, ressaltamos a importância da compreensão do trabalho dos/as  
assistentes sociais circunscrito à dinâmica da exploração e opressões capitalistas, enfatizando  
que apreender esse exercício profissional particular exige considerar as condições de trabalho  
dos/as profissionais.  
Ao tomar como problemática as condições de trabalho, ressalta-se que as relações  
sociais capitalistas de produção e reprodução social são condicionadas pela lógica da  
acumulação do capital. Tal lógica impõe determinadas condições e circunstâncias que visam à  
exploração cada vez mais ampliada da força de trabalho, seja pelo prolongamento da jornada  
de trabalho, seja pela intensificação do trabalho. Nos termos marxianos, produzindo mais-valor  
absoluto e mais-valor relativo. Considerando as lutas pela redução da jornada de trabalho e as  
limitações postas para seu aumento, Marx explica que se impõe um “dispêndio aumentado de  
trabalho, uma tensão maior da força de trabalho, um preenchimento mais denso dos poros do  
tempo de trabalho” (Marx, 2011, p. 482). Tem-se a imposição ao trabalhador de “uma  
Lorena Ferreira Portes; Melissa Ferreira Portes; Evelyn Secco Faquin  
condensação do trabalho num grau que só pode ser atingido com uma jornada de trabalho mais  
curta” revelando que essa massa maior de trabalho num dado período de tempo é “uma  
quantidade maior de trabalho” (Marx, 2011, p. 482). Sendo assim, dentro de certos limites, “o  
que se perde em duração ganha-se no grau de esforço realizado” (Marx, 2011, p. 483).  
Enquanto trabalhador/a regido/a pelo estatuto de assalariamento, o/a assistente social  
fica sujeitado/a às modificações das legislações trabalhistas, fazendo com que suas condições e  
relações de trabalho também se alternem. As mudanças nas legislações trabalhistas, com  
destaque para as normativas e legislações que tratam da flexibilização e terceirização  
implementadas no Governo Temer, afetam toda a classe trabalhadora que precisa vender sua  
força de trabalho para sobreviver, mas chama-se a atenção para o fato de que são os/as  
trabalhadores/as que estão menos protegidos/as legalmente, os/as que mais são afetados/as por  
tais mudanças, agravando, ainda mais, a condição de precarização do seu trabalho.  
A/O assistente social trabalha no campo dos serviços e ainda que, majoritariamente,  
conforme pesquisa realizada pelo CFESS em 2022 sobre o perfil dos/as assistente sociais, a  
forma de ingresso desses/as profissionais no mercado de trabalho se dê, prioritariamente, por  
meio de concurso público, já é possível identificar novas formas de contratação, com destaque  
para o crescimento de seleções públicas simplificadas, cargos em comissão, pregão eletrônico,  
edital público, pejotização. Os dados da pesquisa revelam a diminuição da contratação por  
concurso público e o aumento de contratos precários, identificados como intermitentes e  
temporários.  
580  
Mas, afinal, o que pode ser entendido por trabalho precário?  
Alguns pesquisadores têm buscado, principalmente, a partir da década de 1990, apontar  
indicadores para analisar a precarização do trabalho no Brasil. Franco e Druck (2008) têm se  
destacado nesse sentido. Para as autoras, pesquisadoras da Universidade Federal da Bahia  
(UFBA), o trabalho precário existe quando ele se materializa em condições inseguras, instáveis,  
frágeis, desprotegidas, com características de sazonalidade e temporalidade, fazendo com que  
o/a trabalhador/a tenha sua capacidade de resistência enfraquecida ou anulada.  
Para Franco, Druck e Seligmann-Silva (2010), a precarização não pode ser entendida  
apenas como ausência de direitos formais ou vínculos empregatícios estáveis, mas como um  
processo multifacetado que envolve a intensificação do trabalho, a instabilidade contratual, a  
insegurança social, a degradação das condições de saúde e segurança no trabalho, além do  
enfraquecimento da identidade profissional e da capacidade de resistência coletiva. Nesse  
sentido, a precarização é vivida cotidianamente nos ambientes laborais e afeta também a  
subjetividade dos trabalhadores, produzindo sentimentos de medo, competição e isolamento.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 573-594, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Elementos para pensar o trabalho profissional de assistentes sociais pela perspectiva da totalidade social  
Druck (2011), por sua vez, enfatiza que a precarização é um projeto político articulado  
ao processo de acumulação capitalista, que busca reduzir custos com trabalho, fragmentar os  
vínculos coletivos e enfraquecer as organizações sindicais. A autora denuncia a expansão do  
trabalho terceirizado e das formas atípicas de contratação (como contratos temporários,  
"pejotização" e trabalho por aplicativos) como instrumentos centrais da precarização. Para  
Druck (2011), essas formas de contratação promovem desigualdades no interior da classe  
trabalhadora, criando camadas distintas de trabalhadores com diferentes graus de proteção,  
remuneração e acesso a direitos.  
Ambas as autoras destacam que a precarização não se limita ao setor privado, mas  
também se dissemina no setor público, por meio de políticas de gestão que introduzem lógicas  
empresariais nas instituições estatais, promovem cortes de pessoal, metas de produtividade e  
formas indiretas de contratação. Essa tendência atinge especialmente categorias como  
professores, profissionais da saúde e assistentes sociais, que passam a vivenciar o trabalho sob  
condições adversas, com sobrecarga, perda de autonomia e instabilidade funcional.  
Franco e Druck (2008) também alertam para a naturalização da precarização como algo  
inevitável ou necessário diante das “exigências do mercado”, o que impede o reconhecimento  
dos direitos como conquistas históricas e favorece a aceitação da flexibilização. Ao desvelar os  
impactos da precarização para além dos aspectos econômicos — atingindo as dimensões  
sociais, políticas e subjetivas do trabalho —, ambas as pesquisadoras contribuem para a  
formulação de estratégias de resistência baseadas na solidariedade, na organização coletiva e  
na valorização do trabalho decente.  
581  
É importante advertir que o trabalho precário no Brasil ganha novos entornos com a  
aprovação da Lei da Terceirização sancionada pelo Presidente Michel Temer em março de 2017,  
que agregou à precarização mecanismos de intensificação dessa precarização, exigindo mais  
trabalho, mais exploração, mais produtividade. O terceiro mandato do Governo Lula (2023)  
chegou com a proposta de revisar pontos críticos dessa legislação com o objetivo de ampliar a  
proteção social, fortalecer os sindicatos e combater a precarização das relações de trabalho. No  
entanto, na atualidade, o que se identifica é ausência de um avanço desse debate com decisões  
governamentais que consolidam o perfil neoliberal de sua gestão e o descaso com a melhoria  
das condições de trabalho da classe trabalhadora.  
Dal Rosso (2008), em sua obra “Mais Trabalho”, analisa o conceito de intensidade  
buscando resgatar seu significado ao longo do tempo, distinguindo-o do conceito de  
produtividade. A busca por maior produtividade pode levar à intensificação do trabalho, com  
consequências drásticas, principalmente para a saúde dos/as trabalhadores/as. Para o  
Lorena Ferreira Portes; Melissa Ferreira Portes; Evelyn Secco Faquin  
pesquisador, os estudos sobre produtividade focalizam-se nas transformações tecnológicas, nos  
resultados do trabalho, naquilo que pode ser visto, que é material, mas estudar a intensificação  
exige se debruçar sobre outros aspectos que são imateriais, ou seja, os efeitos/consequências  
sobre o/a trabalhador/a, que não podem ser medidos materialmente porque envolvem  
dimensões como desgaste físico, questões emocionais e de saúde, por exemplo.  
No processo de precarização, a intensificação é situação posta no trabalho dos/as  
assistentes sociais. Nos tempos atuais, o uso das tecnologias de informação e comunicação deve  
ser considerado no debate, assim como as novas formas (cada vez mais perversas) de  
contratação do trabalho dos/as assistentes sociais que enterram os direitos trabalhistas e  
sucumbem perante os discursos de flexibilização e modernização do trabalho na ótica  
gerencialista.  
Se as condições objetivas e materiais colocam-se como determinantes para a análise do  
trabalho, isso não implica em desconsiderar as condições subjetivas que se interpõem na sua  
realização. Longe de um viés economicista e refutando uma apreensão subjetivista,  
recuperamos as contribuições de Netto (2011b) sobre a profissão no espectro da divisão social  
e técnica do trabalho na sociedade burguesa consolidada e madura, quando enfatiza que é  
preciso considerar o primordial, isto é, “o erguimento de uma configuração profissional a partir  
de demandas histórico-sociais macroscópicas” antes de recorrer à sua estrutura como saber  
(Netto, 2011b, p. 87). O autor continua destacando que a afirmação e o desenvolvimento de um  
estatuto profissional se operam mediante um duplo dinamismo: de uma parte, aquele que é  
deflagrado pelas demandas socialmente colocadas; de outra, aquele que é reservado pelas suas  
reservas próprias de forças (teóricas e prático-sociais), aptas ou não para responder às  
requisições extrínsecas.  
582  
O esforço analítico empreendido até aqui neste texto decorre da necessidade de  
pensarmos o trabalho do/a assistente social enquanto produto histórico, circunstanciado pelas  
determinações econômicas, sociais e políticas da dinâmica do capital. Os processos de trabalho,  
que são coletivos, nos quais se insere o/a assistente social, são mediados pelas correlações de  
força, pelas tensões e disputas de projetos societários. É nesses processos, prenhes de  
contradição, que o/a assistente social é requisitado a construir respostas profissionais,  
desempenhando, assim, suas atribuições e competências. Essas respostas expressam a dimensão  
técnico-operativa do exercício profissional desenvolvido pelo/a assistente social, que estabelece  
relação com as demais dimensões, quais sejam, a teórico-metodológica e a ético-política, e que  
se forjam em condições de trabalho cada vez mais precárias. É uma precarização marcada  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 573-594, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Elementos para pensar o trabalho profissional de assistentes sociais pela perspectiva da totalidade social  
também pela intensificação do trabalho, do adoecimento, do assédio moral individual e coletivo  
dos/as trabalhadores/as, com imposição de índices de metas, de produtividade e de desempenho.  
Reafirmamos a premissa de que a profissão de Serviço Social não se autoexplica nem  
se autodetermina, o que nos leva a apreender o trabalho profissional ancorado radicalmente na  
teoria social crítica de Marx.  
O trabalho profissional de assistentes sociais e a necessária tarefa de enfrentar  
traços de persistência e continuísmos que limitam uma análise pela totalidade  
social  
Considerando a apreensão construída anteriormente, que serviu para sustentar a  
compreensão sobre o trabalho de assistentes sociais, apresentamos, a partir de toda a trajetória  
profissional e acadêmica das autoras, três elementos fulcrais para adensar o debate e trazer  
contributos para fomentar e aprimorar os eixos teóricos analíticos, políticos e operacionais que  
envolvem o trabalho. Um primeiro elemento é retomar a premissa basilar que incide,  
efetivamente, nas respostas a serem apresentadas pela categoria profissional diante das  
demandas sociais postas nos diferentes espaços sócio-ocupacionais: a imbricada relação entre  
profissão e política social.  
As políticas sociais, ainda que não exclusivamente, constituem-se como “base de  
sustentação funcional-ocupacional do Serviço Social” (Guerra; Montaño, 2024, p. 73). O/a  
assistente social tem sido requisitado/a, historicamente, para a formulação e implementação das  
políticas sociais, construindo respostas interventivas para responder às refrações da “questão  
social”, que resultam das lutas de classe que expressam as tensões, conflitos, contradições da  
apropriação da riqueza pela classe detentora dos meios de produção, mas produzida socialmente  
pela classe que vende sua força de trabalho.  
583  
Tais políticas sociais têm sido desconfiguradas pelo movimento de reestruturação  
produtiva do capital que, sob sua égide neoliberal, tem implementado um conjunto de  
contrarreformas do Estado disparadoras de grandes mudanças no mundo do trabalho que  
traduzem uma nova maneira de governar administrativamente a sociedade. Essa organização  
questiona o tamanho do Estado, sua eficiência, seu modus operandi, seu alcance e sua  
capacidade de proteção social e de financiamento.  
Entre essas mudanças que vêm sendo operadas desde os anos 70 do século passado no  
campo dos direitos sociais no sentido de seu aviltamento, destacam-se as reformas trabalhistas,  
que vêm produzindo alterações nas relações e condições de trabalho. Tais reformas configuram-  
se como respostas às crises econômicas, próprias da dinâmica do capital, que se acirram há mais  
Lorena Ferreira Portes; Melissa Ferreira Portes; Evelyn Secco Faquin  
de quatro décadas no panorama mundial e nacional. Destaca-se, no contexto brasileiro, a  
Reforma Gerencial do Estado Brasileiro implementada por Bresser Pereira, em 1995, no  
governo de Fernando Henrique Cardoso, que aprofundou o processo de precarização das  
condições de trabalho presente até hoje.  
A transição do século XX para o século XXI é marcada por transformações gerenciais  
no campo do trabalho que precisam ser analisadas a partir de uma perspectiva histórico-dialética  
que nos permita entender, sem pressa analítica e conclusões precipitadas, que nos encontramos  
diante de mudanças que, apesar de serem anunciadas como novas e modernas formas de  
trabalho, precisam ser interpretadas, como problematiza Druck (2011), como velhas formas e  
modalidades que se reproduzem e se reconfiguram num nítido processo de metamorfose social.  
A autora, quando trata do trabalho precarizado na contemporaneidade, entende-o como “um  
novo e um velho fenômeno, porque é diferente e igual, porque é passado e presente e porque é  
um fenômeno de caráter macro e microssocial” (Druck, 2011, p. 35). Tal metamorfose não  
significa alteração ou supressão do Estado capitalista, mas estratégias perversas para sua  
manutenção na era da financeirização, às custas da intensificação da exploração da força do/a  
trabalhador/a.  
Problematizar o trabalho de assistentes sociais diante das determinações apontadas traz,  
como exigência, a reflexão acerca dos espaços sócio-ocupacionais, que abarcam o conjunto das  
requisições, demandas e ações profissionais, bem como expressam e operacionalizam as  
finalidades das políticas sociais e das instituições. Podemos observar que há um desafio a ser  
encarado: o de não confundir objetivos da política social e do próprio espaço sócio-ocupacional  
com os objetivos da profissão. Tomando por referência as legislações sociais e consequentes  
normativas, protocolos e resoluções que permeiam as políticas sociais e os serviços sociais,  
nota-se que há uma tendência em incorporar os objetivos das políticas sociais em que se dá a  
atuação profissional como sendo, mecanicamente, os objetivos do trabalho profissional. Aqui,  
despe-se do atributo de mediação que é implícito, mas não desvelado na relação.  
Arealidade tem mostrado que, seja pelo imperativo das condições de trabalho que levam  
os/as assistentes sociais a atuarem de forma muito mais “reativa” e “devolutiva” diante das  
demandas postas; seja pela ausência de um planejamento de trabalho de forma mais coletiva,  
as respostas profissionais demonstram as dificuldades profissionais em pensar sobre o trabalho  
que se realizada, isto é, por meio de descrição dos cargos/vagas para contratação de assistentes  
sociais a partir do conhecimento atestado em legislações e do domínio do “uso” de  
instrumentos, técnicas, procedimentos, estratégias, mas sem terem sido solicitadas a reflexão  
e a análise de processos sociais mais amplos.  
584  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 573-594, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Elementos para pensar o trabalho profissional de assistentes sociais pela perspectiva da totalidade social  
Autoras como Mioto e Nogueira (2013) insistem em apontar os desafios da relação entre  
Serviço Social e Política Social, destacando as particularidades das ações profissionais no  
âmbito da política social, especialmente a autonomia e a especificidade, relacionadas à inserção  
dos/as assistentes sociais em espaços tradicionais das políticas públicas, vinculados à prestação  
direta de serviços à população. Nesse prisma, por vezes, não tem comparecido de forma  
expressiva no desenvolvimento do trabalho dos/as profissionais o planejamento das ações  
profissionais, para além das demandas pontuais, mais prementes e repetitivas. Aqui, a  
incorporação dos objetivos das políticas sociais acaba tomando a cena, restando pouco manejo  
dos/as assistentes sociais no estabelecimento das finalidades que devem direcionar o seu  
trabalho para pensar, entre outros pontos, em questões tais como: Quais os interesses que  
movem as ações profissionais? Quais são e de onde vêm as demandas? Como estão sendo  
respondidas? Sob quais meios? Em quais circunstâncias e limitações? Quais são as concretas  
possibilidades de intervenção profissional? Quais conhecimentos são necessários mobilizar?  
Que estratégias teóricas, políticas e instrumentais são fundamentais para subsidiar um trabalho  
pensado, refletido e direcionado na perspectiva da defesa e reafirmação dos direitos sociais e  
humanos? O que precisa ser retomado, reavaliado, discutido e pautado com nossos pares, com  
outros profissionais, com a instituição, com a rede de serviços e com os próprios usuários?  
O enfrentamento dessa equivocada apreensão exige reforçar, mesmo que repetidamente,  
o que de fato é a dimensão técnico-operativa para o Serviço Social. Debater a dimensão técnico-  
operativa no Serviço Social se torna um exercício contínuo, uma vez que sua compreensão  
permanece em disputa, persistindo a contradição entre as construções teóricas da categoria  
profissional e como esta é compreendida. Nessa direção, um primeiro aspecto que cabe ser  
reafirmado é que não é possível compreender a dimensão técnico-operativa de forma isolada,  
tendo em vista sua indissociabilidade das dimensões teórico-metodológica e ético-política.  
Embora tenha sido construída, no decorrer das últimas décadas, uma definição para fins  
didáticos, como o conjunto de instrumentos, técnicas, procedimentos, estratégias, atividades,  
recursos, mobilizados por assistentes sociais que agregam materialidade ao trabalho  
profissional, essa definição acaba se tornando inoperante quando não se articula a  
fundamentação teórico-analítica a um direcionamento ético-político.  
585  
Assim, no bojo das construções impetradas hegemonicamente pela profissão, considerar  
a dimensão técnico-operativa “apenas” a aplicação “prática”, ou tomar a definição da profissão  
apenas pela via da utilização de instrumentos e técnicas, é reduzi-la em proporções não  
tangíveis. O uso de instrumentos, técnicas, procedimentos e habilidades necessários é condição  
elementar ao Serviço Social, mas devem estar articulados às ações profissionais necessárias ao  
Lorena Ferreira Portes; Melissa Ferreira Portes; Evelyn Secco Faquin  
cumprimento de objetivos definidos pelos(as) assistentes sociais. Tais objetivos, no entanto,  
precisam ser pensados e projetados pelos profissionais de Serviço Social. O movimento não  
deve ser pensado como ato individual, que depende dos interesses particulares, mas, ao  
contrário, como tarefa inadiável e intransferível dos/as profissionais que atuam nos diferentes  
espaços sócio-ocupacionais. Responder ao para quê é crucial para não sucumbir às requisições  
indevidas, à não definição do que compete ou o que é atribuição profissional, aos equívocos de  
desconsiderar as especificidades profissionais e servir de “profissional polivalente”, que tudo  
faz, mas pouco conhecimento tem sobre as incumbências e finalidades.  
Como um segundo elemento, alinhado às preocupações apontadas anteriormente,  
situamos um traço ainda pertinente no trabalho de assistentes sociais, que reforça uma herança  
praticista e empirista, desembocando na forma de compreender o trabalho e planejar as ações  
profissionais. Como profissão de natureza interventiva, o Serviço Social dá respostas às  
demandas e requisições apresentadas, assentadas nas ações profissionais que são orientadas  
pelos objetivos profissionais, pelas atribuições e competências delimitadas no campo da sua  
legislação profissional, pela direção política que imprime ao seu trabalho e pelos conhecimentos  
que mobiliza para dar concretude às respostas profissionais. Entretanto, vimos, na produção do  
conhecimento e no debate profissional, contextualizando, historicamente, como a profissão foi  
construindo o direcionamento político e o posicionamento teórico-analítico para sustentar sua  
intervenção profissional, o seu fazer profissional, pressupondo a articulação de três dimensões:  
teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa.  
586  
Diante dessas considerações, apresentamos dois aspectos presentes no trabalho  
profissional que se aproximam de uma perspectiva/atitude pragmática: a) imediaticidade e  
supervalorização da prática; b) desprezo por uma teoria crítica e tendência anti-intelectual.  
O primeiro aspecto revela-se no fortalecimento da herança conservadora1 presente na  
profissão, que a empurrou para uma perspectiva tecnicista e instrumentalista, esvaziando os  
componentes políticos e teóricos que perpassam o trabalho profissional. Sobre essa discussão  
há vasta bibliografia disponível. O traço praticista das respostas profissionais conduz a uma  
característica, ainda muito forte, que é a exigência por respostas pontuais, imediatas e que se  
prendam a uma lógica operacional que não favoreça pensar, refletir, problematizar, planejar  
coletivamente para além das questões imediatas e de curto prazo.  
1 Sobre a herança conservadora no Serviço Social brasileiro, consultar as produções de Marilda Villela Iamamoto.  
Destaque para os livros “Relações Sociais e Serviço Social no Brasil: esboço de uma interpretação teórico-  
metodológica”, escrito em parceria com Raul de Carvalho e “Renovação e Conservadorismo no Serviço Social:  
ensaios críticos”.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 573-594, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Elementos para pensar o trabalho profissional de assistentes sociais pela perspectiva da totalidade social  
Coelho (2013) traz ricas contribuições sobre a imediaticidade no trabalho profissional  
do assistente social. A autora afirma que a imediaticidade impõe-se no cotidiano profissional  
levando a uma compreensão de prática como sinônimo de utilidade, ou seja, o trabalho de  
assistentes sociais centra-se na possibilidade de administrar o caos, tendo por parâmetro a  
aferição da competência e eficácia. Nessa direção, “as respostas profissionais privilegiam a  
utilização dos instrumentos para a manipulação de variáveis empíricas, tendo em vista o  
cumprimento de metas balizadas por critérios de produtividade”, sendo que “a competência  
profissional está diretamente vinculada à capacidade de cumprir, eficazmente, a essas metas”.  
Sendo assim, concebe-se a “prática profissional” como aquela correspondente e necessária ao  
cotidiano, que “não requer o pensar, uma vez que não há perguntas, e as respostas são  
previamente demarcadas por procedimentos, normas e rotinas atribuídas; ou porque não se  
reconhece o pensamento intrínseco às práticas cotidianas, que resulta de largas mediações  
conectadas de forma imediata” (Coelho, 2013, p. 91). O perfil profissional coloca-se como a de  
um técnico bem adestrado (Netto, 1996) que responda, acrítica e mecanicamente, às demandas  
e requisições postas; um profissional “tarefeiro”, habilitado a operacionar manuais e protocolos,  
cumprindo o receituário imposto pelas instituições, sem qualquer nível de resignação, postura  
crítica e atitude propositiva. Iamamoto (2013, p. 215) chama a atenção para esse perfil  
profissional que expressa a “tecnificação pragmatista do Serviço Social” e que leva os/as  
assistentes sociais a refugiarem-se “cada vez mais em uma discussão ‘interna’ sobre elementos  
que, por si, supostamente lhe confeririam um perfil peculiar – objetos, objetivos, métodos e  
procedimentos de intervenção caindo nas amarras do fetiche do metodologismo”. Assim, o  
interesse profissional acaba se reduzindo nas preocupações com o “aperfeiçoamento do  
instrumental técnico-operativo, expresso pela sofisticação dos modelos de diagnóstico e  
planejamento, na busca de uma eficiência que se pretendia asséptica, nos marcos de uma  
crescente burocratização das atividades” (Iamamoto, 2013, p. 215). Longe de traçar uma análise  
endogenista e subjetivista, essas manifestações colocam-se como desdobramentos das  
exigências do mercado de trabalho e das instituições em que os profissionais desenvolvem o  
seu trabalho. No entanto, as condições objetivas, materiais e institucionais – que são  
determinantes em última instância – incidem significativamente nas condições subjetivas e na  
cultura profissional.  
587  
A supervalorização da prática consiste em extirpar qualquer possibilidade analítica,  
reduzindo a “prática profissional” a respostas e ações profissionais imediatas e superficiais, que  
não extrapolem o campo operativo subsumido aos procedimentos técnicos e instrumentais. O  
Lorena Ferreira Portes; Melissa Ferreira Portes; Evelyn Secco Faquin  
importante é “o que fazer e o como fazer” para dar respostas “eficientes” na resolutividade dos  
problemas, no cumprimento das metas e métricas impostas aos profissionais.  
É oportuno reforçar que a imediaticidade é um nível superficial de apreensão do real. O  
modo de aparecer não é, de fato, o modo de ser. A imediaticidade esconde as mediações  
contidas no real, ofuscando suas determinações ontológicas.  
Guerra e Montaño, em obra recente (2024), trazem pontos centrais para pensar a  
superação da razão formal-abstrata na construção e consolidação de uma perspectiva crítica no  
Serviço Social. Destacamos, a seguir, alguns desses pontos.  
Em relação ao “imediatismo e a cotidianização” da prática profissional, os  
autores pontuam que procura-se alcançar respostas imediatas a demandas  
emergenciais, importante assim apenas aquelas ações com impactos e  
resultados diretos e quantificáveis na realidade, em detrimento das ações de  
médio ou longo prazo, não mensuráveis imediatamente. Assim, por exemplo,  
privilegiam-se as ações que respondem diretamente aos problemas pontuais,  
específicos e emergenciais. Em tal sentido, a dinâmica das demandas  
emergentes e imediatas no cotidiano das pessoas parece colocar o assistente  
social num frenesi de respostas pontuais e imediatas no seu cotidiano  
profissional. A reprodução dessa relação demanda-emergencial/resposta-  
imediata leva o profissional (e a profissão como um todo) a uma lógica  
pragmática, movida pela “pré-ocupação” (Guerra; Montaño, 2024, p. 279).  
A postura “reativa” dá o tom do exercício profissional ao reduzi-lo a “dar as respostas  
pontuais e imediatas” livres de análises mais consistentes ou de reflexões críticas mais  
contundentes à dinâmica do cotidiano profissional. O fetiche por modelos e receitas prontas  
para a intervenção também se coloca como tônica, além da atenção às ações repetitivas e  
mecânicas.  
588  
Agregado a isso, coloca-se o segundo aspecto – desprezo por uma teoria crítica e  
tendência anti-intelectual. Considerando que o trabalho de assistentes sociais tende a focar no  
microssocial, na demanda “recortada” que aparece para ser atendida pelos/as profissionais,  
gerando uma falsa ideia de que não possui vinculações com as contradições sociais do modo de  
produção capitalista e que, portanto, não expressam as manifestações das lutas de classes, mas  
como demandas pontuais, individuais e fragmentadas, o teor praticista/pragmatista influencia  
à medida que desvaloriza a necessidade da articulação teórico-prática. Como pontuou Guerra  
(2013, p. 41), “a supressão das mediações teóricas e ideopolíticas, próprias da apreensão da  
realidade na imediaticidade do cotidiano, leva a uma apropriação da realidade como carente de  
mediações”. Dessa forma, “a abstração da das mediações como resultado de uma apreensão da  
realidade na sua imediaticidade é o procedimento da consciência comum, própria do cotidiano,  
que não questiona a gênese e não alcança a apreensão dos fundamentos” (Guerra, 2013, p. 41).  
Descarta-se, por consequência, a teoria como elemento capaz de fomentar uma compreensão  
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Elementos para pensar o trabalho profissional de assistentes sociais pela perspectiva da totalidade social  
mais prenhe de determinações, da totalidade do real, da superação da fragmentação e  
superficialidade do terreno cotidiano. Põe-se a desqualificação da teoria como ferramenta  
analítica fundamental para pautar o trabalho profissional, uma vez que seríamos “os  
profissionais da prática” a dar respostas pontuais no cotidiano, por meio de ações técnicas que  
não exigem uma ação reflexiva de natureza teórico-metodológica.  
Aqui se faz presente uma equivocada apreensão de que só interessa mobilizar  
conhecimentos diretamente ligados à intervenção, reduzindo-os para o campo das legislações  
sociais, dos conhecimentos instrumentais e das orientações para execução das políticas sociais.  
O que extrapola esse universo é considerado “não funcional” ao atendimento das demandas  
profissionais, dada a natureza prático-interventiva da profissão. Pode aparecer, nesta situação,  
ou o desprezo total pela teoria ou, quando mobilizada, reivindica-se que ela seja “aplicável” ao  
que se coloca no imediato. Uma teoria eficiente deve responder eficientemente à prática, caso  
contrário, não teria validade.  
A rejeição ao marxismo comparece na profissão, por vezes, por essa ótica que o  
considera um referencial teórico que não responde às questões da prática e do fazer profissional.  
Espera-se da teoria um guia para ação, reforçando uma concepção pragmática da teoria como  
apontam Guerra e Montaño (2024). A tendência à fragmentação do conhecimento, e sua  
posterior validação prática, reforça o que vimos problematizamos no decorrer do texto. Guerra  
e Montaño (2024) apresentam aspectos dessa expressão: “o curto prazo, o local, o singular e o  
imediato, ou o plano “tático”, hipotecando e deixando em segundo plano qualquer estratégia  
que tenha um horizonte de longo alcance, universal e mediato.  
589  
Esse quadro indica outra tendência historicamente presente na profissão: o anti-  
intelectualismo. Considerados/as como profissionais da prática, numa concepção esvaziada,  
despolitizada e meramente instrumental, os/as assistentes sociais são postos como técnicos e  
não como intelectuais. Cria-se até uma falsa dicotomia: ou ele é um técnico bem adestrado ou  
é um profissional intelectual que pensa criticamente sobre seu trabalho e na realidade social em  
que está inserido. Discordamos de tal apreensão, pois consideramos que o/a assistente social  
não se enquadra como meramente um técnico, embora seja um profissional que mobiliza  
conhecimentos técnicos que o habilitam a desempenhar um determinado ofício, ocupando um  
determinado lugar na divisão social e técnica do trabalho. Se assim não fosse, não haveria  
justificativa para a existência da profissão. Sua formação específica, porém, dotada de  
conhecimentos técnicos especializados, operacionais e instrumentais, que o habilitam a atuar  
Lorena Ferreira Portes; Melissa Ferreira Portes; Evelyn Secco Faquin  
como assistente social, não se resume a um caráter tecnicista, desprovido de conhecimentos  
teórico-analíticos e de um posicionamento ético-político2.  
Por óbvio, o teor de “intelectual” não se restringe ao assistente social que atua na  
formação profissional, no âmbito da produção de conhecimentos e da pesquisa, embora essa  
intelectualidade tenha suas particularidades. Os apontamentos de Portes et al. (2024) marcam  
essa preocupação em não criar falácias sobre o perfil técnico e intelectual dos/as assistentes  
sociais, não recaindo no traço intelectualista e teoricista. Argumentam as autoras que é preciso  
combater a proposição de que  
há os iluminados, os críticos e detentores do saber científico e estariam na  
academia desenvolvendo suas pesquisas e contribuindo com a produção do  
conhecimento; por sua vez, encontram-se os “profissionais da prática”, que  
atuam na gestão, no planejamento e execução dos serviços sociais, sobretudo  
no atendimento direito às demandas das/os usuárias/os. Esses, de forma  
leviana, são denominados de “tradicionais e conservadores”, ausentes de  
intelectualidade. O traço intelectualista deve ser constantemente enfrentado  
no debate do Serviço Social (Portes et al., 2024, p. 18).  
Continuam a exposição apontando que, para buscar superar alguns estereótipos da  
natureza interventiva da profissão, reduzindo-a a uma formação tecnicista e instrumental, ou  
seja, um profissional que está “preocupado unilateralmente em dominar um único aspecto  
específico da realidade, que constituiu seu âmbito de ação imediata” ou de combater uma  
concepção de “técnico com verniz intelectual” (Iamamoto, 2007, p. 180), poderemos recair no  
teoricismo e intelectualismo, segregando dimensões que estão imbricadas: os/as assistentes  
sociais são técnicos e intelectuais; não é “isso ou aquilo”, pois conjugam-se esses dois aspectos.  
Desta forma, na recusa do intelectualismo, é preciso alargar a análise sobre o trabalho  
profissional e sobre o perfil de um profissional crítico e atento às questões do seu tempo, que  
não se coloca como um profissional que, unilateralmente, “responde e reage” reproduzindo  
traços subalternos do exercício profissional, mas que constrói respostas pensadas, planejadas  
para longo alcance, com direcionamento político e análise teórica. Guerra e Montano (2024, p.  
288) reforçam que um dos desafios centrais ao profissional crítico, enquanto intelectual, remete  
à capacidade de enfrentar e superar, sem sucumbir ao que caracterizam como os “cantos de  
Sereia”. Quais seriam esses cantos?  
590  
Primeiramente, o intelectual crítico tem de superar as visões fragmentadas da  
realidade, pois a fragmentação da realidade, transformada em estudos  
“disciplinares”, leva a um conhecimento fragmentário da mesma, antagônico  
à necessária perspectiva dialética e de totalidade, fundamental para uma  
compreensão da complexidade, das diversas determinações do real, chegando  
à essência, aos fundamentos, à raiz da realidade que se pretende conhecer  
2 Há um imenso debate e produção da área sobre as dimensões profissionais, com destaque para as construções de  
Yolanda Guerra, Cláudia Mônica dos Santos e Rosa Lúcia Prédes Trindade.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 573-594, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Elementos para pensar o trabalho profissional de assistentes sociais pela perspectiva da totalidade social  
(Guerra; Montaño, 2024, p. 288).  
Em segundo lugar, os autores defendem que o profissional crítico tem o desafio de  
“evitar/enfrentar o ‘novo linguajar’ de aparência progressista, mas de (camuflado) conteúdo  
conservador”. Um terceiro desafio ao profissional/intelectual crítico é o de “evitar a cooptação  
e o apassivamento por parte dos setores hegemônicos”, o que leva à adesão e à despolitização.  
Um quarto desafio do intelectual crítico é “evitar enfrentar a sedução do que denominamos de  
os ‘cantos de Sereia’’’ naquilo que chamaram de “ideologia do terceiro setor”, assentado em  
discursos pós-modernos fundados na tríade de autorresponsabilização dos indivíduos,  
desresponsabilização social do Estado e desoneração do capital. Destacam os autores que essa  
ideologia é funcional ao projeto neoliberal e promovida por organismos internacionais. Como  
quinto desafio, está o enfrentamento da armadilha que caracterizam como “cavalo de Troia”.  
Essa é uma armadilha que vem travestida de progressista – promovida pela esquerda  
“possibilista” e pós-moderna –, mas de conteúdo neoliberal, que destrói por dentro as lutas das  
classes trabalhadoras, desviando seu foco para projetos camuflados por novo linguajar  
(empoderamento, responsabilidade social e empresarial, economia solidária, sustentabilidade  
ambiental, o linguajar do politicamente correto, por exemplo) que desarticulam qualquer  
possibilidade de unidade dos trabalhadores.  
Por certo que o campo teórico-analítico pode contribuir para o campo da intervenção no  
sentido de calcar as respostas profissionais. No entanto, não é determinante ou não se coloca  
como momento predominante, mas pode mobilizar os/as profissionais a problematizarem a  
realidade social, institucional e profissional que os/as cercam. É num processo de intensas e  
contínuas mediações e contradições em que o trabalho de assistentes sociais (como qualquer  
outro ofício profissional na ordem do capital) se debruça e se desenvolve. Colocado no patamar  
de ampliação e reafirmação de direitos sociais e humanos, de alargamento da participação  
dos/as usuários/as nas diferentes instâncias da organização política; da desburocratização do  
acesso aos serviços, benefícios, projetos e demais ações que se colocam no campo dos direitos  
(mesmo reconhecendo seus limites burgueses); de enfrentamento de posturas autoritárias,  
policialescas e discriminatórias; de problematização do papel do Estado e de seu atrelamento  
aos interesses do capital; de reivindicação de melhores condições de trabalho e ampliação de  
políticas sociais ( mesmo que saibamos que, em última instância, são funcionais ao capital para  
reprodução da força de trabalho), o trabalho precisa ser pensando teórica e politicamente.  
É preciso não confundir profissão com protopartido, com movimento social ou qualquer  
espécie de organização política. A natureza assalariada do trabalho já se interpõe às limitações  
profissionais diante das determinações macroestruturais. Isso não significa que não há  
591  
Lorena Ferreira Portes; Melissa Ferreira Portes; Evelyn Secco Faquin  
vinculação política da profissão com a luta mais ampla da classe trabalhadora, ou melhor, com  
seus interesses históricos. Mesmo reconhecendo o vigor limitado das ações profissionais na  
esfera das lutas classistas e revolucionárias, não podemos nos furtar a essa tarefa.  
Consideramos que um referencial teórico crítico que dê condições para que os/as  
profissionais analisem a realidade na perspectiva da totalidade, contrapondo-se a elaborações  
superficiais, subjetivistas, idealistas e conservadoras, não é suficiente, mas é fundamental e  
urgente. O construto teórico-analítico pode favorecer posicionamentos políticos que se  
coloquem no campo dos enfrentamentos das desigualdades e injustiças sociais, de toda forma  
de violência e opressões e de barbárie social endereçadas à classe trabalhadora.  
Netto (2017, p. 328) alerta sobre a hipertrofia que tende a insistir na área do Serviço  
Social: “reduzir a intervenção profissional ao exercício técnico elementar de uma assistência  
refilantropizada e, de outro, a reconduzir o discurso teórico-profissional a âmbitos societais  
microscópicos”. Aponta que a profissão enfrenta, de uma parte, o risco de “perder o estatuto  
acadêmico a que se alçou com a sua consolidação, convertendo-se em profissão mera e  
elementarmente técnica e de segunda linha” (Netto, 2017, p. 328). De outra parte, Netto pontua  
que “os intentos de renovação crítico-teórica tendem a recolocar, mais sofisticadamente, os  
impasses e limites de uma profissão de corte ‘psico-social’ como é verificável em significativos  
e recentes esforços de teorização profissional” (Netto, 2017, p. 328).  
592  
Não é um detalhe a ser menosprezado, pontua Netto (2017), que, “nesses esforços,  
intencionalmente críticos, a categoria teórica da exploração não compareça inclusive em boa  
parte daquelas elaborações que procuram pensar numa perspectiva ‘anti-opressiva’” (Netto,  
2017, p. 329).  
Considerações finais  
A análise do trabalho de assistentes sociais à luz da totalidade social revelou-se  
imprescindível para a apreensão crítica das determinações históricas, políticas, econômicas e  
sociais que configuram a profissão na contemporaneidade. Ao romper com leituras  
fragmentadas, endogenistas e idealistas, o presente estudo reafirma a centralidade do referencial  
teórico-metodológico marxiano nas análises da realidade social, para desvelar as múltiplas  
mediações que condicionam o trabalho profissional.  
Reconhecer o Serviço Social como profissão inserida na divisão social e técnica do  
trabalho, sob a égide do modo de produção capitalista, possibilita identificar, entre outras  
questões, as formas perversas de precarização que se expressam no trabalho e explicitar como  
incidem diretamente sobre as condições materiais e subjetivas de trabalho dos/as assistentes  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 573-594, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Elementos para pensar o trabalho profissional de assistentes sociais pela perspectiva da totalidade social  
sociais, comprometendo sua autonomia profissional — já historicamente relativa —,  
fragilizando sua saúde e afetando, de forma significativa, a qualidade dos serviços prestados à  
população. Esta, por sua vez, é impactada por respostas profissionais formuladas de maneira  
reiterativa, mecanicista e imediatista, voltadas prioritariamente ao atendimento das demandas  
e requisições institucionais que não foram problematizadas com rigor crítico e analítico.  
A análise empreendida neste artigo permitiu aprofundar a reflexão sobre a dimensão  
técnico-operativa no Serviço Social, que não pode ser analisada de forma desarticulada das  
demais dimensões do trabalho profissional — teórico-metodológica e ético-política —,  
tampouco apartada da realidade concreta. Pelo contrário, sua efetivação se dá de maneira  
articulada e processual, mediada pelas determinações da luta de classes e pelas injunções do  
capital sobre as políticas sociais, que conformam os espaços sócio-ocupacionais da profissão.  
Para tanto, é necessária uma postura dialógica, educativa e de formação permanente  
para enfrentar — não na sua totalidade, por óbvio — os traços praticistas e imediatistas e, de  
certo modo, anti-intelectualistas, que ainda permanecem no desenvolvimento do trabalho dos/as  
assistentes sociais. Esse enfrentamento não será obra individual e requer o fortalecimento dos  
debates coletivos, da reorganização política da categoria profissional e de intenso processo de  
qualificação profissional.  
593  
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Fundamentos do Serviço Social:  
a “questão social” no centro do debate  
Fundamentals of Social Work:  
the “social question” at the center of the debate  
Ana Carolina do Nascimento Rodrigues*  
Resumo: O texto tem como objetivo realizar  
um resgate teórico acerca da “questão social”,  
partindo do pressuposto de que a mesma tem um  
lugar central na compreensão dos fundamentos  
do Serviço Social sob uma abordagem  
histórico-ontológica. A metodologia utilizada  
foi a revisão bibliográfica, por meio da qual nos  
debruçamos sobre o que grandes estudiosos  
vêm debatendo sobre a “questão social”.  
Retomamos a essência da “questão social”  
compreendida a partir da Lei Geral da  
Acumulação Capitalista, passamos por algumas  
das características da formação sócio-histórica  
brasileira e sobre as configurações da “questão  
Abstract: This text aims to provide a theoretical  
overview of the "social question," assuming that  
it plays a central role in understanding the  
foundations of Social Work from a historical-  
ontological perspective. The methodology used  
was a bibliographical review, through which we  
delve into the debates of leading scholars on the  
"social question." We revisit the essence of the  
"social question" as understood from the  
General Law of Capitalist Accumulation,  
examine some of the characteristics of Brazil's  
sociohistorical formation, and explore the  
configurations of the "social question" in Brazil.  
We also explore societal transformations that  
are altering the expressions of the "social  
question" today. We present our reflections on  
how the State, through social policies, responds  
to this phenomenon and the dialectical  
relationships between the profession and the  
"social question." We conclude that Marxist  
thought is the only one capable of unveiling this  
dynamic.  
social” no Brasil,  
e
ainda sobre as  
transformações societárias, que alteram as  
expressões da “questão social” na atualidade.  
Trazemos nossas reflexões sobre como o  
Estado, via políticas sociais, responde a esse  
fenômeno e quais as relações entre a profissão e  
a
“questão social”. Concluímos que  
o
pensamento marxista é o único capaz de  
desvelar essa dinâmica.  
Palavras-chaves: Fundamentos do Serviço  
Keywords: Fundamentals of Social Work;  
Social; Questão social; Serviço Social.  
Social question; Social Work.  
* Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: ananascimento.rodrigues@estudante.ufjf.br  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.49594  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 27/07/2025  
Aprovado em: 23/10/2025  
Ana Carolina do Nascimento Rodrigues  
Introdução  
Segundo Guerra e Batista (2021), a “questão social” se põe na agenda de pesquisa para  
o Serviço Social a partir da aprovação das Diretrizes Curriculares da Associação Brasileira de  
Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS) em 1996. Essa novidade na direção da  
formação profissional representa o legado crítico do Processo de Renovação da profissão1.  
Junto de outros marcos normativos importantes como a Lei de Regulamentação da Profissão  
(Lei nº 8.662/1993) e o Código de Ética Profissional do ano de 1993, as Diretrizes Curriculares  
da ABEPSS expressam o amadurecimento e a consolidação do Projeto Ético-Político de  
vertente marxista como hegemônico no Serviço Social Brasileiro. No referido documento, a  
“questão social” aparece como fundamento básico para a existência do Serviço Social  
(ABEPSS, 1996).  
Entretanto, a expressão “questão social” pode possuir sentidos diversos a depender do  
campo teórico em que se baseia (Netto, 2001), e mesmo entre autores do campo marxista, a  
concepção sobre a relação entre “questão social” e Serviço Social pode apresentar diferentes  
pontos de vista, aparecendo “como eixo fundante da profissão, como seu objeto/matéria prima,  
âmbito de intervenção e/ou como uma categoria teórica explicativa” (Guerra; Batista, 2021, p.  
184). Tal diversidade marca a importância e a sutileza do debate.  
A obra de Iamamoto e Carvalho (2014), originalmente publicada em 1982 é um marco  
na produção de conhecimento na área do Serviço Social brasileiro visto que inaugura a  
aproximação teórica da profissão com a tradição marxista. Os autores fundamentam sua análise  
nas categorias explicitadas por Marx para a compreensão da sociedade capitalista e desvendam  
o surgimento do Serviço Social nesta sociabilidade. Ao tratarem da dinâmica da sociedade  
capitalista, fundamentalmente vão à exploração da classe trabalhadora pela burguesia, sem a  
qual não é possível explicar as relações sociais no capitalismo. Tal exploração não ocorre sem  
contradições e, portanto, tais relações também são marcadas pelo elemento da luta de classes,  
596  
1
Em meados da década de 1960, impulsionado pelo Movimento de Reconceituação da América Latina, o Serviço  
Social brasileiro iniciou seu Processo de Renovação, que não se deu de forma homogênea, mas foi atravessado  
por diferentes perspectivas. Em um bloco, duas vertentes que, de forma geral, defendiam uma modernização  
técnica da profissão sem questionar as suas bases conservadoras e o seu reforço à manutenção da sociabilidade do  
capital. Em contraponto a este bloco, havia a perspectiva da Intenção de Ruptura, que trouxe o questionamento  
das bases teórico-práticas da profissão, a aproximação com a teoria social crítica de Marx e inserção de parte da  
categoria em movimentos sociais e sindicais. É na década de 1980 que a Intenção de Ruptura se fortalece na  
academia e começa a se expandir para a base da categoria profissional, o que só foi viável porque é nesse período  
que o regime ditatorial entra em decadência e é iniciado o processo de redemocratização no país. Nessas  
circunstâncias, o coletivo da categoria, através de suas entidades representativas, passou a repensar o projeto  
profissional do Serviço Social e gestou-se o chamado Projeto Ético-Político, que se relaciona com a superação da  
ordem do capital e para tanto, deve disseminar os valores necessários à construção de uma nova sociabilidade,  
como: democracia, liberdade e justiça social (Netto, 1991).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 595-610, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Fundamentos do Serviço Social: a “questão social” no centro do debate  
que se expressa por meio da “rebeldia”, traduzida como a organização política do proletariado.  
A dinâmica aqui exposta nos oferece os fundamentos para a compreensão da “questão social”,  
conceito que não foi elaborado por Marx, mas que expressa um movimento da realidade que só  
é passível de desvelamento através de sua teoria.  
Santos (2010) parte da análise de Iamamoto e Carvalho (2014) para apontar uma lacuna  
existente na produção teórica do Serviço Social nas décadas seguintes. A tese da autora  
demonstrou a necessidade de aprofundar a abordagem no que se referia às particularidades  
históricas da formação social brasileira na constituição da nossa “questão social”.  
Tendo em vista o exposto, este artigo tem como objetivo a realização de um resgate  
teórico acerca da “questão social”, pensando os processos sócio-históricos que a colocam como  
fundamento do Serviço Social. Para isto, o trabalho foi organizado da seguinte maneira: na  
presente introdução, demarcamos a relevância do debate acerca da “questão social” para o  
Serviço Social, situando a heterogeneidade no que se refere à utilização da expressão; no tópico  
intitulado A dinâmica universal da “questão social, apresentamos elementos históricos sobre o  
surgimento da expressão “questão social”, sua dinâmica universal explicitada por Marx na Lei  
Geral da Acumulação Capitalista; o tópico seguinte - As novas configurações da “questão  
social” e seu debate na contemporaneidade - aborda, de forma sintética, algumas  
características da “questão social” na realidade brasileira, tendo em vista as particularidades de  
nossa formação sócio-histórica e as transformações societárias operadas como respostas à crise  
estrutural do capital das últimas décadas e seus rebatimentos na “questão social”, assim como  
na disputa ideológica acerca de seu significado; o último tópico recebe o nome As relações  
entre a “questão social”, política social e Serviço Social, e pretende apontar como a “questão  
social” mediatizada pelas políticas sociais do Estado burguês no capitalismo monopolista cria  
a necessidade social para o surgimento e desenvolvimento da profissão, além de oferecermos  
algumas reflexões sobre estas relações na atualidade; por último, trazemos nossas  
considerações finais, onde reafirmamos a necessidade de aprofundamento teórico acerca do  
método materialista histórico-dialético, das particularidades sócio-históricas do  
desenvolvimento do capitalismo no Brasil e do trato dado à “questão social” pelo Estado, que  
rebate na apreensão do fenômeno pela categoria de Assistentes Sociais - que tem na “questão  
social” a base de justificativa para a existência da profissão.  
597  
Demarcamos aqui que não temos como objetivo esgotar o tema, que sabemos ser  
complexo e de extrema relevância para o Serviço Social brasileiro. Intencionamos, tão somente,  
apresentar uma revisão bibliográfica sobre a “questão social” articulada a algumas reflexões  
Ana Carolina do Nascimento Rodrigues  
sumárias que realizamos sobre sua preponderância no que se refere aos estudos dos  
fundamentos do Serviço Social.  
A dinâmica universal da “questão social”  
Segundo Netto (2001), a expressão “questão social” surgiu aproximadamente na terceira  
década do século XIX para dar conta de explicitar o inédito fenômeno do pauperismo, que havia  
se tornado evidente com os efeitos da Primeira Revolução Industrial na Inglaterra ao final do  
século XVIII. “Pela primeira vez na história registrada, a pobreza crescia na razão direta em  
que aumentava a capacidade social de produzir riquezas” (Netto, 2001, p. 42). Ainda segundo  
Netto (2001), a partir da segunda metade do século XIX, a expressão “questão social” ganha  
notoriedade no campo do pensamento conservador. Tal fato guarda relação com a Revolução  
de 1848 e a perda do caráter progressista da burguesia. A necessidade de conservação da ordem  
burguesa frente ao proletariado, que faz a passagem de classe em si à classe para si, -  
apresentando-se como protagonista do seu próprio projeto societário - leva a burguesia à  
utilização de repressão e à disseminação de sua ideologia dominante, que coloca empecilhos ao  
desvelamento da realidade (Guerra; Batista, 2021).  
Para Guerra e Batista (2021, p. 183), “Transformaram todos os processos em uma mera  
abstração, e ao fazê-lo, os economistas modernos não explicitam a contradição das relações  
reais, mas a eternizam”. A partir disso, os intelectuais burgueses passam a pensar sociedade e  
economia de forma desconectada, o que impede a compreensão da relação entre o  
desenvolvimento capitalista e o pauperismo. Desta forma, a “questão social” é vista de forma  
natural, como inerente a qualquer modo de produção ou ainda como um “problema” individual,  
passível de ação moralizadora. Sob ambos os pontos de vista, a gênese da “questão social” é  
mistificada, o que contribui para a conservação da sociedade capitalista.  
598  
Neste mesmo cenário, com o proletariado organizado politicamente, a classe  
trabalhadora compreendeu que a “questão social” tem origem na sociedade burguesa e só pode  
ser extinta a partir de sua supressão. É então que o pensamento revolucionário passa a apreender  
o traço conservador da expressão “questão social” e a utilizá-la apenas apontando este elemento  
mistificador (Netto, 2001). Contudo, o que Netto (2001, p. 45) aponta é que somente em 1867  
com a publicação do primeiro volume de “O Capital”, é que se alcança a compreensão teórica  
“do complexo de causalidades da ‘questão social’”. Tornou-se possível então, desvendar a  
dinâmica da “questão social” para além de sua aparência mais imediata, o pauperismo. Esse  
desvendamento se dá no capítulo que trata da “Lei Geral da Acumulação Capitalista”, na qual  
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Fundamentos do Serviço Social: a “questão social” no centro do debate  
Marx explicita a lógica da exploração contida na relação entre capital e trabalho como traço  
constitutivo do capitalismo.  
Quanto ao pauperismo, Marx (2023, p. 470-471), afirma:  
O sedimento mais baixo da superpopulação relativa habita, por fim, a esfera  
do pauperismo [...] O pauperismo constitui o asilo para inválidos do exército  
trabalhador ativo e o peso morto do exército industrial de reserva. Sua  
produção está incluída na produção da superpopulação relativa, sua  
necessidade na necessidade dela, e juntos eles formam uma condição de  
existência da produção capitalista e do desenvolvimento da riqueza. [...]  
Quanto maior forem as camadas lazarentas da classe trabalhadora e o exército  
industrial de reserva, tanto maior será o pauperismo oficial. Essa é a lei geral,  
absoluta, da acumulação capitalista.  
Santos (2010, p. 126) resume bem este movimento exposto por Marx na seguinte  
passagem:  
A incorporação pelos capitalistas das inovações tecnológicas, tendo em vista  
o aumento da produtividade do trabalho social e diminuição do tempo de  
trabalho socialmente necessário à produção de mercadorias, produz um  
movimento simultâneo de aumento de capital constante e diminuição do  
capital variável, empregado na força de trabalho.  
Ao revelar essa dinâmica, Marx (2023) explicita como o desenvolvimento da  
acumulação capitalista produz uma população trabalhadora excedente, o exército industrial de  
reserva. População que se torna recurso indispensável ao funcionamento do capital, uma vez  
que “Toda a forma de movimento da indústria moderna deriva, portanto, da transformação  
constante de uma parte da população trabalhadora em mão de obra desempregada ou  
semiempregada” (Marx, 2023, p. 463). Essa população supérflua - que se evidencia na  
aparência fenomênica do pauperismo - atua de forma a pressionar para baixo os salários dos  
trabalhadores ativos e manter suas precárias condições de trabalho. Entretanto,  
599  
Tão logo os trabalhadores desvendam, portanto, o mistério de como é possível  
que, na mesma medida em que trabalham mais, produzem mais riqueza alheia,  
de como a força produtiva de seu trabalho pode aumentar ao mesmo tempo  
que sua função como meio de valorização do capital se torna cada vez mais  
precária para eles; tão logo descobrem que o grau de intensidade da  
concorrência entre eles mesmos depende inteiramente da pressão exercida  
pela superpopulação relativa; tão logo, portanto, procuram organizar,  
mediante trade’s unions etc., uma cooperação planificada entre empregados e  
os desempregados com o objetivo de eliminar ou amenizar as consequências  
ruinosas que aquela lei natural da produção capitalista acarreta para sua classe,  
o capital e seu sicofanta, o economista político, clamam contra a violação da  
“eterna” e, por assim dizer, “sagrada” lei da oferta e demanda (Marx, 2023, p.  
468).  
Marx (2023) parte da análise histórica da realidade para demonstrar que a exploração  
não ocorre sob o proletariado de forma passiva, mas que ao tomar consciência desta dinâmica,  
a classe trabalhadora se organiza, de modo à tensionar a correlação de forças que se desenha.  
Ana Carolina do Nascimento Rodrigues  
Todo este movimento do real, expresso na Lei Geral da Acumulação Capitalista, serve como  
base universal para pensar a “questão social”, entretanto é necessário também estudar as  
particularidades históricas e nacionais para a análise do fenômeno (Netto, 2001).  
As novas configurações da “questão social” e seu debate na contemporaneidade  
Ianni (1989) é uma referência ímpar para analisarmos a “questão social”, que segundo  
ele “reflete disparidades econômicas, políticas e culturais, envolvendo classes sociais, grupos  
raciais e formações regionais. Sempre põe em causa as relações entre amplos segmentos da  
sociedade civil e o poder estatal” (Ianni, 1989, p. 145). O autor aponta a existência da “questão  
social” no Brasil já no período da escravidão, quando os escravizados eram expropriados do  
produto de seu trabalho e de si mesmos, ao que só podiam resistir através do suicídio, rebelião  
na senzala, fuga, formação de quilombos.  
Gonçalves (2018, p. 515) nos mostra que no pós-escravidão “O Estado brasileiro não  
implementou políticas que impulsionassem a inclusão destes(as) no universo da cidadania”, o  
que resultou na não integração dos ex-escravizados ao proletariado que se constituía, nem  
mesmo enquanto exército industrial de reserva. O discurso racista que orientou esta segregação  
foi de que os negros não dispunham das qualidades e qualificações necessárias para o  
erguimento da sociedade capitalista. A política migratória patrocinada pelo Estado brasileiro é  
parte da estratégia de branqueamento da população. Logo, a questão racial é constitutiva da  
“questão social” no Brasil e uma não é suprimível sem a supressão da outra (Gonçalves, 2018).  
Na emergência do estatuto do trabalho livre, coloca-se explicitamente, pelo proletariado  
que então se formava, a “questão social” na cena pública brasileira por meio das lutas sociais  
que reivindicavam melhores condições de vida e trabalho. Pela via estatal, passa-se então a  
combinar medidas de repressão com algumas concessões reformistas, visando controlar  
qualquer possibilidade de revolução (Ianni, 1989). Diante desta realidade, os caminhos tomados  
para “tratar” a “questão social” passam por naturalização, ações no âmbito da assistência social  
estatal, pedagogia do trabalho2 e criminalização (Ianni, 1989). Caminhos estes que se  
combinam ao longo da história e que, em última instância, são funcionais à lógica burguesa.  
600  
2 “Para muitos, a questão social diz respeito ao trabalho produtivo exigido pela economia de mercado, à reprodução  
progressivamente diversificada de capital. Desde o declínio do regime escravista, começou a redefinição do  
trabalho, como necessário e produtivo, no sentido de produzir mercadoria e lucro, de ser indispensável à vida do  
indivíduo e da sociedade. [...] Além dos governantes e dos porta-vozes dos setores dominantes, vários intelectuais  
dedicam-se a fazer apologia ao trabalho. Os novos tempos exigem a pregação sobre o trabalho, como atividade  
dignificante. Trata-se de combater a preguiça, a leseira, tristeza, luxúria” (Ianni, 1989, p. 152).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 595-610, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Fundamentos do Serviço Social: a “questão social” no centro do debate  
Vejamos como a “questão social” vem se desdobrando na contemporaneidade e, em que medida  
os debates em seu entorno e as respostas oferecidas corroboram com tais caminhos.  
Iamamoto (2014) faz um resgate das determinações históricas que redimensionam a  
“questão social” na contemporaneidade e para isso analisa a mundialização e financeirização  
da economia3. Segundo a autora:  
O que é obscurecido nessa nova dinâmica do capital é o seu avesso: o universo  
do trabalho - as classes trabalhadoras e suas lutas -, que cria riqueza para  
outros, experimentando a radicalização dos processos de exploração e  
expropriação. As necessidades sociais das maiorias, a luta dos trabalhadores  
organizados pelo reconhecimento de seus direitos e suas refrações nas  
políticas públicas [...] sofrem uma ampla regressão na prevalência do  
neoliberalismo, em favor da economia política do capital. Em outros termos,  
tem-se o reino do capital fetiche na plenitude de seu desenvolvimento e  
alienação (Iamamoto, 2014, p. 107).  
A mundialização e financeirização da economia ocorrem através da fusão entre  
instituições financeiras e industriais, que passam a centralizar a acumulação de capital. O que  
a autora denomina como capital fetiche é a ideia que a esfera das finanças é capaz de criar lucro,  
o qual não existe sem a extração de mais-valia. Essa dominação das finanças só é possível com  
o suporte dos Estados nacionais, que asseguram as condições necessárias para a exploração dos  
países centrais sobre os de capitalismo periférico. Segundo Iamamoto (2014, p. 111),  
O capital internacionalizado produz a concentração de riqueza, em um pólo  
social (que é, também, espacial) e, noutro, a polarização da pobreza e da  
miséria, potenciando exponencialmente a lei geral da acumulação capitalista,  
em que se sustenta a questão social.  
601  
Essa dinâmica explica o aumento do desemprego crônico, o aprofundamento da  
precarização e da flexibilização das condições e relações de trabalho e o sucateamento das  
políticas sociais (Iamamoto, 2014).  
O fio condutor proposto por Iamamoto (2014) é de que o processo de financeirização e  
mundialização da economia está no centro de processos que vêm sendo tratados de forma  
autônoma, como: a contrarreforma do Estado, a reestruturação produtiva, a “questão social”, a  
ideologia neoliberal e o pensamento pós-moderno. Para ela, é fundamental apontar tais  
conexões, inclusive para clarificar o entendimento de que esse momento do capitalismo traz  
novidades que redimensionam a “questão social”, trazendo novas configurações, mas não  
alteram sua estrutura. Dessa forma, entende que não é possível falar em uma “nova questão  
social” ou “questões sociais” autônomas entre si. Reafirma que a gênese da “questão social”  
está na dinâmica exposta na Lei Geral da Acumulação Capitalista. Embora reconheça as  
3
Não seria possível, nos limites deste artigo, descrever todo esse complexo processo, que aparece de forma  
aprofundada na obra de Iamamoto (2014, p. 116-118).  
Ana Carolina do Nascimento Rodrigues  
transformações econômicas, regionais e culturais das últimas décadas que produzem alterações  
na forma da “questão social”, é categórica na compreensão de que elas não alteram seu  
conteúdo.  
Na contramão do que explicita Iamamoto (2014) acerca das transformações societárias  
acima descritas, está o debate francês sobre a “questão social” - largamente incorporado no  
discurso institucional brasileiro -, representado por Castel (1998) e Rosanvallon (1998). Castel  
(1998) interpreta a “nova questão social” a partir do enfraquecimento da condição salarial  
advinda da “perda da centralidade do trabalho”, que ele concebe como fundamento da  
cidadania. Ao tratar da precarização do emprego e do desemprego, Castel (1998), aponta a  
existência dos supranumerários e compreende a partir do pensamento de Durkheim, que estes  
estão desintegrados da sociedade, cabendo ao Estado o papel de fiador da “coesão social” via  
políticas sociais.  
Para Rosanvallon (1998, p. 23), “Os fenômenos atuais da exclusão não se enquadram  
nas antigas categorias da exploração do homem. Assim surgiu uma “nova questão social”,  
fenômeno que também teria na “coesão social”, via Estado, a sua resposta. Isso demarca que  
sua análise também se encontra no campo teórico do positivismo. Aponta a “inserção social”  
pela via do trabalho como um direito que deveria prevalecer em detrimento de um direito à  
renda. Além disso, argumenta sobre a necessidade de condicionalidades para aqueles que  
recebem assistência social estatal. Através dessa lógica defende a não remuneração da exclusão.  
Em suma, concebe a crise do Estado Providência4 como uma crise de valores. A solidariedade,  
enquanto um valor, seria uma forma de compensar as “desigualdades naturais” através da  
distribuição.  
602  
Não é nosso objetivo nos aprofundarmos nos escritos de Castel (1998) e Rosanvallon  
(1998) sobre a “questão social”, apenas trouxemos os principais pontos de suas análises para  
demarcar que ainda hoje existem disputas em campos teóricos divergentes sobre o significado  
da expressão “questão social”. Isto não é secundário, uma vez que o pensamento dos referidos  
autores penetra nas políticas sociais brasileiras, em especial na política de Assistência Social.  
Sem a pretensão de simplificar o debate dos autores ou de igualá-los, o que podemos apreender  
é que ambos analisam a sociedade a partir da teoria social de Durkheim, o positivismo. Não  
4
Apresentamos um trecho do prefácio escrito por Lúcio Alcântara na edição brasileira do livro “A Nova Questão  
Social” (Rosanvallon, 1998) onde ele traz as palavras do próprio Rosanvallon para explicar a relação entre o Estado  
Providência e a social-democracia “Baseia-se na ideia de compromisso social, ligando o Estado, o patronato (o  
capital) e os sindicatos (a classe operária). A classe operária aceita não contestar as relações de produção (a  
propriedade privada) em troca de um Estado social redistributivo e da existência de um sistema ativo de  
negociações sociais” (Rosanvallon, 1998, p. 12).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 595-610, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Fundamentos do Serviço Social: a “questão social” no centro do debate  
possuem como objetivo trazer reflexões que possam contribuir com a ultrapassagem do modo  
de produção capitalista. Ao contrário, propõem ações nesta que entendem ser a sociedade  
possível, contribuindo para a sua conservação. Ao falarem em “nova questão social”,  
compreendem que as transformações ocorridas no mundo do trabalho criam um novo “fato  
social”. Não compreendem que a dinâmica exposta por Marx na Lei Geral da Acumulação  
Capitalista se reatualiza em novos cenários e momentos, mas não perde sua essência.  
Santos (2010) traz uma crítica importante sobre a incorporação do debate francês para  
pensar a “questão social” no Brasil, afirmando que tal incorporação desconsidera as  
particularidades do capitalismo brasileiro. Como exemplo, a autora aborda o debate de Castel  
(1998) sobre o fim da sociedade salarial, modelo que nunca chegou a ocorrer no Brasil. A autora  
propõe uma análise sobre as particularidades da “questão social” no Brasil sob a ótica do  
desemprego, tendo em vista “a centralidade do trabalho como elemento fundante da  
sociabilidade” (Santos, 2010, p. 130). Para isto caracteriza alguns fenômenos da formação  
sócio-histórica brasileira.  
Um destes fenômenos é o caráter conservador da modernização capitalista no Brasil,  
como exemplo, Santos (2010) cita o latifúndio, que tem sua origem no Brasil Colônia, mas  
acaba sendo refuncionalizado dentro da dinâmica capitalista brasileira. Nas palavras da autora:  
Por mais que o desenvolvimento capitalista posteriormente operado no país  
tenha possibilitado o ingresso na fase de industrialização pesada, o mesmo não  
implicou qualquer alteração significativa em relação à estrutura fundiária.  
Seus impactos podem ser observados na transformação na base produtiva da  
agricultura brasileira, pautada por processos de modernização que,  
incentivados pelos fortes mecanismos creditícios públicos, disponíveis aos  
grandes proprietários, consolidaram, com base no latifúndio, as chamadas  
agroindústrias. [...] A modernização do agronegócio se faz, no entanto, sob a  
mesma base sócio-política (a grande propriedade territorial) e com a mesma  
debilidade da modernização industrial (importando tecnologia e insumos), o  
que caracteriza, na atualidade uma espécie de “volta ao passado” (Santos,  
2010, p. 133).  
603  
Outro aspecto abordado por Santos (2010) acerca do caráter conservador da  
modernização capitalista no Brasil é a dependência de países partícipes da “rota de transferência  
de tecnologia e dos acordos de cooperação tecnológica” (Santos, 2010, p. 135), da qual o país  
não faz parte. Aponta ainda, a clássica exclusão das camadas populares nos processos de  
decisão política do país, conforme também aparece em Ianni (1989). A estratégia se dá pela  
“antecipação das classes dominantes aos movimentos reais ou potenciais das classes  
subalternas” (Santos, 2010, p. 136). Conectado a isto está o papel do Estado brasileiro, imbuído  
de interesses burgueses, que atua “no sentido de garantir as condições para o elevadíssimo grau  
Ana Carolina do Nascimento Rodrigues  
de exploração da força de trabalho” (Santos, 2010, p. 138), mas também na garantia de  
subsídios em todas as fases de desenvolvimento até a consolidação do capitalismo monopolista.  
Um elemento primordial na análise de Santos (2010) é que a precarização do trabalho e  
o desemprego não são problemáticas que surgem no Brasil com a entrada do modelo de  
acumulação flexível, como resposta à crise do capitalismo mundial. Para a autora:  
Se a flexibilidade e precariedade costumam aparecer ligadas à fase de  
acumulação flexível do capital, no Brasil, não se pode considerá-las sem que  
sejam, antes, situadas como características do “fordismo à brasileira”: o  
desemprego enquanto expressão da “questão social” adquire o caráter de  
desemprego estrutural na economia brasileira desde que o capitalismo  
retardatário completa seu ciclo, no auge da “industrialização pesada” (Santos,  
2010, p. 145).  
Dito isto, Santos (2010) não nega que acumulação flexível, neoliberalismo e  
financeirização tenham rebatimentos importantes nas demandas relacionadas à “questão social”  
no Brasil e no desemprego, enquanto expressão da “questão social”. O que chama a atenção em  
sua análise é para que não se caia na superficialidade de considerar a realidade dos países  
centrais como universal, ignorando as mediações referentes às particularidades do  
desenvolvimento do capitalismo em nossas terras e, por conseguinte, da “questão social” no  
Brasil. Todavia, defende que “se manifesta na atualidade uma extensão e aprofundamento da  
flexibilidade estrutural do mercado de trabalho, estendendo-a a outros aspectos além da  
flexibilidade quantitativa dos empregos, expressa na alta rotatividade da mão-de-obra” (Santos,  
2010, p. 146).  
604  
Segundo Iamamoto (2014, p. 123):  
O resultado desse processo tem sido o agravamento da exploração e das  
desigualdades sociais dela indissociáveis, o crescimento de enormes  
segmentos populacionais excluídos do “círculo da civilização”, isto é, dos  
mercados, uma vez que não conseguem transformar suas necessidades sociais  
em demandas monetárias. As alternativas que lhes restam, na ótica oficial, são  
a “violência e a solidariedade”.  
Diante desta conjuntura, Pereira (2001) traz uma provocação importante sobre o uso da  
expressão “questão social” na atualidade. A autora problematiza que tem sido comum tomar a  
“questão social” como a contradição entre capital e trabalho, desconsiderando a luta de classes  
enquanto um de seus elementos constitutivos. Sua tese é de que na contemporaneidade, a classe  
trabalhadora não vem dispondo das condições necessárias para explicitar politicamente os  
“problemas” pulverizados que enfrenta como uma questão que possui uma raiz comum. Aponta  
ainda que da forma fragmentada como se apresentam, tais reivindicações não são suficientes  
para pôr em xeque a ordem burguesa na direção de um projeto contra-hegemônico.  
Portanto, por falta de forças sociais com efetivo poder de pressão para fazer  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 595-610, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Fundamentos do Serviço Social: a “questão social” no centro do debate  
incorporar na agenda pública problemas sociais ingentes, com vista ao seu  
decisivo enfrentamento, entendo que temos pela frente não propriamente uma  
“questão social” explícita, mas uma incômoda e complicada “questão social”  
latente, cuja explicitação acaba por tornar-se o principal desafio das forças  
progressistas (Pereira, 2001, p. 52).  
No próximo item, traremos os elos que se formam entre a “questão social”, política  
social e Serviço Social no surgimento da profissão e na conjuntura ora explicitada.  
As relações entre a “questão social”, política social e Serviço Social  
Nas palavras de Iamamoto e Carvalho (2014, p. 83-84),  
A questão social não é senão as expressões do processo de formação e  
desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no cenário político da  
sociedade, exigindo seu reconhecimento pelo Estado. É a manifestação, no  
cotidiano da vida social, da contradição entre o proletariado e a burguesia, a  
qual passa a exigir outros tipos de intervenção, mais além da caridade e da  
repressão. O Estado passa a intervir diretamente nas relações entre o  
empresariado e a classe trabalhadora, estabelecendo não só uma  
regulamentação jurídica do mercado de trabalho, através de legislação social  
e trabalhista específicas, mas gerindo a organização e prestação dos serviços  
sociais, como um novo tipo de enfrentamento da questão social.  
Tal conceituação é necessária para compreender porque os autores afirmam ser a  
“questão social” a base de justificação para o Serviço Social. É por meio das políticas sociais  
que são criadas pelo Estado no capitalismo monopolista como respostas às expressões da  
questão social que surge a necessidade de profissionais especializados para atuar nelas, entre  
os quais, Assistentes Sociais. Desta forma, Iamamoto e Carvalho (2014) pontuam que o  
surgimento e desenvolvimento da profissão é mediatizado pelas políticas sociais estatais e  
serviços sociais ofertados pela classe dominante, nos quais Assistentes Sociais se inserem  
enquanto trabalhadores assalariados. Guerra (2004, p. 26-27), afirma que  
605  
a ontologia de Marx permite consubstanciar a compreensão da profissão como  
produto histórico e, como tal, auto-implicado no processo histórico. É história  
social, resultado da ação dos homens na produção e reprodução da sua vida  
material e espiritual, tendo no trabalho a forma primária de manifestação da  
vida, que funda o chão no qual a profissão irá se desenvolver.  
Para Netto (1996, p. 22) este chão é sedimentado a partir da fase monopolista do  
capitalismo em que “a preservação e o controle contínuos da força de trabalho, ocupada e  
excedente, é uma função estatal de primeira ordem”. Logo, as políticas sociais no capitalismo  
monopolista não nascem isentas de contradições, ao mesmo tempo em que são o resultado da  
luta da classe trabalhadora por melhores condições de vida e trabalho, também são uma  
estratégia do Estado e da burguesia para atuar no controle do proletariado, pois contribuem para  
a reprodução material e ideológica da força de trabalho (Iamamoto; Carvalho, 2014). Uma vez  
Ana Carolina do Nascimento Rodrigues  
que o Serviço Social se institucionaliza principalmente neste espaço, essa contradição também  
marca a profissão.  
A intervenção estatal sobre a “questão social” via políticas sociais ocorre de forma  
fragmentada e parcializada, pois esta é a única forma possível do Estado burguês oferecer  
respostas à “questão social” sem colocar em risco a ordem burguesa (Netto, 1996). Desvendar  
que as mazelas vivenciadas pela classe trabalhadora têm origem em um único fenômeno, a  
“questão social”, seria assumir a exploração do trabalho pelo capital. Ao dar respostas  
parcializadas, ocultando a gênese da “questão social", o Estado burguês atende a algumas  
reivindicações da classe trabalhadora na direção da produção de consenso. Além disso, garante  
que os trabalhadores ativos e o exército de reserva se mantenham vivos e operando em  
condições favoráveis à dinâmica capitalista.  
No que tange ao Serviço Social e sua relação com a “questão social”, Pereira (2001, p.  
58) sugere que apesar de ser este “o foco privilegiado de interesse científico e político” da  
profissão, o conceito não está suficientemente claro para a categoria. Tal constatação apresenta  
um problema fundamental para o Serviço Social brasileiro, a quem a autora faz a provocação  
de somar-se a outras profissões de conteúdo social para contribuir com a desnaturalização da  
“questão social”, que “pela sua natureza (como expressão) não possui poder explicativo”  
(Guerra; Batista, 2021, p. 185). Sem a explicitação da dinâmica - em que o proletariado seja  
protagonista na construção de um projeto societário que leve à supressão da “questão social” -  
que se esconde atrás dessa expressão, a utilização indiscriminada do termo serve apenas à  
conservação da ordem do capital.  
606  
Gonçalves (2018) traz um dado fundamental para a qualificação do debate sobre a  
“questão social” no Brasil pelo Serviço Social. Afirma a adesão da profissão, em seu  
surgimento, às políticas sociais eugenistas e higienistas do Estado brasileiro à época,  
movimento que demarca a vinculação às ideias da classe dominante. A autora aponta que a  
herança do período escravocrata, que esteve presente no início da profissão, se mantém na  
atualidade por meio da naturalização da miséria, segundo ela “Suspeita-se da índole dos(as)  
trabalhadores(as) negros(as) e não das desigualdades de classes” (Gonçalves, 2018, p. 520).  
Com isso, a autora explicita que a questão racial é nuclear para a compreensão da “questão  
social” no Brasil e que o Serviço Social brasileiro não pode se furtar dessa compreensão e da  
contribuição para o tensionamento da correlação de forças onde dominam os grandes sistemas  
de opressão: capitalismo e racismo.  
Guerra (2018) revela tendências a serem enfrentadas no ensino em Serviço Social para  
a formação de Assistentes Sociais verdadeiramente críticos, cientes de qual dinâmica a  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 595-610, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Fundamentos do Serviço Social: a “questão social” no centro do debate  
expressão “questão social” designa - enquanto base de fundação da profissão - e,  
principalmente, aptos a intervir na realidade com o objetivo de alterá-la. Uma das tendências  
apontadas pela autora é o teoricismo, que representa a inclinação de compreender que a  
apropriação do referencial teórico marxista (por si só) seria suficiente para formar Assistentes  
Sociais dotados de competência técnica para produzir respostas críticas e qualificadas frente às  
requisições institucionais. Segundo Guerra (2018, p. 31), “O teoricismo é parte de uma  
apropriação idealista do real” e segue apontando que sob esta lógica, os conceitos são abstraídos  
de sua constituição ontológica, não captando as mediações estruturais.  
Consideramos fundamental trazer uma associação entre a tendência ao teoricismo  
apontada por Guerra (2018) e a adesão formal de Assistentes Sociais à utilização do termo  
“expressões da questão social” para definir o objeto de intervenção da profissão. Neste caso,  
podemos supor com base em Pereira (2001), que a “questão social” se tornou um jargão  
profissional que vem sendo utilizado indiscriminadamente e desconstituído de suas  
determinações histórico-ontológicas. O caminho anunciado por Guerra (2018, p. 32) para fazer  
frente a este movimento está em “que os docentes demonstrem claramente os nexos internos,  
intrínsecos entre tais categorias ontológicas da sociedade burguesa e a existência da profissão”.  
Este caminho contribui ainda, segundo Guerra (2018), para qualificar as respostas profissionais  
para além dos “manuais” elaborados no âmbito das políticas sociais que, por possuírem a  
natureza conservadora que já sinalizamos, servem a objetivos estranhos aos do Projeto Ético-  
Político hegemônico na profissão.  
607  
Há ainda em Guerra (2018), reflexões sobre o tratamento da história na formação em  
Serviço Social, que pela própria lógica da periodização, pode ser abordada de uma forma  
etapista, em detrimento da concepção de história a partir do materialismo histórico-dialético.  
Por meio desta última:  
A história da sociedade é mobilizada pelas classes sociais. A luta de classes  
como motor da história põe e repõe a necessidade da profissão e os dilemas  
nos quais atua. Seguramente, não se explica a profissão nem muitas de suas  
características sem a problematização do projeto de modernização  
conservadora, de sua cultura política autoritária, corporativa e de suas  
instituições. A heteronomia e as práticas antidemocráticas são marcas de uma  
sociedade na qual se valoriza as práticas de favor, o clientelismo, os  
casuísmos, os fisiologismos. É preciso entender como essas práticas da nossa  
cultura atravessam e entretecem o Estado, caracterizado pelo seu  
patrimonialismo, e as instituições que o representam; como as políticas sociais  
são criadas na lógica da coerção e da busca do consenso identificando as  
requisições institucionais daí derivadas; como a profissão vem reagindo e  
resistindo a essas investidas na conformação do seu modo de ser e de  
responder à realidade (Guerra, 2018, p. 35).  
Ana Carolina do Nascimento Rodrigues  
Desta forma, a autora coloca que a concepção de história como processo de avanços e  
retrocessos torna possível compreender que o conservadorismo, que marca o surgimento da  
profissão, não é algo superado, mas que se reatualiza e se refuncionaliza sob novas roupagens  
(Guerra, 2018). Aqui podemos citar como exemplo: a visão higienista criticada por Gonçalves  
(2018), que ainda ressoa no cotidiano de Assistentes Sociais ao atuar junto à população negra,  
pobre e periférica; a adesão de parcela da categoria, sob a influência das políticas sociais (em  
especial a de Assistência Social), ao debate francês da “questão social”, que tem na integração  
e na coesão social a resposta para o fenômeno, culminando na incorporação ao discurso  
profissional dos conceitos de risco, vulnerabilidade social e fortalecimento de vínculos sem a  
devida problematização de qual campo teórico denotam e a qual projeto de sociedade  
fortalecem.  
Considerações Finais  
No decorrer deste trabalho nos propusemos a olhar para a “questão social”, sua natureza,  
determinações histórico-nacionais, disputas teóricas e sua relação com o Serviço Social  
mediatizada pelas políticas sociais. Essas são apenas algumas de suas facetas. Independente de  
compreender se a “questão social” trata-se do objeto de intervenção do Serviço Social, ou de  
seu fundamento, ou ainda do interesse teórico-científico da profissão, o que se apresenta como  
inequívoco é que este fenômeno e todo o processo que ele desencadeia numa fase específica do  
capitalismo criam a necessidade e, por isso, a condição para a existência do Serviço Social.  
Essa relação só é clarificada pelas lentes da teoria social marxista.  
608  
Concordamos com Guerra (2004, p. 27) ainda quanto a sua abordagem histórico-  
ontológica dos fundamentos do Serviço Social. Para a autora, os fundamentos versam sobre o  
que funda a profissão. Afirma que “a concepção dialética da história entendida como um  
processo de continuidades e rupturas tem uma substância, um núcleo, que permanece”. Logo,  
podemos depreender que a base de justificativa para o surgimento da profissão e seu  
desenvolvimento permanece a mesma ao longo dos anos – a “questão social” e todo o processo  
político que o fenômeno desencadeia no estágio monopolista do capitalismo, que exige  
respostas via políticas sociais estatais.  
Entretanto, é necessário captar as mediações particulares de como a “questão social” se  
desenvolveu na realidade brasileira, quais as características da nossa formação social lhe  
oferecem diferentes contornos, como o Estado a responde via políticas sociais e como  
Assistentes Sociais se inserem no bojo dessas respostas. Questões que obviamente se alteram  
com as transformações vivenciadas pelo capitalismo, nas ofensivas que produz para sua  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 595-610, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Fundamentos do Serviço Social: a “questão social” no centro do debate  
conservação. Concordamos com Guerra (2018, p. 29) que a formação em Serviço Social deve  
“fornecer os fundamentos para uma intervenção qualificada que expresse os fundamentos nos  
quais se subsidia e que seja capaz de produzir conhecimentos relevantes do ponto de vista  
social, dentro de um projeto de ruptura”. Neste sentido, o esforço produzido aqui se deu no  
sentido de reunir elementos para reflexão sobre a “questão social” como ponto fulcral para o  
Serviço Social, que esperamos contribuir para suscitar ainda mais o debate.  
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Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 595-610, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Trabalho Social – uma definição em disputa:  
breve revisão do debate de lutas e resistências  
Social Work – a disputed definition: conflicts and resistance in debate  
Débora Holanda Leite Menezes*  
Camila Andrade Moura Cardoso**  
Jullie Doria Freitas ***  
Resumo: Este artigo realiza uma crítica à  
definição mundial do Trabalho Social  
formulada pela FITS em 2000, destacando suas  
limitações teóricas, políticas e práticas no  
contexto da atuação profissional. Utiliza-se o  
materialismo histórico-dialético como método,  
com revisão bibliográfica e documental. Apartir  
de um resgate histórico e da análise das  
propostas do CFESS e do workshop brasileiro  
sobre o Serviço Social, discute-se a necessidade  
de incorporação de conhecimentos teóricos  
sólidos, a superação do conservadorismo e a  
valorização do caráter ético-político da  
profissão. O texto enfatiza que a prática  
profissional deve transcender o individualismo,  
promovendo a defesa intransigente dos direitos  
humanos e sociais, em consonância com as  
Abstract: This article presents a critique of the  
global definition of Social Work formulated by  
IFSW in 2000, highlighting its theoretical,  
political, and practical limitations within the  
context of professional practice. The study  
employs historical-dialectical materialism as its  
methodological  
approach,  
based  
on  
bibliographic and documentary review.  
Through a historical overview and analysis of  
the proposals by CFESS and the Brazilian  
workshop on Social Work, the article discusses  
the need to incorporate solid theoretical  
knowledge, overcome conservatism, and  
reinforce the ethical-political character of the  
profession. It emphasizes that professional  
practice must transcend individualism,  
promoting the unwavering defense of human  
and social rights in accordance with the cultural,  
political, and socioeconomic specificities of  
each country. Finally, it underscores the urgency  
of revising the current definition in order to  
strengthen the profession’s identity, overcome  
conservatism, and advance the political project  
of Social Work on the global stage.  
especificidades  
socioeconômicas de cada país. Por fim, ressalta-  
se urgência de revisar definição  
culturais,  
políticas  
e
a
a
continuamente para fortalecer a identidade, a  
superação do conservadorismo e o projeto  
político do Serviço Social no cenário mundial.  
Palavras-chaves: Trabalho Social; Serviço  
Keywords: Social Work; FITS.  
Social; FITS.  
* Universidade Federal do Rio de Janeiro. E-mail: debyholandaufrj@gmail.com  
** Universidade Federal do Rio de Janeiro. E-mail: camilaandradecardoso19@gmail.com  
*** Universidade Federal do Rio de Janeiro. E-mail: julliedoria@gmail.com  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.49667  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 31/07/2025  
Aprovado em: 02/12/2025  
Débora Holanda Leite Menezes; Camila Andrade Moura Cardoso; Jullie Doria Freitas  
Introdução  
O Serviço Social é uma profissão que atua diretamente na interface das complexas  
relações sociais, políticas, econômicas e culturais que estruturam as sociedades  
contemporâneas. No Brasil, a sua prática profissional não se restringe a intervenções pontuais,  
mas se insere em um projeto ético-político que visa a transformação das condições sociais e a  
promoção da justiça social, da dignidade humana e dos direitos universais.  
Em vista disso, a pesquisa adota o materialismo histórico-dialético como fundamento  
teórico-metodológico, pois essa proposta nos permite compreender a realidade social como um  
processo histórico em constante metamorfose, marcado por contradições e mediações. Essa  
perspectiva possibilita uma análise crítica e totalizante do objeto de estudo, superando visões  
fragmentadas e imediatistas. Metodologicamente, recorre-se à revisão bibliográfica e  
documental, com o objetivo de identificar, analisar e comparar as produções teóricas e registros  
de instituições como o Conselho Regional de Serviço Social (CFESS) e a Federação  
Internacional dos Trabalhadores Sociais (FITS), de forma a contribuir para a compreensão do  
fenômeno investigado em sua historicidade e inserção nas relações sociais mais amplas.  
No cenário internacional, a definição e conceituação do Trabalho Social têm sido objeto  
de múltiplos debates, revelando a diversidade e a pluralidade das práticas profissionais, assim  
como as dificuldades para se estabelecer uma definição que abarque as especificidades locais e  
regionais de maneira adequada. Esse contexto evidencia a importância de refletir criticamente  
sobre os fundamentos teóricos e políticos que sustentam as definições oficiais, especialmente  
aquelas produzidas por organismos internacionais como a Federação Internacional de  
Trabalhadores Sociais (FITS).  
612  
Destarte, este artigo parte do pressuposto de que a definição do Serviço Social ou  
Trabalho Social dos anos 2000, proposta pela FITS, incorpora orientações conservadoras que  
limitam a compreensão crítica da profissão. A análise aqui apresentada se fundamenta na  
interpretação histórica de José Paulo Netto (1999) e Marilda Villela Iamamoto (1999), que  
destacam a construção do Serviço Social como prática social situada em contextos históricos e  
políticos específicos, marcada por disputas ideológicas e pela busca de legitimação profissional.  
Ao adotar essa perspectiva, torna-se possível compreender a necessidade de problematizar  
conceitos que, ainda que formalmente reconhecidos, reproduzem ecletismos teórico-políticos e  
fragilizam o compromisso emancipatório da profissão.  
A definição mundial de Trabalho Social, elaborada pela FITS em 2000, foi amplamente  
discutida e contestada por diversas correntes profissionais, em especial pelos países da América  
Latina. Essa definição, apesar de representar uma tentativa de unificação conceitual,  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 611-632, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Trabalho Social uma definição em disputa: breve revisão do debate de lutas e resistências  
apresentava limitações significativas, sobretudo no que diz respeito à sua dimensão teórica, à  
compreensão da prática profissional e à perspectiva ética que orienta a profissão nos países  
latino-americanos. Muitos apontam que essa formulação da FITS incorreu em equívocos ao  
enfatizar uma abordagem holística que se traduz em práticas predominantemente  
individualistas e psicossociais, e ao mesclar aspectos conservadores com tentativas ecléticas de  
superação, resultando em uma definição ambígua e, por vezes, contraditória. Além disso, a  
manutenção dessa definição sem revisões adequadas contribui para a perpetuação de  
concepções distorcidas e dificulta o fortalecimento do Serviço Social enquanto campo de  
conhecimento crítico e interventivo.  
Diante dessas controvérsias, o Brasil, por meio do Conselho Federal de Serviço Social  
(CFESS) e de workshops específicos, esteve desenvolvendo propostas alternativas que  
reafirmaram o compromisso ético-político da profissão, valorizando a análise crítica do  
processo histórico, o enfoque na totalidade das relações sociais e a transformação estrutural das  
desigualdades e injustiças. Essas proposições destacam a importância de um domínio teórico-  
metodológico consistente, da defesa intransigente dos direitos humanos e sociais, e da atuação  
articulada com as políticas públicas e movimentos sociais. Assim, a reflexão acerca da definição  
mundial do Trabalho Social e a busca por sua redefinição se apresentam como um passo  
fundamental para a consolidação de um projeto profissional que dialogue com as realidades  
específicas de cada país, respeitando suas particularidades e promovendo a emancipação social  
a partir de uma práxis social crítica e comprometida.  
613  
A definição de Serviço Social no Brasil: das protoformas à emergência e  
consolidação da profissão  
A definição de Serviço Social no Brasil não surgiu de forma linear ou pacífica,  
tampouco descolada de disputas ideológicas e políticas de um determinado período histórico.  
Pelo contrário, trata-se de uma construção histórica profundamente marcada por contradições,  
influências conservadoras e processos de ruptura e resistência. Das protoformas1 da caridade e  
filantropia, de sua emergência até a consolidação do seu projeto ético-político crítico, o Serviço  
Social brasileiro trilhou um caminho que ainda hoje carrega marcas dessa disputa por identidade  
e legitimidade profissional.  
1
Para Netto (2009), as protoformas do Serviço Social são intervenções sociais anteriores ao surgimento da  
profissão, comumente de caráter assistencialista, com viés caritativo e na perspectiva da ajuda e da filantropia. De  
todo modo, não será a continuidade evolutiva dessas práticas que explicaria o surgimento da profissão de Serviço  
Social, mas sim a ruptura com essas práticas em um contexto da necessidade de criação de um profissional para  
gerar respostas às expressões da questão social. Nesse contexto, surge o profissional assistente social no interior  
da lógica da divisão social e técnica do trabalho no contexto do capitalismo monopolista.  
Débora Holanda Leite Menezes; Camila Andrade Moura Cardoso; Jullie Doria Freitas  
Historicamente, o Serviço Social surge no Brasil na década de 1930, no processo de  
constituição e consolidação do Estado burguês e da ordem social condicionada ao capitalismo  
monopolista. Nesse início, a profissão será vinculada ao processo de restauração do catolicismo  
no Brasil, com as primeiras escolas de Serviço Social criadas sob a orientação da ação católica.  
Além da influência do catolicismo social europeu, que desde a encíclica Rerum Novarum de  
1891, buscava promover uma intervenção moral e religiosa diante da Questão Social. Como  
destaca Ana Maria Ramos Estevão (1999), o imaginário popular consolidou a figura do  
assistente social como “aquela moça boazinha que o governo paga para ter dó dos pobres”. Essa  
concepção reforçava um papel assistencialista, tutelar e moralizante, baseado na ajuda  
individualizada aos “necessitados”, descolada da análise crítica das estruturas que produzem a  
pobreza.  
Esse perfil advém de um período que antecede a consolidação do Serviço Social  
enquanto profissão voltada às intervenções sociais. Nessa fase embrionária ou pré-profissional,  
as práticas sociais assumiam um caráter essencialmente caritativo e assistencialista, orientadas  
por uma lógica moral e religiosa de ajuda ao “próximo”. Apesar de todo o processo histórico  
de ruptura, crítica e superação dessas bases, sobretudo com a contribuição do movimento de  
reconceituação a partir do final da década de 1960, e a consolidação do Serviço Social como  
uma profissão de caráter interventivo, crítico e eticamente comprometido, tal representação  
inicial permanece, até os dias atuais, como uma retórica recorrente e amplamente reproduzida  
no senso comum.  
614  
Iamamoto (1982) também aponta que o Serviço Social, nesse período inicial,  
desempenhava um papel funcional à manutenção da ordem social capitalista, agindo como  
mediador entre o Estado e os segmentos sociais em situação de vulnerabilidade, sem, no  
entanto, questionar as causas estruturais da desigualdade. A atuação profissional era guiada por  
valores religiosos e por uma concepção moral da pobreza, e o foco recaía sobre o  
comportamento dos indivíduos, reforçando o caráter psicologizante e normativo da intervenção  
social.  
Nas décadas de 1940 a 1960, o processo de institucionalização do Serviço Social  
avança, com a criação de escolas de formação e a incorporação da profissão ao aparelho estatal.  
Esse vínculo institucional permitiu certo reconhecimento jurídico e funcional, mas também  
reforçou a dimensão conservadora do exercício profissional, atrelado à lógica da adaptação dos  
sujeitos à ordem vigente, principalmente através de ações de cunho moral e disciplinador.  
Nesse período, segundo Iamamoto (2004), a profissão consolidou seu papel na gestão  
da “questão social”, compreendida ainda de forma fragmentada, atuando nas políticas públicas  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 611-632, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Trabalho Social uma definição em disputa: breve revisão do debate de lutas e resistências  
com enfoque na resolução imediata dos “problemas” sociais, sem romper com o modelo liberal  
de compreensão da sociedade.  
A partir do final da década de 1970 e, principalmente, na década de 1980, com a crise  
do regime militar e o processo de redemocratização, emergem movimentos dentro da categoria  
profissional que propõem uma ruptura com o conservadorismo e uma reorientação do Serviço  
Social com base em fundamentos marxistas. Nesse contexto, ganha força o chamado projeto  
ético-político profissional, que passa a articular o Serviço Social com os interesses das classes  
trabalhadoras.  
José Paulo Netto (2022) foi um dos principais intelectuais que contribuíram para a  
consolidação desse projeto. Para ele, o Serviço Social deve se entender como uma profissão  
que atua nas expressões da questão social, ou seja, nas contradições sociais resultantes da  
dinâmica capitalista de produção e reprodução da vida. O assistente social, portanto, não busca  
“resolver problemas”, mas sim contribuir com processos de organização popular, defesa de  
direitos e transformação das condições sociais que produzem a desigualdade.  
Essa concepção é incorporada de forma paradigmática no Código de Ética Profissional  
do Assistente Social (1993), que rompe com a lógica tutelar e afirma princípios como: “a defesa  
intransigente dos direitos humanos”, “a ampliação da cidadania” e “o posicionamento a favor  
da equidade e justiça social” (CFESS, 2011). Em termos legais, a Lei n.º 8.662/1993, que  
regulamenta a profissão, também reforça o papel do assistente social como profissional  
comprometido com a construção de políticas públicas, formulação de estratégias de  
enfrentamento da desigualdade social e mediação das demandas da população usuária junto ao  
Estado.  
615  
Mesmo após a regulamentação legal e ética da profissão, a definição de Serviço Social  
no Brasil permanece em disputa. Isso se deve ao fato de que a prática profissional se realiza em  
um contexto contraditório: enquanto o projeto ético-político aponta para a emancipação humana  
e para a construção de uma nova ordem societária, a realidade concreta impõe limites, como o  
desmonte das políticas públicas, a precarização do trabalho e a crescente demanda por respostas  
imediatas às necessidades sociais.  
Iamamoto (2008) alerta que o Serviço Social se realiza como especialização do trabalho  
no interior da divisão social do trabalho no capitalismo, e, portanto, está sujeito às suas  
determinações históricas. No entanto, isso não significa uma adesão acrítica às suas funções,  
mas a possibilidade de tensioná-las, redefini-las e resistir às tendências conservadoras, inclusive  
aquelas que reaparecem travestidas de “novas práticas”, como a psicologização da intervenção  
social.  
Débora Holanda Leite Menezes; Camila Andrade Moura Cardoso; Jullie Doria Freitas  
Assim, o Serviço Social brasileiro carrega uma trajetória marcada por rupturas e  
permanências. A disputa pela definição da profissão reflete, na verdade, a disputa por projetos  
de sociedade. E é justamente esse aspecto que entra em choque com definições simplificadoras,  
como a proposta elaborada pela Federação Internacional de Trabalhadores Sociais (FITS), que  
será analisada no tópico seguinte.  
Uma pauta baseada na FITS: definição mundial de Trabalho Social e suas  
repercussões  
É ponto pacífico para a corrente crítica, atualmente hegemônica no Serviço Social  
brasileiro, que existe um problema teórico, político e ético com a definição de Trabalho Social2  
estabelecida pela FITS nos anos 2000. Há cerca de 25 anos, foi formulada em assembleia  
realizada em Montreal, no Canadá, uma definição que perdurou por mais de uma década, até a  
sua modificação ocorrida no ano de 2014. Evidencia-se que essa definição foi pouco debatida  
democraticamente e não contemplava o projeto ético-político do Serviço Social brasileiro,  
assim como deixava às margens a compreensão de Trabalho Social estabelecida por outros  
países da América Latina.  
O conservadorismo arraigado na definição deliberada por esta assembleia fortalecia  
uma regressão na compreensão mundial do que realmente é o Serviço Social. Há 11 anos, o  
Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) já apontava os perigos e as inconsistências  
encontradas na atual definição em seu artigo na revista “Serviço Social e Sociedade” na edição  
de número 108, publicado em 2011, denominado como “A definição de Trabalho Social da  
FITS: Por que revisar?”.  
616  
O documento apontava as dificuldades de se condensar uma definição que contemplasse  
os amplos aspectos e as contradições vivenciadas pelo Serviço Social ao longo do mundo. O  
CFESS neste artigo defendeu a impossibilidade e o fato de não ser necessária uma definição  
mundial, com riscos de se cair em uma produção simplista, extremamente genérica e na pior  
das hipóteses eclética, ideo-política e teoricamente. Defendeu-se a exclusão da atual definição,  
contudo compreendendo que era uma luta “vencida”, propôs-se a sua alteração, em conjunto  
com outras instâncias do Serviço Social, como a Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa  
2
Cabe destacar que este artigo não tem como objetivo central aprofundar as distinções conceituais entre as  
expressões “trabalho social” e “Serviço Social”. Embora reconheçamos que tais termos possam assumir  
significados diversos em determinados contextos teóricos e nacionais, optamos, neste estudo, por utilizar a  
expressão “trabalho social” como equivalente a “Serviço Social”. Essa escolha se justifica pela predominância  
dessa terminologia nos documentos e debates da Federação Internacional de Trabalhadores Sociais (FITS), bem  
como por sua ampla adoção nos países latino-americanos, onde a profissão é, em grande medida, reconhecida e  
representada por essa designação. Nossa ênfase, portanto, recai sobre as aproximações e convergências, e não  
sobre as divergências terminológicas.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 611-632, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Trabalho Social uma definição em disputa: breve revisão do debate de lutas e resistências  
em Serviço Social (ABEPSS), para a assembleia da FITS que aconteceria em Estocolmo na  
Suécia, entre 08 a 12 de julho de 2012.  
No entanto, apesar do empenho e movimentação efetivados pelas instâncias mais  
significativas do Serviço Social brasileiro, a definição só sofreu alterações após 14 anos, e ainda  
assim, foram encontradas escassas produções disponíveis a respeito da assembleia realizada em  
Estocolmo e a respeito de como se desdobrou a questão referente à definição mundial de  
Trabalho Social. O único documento encontrado foi um relatório anual de gestão de 2011 a  
2014 elaborado pelo CFESS, em que no tópico 5.2.3 desdobra-se a respeito da participação na  
FITS, informando que a nova definição de Serviço Social foi aprovada em Melbourne na  
Austrália no dia 06 de julho de 2014 durante a Assembléia Geral da FITS. Essa nova definição  
encontra-se disponível no site da FITS3 com suas respectivas traduções.  
[...] O investimento realizado pelo Conjunto CFESS/CRESS nesse tema e a  
realização do Workshop em 2012 no Rio de Janeiro, permitiu que as  
organizações latino-americanas e caribenhas pudessem propor e aprovar uma  
definição de Serviço Social de consenso entre organizações da região. O texto  
aprovado em 2012 integra o estatuto do COLACATS, aprovado em 2013 e  
composto por 12 países. O maior saldo do processo de disputa em torno da  
definição de Serviço Social desde 2000 foi que, ao provocar o debate  
internacional, fortalecemos o debate regional. A nova definição aprovada pela  
FITS permite que cada região construa sua interpretação, legitimando o  
processo construído na América Latina e Caribe [...] (CFESS, 2015, p. 81).  
617  
Diante da resistência apresentada pela FITS pelo período de 14 anos, mesmo que  
subliminarmente, através da omissão e negligência diante das solicitações de redefinição feitas  
por diferentes países que compõem a América Latina. Diversas recomendações foram feitas  
com o intuito de remediar a questão e buscar alternativas democráticas de construção teórica  
sobre o que seria o Trabalho Social ou Serviço Social por todo o globo. Uma dessas propostas  
pautava-se na construção do workshop de 2012 e teria a contribuição de profissionais de Serviço  
Social e das diferentes organizações de Serviço Social atuantes em países da América Latina,  
em que participaram o Brasil, Uruguai, Argentina, Paraguai, Chile, República Dominicana e  
Porto Rico. Também participaram instituições como a Associação Latino-americana de  
Investigação e Ensino em Trabalho Social (ALAIETS) e a ABEPSS. O workshop culminou em  
diretrizes de atualização da definição, que na realidade configurava uma transformação radical  
das balizas perpetradas na definição anterior.  
Para que seja possível a compreensão das diferenças e mudanças substanciais  
promovidas por essa proposta, torna-se necessário o retorno ao ponto de partida, analisando de  
onde viemos e para onde essas instâncias buscavam e buscam caminhar. Dessa forma, propõe-  
3 http://ifsw.org/get-involved/global-definition-of-social-work/  
Débora Holanda Leite Menezes; Camila Andrade Moura Cardoso; Jullie Doria Freitas  
se um comparativo entre a definição orquestrada na assembleia de Montreal e a proposta feita  
pelos países da América Latina no workshop. A FITS, em 2000, definiu o Serviço Social como  
uma profissão na qual o profissional assistente social busca a mudança social e a resolução de  
problemas, trabalhando com teorias do comportamento humano e o empenho dos sujeitos na  
melhoria de seu “bem-estar”, focalizando a sua atuação nas relações entre as pessoas, norteados  
pelos princípios dos direitos humanos e da justiça social (FITS, 2000).  
Definição: O exercício da profissão de assistente social ou trabalhador social  
promove a mudança social, a resolução de problemas no contexto das relações  
humanas e a capacidade e empenhamento das pessoas na melhoria do "bem –  
estar". Aplicando teorias de comportamento humano e dos sistemas sociais, o  
trabalho social focaliza a sua intervenção no relacionamento das pessoas com  
o meio que as rodeia. Os princípios de direitos humanos e justiça social são  
elementos fundamentais para o trabalho social (FITS, 2000, p. 01).  
É possível identificar diferenças conceituais densas somente neste pequeno trecho que  
condensa a definição, conforme a compreensão do que é Serviço Social para o conjunto  
CFESS/CRESS, para a ABEPSS e consoante aos intelectuais consagrados do Serviço Social  
brasileiro, entre eles Marilda Villela Iamamoto e José Paulo Netto.  
O primeiro ponto a ser destacado é que o Serviço Social não busca a mudança social,  
contudo, os profissionais assistentes sociais atuam na perspectiva da defesa da construção de  
uma nova ordem social livre de desigualdades de raça/etnia, gênero e classe social. Apesar de  
não estar nítido, existem diferenças conceituais significativas, a mudança possui um viés  
superficial, no entanto, uma nova ordem implica em uma alteração profunda da dinâmica  
societária, conforme definido por José Paulo Netto (1999) ao abordar sobre o projeto ético-  
político brasileiro: “conseqüentemente, este projeto profissional se vincula a um projeto  
societário que propõe a construção de uma nova ordem social, sem exploração/dominação de  
classe, etnia e gênero” (p. 15).  
618  
Ressalta-se que a transformação social seria o termo mais próximo para se comparar à  
categoria utilizada pela FITS. Porém, quando nos referimos a uma nova sociedade, é sob o  
vislumbre da possibilidade de construção de uma sociedade que permita a plena expansão e  
emancipação dos indivíduos sociais e, para tal, será necessária a subsunção da sociedade de  
classes. Todavia, o termo transformação social já foi utilizado como forma de individualização  
das expressões da Questão Social, sendo apropriado pela fenomenologia. “Esta tendência que  
no Serviço Social brasileiro vai priorizar as concepções de pessoa, diálogo e transformação  
social (dos sujeitos) é analisada por Netto (1994, p. 201) como uma forma de reatualização do  
conservadorismo” (Netto apud Yazbek, 2009, p. 08).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 611-632, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Trabalho Social uma definição em disputa: breve revisão do debate de lutas e resistências  
O próprio Netto debate e ironiza a aplicação do termo transformação social em seu livro  
“Ditadura e Serviço Social” de 1994, “O “marco referencial teórico” da “nova proposta” é uma  
tríade conceitual: diálogo, pessoa e transformação social, cuja articulação e implementação  
constituem propriamente a metodologia profissional, posto o Serviço Social no escaninho da  
ajuda psicossocial” (p. 228).  
E para dirimir quaisquer dúvidas acerca do que entende por transformação  
social , que “um grande número de autores” concebe em termos “da mudança  
em nível socioeconômico”, Almeida esclarece que lhe parecem “de maior  
importância aquelas definições que enfocam a dimensão da mudança no  
crescimento e no desenvolvimento da pessoa. Nesta perspectiva, a  
transformação social se traduz em modificações qualitativas de seus  
elementos, expressas no movimento ‘do ser ao ser mais’” (Netto, 1994, p.  
228).  
Portanto, neste quesito, devido à sua apropriação equivocada pelo viés altamente  
conservador no passado, o termo transformação social sucumbe ao mesmo empobrecimento  
teórico que a categoria mudança e se iguala ao seu sentido, já que na própria definição da FITS  
fala-se de “empenhamento das pessoas” e “teorias do comportamento humano”. Essas  
categorias estão alinhadas à psicologização das expressões da Questão Social, vertente  
conservadora que não assume mais o papel privilegiado em nosso projeto ético-político  
hegemônico, ou no nosso Código de Ética Profissional de 1993 e nem mesmo nas diretrizes  
curriculares propostas pela ABEPSS. A resolução do CFESS n° 569, de 25 de março de 2010,  
inclusive, veda a realização de terapias associadas ao exercício profissional do Assistente  
Social.  
619  
Art. 1º. A realização de terapias não constitui atribuição e competência do  
assistente social.  
Art. 2º. Para fins dessa Resolução consideram-se como terapias individuais,  
grupais e/ou comunitárias:  
a. Intervenção profissional que visa a tratar problemas somáticos, psíquicos  
ou psicossomáticos, suas causas e seus sintomas;  
b. Atividades profissionais e/ou clínicas com fins medicinais, curativos,  
psicológicos e/ou psicanalíticos que atuem sobre a psique (CFESS, 2010, p.  
02).  
Sendo assim, associar o bem-estar e a mudança social ao empenhamento das pessoas  
individualiza as expressões da Questão Social e mascara as desigualdades sociais. Ademais,  
atrelar as teorias do comportamento humano a esse véu ultraconservador e focalizar a  
intervenção no relacionamento das pessoas recai em uma atuação psicologizante que remonta  
ao passado conservador da profissão, significando o apoderamento e a incorporação de  
categorias e conceitos da psicologia que retiram o caráter político da intervenção social e  
desviam o “olhar da análise das causas estruturais da questão social” (Iamamoto, 1982, p. 111).  
Débora Holanda Leite Menezes; Camila Andrade Moura Cardoso; Jullie Doria Freitas  
Quanto à concepção de resolução de problemas no contexto das relações humanas,  
compreende-se que o Serviço Social não soluciona problemas, mas busca fornecer respostas às  
expressões da Questão Social. “O Serviço Social é parte constitutiva das relações sociais,  
participando do processo de reprodução das relações sociais capitalistas e das formas de  
enfrentamento da questão social” (Iamamoto, 2008, p. 48).  
O Serviço Social tem na questão social a base de sua fundação como  
especialização do trabalho. Questão social apreendida como o conjunto das  
expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que tem uma  
raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se  
mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se  
privada, monopolizada por uma parte da sociedade (Iamamoto, 2004, p. 27).  
Desse modo, enquanto problema aparenta ser uma situação pontual, individual e  
desarticulada de uma conjuntura social, política e econômica específica, a Questão Social  
trabalha na perspectiva da contradição capital versus trabalho e na dinâmica das classes sociais  
que produzem desigualdades sociais. O problema é uma concepção fragmentada que não está  
vinculada à dimensão da totalidade sócio-histórica e por isso permeia o campo do imediatismo  
sem alcançar a essência dialética dos fenômenos que se apresentam.  
Ao realizar um comparativo com as definições propostas tanto pelo CFESS em 2011,  
quanto pelo workshop de 2012 realizado pelos países da América Latina, notam-se diferenças  
cruciais na forma de compreender o exercício profissional do assistente social ou trabalhador  
social. Importante ressaltar que ambas as definições precisavam ser mediadas visando que  
fossem aceitas, já que os grupos de trabalho previam que definições propondo mudanças  
radicais não seriam aceitas pelas vertentes mais conservadoras da FITS. Sendo assim, podem-  
se notar processos de ruptura, de refinamento teórico e de atenuação de determinados termos.  
A concepção proposta pelo CFESS (2011) altera alguns termos da atual definição  
mundial de Trabalho Social, como “focaliza a sua intervenção no relacionamento entre as  
pessoas” (FITS, 2000) para “atua no âmbito das relações entre os sujeitos sociais e, entre eles,  
o estado”, ou, por exemplo, o “empenhamento das pessoas na melhoria do bem-estar” para  
“fortalecer a autonomia, a participação e o exercício da cidadania”. A definição proposta refere  
que:  
620  
Definição: O/a Trabalhador Social ou Assistente Social atua no âmbito das  
relações entre os sujeitos sociais e, entre eles, o Estado. Desenvolve um  
conjunto de ações de caráter socioeducativo que incidem na reprodução  
material e social da vida, com indivíduos, grupos, famílias, comunidades e  
movimentos sociais numa perspectiva de transformação social. Essas ações  
visam: fortalecer a autonomia, a participação e o exercício da cidadania;  
capacitar, mobilizar e organizar os sujeitos, individual e coletivamente,  
garantindo o acesso a bens e serviços sociais; a defesa dos direitos humanos;  
a salvaguarda das condições socioambientais de existência; e a efetivação dos  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 611-632, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Trabalho Social uma definição em disputa: breve revisão do debate de lutas e resistências  
ideais da democracia e o respeito à diversidade humana. Os princípios de  
defesa dos direitos humanos e da justiça social são elementos fundamentais  
para o Trabalho Social, para que esse trabalho se realize com vistas a combater  
a desigualdade social e as situações de violência, de opressão, de pobreza, de  
fome e de desemprego (CFESS, 2011, p. 746).  
Pode-se notar a alteração da categoria mudança social para transformação social, que  
apesar das críticas apresentadas, neste contexto trata-se de um avanço conceitual, pois o autor  
contextualiza a sua definição de transformação social, que no caso está atrelada a ações que  
incidam sobre a reprodução material e social da vida, garantindo o acesso a bens e serviços  
sociais desvinculando das mudanças individuais. Ainda assim, pode-se dizer que essa vertente  
não possui um caráter vinculado à concepção de uma nova ordem societária, como proposto  
por José Paulo Netto no texto supracitado de 1999, mas possui um caráter de alteração ou  
transformação no sentido literal da palavra.  
Para além disso, na atualidade, não nos referimos mais ao assistente social como  
garantidor de direitos, mas como um profissional que busca a viabilização dos direitos sociais.  
Isto se dá justamente porque na sociedade do capital, com o processo de retração dos direitos  
sociais, os recursos estão cada vez mais escassos para operar as políticas, benefícios e serviços  
públicos, tornando uma exceção o acesso a direitos e garantias sociais e não a regra (Iamamoto,  
2004). Bem como, no que diz respeito à definição promovida pelo workshop, compreende-se  
que caminhou pela mesma base de orientação, sendo identificadas somente mudanças pontuais  
entre esta última e a proposta “brasileira”.  
621  
Definição: O Serviço Social/Trabalho Social é uma profissão que se insere no  
âmbito das relações entre sujeitos sociais e entre estes e o Estado nos diversos  
contextos sócio-históricos de atuação profissional. Desenvolve uma práxis  
social e um conjunto de ações de natureza socioeducativa, que incidem na  
reprodução material e social da vida, em uma perspectiva de transformação  
social comprometida com a democracia e com o enfrentamento das  
desigualdades sociais, fortalecendo a autonomia, a participação e o exercício  
da cidadania, na defesa e na conquista dos direitos humanos e da justiça social  
(CFESS, 2012, p. 01).  
Como únicos pontos de convergência, as três possuem em comum os ideais de direitos  
humanos e justiça social, identificados como fundamentos do trabalho social. Embora seja  
contraditório e eclético em certa medida, se comparado a outros elementos trazidos pela  
definição da FITS, entende-se como um avanço, que de fato deveria ser um norte para o Serviço  
Social ao redor do mundo.  
O Código de Ética do Assistente Social brasileiro também elenca como princípios do  
exercício profissional fundamentais a “II. Defesa intransigente dos direitos humanos e recusa  
do arbítrio e do autoritarismo” e “V. Posicionamento a favor da equidade e justiça social, que  
Débora Holanda Leite Menezes; Camila Andrade Moura Cardoso; Jullie Doria Freitas  
assegure universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos programas e políticas  
sociais, bem como sua gestão democrática” (1993, p. 23). O código de ética brasileiro traz mais  
informações que auxiliam na interpretação do que seria o significado de direitos humanos e  
justiça social, ao invés de deixar às custas da imaginação, como faz a definição proposta pela  
FITS.  
Veja bem, seria totalmente acessível à compreensão dessas categorias analíticas, caso a  
definição dessa federação não contemplasse elementos tão dissonantes. Do modo como está  
estabelecida, torna-se uma empreitada deveras difícil de engendrar sem cair em equívocos  
teóricos conceituais.  
Posto esse motivo, observa-se o comentário relacionado à definição que compõe o  
documento. Identificam-se termos como “ajudar”, “enriquecer”, “prevenir disfunções” e a  
afirmação na qual o assistente social é um agente de mudança na vida dos sujeitos, apelando  
para o messianismo, apagando a luta de classes, e retirando a autonomia, mesmo que relativa,  
dos sujeitos no processo de construção e alteração da sua própria realidade.  
Comentário: O Trabalho Social, nas suas diversas vertentes, abrange as  
múltiplas e complexas interrelações que se estabelecem entre as pessoas e o  
meio que as envolve. A sua missão é ajudar as pessoas a desenvolverem todas  
as suas potencialidades, a enriquecerem as suas vidas e a prevenir as  
disfunções. Desta forma, os profissionais do trabalho social são agentes de  
mudança na sociedade e também na vida dos indivíduos, família e  
comunidades a quem o seu trabalho se dirige. Ao trabalho social está  
subjacente um conjunto articulado de valores, de teorias e de práticas (FITS,  
2000, p. 01).  
622  
Novamente, avalia-se a dissonância entre o que está posto e o projeto ético-político  
brasileiro, bem como em relação ao conjunto de competências e atribuições da categoria,  
estabelecidos pela lei n° 8.662/1993, que regulamenta a profissão. Não se trata de compreender  
o Serviço Social brasileiro como um projeto de caráter “colonizador”, que pretende impor suas  
regras e os princípios profissionais em escala global. Contudo, é fundamental realizar esse  
comparativo para identificar em que aspectos o nosso projeto profissional avança, retrocede e  
de que modo pode contribuir para a construção coletiva de uma prática e objetivos profissionais  
que não sejam tão divergentes entre si. Tal análise permite vislumbrar uma possível unidade  
vinculada a princípios universais orientados pela promoção da igualdade, dignidade humana e  
da justiça social, princípios altamente mencionados na definição de 2000, mas que, em certa  
medida, entram em contradição com as bases teóricas e fundacionais dessa mesma definição.  
Ao analisar o tópico dos comentários, avalia-se que ele dá voz à reiterada afirmação de  
que a “assistente social é aquela moça boazinha que o governo paga para ter dó dos pobres”,  
conforme muito bem elucidado por Ana Maria Ramos Estevão, em seu livro “O que é Serviço  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 611-632, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Trabalho Social uma definição em disputa: breve revisão do debate de lutas e resistências  
Social” de 1992. Esse é um perfil delineado a partir de um período anterior à emergência do  
Serviço Social como profissão institucionalizada, quando suas protoformas ainda se  
encontravam intrinsecamente vinculadas aos ideais perpetrados pela igreja católica e que ainda  
atuava no âmbito da caridade e do assistencialismo. Apesar de toda a trajetória de superação  
dessas premissas, essa continua sendo uma retórica constante e reiterada no senso comum.  
Como contraponto a essa proposta, tem-se o comentário elaborado pelo CFESS para a  
20° conferência Mundial de Serviço Social em Hong Kong de 10 de junho de 2010.  
Comentário: a formação do(a) assistente social está fundamentada em  
princípios que respeitam as diferenças e fortalecem as potencialidades dos  
sujeitos com os quais trabalha, sem discriminação de qualquer natureza. Para  
tanto o(a) profissional deve ter postura ética, competência teórica e habilitação  
técnica para desenvolver suas competências e atribuições articuladas a um  
conjunto de valores, teorias e práticas de defesa dos direitos humanos (CFESS,  
2011, p. 743).  
E do mesmo modo, o comentário elaborado pelo workshop supramencionado:  
Comentário: A construção de uma definição mundial de Serviço Social adota  
o princípio da unidade na diversidade. Reconhece que a existência do Serviço  
Social no mundo está relacionada às manifestações da desigualdade social  
inerentes às sociedades contemporâneas e aos meios do seu enfrentamento,  
que apontam para: a) democracia e direitos humanos; b) constituição de uma  
esfera pública (regulações sociais e políticas); c) sistemas de solidariedade  
internacional, proteção e segurança social; d) movimentos e lutas sociais.  
Estes meios demandam ações profissionais particulares, de acordo com as  
características socioeconômicas, políticas e culturais de cada país/região  
(CFESS, 2012, p. 01).  
623  
É notória a diferença entre as propostas, inclusive o comentário extraído do workshop  
avança perante o comentário produzido pelo próprio CFESS, no que se refere à análise de  
macroestrutura, com vistas a contemplar as diferentes perspectivas de trabalho social ao longo  
do mundo, enquanto o CFESS, de maneira coerente, busca se ater na reparação dos danos  
ocasionados pela definição mundial quanto às competências do assistente social. Posto isso,  
“ajudar” torna-se a busca por meios de enfrentamento das desigualdades sociais, o  
“enriquecimento” se transforma em sistemas de solidariedade internacional, com vistas à  
proteção e segurança social, e “prevenir disfunções” agora é transmutada para o respeito às  
diferenças.  
Constatam-se palavras, categorias e terminologias que escondem o seu real caráter  
mistificador das relações sociais de classe, gênero e raça, que, quando alteradas e confrontadas,  
aparentam ser antônimas, possuindo um significado político e social completamente diverso da  
proposta inicial.  
Débora Holanda Leite Menezes; Camila Andrade Moura Cardoso; Jullie Doria Freitas  
Na parte que incidem os valores profissionais, a proposta não é muito diferente, a não  
ser no que tange ao aprofundamento dos ideais conservadores. Havendo uma contradição  
inerente aos princípios elencados, pois como é possível a busca pelo respeito, dignidade e  
igualdade estarem atreladas ao objetivo de mitigar a pobreza para os desfavorecidos e  
vulneráveis? Os princípios da igualdade e dignidade não expressam a redução das  
desigualdades sociais, e sim a sua extinção.  
Outro ponto-chave de análise reside no entendimento de que diversos termos utilizados  
há décadas atrás, nos dias de hoje, estão sendo substituídos e sumindo de nossos vocabulários  
profissionais, já que possuem um caráter conservador que perpetua a naturalização das  
desigualdades sociais. Diante do cenário de movimento histórico e dialético constante,  
compreende-se que não é possível estabelecer uma definição que não sofra mudanças e não seja  
reformulada ao longo do tempo. Uma definição estática seria a-histórica e, por esse motivo,  
totalmente incoerente. Desse modo, defende-se neste artigo uma redefinição contínua, visando  
dar conta das transformações ocorridas no seio das sociedades.  
Valores O trabalho social desenvolve-se a partir dos ideias de humanismo e  
democracia e os seus valores radicam no respeito pela Igualdade, valor e  
dignidade de todos. Desde o seu inicio, há um século atrás, o trabalho social  
centrou a sua acção na resposta às necessidades das pessoas, bem como o  
desenvolvimento das capacidades do ser humano. Os direitos humanos e a  
justiça social motivam e legitimam a sua ação. Solidariamente com os mais  
desfavorecidos visa mitigar a pobreza e liberar as pessoas vulneráveis e  
oprimidas promovendo a sua inclusão social. Os valores subjacentes ao  
trabalho social constam de códigos de ética da profissão a nível nacional e  
internacional (FITS, 2000, p. 01).  
624  
Os valores propostos pelo CFESS suscitam a superação da pobreza, da fome, do  
desemprego, das desigualdades e discriminações sociais. Entre outros valores que realizam uma  
contraposição clara e evidente aos valores da FITS, ampliando o significado do que seriam os  
valores que devem nortear a profissão.  
Valores: As ações profissionais têm por base valores e princípios éticos  
universais, ou seja, a defesa da liberdade, da igualdade, da justiça social e da  
cidadania tendo em vista a superação da opressão, da fome, da pobreza, do  
desemprego e das desigualdades e discriminações sociais. Guiadas por tais  
valores e no zelo de sua qualidade, as práticas objetivam: o fortalecimento das  
instituições democráticas, das políticas econômicas a serviço do crescimento  
e da redistribuição da renda e da riqueza, dos direitos sociais universais; a  
observância de normas internacionais dos direitos humanos com respeito à  
diversidade de cultura, etnia/raça, geração, pensamento, identidade e relações  
de gênero, orientação sexual, concepções teórico-metodológicas e defesa de  
uma sociedade sem guerras, violência e opressão; o apoio às ações sociais  
globais na defesa das condições socioambientais e da sustentabilidade do meio  
ambiente que contribuam no combateà pobreza, à fome e ao desemprego; no  
apoio à população em situações especiais decorrentes de conflitos políticos,  
religiosos e militares (CFESS, 2011, p. 746).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 611-632, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Trabalho Social uma definição em disputa: breve revisão do debate de lutas e resistências  
No documento produzido pelo workshop, mantém-se a primeira oração, alterando  
somente a parte dos princípios éticos universais para apenas princípios éticos isoladamente.  
Porém, o restante do parágrafo é sublimado, transformando a proposta em uma contribuição  
reducionista. De todo modo, é possível inferir que isto se deu com o intuito de contemplar o  
entendimento de Trabalho Social em outras nações, pois nem todas se identificam com os  
valores ético-políticos brasileiros. Como se pode avaliar na íntegra, “valores: as ações  
profissionais têm por base valores e princípios éticos como: a defesa da liberdade, da igualdade,  
da justiça social, do pluralismo e da cidadania, tendo em vista a superação da opressão, da fome,  
da pobreza, do desemprego, das desigualdades e das discriminações sociais” (CFESS, 2012, p.  
01).  
Não deixa de ser uma perda significativa de compreensão das possibilidades teórico-  
históricas de um Serviço Social bem articulado e bem posicionado politicamente. Contudo,  
trata-se de uma sugestão de definição mundial, necessitando ser mais abrangente, e ao menos  
os valores elencados são coerentes com a corrente atualmente hegemônica do Serviço Social  
brasileiro.  
Nesse momento, adentramos em um tópico ainda mais delicado, trata-se da concepção  
sobre a teoria que norteia o trabalho social e que fatalmente será diversa ao redor do mundo.  
Na FITS, como era de se esperar, a teoria estará pautada prioritariamente em conhecimento  
empírico e teorias de desenvolvimento de comportamento humano, com vistas a promover  
transformações subjetivas e no plano individual, e até mesmo culturalmente. Inclui como teoria  
os estudos sobre os fatores biopsicossociais e superdimensiona a esfera psicológica.  
625  
Teoria: A metodologia do trabalho social apoia-se num conjunto de  
conhecimentos empíricos e resultantes de investigação e de avaliação de  
experiências práticas, incluindo conhecimentos específicos, inerentes a  
determinados contextos locais. O trabalho social tem em conta a  
complexidade das interacções entre os seres humanos e o meio que os rodeia  
e a capacidade destes apesar de afectados por isso, de estarem preparadas para  
as modificarem incluindo os factores de âmbito bio- psicosocial. O exercício  
desta profissão apoia-se em teorias de desenvolvimento de comportamento  
humano e ainda de sistemas sociais para analisar situações complexas e  
proporcionar transformações a nível individual, organizacional, social e  
cultural (FITS, 2000, p. 01).  
Importante ressaltar que, apesar da importância do assistente social compreender os  
fatores biológicos e psicológicos que incidem sobre o processo saúde-doença, principalmente  
para aqueles que atuam na área da saúde, esta não é uma teoria que fundamenta os estudos em  
Serviço Social e não é a nossa esfera de atuação. Estudamos esses fatores, meramente com um  
único intuito: olhar de maneira macroscópica para as necessidades sociais dos sujeitos, e com  
Débora Holanda Leite Menezes; Camila Andrade Moura Cardoso; Jullie Doria Freitas  
isso buscar respostas qualificadas às expressões da Questão Social, mediante uma atuação que  
se atém à dimensão social do processo saúde-doença.  
Remontamos à época de Mary Richmond, na qual a principal proposta do Serviço Social  
é trabalhar a personalidade da pessoa humana e o seu meio social, e este meio estaria reduzido  
ao núcleo sociofamiliar e comunitário. Atuando-se na perspectiva do desenvolvimento de  
potencialidades, com a elaboração de diagnósticos sociais individuais para estabelecer um  
plano de atuação, e este plano desenvolveria as capacidades e a personalidade dos sujeitos  
(Estevão, 1999). Viés simplista, reducionista e altamente culpabilizatório, já superado pela  
vertente teórica alavancada no processo de intenção de ruptura orquestrado na década de 1970.  
É visível esse movimento de ruptura embutido no tópico da teoria elaborado pelo  
CFESS em 2011,  
Teoria Para compreender as relações sociais e as condições de vida dos  
usuários, o Trabalho Social incorpora teorias sociais e econômicas que lhe  
permitam analisar e intervir na realidade com vistas à sua transformação.  
Assim, portanto, a metodologia do Trabalho Social fundamenta-se em um  
acervo de conhecimentos teóricos e de informações empíricas resultantes de  
pesquisa científica e da socialização de experiências que possibilitem uma  
leitura crítica do processo histórico numa perspectiva de totalidade, em seu  
movimento e em suas contradições; simultaneamente, permitam decifrar a  
inserção de indivíduos, grupos, famílias e coletividades no processo social,  
suscitando a compreensão de seus modos de vida e de trabalho e de suas  
reivindicações sociais (CFESS, 2011, p. 747).  
626  
Já a proposta do workshop retifica a incorporação de teorias econômicas para  
conhecimentos específicos, avalia-se que isso se deu justamente devido às diferentes  
aproximações teóricas feitas pelos trabalhadores sociais nas mais diversas sociedades.  
Ampliou-se a nomenclatura de Trabalho Social, já que alguns países denominam o Trabalho  
Social de maneira diferente, como no Brasil, onde a profissão é Serviço Social e o profissional  
é assistente social e não trabalhador social. Ambas as redefinições substituíram conhecimento  
empírico por informações empíricas, compreendendo que o empirismo não é conhecimento sem  
a articulação com um embasamento teórico e científico, mas sim um ponto de partida para as  
análises. Ademais, em conjunto, retiraram a teoria do âmbito individual, caminhando para o  
ideal de totalidade. Por fim, a proposta que apresentaremos no próximo parágrafo avançou no  
sentido de metamorfosear indivíduos em sujeitos sociais.  
Teoria: O Serviço Social/Trabalho Social mundial fundamenta-se em teorias  
sociais e conhecimentos específicos, para analisar e intervir na realidade,  
visando à sua transformação. A metodologia fundamenta-se em um acervo de  
conhecimentos teóricos, informações empíricas e saberes populares  
resultantes da pesquisa científica e da socialização de experiências que  
possibilitem uma leitura crítica do processo histórico, numa perspectiva de  
totalidade, permitindo, ao mesmo tempo, compreender a inserção dos sujeitos  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 611-632, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Trabalho Social uma definição em disputa: breve revisão do debate de lutas e resistências  
sociais (indivíduos, grupos, famílias e coletividades) no processo social,  
suscitando a compreensão de seus modos de vida, de trabalho e de suas  
reivindicações (CFESS, 2012, p. 01).  
Por fim, no que se refere à prática profissional, nos parâmetros da FITS, os equívocos  
são pressupostos de uma teoria “social” fadada ao fracasso. Aborda-se uma prática reiterativa  
e irrefletida, que busca respostas para os “problemas” de natureza pessoal do dia a dia, por meio  
de uma abordagem holística, com processos de natureza psicossocial e focalizados a nível  
individual. Identificou-se o trabalho com terapias, tratamentos familiares e aconselhamentos,  
além da miscelânea com a caridade por intermédio da noção de “ajuda” e inclusive com a  
premissa de desenvolvimento econômico.  
Vêm-se promovendo uma mistura das vertentes conservadoras, ao mesmo tempo que,  
de forma totalmente eclética, encontram-se ideais de superação desse mesmo conservadorismo.  
Vinculando-o aos princípios de justiça social e dignidade da pessoa humana, citando a  
importância do enfrentamento das desigualdades sociais e das injustiças existentes na  
sociedade, com ações de planejamento da atuação diante das políticas sociais, e até mesmo a  
importância de considerarmos as particularidades sociais, políticas, culturais e econômicas de  
cada país.  
Prática: O trabalho social enfrenta as barreiras, desigualdades e injustiças  
existentes na sociedade. Atua em situações de crise e de emergência, mas  
também dá resposta aos problemas de natureza pessoal e social do dia a dia.  
Este tipo de trabalho utiliza uma variedade de práticas, técnicas e ações em  
consonância com a abordagem holística (integral) do ser humano e do  
ambiente que o rodeia. A variedade de intervenções do trabalho social passa  
desde processos de natureza psicossocial focalizados a nível individual até  
intervenções relacionadas com a política social, planeamento social e  
desenvolvimento social. As intervenções integram aconselhamento ,  
acompanhamento de casos, trabalho de grupo, trabalho social de cariz  
pedagógico, tratamento e terapia familiares, bem como ajudar as pessoas a  
obter os bens e serviços disponíveis na comunidade. A sua intervenção inclui  
ainda a gestão de organismos, de serviços comunitários e envolvimento em  
acções político-sociais para influenciar a política social e o desenvolvimento  
económico. A intervenção holística do trabalho social é universal, mas as  
prioridades no seu exercício variam de país para país e de tempos a tempos,  
conforme as condições culturais, históricas e sócio – económicas existentes  
(FITS, 2000, p. 01).  
627  
A sugestão do Cfess (2011) para a prática profissional compreende as potencialidades  
e os limites da atuação profissional, valorizando as dimensões do exercício profissional, como  
a ético-política, teórico-metodológica e técnico-operativa. Evidenciando a capacidade do  
assistente social em formular e executar as políticas sociais, promover a participação popular  
nos espaços ocupacionais, prestar assessoria e consultoria em matéria de Serviço Social,  
Débora Holanda Leite Menezes; Camila Andrade Moura Cardoso; Jullie Doria Freitas  
orientações sociais para identificação de recursos e defesa de direitos e inúmeras outras  
competências que visam promover, proteger, restaurar e ampliar os direitos sociais.  
Prática: O exercício profissional requer domínio teórico-metodológico,  
postura ética e habilitação técnica para desenvolver competências e  
habilidades técnico-operativas atinentes ao trabalho social, tais como:  
formular e executar políticas sociais em órgãos da administração pública, em  
empresas e em organizações da sociedade civil; elaborar, executar e avaliar  
planos, projetos e programas na área social; contribuir para viabilizar a  
participação dos usuários nas decisões institucionais; planejar, organizar e  
administrar benefícios e serviços sociais; realizar pesquisas que subsidiem a  
formulação de políticas e ações profissionais; prestar assessoria e consultoria  
a órgãos da administração pública, empresas privadas e movimentos sociais  
relacionados às políticas sociais e à garantia dos direitos humanos e sociais da  
coletividade; orientar a população na identificação de recursos para o  
atendimento e defesa dos seus direitos; realizar estudos socioeconômicos para  
a identificação de demandas e necessidades sociais; realizar visitas, perícias  
técnicas, laudos, informações e pareceres sobre matéria de Trabalho Social;  
exercer funções de direção em organizações públicas e privadas na área;  
assumir o magistério em Trabalho Social e supervisionar estudantes  
estagiários. Para isso é necessário que o Trabalhador Social seja crítico e  
propositivo, com sólida formação acadêmico-profissional, contribuindo na  
promoção, proteção, restituição e exigibilidade dos direitos sociais e os meios  
de acessá-los (CFESS, 2011, p. 747).  
No que tange à formulação sobre a prática profissional proposta pelo workshop,  
verifica-se uma diferença de conceituação, já que esta formulação foca mais nos objetivos que  
se busca alcançar através da prática profissional, do que nas competências e atribuições  
profissionais.  
628  
Prática: O exercício profissional do assistente social/trabalhador social requer  
domínio teórico-metodológico, técnico-operativo, postura ética e habilitação  
específica para desenvolver competências e atribuições atinentes à profissão.  
Aprática profissional tem como objetivos: o fortalecimento da cidadania e das  
instituições democráticas, dos direitos sociais universais; o respeito às normas  
internacionais de Direitos Humanos relativas à diversidade de cultura, etnia,  
geração, pensamento, identidade e relações de gênero, orientação sexual; o  
apoio às ações sociais em defesa das condições socioambientais; o combate às  
desigualdades e à pobreza, à fome, ao desemprego e a todas as formas de  
injustiças e violências, com a redistribuição da renda e da riqueza. Para isso,  
é necessário que o/a assistente social/trabalhador social seja crítico/a e  
propositivo/a, com sólida formação acadêmico-profissional, contribuindo  
com a promoção, proteção, restituição e exigibilidade dos direitos humanos e  
sociais e os meios de acesso aos mesmos (CFESS, 2012, p. 01).  
Mais uma vez, interpreta-se que essa diferença de conceituação ocorreu devido à  
dificuldade de se ter uma prática similar mundialmente, as competências e atribuições  
profissionais se alteram a depender da sociedade e da sua dinâmica política, social e econômica.  
Ainda assim, não deixa de ser essencial a compreensão dos meios utilizados, isto é, das técnicas,  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 611-632, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Trabalho Social uma definição em disputa: breve revisão do debate de lutas e resistências  
instrumentos e habilidades, para alcançar os objetivos propostos, pois, em última instância, a  
práxis social compreende instrumentais, conhecimento e, sobretudo, intencionalidade.  
Finalmente, no ano de 2014, a proposta de revisão foi aceita e incorporada pela FITS.  
Sendo assim, é preciso evidenciar o avanço significativo que essa definição apresenta em  
comparação à definição dos anos 2000. De acordo com a tradução para o português denominada  
como “Proposta de tradução da Definição Global da Profissão de Serviço Social”, é possível  
identificar que inúmeras premissas de caráter altamente conservador foram retiradas de cena,  
não identificamos mais conceitos como: ajuda, teorias comportamentais, conhecimento  
empírico, problemas sociais, entre outros (IFSW, 2014).  
Todavia, ainda é possível identificar noções que destoam em determinada medida da  
concepção latino-americana de Serviço Social ou Trabalho Social. Por exemplo, a ideia de  
promoção da inclusão e coesão social alinhada ao desenvolvimento social, ou termos como  
desfavorecidos e empowerment atrelados à promoção da pessoa, e até mesmo análises e  
intervenções pautadas em ideais holísticos, biopsicossociais e espirituais.  
Nesta perspectiva, ainda existem incoerências significativas entre a definição mundial  
e as compreensões de Serviço Social ao longo do mundo, entretanto, é possível identificar  
progressos consideráveis, no que tange às teorias. Essa definição irá afirmar que “[...] nas  
teorias do serviço social, nas ciências sociais, nas humanidades e nos conhecimentos indígenas,  
o serviço social relaciona as pessoas com as estruturas sociais para responder aos desafios da  
vida e à melhoria do bem-estar social” (IFSW, 2014, p. 01). Identifica-se também a referência  
a práticas emancipatórias, e a análise das estruturas sociais que perpetuam as desigualdades, a  
discriminação, a exploração e a opressão, os princípios como a defesa da justiça social e dos  
direitos humanos permanecem.  
629  
Ainda que se verifiquem inúmeros avanços na definição contemporânea, já se passou  
mais de uma década sem uma reformulação ou refinamento de pontos que, notoriamente,  
permanecem imersos em um ecletismo teórico-político. Nesse sentido, é necessário  
compreender a construção do entendimento coletivo sobre o que constitui o Serviço Social ou  
Trabalho Social como uma tarefa contínua e ininterrupta, reconhecendo que a promoção de  
relações democráticas constitui um pilar fundamental, e não um elemento acessório, desse  
processo. Torna-se, portanto, indispensável que o trabalhador assistente social ou trabalhador  
social se reconheça como parte de um conjunto profissional, cujos integrantes possuem sua  
força de trabalho e seus direitos igualmente expropriados no contexto do capitalismo  
“globalizado”.  
Débora Holanda Leite Menezes; Camila Andrade Moura Cardoso; Jullie Doria Freitas  
Fechando um parênteses para abrir novos caminhos  
No prelúdio deste documento, realizou-se um resgate histórico das bases que moldaram  
a nossa profissão, com o intuito de fornecer um fundamento teórico para a crítica realizada ao  
longo do texto, em torno da definição mundial de Trabalho Social realizada pela FITS nos anos  
2000.  
Ao longo do desenvolvimento, evidenciou-se que a trajetória do Serviço Social no  
Brasil é marcada por disputas ideológicas e políticas que atravessam desde a retomada das  
protoformas caritativas até a consolidação do projeto ético-político crítico, comprometido com  
a emancipação humana e a transformação social. Demonstrou-se que, diferentemente de  
perspectivas conservadoras e individualizantes, o Serviço Social brasileiro fundamenta-se em  
uma compreensão histórico-dialética da realidade, que reconhece a Questão Social como  
expressão das contradições do modo de produção capitalista e orienta sua práxis pela defesa  
intransigente dos direitos humanos e da justiça social.  
A análise comparativa entre as definições propostas pela FITS (2000 e 2014) e as  
formulações críticas apresentadas pelo CFESS revelou que a primeira incorreu em equívocos  
teórico-metodológicos, ao adotar uma abordagem psicossocial e eclética, descolada da  
totalidade histórica das relações sociais. Por sua vez, as propostas brasileiras buscaram superar  
esse reducionismo, reafirmando a centralidade da dimensão ético-política e a necessidade de  
um arcabouço teórico consistente que articule teoria, método e prática em direção à  
transformação social. Ainda que a redefinição de 2014 represente um avanço significativo,  
constatou-se que persistem resquícios de ecletismo e de perspectivas conciliatórias que destoam  
da concepção crítica latino-americana.  
630  
Ainda que, passados 25 anos, permaneça controverso o processo de formulação dessa  
primeira definição, causa ainda mais perplexidade o fato de ela ter permanecido inalterada por  
quatorze anos, apesar dos inúmeros equívocos que apresentava e da intensa reivindicação dos  
países latino-americanos por sua revisão. Não se sustenta o argumento de que havia pautas  
emergenciais prioritárias ou de que os dirigentes da FITS não estavam a par da insatisfação  
gerada com a definição proposta nos anos 2000, sobretudo diante da expressiva mobilização  
promovida, como referido, em grande parte pelos países da América Latina. Entre essas ações,  
destacam-se as propostas de redefinição apresentadas por diferentes nações, o workshop  
brasileiro e as diversas manifestações realizadas em encontros e assembleias subsequentes à  
promulgação da referida definição.  
À primeira vista, pode parecer irrelevante ou pouco pertinente atribuir tamanha  
importância a essa temática. Contudo, para aqueles que analisam a questão de forma crítica e  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 611-632, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Trabalho Social uma definição em disputa: breve revisão do debate de lutas e resistências  
atenta, torna-se evidente a urgência e relevância deste debate. A definição analisada, mesmo  
que não intencionalmente, compõe um projeto político e econômico antagônico ao que é  
vislumbrado pelo projeto hegemônico do Serviço Social brasileiro, e a sua perpetuação facilita  
a mistificação do que é o Serviço Social ao redor do mundo. Contribuindo para a formulação  
de ideias no senso comum, muitas vezes contrárias ao que o Trabalho Social pretende ser em  
determinados países. Essa definição também influência nos rumos que o Serviço Social irá  
tomar nos diferentes países, principalmente naqueles que ainda não possuem bases teóricas  
sólidas.  
Diante da compreensão de que o Serviço Social e/ou Trabalho Social compõem e  
influenciam, ainda que em certa medida, o movimento histórico da sociedade, a sua redefinição  
foi e continua sendo uma pauta necessária. Persistem, contudo, determinados equívocos  
presentes na redefinição de 2014, sobretudo pela dificuldade em articular princípios e valores  
tão divergentes das diferentes sociedades que integram a Fits. Portanto, essa revisão precisa ser  
conduzida de forma sistemática e não deve ser postergada, pois, como demonstra a própria  
história, adiar o imprescindível é permitir que o amanhã perdure por décadas. E, até mesmo, no  
mais sombrio dos desfechos, incorrer o risco de converter-se naquele “dia que durou 21 anos”4.  
Referências bibliográficas  
631  
ABEPSS (org.). Serviço Social: direitos sociais e competências profissionais. Brasília:  
CEAD/UnB, 1999. p. 1516.  
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2010. Dispõe sobre a vedação da realização de terapias associadas ao título e/ou ao  
exercício profissional do assistente social. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2010.  
CFESS. A definição de trabalho social da FITS: Por que revisar? Serviço Social &  
Sociedade. São Paulo: Cortez, n. 108, p.733-747, out/dez. 2011.  
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Acesso em 15 de julho de 2025.  
CFESS. Workshop sobre a definição de serviço social. [S. l]: CFESS. 2012. Disponível em:  
julho 2025.  
ESTEVÃO, Ana Maria Ramos. O que é Serviço Social. Rio de Janeiro: Brasiliense, 1999.  
IAMAMOTO, Marilda Villela. Relações sociais e Serviço Social no Brasil: esboço de uma  
interpretação histórico-metodológica. São Paulo: Cortez, 1982.  
4Referência à ditadura civil-militar no Brasil, instaurada em 1964 e oficialmente encerrada em 1985, período  
comumente mencionado como "o dia que durou 21 anos". A expressão ganhou notoriedade com o documentário  
de Camilo Galli Tavares, lançado em 2012, que leva esse título e apresenta uma crítica contundente ao regime.  
Débora Holanda Leite Menezes; Camila Andrade Moura Cardoso; Jullie Doria Freitas  
IAMAMOTO, Marilda Villela. Serviço Social em tempo de capital fetiche: capital financeiro,  
trabalho e questão social. São Paulo: Cortez, 2008.  
IAMAMOTO, Marilda Villela. O Serviço Social na contemporaneidade: trabalho e formação  
profissional.  
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Paulo:  
Cortez,  
2004.  
Disponível  
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IFSW. Global Definition of Social Work: Proposta de tradução da Definição Global da  
Profissão de Serviço Social. [S. l.]: International Federation of Social Workers (IFSW),  
social-work/. Acesso em: 10 de out. de 2025.  
NETTO, José Paulo. A construção do projeto ético-político do Serviço Social. In: MOTA,  
Elizabete Ana. et al (org.). Serviço social e saúde: formação e trabalho profissional. 1.ed.  
São Paulo: Cortez, 2022. p 1-22.  
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NETTO, José Paulo. Ditadura e Serviço Social. São Paulo, Cortez, 1994.  
TAVARES, Camilo (Direção). O dia que durou 21 anos. São Paulo: Pequi Filmes, 2012. 1  
vídeo  
(77  
min),  
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Disponível  
em:  
YAZBEK, Maria Carmelita. Os fundamentos históricos e teórico-metodológicos do Serviço  
Social brasileiro na contemporaneidade. In: CFESS; ABEPSS (org.). Serviço social: direitos  
sociais e competências profissionais. Brasília: UnB, 2009. p. 127.  
632  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 611-632, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Internacionalização sob critérios hegemônicos:  
reflexões sobre a área de Serviço Social no  
CAPES-Print  
Internationalization under hegemonic criteria: analyzing Brazilian Social  
Work field through the CAPES-Print program  
Rafael Vieira Teixeira*  
Janaina Lopes do Nascimento Duarte**  
Resumo: Apresenta-se resultados da pesquisa  
de pós-doutorado sobre a internacionalização da  
área de Serviço Social no CAPES-Print. O  
objetivo foi analisar o acúmulo da área frente  
aos critérios e prioridades do Programa. O  
estudo documental baseou-se em dados oficiais  
disponíveis nas páginas oficiais da CAPES, das  
Instituições e dos Programas de Pós-Graduação  
(PPG’s) envolvidos. Identificou-se tendência de  
subordinação dos PPG’s aos critérios do Print e  
indícios de ações de cooperação internacional  
estrategicamente baseadas nos princípios do  
Projeto Ético Político Profissional.  
Abstract: We share results of research on the  
internationalization of the Social Work field in  
the CAPES-Print Program. We analyzed the  
experiences of the field within the criteria and  
priorities of this Program. We found a strong  
tendency to subordinate graduate program to  
the established criteria. At the same time,  
however, we noted the experience of the  
Brazilian Social Work Project, which was a  
milestone in history. We believe that some  
choices follow the values of the project and  
express a strategic intention to carry out  
internationalization in an internationalist way.  
Palavras-chaves: Pós-graduação; Serviço  
Keywords:  
Graduate;  
Social  
Work;  
Social; Internacionalização; CAPES-Print.  
Internationalisation; CAPES-Print.  
* Universidade Federal do Espírito Santo. E-mail: rafael.v.teixeira@ufes.br  
** Universidade de Brasília. E-mail: jana.lopesduarte@gmail.com  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.49336  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 03/07/2025  
Aprovado em: 12/12/2025  
Rafael Vieira Teixeira; Janaina Lopes do Nascimento Duarte  
Introdução  
Apresentam-se, neste texto, os resultados de pesquisa cujo tema foi a internacionalização  
da pós-graduação na área de Serviço Social no Brasil. Objetivando analisar este processo na  
atualidade, elegemos1 o Programa CAPES-Print2 (CAPES, 2017) para investigar a  
internacionalização dos Programas de Pós-Graduação (PPG’s) da área 32 (Serviço Social).  
O estudo bibliográfico sobre o tema constituiu parte fundamental no processo, e a coleta  
de dados decorreu de pesquisa documental na página eletrônica oficial da CAPES  
(Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior do Ministério da Educação),  
no período entre agosto de 2024 a novembro de 2025. Em um primeiro momento, focamos a  
busca por conhecer a concepção de internacionalização presente nas publicações da agência.  
Dentre outras, as regulamentações que sustentam o Programa CAPES-Print foram  
significativas, a fim de detectar os fundamentos hegemônicos sobre a perspectiva de  
internacionalização. O passo seguinte consistiu em conhecer as IES (Instituições de Ensino  
Superior) e os PPG’s (Programas de Pós-Graduação) participantes do Programa, com foco nos  
PPG’s da área de Serviço Social. Assim, incluímos na busca documental os sites oficiais dessas  
IES e de seus respectivos PPG’s, coletando informações sobre propostas institucionais de  
internacionalização e a participação dos programas da área 32 no CAPES-Print.  
A partir da coleta passamos ao processo de sistematização e análise, quando elaboramos  
algumas planilhas. Com os dados extraídos e organizados a partir de tabelas e quadros, e  
amparados na permanente revisão bibliográfica, analisamos os principais achados sobre a  
atuação dos PPG’s da área de Serviço Social no CAPES-Print, acreditando que contribuímos  
com reflexões consistentes.  
634  
Além desta introdução, o artigo traz mais 03 seções, e considerações finais: 1)  
contextualização do Programa CAPES-Print na atual conjuntura, em que problematizamos as  
tendências em curso para a pós-graduação e, consequentemente, para a internacionalização. Na  
trilha de Florestan Fernandes (2010), discutimos a universidade e seus dilemas na relação com  
as estratégias adotadas pelos países, reconhecendo que a internacionalização é parte da  
geoeconomia política inerente ao desenvolvimento desigual e combinado do capitalismo; 2)  
1 De acordo com Leão, Nogueira e Castro (2024, p. 99), desde 2017, quando a CAPES destinou aproximadamente  
R$ 1 bilhão para impulsionar a internacionalização das Instituições de Educação Superior (IES) brasileiras, o  
CAPES-Print “se tornou o principal instrumento de internacionalização dos programas de Pós-graduação”. A alta  
relevância do CAPES-Print também pode ser constatada na página oficial da CAPES. Dentre as ações de  
internacionalização listadas de 2020 a 2024, o CAPES-Print aparece como a primeira em todos os anos. Vale  
menção, ainda, o fato das ações do CAPES-Print terem findado, efetivamente, em 2025, mesmo ano em que foi  
lançado seu correlato, o Programa Redes para Internacionalização Institucional CAPES-Global.Edu (Portaria  
GAB/CAPES nº 74, de 28 de Março de 2025).  
2 Programa Institucional de Internacionalização Capes-PrInt, instituído pelo Edital nº. 41/2017 (CAPES, 2017).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 633-653, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Internacionalização sob critérios hegemônicos: reflexões sobre a área de Serviço Social no CAPES-Print  
apresentamos uma breve digressão histórica do Serviço Social Brasileiro, com foco nos  
fundamentos que embasaram o desenvolvimento do Serviço Social enquanto área de  
conhecimento, e sua crescente atuação na pós-graduação; 3) analisamos a participação dos  
PPG’s da área de Serviço Social no CAPES-Print. Nas considerações finais, sintetizamos os  
principais achados, fortalecendo a perspectiva internacionalista da Área, frente aos critérios  
hegemônicos adotados pela CAPES.  
Pós-graduação, CAPES-Print e a concepção hegemônica de internacionalização da  
Educação Superior  
De acordo com Leher e Santos (2023), desde o começo da ditadura empresarial-militar  
de 1964, a internacionalização da pós-graduação constitui parte do projeto heterônomo de  
desenvolvimento adotado no Brasil. Conforme os autores, em 1986, com o III Plano Nacional  
de Pós-Graduação (PNPG), “a internacionalização passou ser concebida como uma variável  
chave e definitiva do prestígio do pesquisador, do grupo, do centro ou da instituição [...]”  
(Leher; Santos, 2023, p. 16). Os autores ainda explicam que nos PNPG’s seguintes a  
internacionalização passou a ocupar cada vez mais uma posição central, no tocante às  
prioridades de desenvolvimento da pós-graduação, mantendo, contudo, uma direção  
subordinada aos interesses imperialistas.  
635  
Na mesma direção, Knobel et al. (2020, p. 674) argumentam que:  
a implementação de políticas dependentes de relações internacionais se  
confunde com o próprio desenvolvimento do sistema, haja vista a participação  
de atores externos – sobretudo os Estados Unidos – em processos históricos  
determinantes, como [...] na expansão e na consolidação da pós-graduação  
stricto sensu.  
Assim, podemos inferir que o tema internacionalização da educação superior vem  
ganhando notoriedade, quase sempre conectado à pós-graduação stricto sensu. A pós-  
graduação no Brasil se constitui e desenvolve subordinada à particularidade de uma economia  
periférica e dependente e, na atualidade, o desenvolvimento da pós-graduação continua a seguir  
diretrizes assumidas desde os Planos Nacionais do período empresarial-militar. Podemos  
também entender que a pós-graduação, no Brasil, enquanto política pública, ocorre  
majoritariamente nas universidades públicas e sob financiamento público-estatal (Leher;  
Santos, 2023).  
Convém, então, considerar que a importância crescente da internacionalização da pós-  
graduação está contida em um contexto histórico no qual as políticas neoliberais avançam  
mundialmente, impactando as políticas públicas e sociais. Segundo Knobel et al. (2020, p. 674,  
grifos nossos):  
Rafael Vieira Teixeira; Janaina Lopes do Nascimento Duarte  
[...] foi a partir dos anos 2000 que o significado e as funções designadas à  
internacionalização adquiriram novas conotações no Brasil. Como reflexo das  
reconfigurações na educação superior mundial, o processo tem se tornado  
cada vez mais intencional, sistemático [...], frequentemente referenciado pelos  
discursos políticos e acadêmicos dominantes como um imperativo [...] para  
que o país se integre à chamada ‘economia global do conhecimento’.  
Com base em Dierckxsens e Piqueras (2018, p. 105) afirmamos que as reconfigurações  
na educação superior a partir do final do século XX e início do XXI tem como causalidade uma  
série prolongada de queda nas taxas de lucro em nível mundial, denotando tendência ao  
esgotamento da reprodução do capital ao nível da totalidade, a qual configura uma “situação de  
crise estrutural mundial”. E, assim, de acordo com Duarte (2020, p. 27),  
[...] a educação superior vem se constituindo como política estratégica do  
projeto de reestruturação e mundialização do capital em tempos de crise, pois  
se compõe como espaço amplo de acumulação e, ao mesmo tempo, atende à  
requisição de formação profissional de um perfil compatível com os interesses  
capitalistas em cenário de crise.  
Neste contexto, as pesquisas, sobretudo as que levam à rápida aplicação, passam a ser  
objeto de obsessão pelas corporações, pelas cúpulas das classes dominantes e pelos gestores  
que atuam na formulação de políticas institucionais. Isto amplia a importância da  
internacionalização na pós-graduação, porém com viés cada vez mais subordinado às  
necessidades da acumulação, sob inequívoca apropriação instrumental e competitiva do  
processo de produção e partilha do conhecimento. (Dierckxsens; Piqueras, 2018)  
No Brasil, o protagonismo estatal na indução das políticas de pesquisa e pós-graduação,  
assim como nas demais políticas educacionais, tem sido subordinado aos critérios  
macroeconômicos neoliberais. Esta realidade se mostra através de cortes e contingenciamentos  
orçamentários que priorizam compromissos com rentistas, impactando a internacionalização.  
Como anotam Moreira e Ribeiro (2022), para uma lógica crescentemente privatista e  
competitiva:  
636  
[...] há uma explícita opção pelo aprofundamento das políticas de austeridade  
fiscal, que se materializaram, sobretudo, nos sucessivos contingenciamentos  
e cortes no orçamento, em particular para a Educação. Nesse sentido, se no  
início da década a temática da internacionalização da Educação Superior  
emergia atrelada a uma política de Estado, sua permanência enquanto  
elemento da política educacional sugere a prevalência de uma perspectiva que  
a concebe como um bem privado, capaz de garantir diferenciação social [...]  
(Moreira; Ribeiro, 2022, p. 4).  
Considerando também o padrão dependente educacional brasileiro3, o estímulo à  
internacionalização neste contexto restritivo de investimentos públicos, implica critérios ainda  
3 Como afirma Fernandes (2010, p. 267), “as universidades das nações subdesenvolvidas também estão inseridas  
nas relações de dependência e concorrem para preservar as formas de subordinação cultural existentes”.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 633-653, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Internacionalização sob critérios hegemônicos: reflexões sobre a área de Serviço Social no CAPES-Print  
mais competitivos e individualizados, como fatores de diferenciação social. Podemos  
identificar que é precisamente neste ambiente que a CAPES fomenta e avalia os programas de  
pós-graduação no Brasil, elegendo a internacionalização como principal indicador de  
excelência4.  
Todavia, apesar de aparecer como indicador central para o desenvolvimento da pós-  
graduação, é interessante notar que a internacionalização não é acompanhada por uma análise  
crítica de seus propósitos. Os documentos da CAPES analisados em nossa pesquisa não  
apresentam, explicitamente, uma concepção própria sobre a internacionalização almejada,  
tampouco sua vinculação às prioridades de desenvolvimento da nação. A pretensa isenção dos  
documentos a esse respeito sugere, na aparência, que esta não é uma questão importante e,  
principalmente, que os indicadores de avaliação são neutros. A nossa análise é que a opção por  
não posicionar uma concepção de maneira explícita indica, subliminarmente, a pretensão de  
fazer crer que uma dada concepção possa ser tomada como consensual, ou como um “processo  
natural de amadurecimento institucional em internacionalização” (CAPES; 2020a, p. 5, grifos  
nossos).  
Mesmo não apresentando uma concepção fundamentada sobre o tema, a CAPES  
manifesta que trabalha com as distintas visões existentes em diversas áreas. No entanto, a  
produção objetiva do órgão se atém a um conjunto de prescrições em comum para avaliação da  
internacionalização em todas as áreas, produzindo: “[...] uma definição conceitual de  
internacionalização voltada para o processo de avaliação dos programas de pós-graduação,  
abrangendo todas as áreas do conhecimento” (CAPES; 2019). Parece sintomático, nesse  
sentido, que o relatório do Grupo de Trabalho Internacionalização5, elaborado em 2019,  
apresente apenas o conceito de “avaliação da internacionalização”, sem antes indicar o que  
entende por internacionalização:  
637  
A avaliação da internacionalização refere-se à forma e ao conteúdo da  
formação oferecida pelos programas de pós-graduação, indicada por pesquisa  
colaborativa multilateral, divulgação da produção intelectual, mobilidade de  
docentes e discentes em colaboração e atuação institucional, além de  
condições institucionais específicas de apoio (CAPES; 2019, p. 5, grifos  
nossos).  
4
Vale destacar que os mais elevados conceitos do Órgão para avaliação dos programas de pós-graduação, as  
maiores notas, 6 e 7, “expressam excelência constatada em nível internacional” (CAPES, 2007, on line).  
5 O Grupo de Trabalho Internacionalização foi instituído pela Portaria MEC Nº 277, de 24 de dezembro de 2018,  
tendo como objetivo “Definir de maneira uniforme, para todas as áreas de avaliação da CAPES, conceitos,  
variáveis e indicadores que representem o tema e a dimensão da internacionalização no processo de avaliação dos  
programas de pós-graduação stricto sensu” (CAPES, 2019, p. 3, grifos nossos)  
Rafael Vieira Teixeira; Janaina Lopes do Nascimento Duarte  
A partir disso, o Grupo de Trabalho (GT) apresenta diretrizes e indicadores para a  
avaliação da internacionalização, orientadas por quatro dimensões gerais: Pesquisa  
colaborativa, divulgação da produção intelectual, mobilidade de docentes e discentes, e atuação  
institucional (CAPES, 2019). Note-se que, dentre as quatro, apenas uma dimensão prioriza a  
internacionalização como um processo coletivo e estratégico: as condições institucionais. As  
demais, via de regra, são gerenciadas a partir dos currículos de pesquisadores/as.  
As dimensões da pesquisa, da divulgação da produção e da mobilidade são avaliadas  
mediante indicadores quantitativos e individualizados, com efeito de hierarquizar o mérito  
acadêmico e científico. Assim, o GT define como indicadores, entre outros: quantidade de  
docentes e discentes partícipes em projetos de cooperação, sobretudo, com financiamento  
internacional; quantidade de publicações em veículos internacionais, associados aos fatores de  
impacto; número de docentes e discentes que visitam instituições internacionais e de docentes  
e discentes estrangeiros que visitaram instituições no Brasil, etc. (CAPES, 2019). Em resumo,  
todos estes indicadores são colhidos mediante a quantificação da participação dos indivíduos  
em ações de internacionalização.  
Ademais, ao tratar das prioridades de acordos de cooperação e da busca por veículos de  
divulgação dos trabalhos, notamos que nos documentos são priorizados indicadores que  
aproximam os vetores de internacionalização aos interesses dos países centrais do capitalismo,  
ou, mais precisamente, como afirmam Leher e Santos (2023, p. 13), “as diretrizes e métricas de  
internacionalização reproduzem as assimetrias da geoeconomia política do conhecimento”. A  
título de exemplo, podemos identificar no excerto, extraído do Guia para Aceleração da  
Internacionalização (CAPES, 2020b), o que seriam as lições apreendidas, quais os principais  
parceiros e que sistemas devem ser ajustados à realidade brasileira:  
638  
[...] lições aprendidas com o primeiro Relatório do Programa Institucional de  
Internacionalização da CAPES – PrInt (em operação desde 2019), das  
orientações de mentoria do Projeto “Laboratório de Internacionalização” do  
American Council of Education (uma parceria recente entre a DRI e Comissão  
Fulbright para três instituições brasileiras), bem como de perspectivas de  
internacionalização resultantes da colaboração institucional dos principais  
parceiros Alemanha, Estados Unidos, França e Reino Unido (em ordem  
alfabética). A proposta é contribuir para que as instituições possam planejar as  
ações considerando [os] principais sistemas de ranqueamento internacional  
de universidades (World Class Universities), [...] ajustados à realidade  
brasileira (CAPES, 2020a, p. 5, grifos nossos.)  
Analisando criticamente este processo de internacionalização inspirado nas chamadas  
World Class Universities, Leher e Santos (2023) argumentam que o ranqueamento é  
parametrizado por agências e critérios construídos nos países que possuem posições de destaque  
nestes rankings, reproduzindo assimetrias e alimentando a heteronomia: “O grosso da  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 633-653, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Internacionalização sob critérios hegemônicos: reflexões sobre a área de Serviço Social no CAPES-Print  
classificação e dos registros científicos está sob inequívoco controle monopólico” (Leher e  
Santos, 2023, p. 15). Enquanto instituições sediadas nos EUA e Reino Unido ocupam quase  
sempre a primeira e a segunda posição nestes rankings, os autores destacam que: “A despeito  
da excelência e da relevância das universidades públicas brasileiras, estas não se encaixam nos  
critérios de modo virtuoso; ainda assim, perseguem febrilmente um melhor lugar nos pelotões  
de frente dos rankings.” (Leher; Santos, 2023, p. 14)  
Logo, podemos entender que o alinhamento à concepção hegemônica neoliberal se  
baseia em experiências internacionais dos países centrais do capitalismo, resultando em um  
processo desfavoravelmente competitivo para as nações periféricas e dependentes, e expresso  
por indicadores que ranqueiam as atividades acadêmicas a partir do acúmulo, da realidade e dos  
interesses daqueles países. Desta forma, o Programa CAPES-Print se estrutura sob as mesmas  
diretrizes gerais acolhidas pela CAPES.  
Segundo o edital que inaugurou o CAPES-Print, o Programa  
[...] visa à seleção de Projetos Institucionais de Internacionalização de  
Instituições de Ensino Superior ou de Institutos de Pesquisa que tenham ao  
menos quatro (4) Programas de Pós-Graduação (PPG) recomendados pela  
Capes [...] entre os quais deverá haver, pelo menos, dois (2) com cursos de  
doutorado (CAPES, 2017, p. 1).  
Verificamos que este Programa se dirige à dimensão das condições institucionais, dentre  
as que norteiam a avaliação da CAPES. De maneira construtiva, esta perspectiva induz à  
cooperação interna entre PPG’s de uma mesma instituição, estabelecendo indicadores que  
invocam o planejamento institucional e que aproximam a perspectiva da internacionalização  
desde uma posição relacionada ao desenvolvimento da instituição em termos de uma política  
nacional. Por outro lado, seguindo os demais determinantes da avaliação da CAPES, sobressai  
a perspectiva de ranqueamento, com critérios competitivos e interessados principalmente na  
cooperação com países que se encontram em uma posição privilegiada na geoeconomia política  
do conhecimento. É assim, por exemplo, que o Anexo I do edital estabelece o que seriam os  
países prioritários, isto é, para os quais deveriam ser destinadas, pelo menos, 70% das propostas  
submetidas (CAPES, 2017).  
639  
No Quadro 1 vemos a distribuição dos países considerados estratégicos/prioritários por  
continentes, o que demonstra de maneira muito consistente que a prioridade é manter uma  
associação dependente em relação aos países de desenvolvimento capitalista avançado,  
principalmente da Europa Ocidental e América do Norte. Enquanto apenas a Argentina é  
considerada prioritária dentre os países sul-americanos, quase 70% dos países prioritários se  
encontra na Europa e na América do Norte, além de outros países da Ásia e da Oceania. E  
Rafael Vieira Teixeira; Janaina Lopes do Nascimento Duarte  
apenas um país africano foi considerado estratégico/prioritário, mesmo com tantos  
afrodescendentes brasileiros.  
Quadro 1: Países Estratégicos Prioritários CAPES-Print (Geral).  
Continente  
África  
Qt.  
Perc.  
Países  
1
4%  
África do Sul  
Norte  
Central  
Sul  
3
-
11%  
-
Canadá, Estados Unidos, México  
América  
-
1
4%  
Argentina  
Ásia  
4
15%  
58%  
China, Coreia do Sul, Índia, Japão  
Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha,  
Finlândia, França, Irlanda, Itália, Noruega, Países  
Baixos, Reino Unido, Rússia, Suécia, Suíça  
Europa  
15  
Oceania  
Total  
2
8%  
Austrália, Nova Zelândia  
26  
100%  
Fonte: Elaboração própria com base no Anexo I do Edital 41/2017 (D.O.U 02/02/2018, Seção 3, p. 23).  
Também condizente com os princípios da internacionalização assumida pela CAPES, o  
Print estabelece como critério de seleção de propostas a avaliação de mérito acadêmico e  
científico, baseando-se no ranqueamento. Estabelece, por exemplo, que as propostas  
demonstrem “[...] o grau de excelência dos Programas de Pós-graduação, inclusive o percentual  
de PPG’s com notas 5, 6 ou 7 na avaliação da Capes de 2017” (CAPES, 2017, p. 13).  
Além disso, como já sinalizamos, o fomento está rigorosamente subordinado a  
contenções orçamentárias. Conforme o item 2.8 do Edital 41/2017, os projetos contemplados  
estão “[...] sujeitos a eventuais contingenciamentos orçamentários que repercutirem sobre a  
Capes. Em tais ocasiões, os Projetos Institucionais de Internacionalização deverão ser  
readequados pelos seus Gestores à nova situação financeira e orçamentária” (CAPES, 2017, p.  
2). Aqui vemos um aspecto que merece ser posto em destaque: na ausência de recursos, mesmo  
em casos de contingenciamento, o ônus recai individualizado sobre quem pesquisa.  
Então, parece inequívoco que o CAPES-Print segue princípios e critérios hegemônicos  
para estimular o processo de internacionalização da pós-graduação no país. Por outro lado, é  
necessário reconhecer a importância do estímulo às relações de cooperação entre instituições  
de ensino e pesquisa em nível internacional, principalmente as públicas, mantendo “em curso  
relevante interação entre grupos de pesquisa e unidades acadêmicas” (Leher; Santos, 2023, p.  
13).  
640  
É preciso ressaltar a importância do financiamento público para o trabalho em  
cooperação, pois, ainda que prevaleçam critérios ranqueadores, o financiamento público por  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 633-653, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Internacionalização sob critérios hegemônicos: reflexões sobre a área de Serviço Social no CAPES-Print  
meio de editais possibilita que instituições públicas fortaleçam suas experiências de cooperação  
e pesquisa em nível internacional. Este parece ser um aspecto presente nas experiências em  
curso na área de Serviço Social. A seguir, enfatizaremos aspectos históricos que deram origem  
à atuação madura da área de Serviço Social na pesquisa e na pós-graduação brasileiras. Esta  
digressão importa para entendermos a perspectiva ético-política que orienta a contribuição da  
área nas ações de internacionalização, frente aos desafios postos pelos critérios do CAPES-  
Print.  
Balizas históricas para análise da internacionalização da área de Serviço Social no  
Brasil  
Para iniciarmos esta sessão convém discutirmos abreviadamente dois marcos relevantes  
do processo sócio histórico do Serviço Social brasileiro, cujas repercussões são estratégicas  
para a análise do atual processo de internacionalização na área, sendo eles os processos de  
Renovação do Serviço Social latino-americano e de construção do Projeto Ético-Político.  
O primeiro deles é o processo de Renovação do Serviço Social Latino-Americano. No  
campo dos fundamentos do Serviço Social é importante precisar que, conforme análises de  
Netto (1998), a Renovação do Serviço Social se constitui como um fenômeno internacional, a  
partir dos anos 1960, sendo “verificável, ainda que sob formas diversas, em praticamente todos  
os países onde a profissão encontrara um nível significativo de inserção na estrutura sócio-  
ocupacional e articulara algum lastro de legitimação ideal” (Netto, 1998, p. 142, grifos nossos).  
O autor complementa que “[...] em escala mundial, ela (a profissão) experimentou uma  
profunda inflexão, cujo conteúdo basilar se constituiu justamente na erosão da legitimidade6  
do Serviço Social tradicional” (Netto, 1998, p. 145, grifos nossos).  
641  
Como parte integrante do processo de Renovação, a partir da erosão do Serviço Social  
tradicional, o Movimento de Reconceituação na América Latina7 se inscreve “na dinâmica de  
6
Segundo Netto (1998), no Brasil, até a primeira metade da década de 1960, o Serviço Social brasileiro se  
constituía com razoável homogeneidade em relação a sua direção teórico-metodológica, ético-política e técnico  
operativa, uma vez que a profissão “[...] mostrava uma relativa homogeneidade nas suas projeções interventivas,  
sugeria uma grande unidade nas suas propostas profissionais, sinalizava uma formal assepsia de participação  
político-partidária, carecia de uma elaboração teórica significativa e plasmava-se numa categoria profissional onde  
parecia imperar, sem disputas de vulto, uma consensual direção interventiva e cívica” (Netto, 1998, p. 128).  
7
Tal movimento permitiu uma “grande união profissional que abriu a via a uma Renovação do Serviço Social. A  
Reconceituação foi um processo que se esboça em 1965, tendo como objetivo adequar a profissão às demandas de  
mudanças sociais registradas ou desejadas no marco continental – e que sensibilizavam o Serviço Social pelos  
mesmos condutos e sujeitos que, internacionalmente forçavam e parametravam alterações profissionais” (Netto,  
1998, p. 146-147). Vale destacar que o Movimento de Reconceituação do Serviço Social latino-americano teve  
seu ponto de arranque a partir do I Seminário Regional Latino-Americano de Serviço Social, realizado em Porto  
Alegre/RS em maio de 1965, sendo seguido por diversos outros seminários nacionais e latino-americanos (com  
ênfase no Cone Sul), culminando com uma Associação Latino-Americana de Escolas de Serviço Social  
(ALAETSS) e promovendo intenso debate por meio de publicações diversas da área (Netto, 2005). No entanto, o  
Rafael Vieira Teixeira; Janaina Lopes do Nascimento Duarte  
rompimento das amarras imperialistas, de luta pela libertação nacional e de transformações da  
estrutura capitalista excludente, concentradora, exploradora” (Netto, 1998, p. 146), que repensa  
a sociedade e a profissão inserida na dinâmica societária. Na particularidade brasileira, podemos  
dizer que a Renovação permitiu um “giro” fundamental no Serviço Social que passa a  
disponibilizar ao mercado “um profissional ‘moderno’, cuja legitimação advém menos de uma  
(auto)representação humanista abstrata que de uma fundamentação teórico-técnica do seu  
exercício como Assistente Social” (Netto, 1998, p. 127).  
Ao longo das décadas 1960/70, período em que o Brasil expande a modernização  
conservadora para relações de produção tipicamente monopolistas, ampliando a dependência  
externa sob uma ditadura empresarial-militar (Fernandes, 1976), o Serviço Social vivencia um  
processo de contestação de suas bases tradicionais conservadoras, de caráter confessional.  
Em meio à crescente contestação do “Serviço Social Tradicional” na América Latina, em  
particular no Brasil ganharam força na profissão perspectivas associadas à modernização  
dependente e também críticas a ela. Isto porque a Renovação da profissão, conforme análises  
incontestáveis de Netto (1998), desenvolveu-se de modo diferencial, cronológica ou  
teoricamente, em três direções principais: a) Modernizadora, a partir da aproximação com o  
positivismo e a ideologia desenvolvimentista, defendida no contexto da ditadura, no qual o fazer  
técnico era supervalorizado; b) Reatualização do Conservadorismo, de inspiração  
fenomenológica, focada no individuo, nas suas vivências e sentimentos, de tendência intimista  
e psicologizante, cultura tolerada pela ditadura; e c) Intenção de Ruptura com o  
conservadorismo, sob o suporte da tradição marxista, especialmente a partir de finais dos anos  
1970. Netto (1998, p. 136, grifos nossos) avalia que a Renovação do Serviço Social se constitui  
como:  
642  
processo complexo em que rompimentos se entrecruzam e se superpõem a  
continuidades e reiterações, é uma tensão entre vetores de transformação e  
permanência – e todos comparecem, em medida desigual e metamorfoseados,  
na resultante em que, indubitavelmente, predomina o novo.  
Desse modo, diante da diversidade e complexidade da Renovação, a partir da mescla entre  
revitalização do “velho”/arcaico e emergência do “novo em potencial”,  
O Movimento de Renovação da profissão [...] não rompe imediatamente com  
o projeto conservador no Serviço Social, mas (este) começa a perder a  
hegemonia no início dos anos 1980, (com) um novo horizonte para a dinâmica  
Movimento de Reconceituação teve seu ponto final no prazo de uma década (1975), sendo duas causas  
fundamentais para este rompimento: as ditaduras que contiveram firmemente o movimento e a “visível pseudo-  
união entre os profissionais” (Netto, 1998, p. 148) dos diferentes países da América Latina. Logo, Netto (1998;  
2005) nos instiga a interpretar que o Movimento de Reconceituação é a expressão do processo de Renovação e da  
sua complexidade, sendo “viabilizado na América Latina, sobre o protagonismo do Brasil e de outros países como  
Chile e Argentina, entre o período de 1965 e 1975” (Duarte, 2019, p. 10).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 633-653, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Internacionalização sob critérios hegemônicos: reflexões sobre a área de Serviço Social no CAPES-Print  
formação e trabalho profissional como resultado do Movimento de  
Renovação, especialmente a partir da vertente de Intenção de Ruptura com o  
Conservadorismo [...] (Duarte, 2019, p. 10, grifos nossos).  
Netto (2005) explica que este Movimento, mesmo interrompido pela forte censura que  
predominou no Cone Sul, com as sucessivas ditaduras apoiadas pelos Estados Unidos, deixou  
um legado decisivo para o Serviço Social latino-americano, que contribuiu para implementação  
da Pós-Graduação em Serviço Social no Brasil. Dentre este legado, ressaltamos como pontos  
importantes para pensarmos a internacionalização da área: a) a articulação de uma nova  
concepção de unidade latino-americana, partindo-se das problemáticas comuns da América  
Latina e da necessidade de uma “unidade construída autonomamente, sem as tutelas  
confessionais ou imperialistas” (Netto, 2005, p. 11); b) a interlocução crítica com as Ciências  
Sociais e o reconhecimento do pluralismo, inclusive admitindo as diferentes matrizes teórico-  
metodológicas da profissão; e, c) a valorização do estatuto intelectual da profissão, abrindo  
portas para a pesquisa na área e para o amadurecimento das investigações sobre a relação teoria-  
prática.  
O segundo acontecimento relevante para o Serviço Social se insere no processo de  
retomada do debate da Reconceituação: estamos nos referindo à construção do chamado Projeto  
Ético-Político do Serviço Social brasileiro, tendo como anos decisivos para sua construção as  
décadas de 1980 e 1990, período em que o Estado brasileiro, mediante forte apelo popular,  
retomou a institucionalidade democrático-burguesa. Superando o atrelamento das instâncias  
profissionais ao Regime Ditatorial, o Serviço Social brasileiro produziu uma virada em termos  
de direcionamento ético-político, teórico-metodológico e técnico-operativo.  
643  
O Serviço Social brasileiro passa a assumir, enquanto profissão e área de conhecimento,  
uma posição na qual assistentes sociais/docentes/estudantes devem se reconhecer enquanto  
parte da classe trabalhadora e, portanto, solidária às demandas e anseios populares. De acordo  
com Netto (2009), iniciou-se um processo mais substantivo de ruptura com os fundamentos  
conservadores que procuravam se aliar ao projeto de modernização dependente.  
Este processo aproximou o Serviço Social da crítica radical à sociabilidade capitalista e  
à dominação imperialista. Se na década de 1980 a intenção de ruptura encontrou  
inconsistências na sua perspectiva de construção de um novo projeto profissional, é importante  
demarcar que alcançou avanços importantes na década de 1990, consolidando sínteses  
profissionais fundamentais para direcionar sua atuação profissional e acadêmico-formativa. No  
âmbito político-institucional, Duarte (2017) destaca marcos legais fundamentais alcançados na  
década de 1990:  
Rafael Vieira Teixeira; Janaina Lopes do Nascimento Duarte  
O referido projeto perpassa e concretiza-se, do ponto de vista legal, no Código  
de Ética (1993), na Lei de Regulamentação da Profissão (Lei nº 8.662/1993),  
nas atuais Diretrizes Curriculares da Formação Profissional (1996), [...] dentre  
outros [...] esse conjunto contribui e compõe um “alicerce” sólido e  
progressista para o Serviço Social, resultando da luta da categoria profissional  
aliada à luta mais ampla da classe trabalhadora (Duarte, 2017, p. 189).  
Desse modo, o Serviço Social vem construindo um projeto profissional que se inspira em  
uma perspectiva progressista, aliada à classe trabalhadora e às suas lutas gerais. Reconhece, a  
partir de fundamentos teórico-metodológicos e ético-filosóficos, os limites da sociedade  
capitalista vigente, projetando a perspectiva de “construção de uma nova ordem societária.”  
(CFESS apud Duarte, 2017, p. 189). No âmbito acadêmico, a articulação entre escolas,  
docentes, discentes; o avanço da pós-graduação e da pesquisa; e as construções coletivas  
organizadas pela Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS),  
resultam do mesmo processo de construção.  
A maturidade acadêmica alcançada pelo Serviço Social encontra-se expressa  
pelo seu reconhecimento como área de conhecimento alcançado a partir de  
1980, com a expansão da pós-graduação stricto sensu. Destaca-se que os  
avanços na formação profissional em nível de pós-graduação [...] chancelam  
essa maturidade acadêmica, via produção de bibliografia consistente, crítica,  
vasta, plural e contemporânea (ABEPSS apud Mendes; Santos; Werlang,  
2017, p. 168).  
Ante o exposto, podemos afirmar que o Serviço Social brasileiro, enquanto área de  
conhecimento e enquanto profissão, almeja a solidariedade entre os povos e corrobora a  
perspectiva de que o conhecimento deve ser compartilhado multilateralmente. Isso significa  
que a internacionalização, como colaboração acadêmico-formativa é um valor contido no  
Projeto Ético-Político. Assim também, nas Diretrizes Gerais para o Curso de Serviço Social  
(ABEPSS, 1996, p. 11) defende-se a necessidade de “uma constante e atenta análise conjuntural  
da sociedade brasileira, em sua inserção internacional, tendo em vista o acompanhamento dos  
processos sociais em curso, geradores das múltiplas manifestações da questão social.” Na  
mesma direção, Leher e Santos (2023, p. 17), argumentam que a internacionalização da pós-  
graduação:  
644  
[...] não pode ignorar a centralidade dos problemas nacionais e, no plano  
mundial, dos problemas dos povos, como os desafios das mudanças  
climáticas, da soberania e da segurança alimentar, das novas pandemias e da  
superação de manifestações racistas e de outras discriminações, assim como  
da desigualdade social planetária.  
Portanto, a internacionalização na área de Serviço Social incorpora os processos sócio-  
históricos acima tratados. Isto é, as relações internacionais não se resumem à produção de  
conhecimentos, mas a incorporam. A noção de unidade latino-americana está presente na  
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Internacionalização sob critérios hegemônicos: reflexões sobre a área de Serviço Social no CAPES-Print  
própria construção do projeto profissional, vinculada a uma perspectiva de superação da  
dependência econômica, da heteronomia cultural, e do imperialismo total (Fernandes, 1976). A  
pesquisa e o propósito da cooperação internacional estão conectados aos princípios ético-  
políticos que incorporam uma agenda internacionalista com perspectiva de avanços das lutas  
gerais das classes trabalhadoras rumo à construção de uma nova ordem social, sem dominação  
e exploração.  
A pós-graduação da área de Serviço Social no Programa CAPES-Print: entre  
critérios hegemônicos e o internacionalismo ético-político  
De acordo com Garcia e Fernandez (2018), a partir da década de 1990 houve um  
crescimento significativo da pós graduação na área de Serviço Social no Brasil. As autoras  
mostram que até o final da década de 1980, a área possuía apenas 6 Programas de Pós  
Graduação (PPG’s) stricto sensu; entre 1980 e 1990 foram criados mais 6; e mais 15 na primeira  
década dos anos 2000. Atualmente, no início da terceira década do século XXI, a área conta  
com um total de 37 PPG’s no País, dos quais 22 ofertam cursos de mestrado e doutorado. Este  
crescimento da área 32 mostra-se compatível com o crescimento da pós-graduação em geral no  
Brasil. Dados da CAPES do ano de 2022 mostram que houve um crescimento de 37% no  
número de programas de excelência (conceitos 6 e 7) (CAPES, 2022), somando todas as áreas  
de conhecimento.  
645  
Com relação ao Programa CAPES-Print, dos 37 PPG’s da área, apenas 8 foram  
contemplados. O levantamento de dados desta pesquisa mostra que, dentre os PPG’s  
contemplados, o conceito CAPES dos referidos programas está entre 5 e 7, com predominância  
do conceito 6. Importante comentarmos que dois dos Programas da área, avaliados com  
conceitos 6 e 7, não participam do Print. Não podemos precisar as razões desta ausência, mas é  
fato que o CAPES-Print exigiu que a submissão de propostas vinculasse, no mínimo 4 PPG’s,  
através de um Plano Institucional Internacionalização. Isso significa que não seria possível a  
adesão individual de qualquer PPG, independente de seu conceito na CAPES. Ainda merece  
registro o fato de 2 PPG’s dá Área 32 com conceito 5 terem sido contemplados pelo Print,  
condizendo com a análise que fizemos na primeira seção sobre as condições institucionais.  
Então, o Print induziu interlocuções e aproximações entre distintas áreas de conhecimento  
de uma mesma instituição. A elaboração das propostas institucionais permitiu agregar PPG’s  
de áreas diversas através da proposição de temas/eixos comuns. Em cada tema, os PPG’s  
poderiam apresentar projetos próprios ou em conjunto com PPG’s de outras áreas. Isso significa  
que há projetos que agregam várias áreas em um mesmo tema.  
Rafael Vieira Teixeira; Janaina Lopes do Nascimento Duarte  
Percebemos, entretanto, que a associação por temas pode ser problemática. Algumas  
propostas institucionais para o Print envolveram muitas áreas em um mesmo tema, dificultando  
a nitidez sobre o papel de cada área na respectiva ação de internacionalização. Na Universidade  
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), por exemplo, o PPG em Serviço Social apresentou um  
projeto no tema sustentabilidade, crescimento e combate às desigualdades e, neste mesmo  
tema, estão mais 35 PPG’s, das mais diversas áreas8.  
Em síntese, há ricas possibilidades de interlocução e colaboração entre os PPG’s de uma  
mesma IES e de áreas afins, mas, por outro lado, devemos considerar que há uma ameaça a  
investigações específicos de algumas áreas, as quais podem ser diluídas ou esvaziadas em prol  
da captação de recursos para a internacionalização. Além disso, a hierarquia que se produz por  
meio dos rankings de avaliação tende a se reforçar neste formato, uma vez que programas com  
maiores conceitos devem “puxar a fila” na elaboração de temas e projetos submetidos a  
Programas como o Print.  
Outro aspecto importante revelado pela pesquisa é a significativa prevalência de  
universidades públicas dentre as contempladas pelo Print. Tanto no geral, quanto na área de  
Serviço Social, pelo menos dois terços das instituições são públicas estatais (Quadro 2). Este  
dado corrobora com Leher e Santos (2023), quando afirmam que, no Brasil, a maior parte da  
pesquisa de excelência é realizada nas universidades públicas, junto à pós-graduação.  
Considerando que o Print é financiado a partir do Orçamento Geral da CAPES9, isto é, com  
recursos públicos providos pelo Ministério da Educação, é essencial demarcar a importância da  
destinação de recursos públicos para o fortalecimento das instituições e serviços públicos.  
646  
8 Administração, Arquitetura, Artes Visuais, Astronomia, Ciências Contábeis, Comunicação, Direito, Economia da  
Industria e da Tecnologia, Educação, Educação em Ciências e Saúde, Engenharia Biomédica, Engenharia Civil,  
Engenharia de Produção, Engenharia de Sistemas e Computação, Engenharia de Transportes, Engenharia Elétrica,  
Engenharia Mecânica, Engenharia Metalúrgica e de Materiais, Engenharia Oceânica, Engenharia Química,  
Engenharia de Processos Químicos e Bioquímicos, Filosofia, Física, Informática, Letras (Ciência da Literatura),  
Letras (Letras Vernáculo), Letras Neolatinas, Linguística, Lógica e Metafísica, Matemática, Planejamento  
Energético, Planejamento Urbano e Regional, Psicossociologia de Comunidade e Ecologia Social, Urbanismo  
(UFRJ, 2018).  
9
Conforme o Edital 41/2017: “2. RECURSOS ORÇAMENTÁRIOS E FINANCEIROS 2.1. Os recursos  
destinados a este Edital, no presente exercício, correrão à conta da Dotação Orçamentária consignada no  
Orçamento Geral da Capes, previstas no Programa Institucional de Internacionalização, Fonte 0112 – Ação 0487  
– Concessão de bolsas de estudos no Ensino Superior. 2.2. As despesas nos exercícios subsequentes correrão à  
conta dos respectivos orçamentos, conforme legislação aplicável e de acordo com a disponibilidade orçamentária  
e financeira da Capes” (CAPES, 2017).  
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Internacionalização sob critérios hegemônicos: reflexões sobre a área de Serviço Social no CAPES-Print  
Quadro 2: Instituições no CAPES-Print por Natureza Jurídica.  
Nat. Jurídica  
Públicas  
Geral  
Serviço Social  
31  
86%  
14%  
6
75%  
Privadas  
Total  
5
2
8
25%  
36  
100%  
100%  
Fonte: Elaboração própria a partir de CAPES (2020b).  
Passando a outro aspecto da nossa análise, qual seja a distribuição regional, vemos que  
os critérios e indicadores do Print reforçam distorções causadas pelo desenvolvimento desigual  
no país. A alta concentração de Instituições de Ensino Superior (IES) e de Institutos de Pesquisa  
(IP) contemplados na Região Sudeste, seguido pela Região Sul, indica ausência de esforços no  
sentido de corrigir desigualdades regionais existentes na pós-graduação. No Quadro 3, vemos  
que pelo menos 75% das propostas financiadas pelo Print estão concentradas nas regiões  
Sudeste e Sul, seja em geral ou especificamente na Área 32. A esse respeito, concordamos com  
Leher e Santos (2023) quando criticam a aferição do mérito acadêmico a partir dos critérios  
adotados, considerando que estes tendem a reforçar desigualdades, e não o contrário.  
647  
A metodologia de cálculo exacerba a desigualdade, pois não basta ser  
excelente; é preciso alcançar percentual elevado de indicadores de instituições  
que já ocupam a liderança do ranking. A utilização da mesma métrica para  
aferir a influência internacional dos países a partir dos rankings apaga  
contrastes marcantes (Leher; Santos, 2023, p. 14, grifos nossos).  
Sobre os contrastes marcantes apagados por esta lógica, no Quadro 3 vemos que  
nenhuma instituição da região Norte brasileira teve proposta deferida pelo Print. Este é, sem  
dúvidas, um dado alarmante e preocupante. As instituições sediadas na Amazônia, uma região  
imensa e muito importante, não contam com recursos do Programa. Isso significa que o  
estímulo a parcerias internacionais em pesquisa e pós-graduação no Brasil reforçam contrastes  
regionais, ao invés de buscar corrigi-los.  
Rafael Vieira Teixeira; Janaina Lopes do Nascimento Duarte  
Quadro 3: Distribuição IES/IP no Print por Regiões Brasileiras (Geral e Área 32-Serviço Social).  
Região  
Geral  
Área 32  
25%  
8
20  
2
22%  
56%  
2
4
1
1
0
8
Sul  
50%  
12,50%  
12,50%  
0
Sudeste  
5,50%  
16,50%  
0
Centro Oeste  
Nordeste  
Norte  
6
0
36  
100%  
100%  
Total  
Fonte: Elaboração própria a partir de CAPES (2020b).  
Avançando na análise dos dados, notamos que a área de Serviço Social também  
acompanha a tendência geral requisitada pelo Print quanto à escolha de países para realização  
de parcerias internacionais. A maioria dos temas que envolvem PPG’s da área de Serviço Social  
no Print é realizada mediante projetos de cooperação com instituições sediadas em países  
considerados estratégicos/prioritários. A título de exemplo, aproximadamente 60% das ações  
que envolvem a área 32 no Print se conectam a instituições da Europa e da América do Norte  
(Quadro 4).  
Como consta na primeira seção deste artigo, dentre os requisitos para submissão de  
propostas ao Print, definiu-se que “[...] ao menos 70% dos recursos devem (sic) ser destinados  
às parcerias com instituições de países com os quais a Capes mantém cooperação efetiva  
(listados no Anexo I)” (CAPES, 2017, p. 5). No Quadro 1, vimos que o referido Anexo lista o  
que, de acordo com o Relatório de Execução do Print (2020b), seriam países estratégicos  
prioritários. A análise mostra que a maioria dos países estratégicos e prioritários são de  
desenvolvimento capitalista avançado, notadamente Europa Ocidental e Estados Unidos.  
A esse respeito, convém retomarmos brevemente uma discussão com base em Florestan  
Fernandes (1976; 2010) e em Leher e Santos (2023). Para Fernandes (1976) a forma de  
associação dependente do Brasil ao modelo de desenvolvimento adotado pelos países de  
desenvolvimento avançado no capitalismo implica uma permanente posição subordinada e  
heteronômica. Leher e Santos (2023) corroboram essa assertiva ao analisarem a associação  
dependente no âmbito das escolhas “estratégicas” em termos de internacionalização da  
educação superior:  
648  
[...] a internacionalização das universidades é indissociável das revoluções  
burguesas e dos projetos de futuro empreendidos pelos blocos de poder.  
Ignorar essas mediações é uma forma de negacionismo sobre o significado do  
sistema de Estados que conforma o imperialismo atual. É inequívoco que os  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 633-653, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Internacionalização sob critérios hegemônicos: reflexões sobre a área de Serviço Social no CAPES-Print  
indicadores [...] são congruentes com as práticas já estabelecidas nos países  
do núcleo hegemônico [...]. As experiências brasileiras possuem lastros  
virtuosos com as relações acadêmicas internacionais, mas são frágeis pelas  
bases heterônomas de tais interações (Leher; Santos; 2023, p. 17).  
Segundo Fernandes (2010, p. 216): “As Universidades nos países dependentes concorrem  
para preservar formas de subordinação cultural existentes (‘elos de assimilação à cultura  
hegemônica’) e propor adaptações mantenedoras da posição heterônoma [...]”. Assim,  
entendemos que a crítica à posição do país na geoeconomia política mundial é um pressuposto  
para se pensar a internacionalização sob uma perspectiva estratégica. Neste sentido, a  
internacionalização da pesquisa e da pós-graduação deve estar conectada às prioridades de  
desenvolvimento balizadas por um projeto nacional soberano, o que pressupõe como horizonte  
estratégico a superação da condição dependente e heterônoma.  
O que identificamos nos documentos elaborados no âmbito do Print, ao contrário disso,  
é a busca irrefletida de associação aos modelos de desenvolvimento hegemônicos. No  
Autodiagnóstico publicado pelo Grupo Gestor do Print em 2021, por exemplo, afirma-se que:  
“Maturidade científica e reputação de classe mundial constituem um importante e necessário  
passo para o domínio tecnológico e a soberania da nação brasileira no cenário internacional”  
(CAPES, 2021, sem paginação). Concordando com a análise de Leher e Santos (2023),  
entendemos que a mera busca pela reputação “world class university” pode se expressar  
contraditória e antagônica à expressão ‘passo para a soberania da nação brasileira em cenário  
internacional’.  
649  
Logo, nossa posição é de que a internacionalização da pós-graduação não deve privilegiar  
a cooperação com instituições sediadas em países centrais do capitalismo, como ocorre no Print.  
Na verdade, dever-se-ia considerar estímulos à cooperação solidária também com países  
periféricos e dependentes na geoeconomia política mundial. Da mesma forma, deve-se valorizar  
e priorizar a pesquisa em cooperação com Instituições da região Amazônica, por exemplo,  
adotando-se uma perspectiva de partilha e produção de conhecimento que não se reduzam às  
ilhas de excelência “de classe mundial”. Nas palavras de Leher e Santos (2023, p. 18, grifos  
nossos): “[...] mais do que associar a internacionalização da pós-graduação aos problemáticos  
rankings, uma estratégia exitosa de internacionalização deveria estar ancorada em projetos  
nacionais”.  
Rafael Vieira Teixeira; Janaina Lopes do Nascimento Duarte  
Quadro 4: Países Parceiros CAPES-Print (Área 32 - Serviço Social).  
Continente  
África  
Qt.  
Perc.  
Países  
2
6%  
África do Sul, Moçambique  
Norte  
3
1
4
8%  
3%  
Canadá, Estados unidos. México  
Cuba  
América  
Central  
Sul  
11%  
Argentina, Chile, Colômbia, Uruguai  
China, Coreia do Sul, Índia, Japão,  
Ásia  
6
17%  
49%  
Paquistão, Timor Leste  
Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca,  
Escócia, Espanha, Finlândia, França,  
Irlanda, Itália, Noruega, Países Baixos,  
Portugal, Inglaterra, Rússia, Suécia,  
Suíça  
Europa  
17  
Oceania  
Total  
2
6%  
Austrália, Nova Zelândia  
35  
100%  
Fonte: Elaboração própria com base em informações do CAPES-Print e dos PPG's da Área de Serviço Social.  
O Quadro 4 mostra que, nas ações da área de Serviço Social no Print, há parcerias com  
países além dos considerados prioritários. Isso pode indicar que a perspectiva internacionalista  
construída pelo Serviço Social se expressa como um aspecto de resistência, sobretudo em  
termos de uma solidariedade latino-americana. Observando os temas e projetos que incluem  
PPG’s da área 32, vemos que boa parte abrange países do Cone Sul, como Argentina, Chile e  
Uruguai. Em nosso entender, tais experiências se conectam ao lastro histórico recente da  
profissão em nível nacional e latino-americano. O quadro 4 mostra, também, que há parcerias  
com Cuba, e com China, Índia e África do Sul, integrantes dos BRICS10, o que sugere uma  
aproximação estratégica nos termos refletidos acima. Assim, acreditamos que a Área pode atuar  
ampliando e ressignificando o sentido “estratégico” e “prioritário” colocado pelo Edital do  
Print.  
650  
Ainda quanto às parcerias dos PPG’s da área 32, destacamos que um número considerável  
de países parceiros tem como primeiro idioma o português. Isso significa que o idioma tende a  
ser um fator que aproxima parcerias na área, representando também uma postura resistente e  
contra-hegemônica. De acordo com Knobel et al. (2020, p. 676), o idioma inglês é visivelmente  
prioritário nas ações de internacionalização hegemônicas, o que se coloca tanto como obstáculo  
10  
De acordo com sua página oficial: “O BRICS é um agrupamento formado por onze países membros: Brasil,  
Rússia, Índia, China, África do Sul, Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Indonésia e Irã.  
Serve como foro de articulação político-diplomática de países do Sul Global e de cooperação nas mais diversas  
áreas” (BRICS Brasil, 2024).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 633-653, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Internacionalização sob critérios hegemônicos: reflexões sobre a área de Serviço Social no CAPES-Print  
para o acesso a ações de internacionalização, haja vista os testes de proficiência, quanto, por  
consequência, como fator que acentua desigualdades.  
Em síntese, consideramos que as análises apresentadas sobre a internacionalização da  
área de Serviço Social no CAPES-Print indicam que os critérios do Programa prevalecem no  
sentido de direcionar os trabalhos de cooperação internacional, sob a perspectiva hegemônica  
de internacionalização. Por outro lado, observamos que a presença da área de Serviço Social é  
viva e latente, e que tende a conectar-se estrategicamente a princípios construídos pelo acúmulo  
coletivo da profissão, no sentido da solidariedade latino-americana e entre países de economia  
dependente, principalmente os de idioma lusófono. Diante do exposto, concordamos com a  
análise de Duarte (2020) de que é preciso problematizar a totalidade da profissão a partir da sua  
localização sócio histórica na sociedade capitalista dependente brasileira. Por isso,  
Há que se pensar na agenda da internacionalização para o Serviço Social  
considerando: as diferenças e as particularidades da profissão, incluindo, aqui,  
as diferentes concepções em nível mundial, sua trajetória e protagonismo  
histórico e teórico-metodológico na América Latina e no Caribe; as distinções  
com outras áreas; e suas experiências; a afinidade teórico metodológica  
crítica; os desafios atuais no campo das políticas sociais, dentre outros  
(Duarte, 2020, p. 105-106).  
Portanto, concluímos que, de forma crítica e reflexiva, é possível acreditar na  
contribuição estratégica da internacionalização realizada pela área de Serviço Social,  
entendendo que “a universidade só aparece e se afirma historicamente como ‘fator de  
desenvolvimento’, quando concorre para a negação e a superação desse status quo” (Fernandes,  
2010, p. 216).  
651  
Considerações Finais  
Neste artigo discutimos que a internacionalização da pós-graduação está conectada com  
a geoeconomia política e com as estratégias hegemônicas que tentam contornar a atual crise  
estrutural do capitalismo. Entendendo a particularidade brasileira enquanto uma economia  
dependente e analisamos que esta realidade repercute nas prioridades da CAPES para o fomento  
das ações de cooperação internacional. Assim, o Print tende a expressar a perspectiva  
hegemônica que não problematiza a condição dependente, o que distancia a possiblidade de se  
desenvolver ações de cooperação em sentido estratégico, visando a superação desta condição.  
Sobre o Serviço Social, enquanto área de conhecimento, enfatizamos que este agrega a  
herança ético-política e teórico-metodológica de sua construção histórica recente no Brasil.  
Com isso, analisamos que algumas ações de cooperação podem incorporar, crítica e  
estrategicamente, iniciativas importantes para uma perspectiva de internacionalização solidária  
Rafael Vieira Teixeira; Janaina Lopes do Nascimento Duarte  
e pautada no anseio por um projeto nacional de desenvolvimento autônomo e soberano.  
Todavia, é preciso reconhecer que estas iniciativas são subordinadas aos critérios do Print.  
Por fim, esperamos que o compartilhamento das aproximações de nossa pesquisa possa  
estimular outros estudos e reflexões que se debrucem sobre o tema da internacionalização no  
Serviço Social. Em especial estudos que, como o nosso, ressaltam o acúmulo da área em uma  
direção estratégica e internacionalista do trabalho em cooperação.  
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Serviço Social, transformações no trabalho e  
desafios ético-políticos: uma análise  
comparativa Brasil-Itália  
Social Work, transformations in work and ethical-political challenges:  
a comparative analysis between Brazil and Italy  
Salyanna de Souza Silva*  
Gisele Caroline Ribeiro Anselmo**  
Francesca Cubeddu***  
Resumo:  
O
presente artigo analisa as  
Abstract: This article analyses recent  
transformations in the labour market of social  
workers, highlighting the differences between  
Brazil and Italy with regard to the processes of  
precarisation and flexibilisation of labour  
relations under the aegis of neoliberalism. The  
objective is to present preliminary reflections  
identified during a comparative research project  
resulting from exchanges between social  
workers, lecturers, and students of Social Work  
from Brazilian and Italian universities. To this  
end, field research was conducted in both  
contexts, including the administration of  
questionnaires and interviews with social  
workers and “privileged observers”. By  
examining the impact of changes in the world of  
work and their repercussions on the practice of  
social workers within the field of social  
assistance policy, we observed the expansion of  
a process of “outsourcing of social services” on  
a global scale. In this dynamic, although  
professionals are formally hired by the State,  
their employment relations and responsibilities  
are increasingly subordinated to social  
organisations, revealing the tensions between  
market logic and the ethical-political project of  
the profession.  
transformações recentes no mercado de trabalho  
das assistentes sociais, destacando as diferenças  
entre Brasil e Itália no que se refere aos  
processos de precarização e flexibilização das  
relações laborais sob a égide do neoliberalismo.  
O objetivo é apresentar reflexões preliminares  
identificadas no percurso de uma pesquisa  
comparativa fruto do intercâmbio entre  
assistentes sociais, docentes, estudantes de  
Serviço Social de universidades brasileiras e  
italianas. Para tanto, foi realizada uma pesquisa  
de campo em ambas as realidades, incluindo  
aplicação de questionários e realização de  
entrevistas com assistentes sociais  
e
“observadores privilegiados”. Ao examinar o  
impacto das mudanças no mundo do trabalho e  
suas reverberações na atuação das/os assistentes  
sociais no âmbito da política de assistência  
social, notamos o crescimento de um processo  
de “externalização dos serviços sociais” a nível  
mundial.  
Nessa dinâmica, embora os/as  
profissionais sejam contratados/as pelo Estado,  
os vínculos e atribuições estão cada vez mais  
subordinados  
evidenciando o tensionamento entre a lógica  
mercantil e o projeto ético-político da profissão.  
caracteres); resumo português.  
às  
organizações  
sociais,  
* Universidade Federal do Espírito Santo. E-mail: salyanna.silva@ufes.br  
** Universidade Federal da Paraíba. E-mail: gisele.anselmo@academico.ufpb.br  
*** Università degli Studi di Salerno. E-mail: francesca.cubeddu@irpps.cnr.it  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.49437  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 24/07/2025  
Aprovado em: 12/12/2025  
Serviço Social, transformações no trabalho e desafios ético-políticos: uma análise comparativa Brasil-Itália  
Palavras-chaves: Trabalho; Transformações  
societárias; Trabalho do/a assistente social;  
Política Social; Projeto ético-político.  
Keywords: Labour; Societal transformations;  
Social worker’s labour; Social policy; Ethical-  
political project.  
Introdução  
Nas últimas décadas, o mundo do trabalho tem passado por profundas transformações  
estruturais, marcadas pela ofensiva do capital sobre os direitos historicamente conquistados  
pela classe trabalhadora. O avanço do projeto neoliberal em escala global tem promovido  
reconfigurações nas formas de contratação, nas relações entre Estado e sociedade civil e na  
organização dos serviços públicos, impactando diretamente a atuação profissional em distintas  
áreas. A intensificação da lógica de mercadorização da vida social e a crescente externalização  
das políticas públicas resultam na precarização dos vínculos laborais e no enfraquecimento do  
papel do Estado como garantidor de direitos. Nesse cenário, profissões que atuam diretamente  
na mediação das expressões da questão social, como o Serviço Social, são desafiadas a  
responder às contradições de um contexto em que o próprio sentido do trabalho e da intervenção  
pública é colocado em disputa.  
O presente artigo tem como objetivo apresentar reflexões preliminares identificadas no  
percurso da pesquisa “Trabalho profissional, precarização e Projeto Ético-Político: uma análise  
entre as/os assistentes sociais de Vitória e Roma” (2022-2025)1. Iniciada em setembro de 2021,  
e concluída em setembro de 2025, a investigação resulta do intercâmbio entre assistentes  
sociais, docentes, bolsistas de Iniciação Científica e estudantes de Serviço Social vinculados/as  
a universidades brasileiras e italianas.2  
655  
A pesquisa realizou um estudo comparativo entre Brasil e Itália sobre as transformações  
contemporâneas no trabalho profissional, com ênfase nos processos de precarização,  
intensificados no contexto de aprofundamento das ofensivas do neoliberalismo. Buscou-se,  
com isso, analisar as repercussões ético-políticas dessas transformações na atuação de  
assistentes sociais nos dois países.  
Adota-se como fundamento teórico-metodológico o materialismo histórico-dialético,  
buscando realizar o estudo comparativo do desenvolvimento da profissão em contextos  
1 Além das bolsas de Iniciação Científica (IC) concedidas pelo Programa Institucional de Iniciação Científica  
(PIIC) da UFES, a referida pesquisa contou com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do  
Espírito Santo (FAPES) e da Pro- Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação para realização de visita técnico-científica  
na Itália no primeiro semestre de novembro de 2022.  
2 O presente artigo retoma considerações e elementos apresentados no trabalho “Serviço Social e a precarização  
do trabalho: um estudo do contexto brasileiro e italiano” publicado no XVII CBAS, do qual fizeram parte além  
das autoras deste artigo, as autoras Larisse Nunes e Rosinei Ferreira de Jesus.  
Salyanna de Souza Silva; Gisele Caroline Ribeiro Anselmo; Francesca Cubeddu  
socioeconômicos e históricos distintos. Parte-se da compreensão de que “tal metodologia não  
se limita a identificar as semelhanças e diferenças entre os fenômenos, mas abrange a  
explicação do porquê de elas ocorrerem ou o que faz com que o comportamento da parte seja  
diverso (Carvalho, 2014, p. 139).  
A pesquisa adotou uma abordagem de métodos mistos, incorporando elementos das  
abordagens quantitativa e qualitativas. Em acordo com John W. Creswell e J. David Creswell  
(2021) essa integração entre as duas diferentes abordagens “gera uma compreensão que vai  
além das informações fornecidas pelos dados quantitativos ou qualitativos isoladamente” (p.  
4), não se restringindo, portanto, a um plano metodológico rigidamente prescrito.  
A partir do objetivo geral, foram realizadas pesquisa bibliográfica e de campo junto aos  
profissionais de Serviço Social, com o intuito de analisar as atuais transformações relacionadas  
à precarização do trabalho e suas implicações ético-políticas na atuação de assistentes sociais  
que trabalham nas políticas de assistência social da cidade de Vitória (Brasil) e Roma (Itália).  
A pesquisa empírica foi conduzida em duas etapas, a saber: 1) aplicação de um questionário  
composto por questões abertas e fechadas; 2) realização de reuniões para socialização dos dados  
brutos coletados, bem como escuta das demandas e sugestões apresentadas por as/os assistentes  
sociais que atuam nos Centros de Referência da Assistência Social (CRAS), em Vitória, e nos  
Segretariato Sociale em Roma.  
656  
Destacamos que os procedimentos éticos referentes a pesquisa com seres humanos  
foram seguidos em todas as fases do presente estudo, atendendo assim as normativas éticas  
vigentes nos países envolvidos. A coleta de dados em Vitória foi iniciada somente após  
aprovação junto à Comissão de Pesquisa da Secretaria Municipal de Assistência Social  
(SEMAS) da Prefeitura de Vitória e do Comitê de Ética em Pesquisa da UFES (CAAE  
52697421.9.0000.5542). Essa etapa ocorreu entre os meses de fevereiro a abril de 2022. Ao  
todo, foram obtidos 25 questionários, o que corresponde a um total de 69,5% do universo de  
profissionais convidados/as. Vale sinalizar que obtivemos a resposta de representantes dos 12  
CRAS do sinalizado município mencionado.  
Além da coleta por meio de questionários, foram obtidos dados qualitativos por meio  
do contato direto com as profissionais durante a realização de um curso de extensão, no qual  
foram apresentados os dados preliminares da pesquisa e registradas falas das participantes.3  
3 O curso de extensão intitulado “Dimensões éticas e pedagógicas do Serviço Social: contribuições para um debate  
internacional” foi realizado entre abril e junho de 2023 com carga horária de 40 horas, teve como objetivo  
apresentar os dados de Vitória obtidos na pesquisa bem como fomentar o debate crítico sobre as condições de  
trabalho e atuação profissional das/os assistentes sociais.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 654-671, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço Social, transformações no trabalho e desafios ético-políticos: uma análise comparativa Brasil-Itália  
No caso da cidade de Roma (Itália), a coleta de dados foi precedida por solicitação  
formal de autorização. Inicialmente, o link do questionário foi enviado via Posta Elettronica  
Certificata (PEC) a cada coordenador/a dos Segretariati Sociali dos 15 municípios romanos.  
No entanto, não houve retorno substancial4: apenas cinco assistentes sociais responderam ao  
instrumento, sendo duas do Município I e uma de cada um dos Municípios VI, IX e XV. Diante  
da baixa adesão, optou-se por organizar um grupo focal de discussão com assistentes sociais  
dos Segretariati Sociali dos municípios de Roma. O encontro foi realizado em novembro de  
2022, no Istituto per gli Studi sui Servizi Sociali (ISTSSS), ocasião em que foram discutidos os  
processos de precarização do trabalho profissional nos dois países, a partir da apresentação dos  
dados obtidos em Vitória/ES. Nessa ocasião, também foi possível obter informações mais  
detalhadas sobre a realidade do trabalho das/dos profissionais em Roma.  
Adicionalmente, foi realizada uma entrevista em profundidade com um “observador  
privilegiado”: o professor universitário Marco Burgalassi, docente da Università degli Studi  
Roma Tre, diretor do Curso de Graduação em Serviço Social e membro do Conselho de  
Assistentes Sociais de Roma. Reconhecido estudioso do trabalho profissional e do sistema de  
Welfare italiano, o docente contribuiu com importantes reflexões acerca da atuação profissional  
no contexto de precarização e das respostas institucionais às transformações do mundo do  
trabalho. Foi possível investigar as dimensões do trabalho dos assistentes sociais e o impacto  
da emergência de saúde da Covid-19.  
657  
O presente artigo organiza-se em três partes. Na primeira, são analisados os elementos  
históricos, políticos e econômicos que conformam as características do mercado de trabalho  
nos contextos brasileiro e italiano, com ênfase nas transformações decorrentes do avanço do  
neoliberalismo e seus efeitos nas condições de trabalho das/dos assistentes sociais. A segunda  
parte dedica-se à análise dos impactos dessas transformações para o Serviço Social nos dois  
países, considerando os efeitos sobre as práticas profissionais, os discursos institucionais e os  
desafios cotidianos enfrentados pelas/os assistentes sociais, evidenciando tanto as semelhanças  
quanto as especificidades de cada realidade nacional. Por fim, na terceira parte, são  
apresentadas as considerações finais, com reflexões sobre os principais pontos discutidos ao  
longo do texto, à luz do projeto ético-político da profissão.  
4 Acreditamos que um dos elementos que explica a dificuldade aos Secretariados romanos seja a vastidão do  
território e o número de municípios (15 municípios) em Roma, que são tão grandes quanto uma cidade. Roma, de  
fato, tem uma população de 2.813.544 habitantes distribuídos em 15 municípios. Para obter dados, consulte:  
Salyanna de Souza Silva; Gisele Caroline Ribeiro Anselmo; Francesca Cubeddu  
Precarização do trabalho e neoliberalismo no Brasil e na Itália  
Nas últimas décadas, tem-se observado um intenso processo de reestruturação no  
âmbito do Estado e da economia, inserido em um movimento de alcance mundial orientado pela  
lógica neoliberal. Tal dinâmica tem se expressado por meio da privatização de bens e serviços  
públicos, da negação de direitos sociais e trabalhistas, da retração das políticas sociais e da  
crescente desregulamentação e flexibilização das relações de trabalho.  
Enquanto projeto econômico e político, o neoliberalismo visa potencializar a “liberdade  
individual”, entendendo esta como incompatível com a justiça social. Logo, as políticas  
keynesianas que se baseiam no estimulo à intervenção do Estado na economia, são satanizadas.  
O centro da perspectiva neoliberal passa a ser o estado de liberdade individual, ou seja, o  
indivíduo na sua procura unicamente singular está concomitantemente contribuindo para o  
interesse de toda a sociedade, trata-se aqui da defesa da perspectiva de mão invisível de Adam  
Smith. (Mustafá; Silva; Anselmo, 2018).  
Ao serem generalizadas e impulsionadas por órgão supranacionais, com destaque para  
Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial e Organização para a Cooperação e  
Desenvolvimento Econômico (OCDE), as medidas neoliberais promoveram uma verdadeira  
destruição econômica e social principalmente nos países ex-União Soviética e do Sul Global.5  
Associado a tal processo temos também o movimento de flexibilização. Para Ricardo  
Antunes (2013), a partir da década de 1970, emerge a era da acumulação flexível, com base no  
Toyotismo, como resposta à crise estrutural do capital. Inicia-se, assim, um intenso processo  
de reestruturação da produção e do trabalho em escala mundial. A terceirização, a  
informalidade e a flexibilização passam a compor a dinâmica predominante das relações de  
trabalho no capitalismo contemporâneo.  
658  
Ainda segundo Antunes (2013), a lógica desse modelo reside na redução do proletariado  
estável e na ampliação, no interior das plantas produtivas modernas, de formas de trabalho  
precarizado, como jornadas parciais (part-time), contratos temporários, terceirizações e  
vínculos marcados pela instabilidade. Soma-se a isso o crescimento do desemprego estrutural.  
Exige-se dessas(es) trabalhadoras(es) níveis cada vez mais elevados de qualificação  
profissional para executar múltiplas funções cada vez mais complexas, frequentemente  
mediadas pelas novas máquinas informatizadas de maior incremento tecnológico.  
Para Claudia Nogueira (2013), no período pós-1970, observa-se também um processo  
de feminização do trabalho, com uma intensificação da inserção das mulheres no mercado de  
5 Para maiores aprofundamentos sobre a trajetória histórica do neoliberalismo sugerimos Mustafá, Silva e Anselmo  
(2018).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 654-671, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço Social, transformações no trabalho e desafios ético-políticos: uma análise comparativa Brasil-Itália  
trabalho. No entanto essa inserção ocorre majoritariamente por meio de ocupações precárias,  
marcadas por acentuada exploração. A autora destaca a existência de uma divisão sociossexual  
do trabalho, um fenômeno histórico que se transforma de acordo com determinado período e é  
diferenciado a depender da sociedade a qual faz parte. Na sociedade capitalista, o trabalho  
doméstico fica sob responsabilidade das mulheres, tanto quando exercido de forma remunerada  
ou não.  
Ainda segundo Nogueira (2013), a divisão sociossexual do trabalho expressa uma  
hierarquia de gênero que contribui para a desqualificação e desvalorização do trabalho  
feminino, tanto no âmbito produtivo quanto no reprodutivo  
Ao compreendermos esse movimento geral do capital, buscamos, neste artigo,  
aproximar-nos de determinadas expressões da particularidade brasileira e italiana. Partimos do  
pressuposto de que, para realizar um estudo comparativo sobre as características do trabalho  
assalariado, é fundamental analisar os elementos históricos, políticos, econômicos e sociais que  
repercutem no movimento histórico-dialético da realidade em cada realidade nacional.  
Nosso objetivo não é meramente compor um “quadro comparativo” entre as condições  
de trabalho do Serviço Social no Brasil e na Itália, mas compreender os fatores estruturais e  
conjunturais que influenciaram o desenvolvimento dessas particularidades.  
Neste sentido, Edneia Alves Oliveira (2017) sinaliza que embora Brasil e Itália ocupem  
posições diferentes na divisão internacional do trabalho, é possível identificar algumas  
características comuns em seus processos históricos. No âmbito da formação no Estado, ambos  
os países compartilham a ausência de uma revolução burguesa clássica, a persistência de  
disparidades regionais marcantes e a presença de um forte fisiologismo na condução das  
políticas sociais. Oliveira (2017, p. 2) destaca ainda a “implementação do ideário neoliberal e  
as mudanças em curso orquestradas para adequar a legislação trabalhista ao novo processo  
organizativo”  
659  
Segundo a referida autora, o mercado de trabalho italiano sempre apresentou como  
característica histórica a proteção ao/à trabalhador(a), resultado do pacto keynesiano/fordista  
pós-Segunda Guerra e da luta do movimento sindical operário6. Um exemplo emblemático é a  
Caixa Integração de Ganhos Ordinária (Cassa Integrazione Guadagni Ordinaria - CIGo),  
criada na década de 1980, considerada como uma política social mais difundida e generosa na  
Europa.  
6 Cabe evidenciar a importante influência do Partido Comunista Italiano (PCI) para o movimento operário, dentre  
as ações mais conhecidas podemos destacar os Conselhos de Fábrica que nascem em Turim no ano de 1919 sob  
liderança de Antônio Gramsci.  
Salyanna de Souza Silva; Gisele Caroline Ribeiro Anselmo; Francesca Cubeddu  
No caso brasileiro, Josiane Soares Santos (2012) enfatiza o caráter periférico e  
retardatário do capitalismo nacional, acentuado pelo imperialismo e pelos processos de  
concentração e centralização de capital próprios do capitalismo em seu estágio monopolista.  
Destarte, as relações sociais e de trabalho no país conformaram-se de maneira “não clássica”,  
com uma burguesia nacional que recorre constantemente à lógica da “revolução passiva”.  
Assim, o mercado de trabalho no Brasil se constituiu a partir de elementos particulares  
da sua formação social. Santos (2012) afirma que o capitalismo brasileiro não se desenvolveu  
um modelo clássico de padrão "fordistas/keynesianista”, o que resultou na prevalência da  
“flexibilidade estrutural e a precarização das ocupações como características históricas do  
regime de trabalho” (Santos, 2012, p. 232).  
A autora também destaca que o passado colonial-escravista e a ausência de uma  
“ruptura” real entre a burguesia nacional e os setores aristocráticos e elitistas, contribuíram para  
a conformação de uma sociedade que tem o racismo como um elemento estrutural. Mesmo após  
a abolição da escravidão, a população negra não foi imediatamente transformada em  
trabalhadores(as) assalariados(as). Ao contrário, o Estado nacional priorizou à imigração  
europeia, promovendo um projeto de branqueamento da população brasileira e a consequente  
marginalização dos/as trabalhadores/as negros/as, elementos presentes até os dias de hoje, seja  
na sociedade que na constituição do mercado de trabalho nacional (Santos, 2012, p. 138).  
Ao trazer elementos históricos e econômicos da formação das classes sociais no Brasil,  
Clóvis Moura (2019) analisa o racismo como componente estruturante e segregador da  
sociedade brasileira. Segundo o autor, a população negra ex-escravizada, mesmo após a  
abolição da escravidão, não foi incorporada ao trabalho assalariado automaticamente, mas foi  
relegada às formas mais aviltantes de trabalho e às piores condições de moradias. Como destaca  
Moura (2019, p. 103):  
660  
Assim como a sociedade brasileira não se democratizou em suas relações  
sociais fundamentais, também não se democratizou em suas relações raciais.  
Por essa razão, aquela herança negativa que vem da forma como a sociedade  
escravista teve início e se desenvolveu, ainda tem presença no bojo da  
estrutura altamente competitiva do capitalismo dependente que se formou em  
seguida (Moura, 2019, p. 103).  
Nesse sentido, enquanto Oliveira (2017, p. 21) observa que, na Itália, o mercado de  
trabalho historicamente contou com certa proteção social, no Brasil, ao contrário, os processos  
de precarização e flexibilização sempre foram elementos estruturais. Conforme suas palavras:  
Na Itália há uma tendência de precarização contínua, mas ainda com  
determinada proteção social, o que considero uma precarização protegida,  
enquanto no Brasil o que assistimos é uma ausência de direitos sociais e  
trabalhistas revelando uma precarização desprotegida (Oliveira, p. 252).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 654-671, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço Social, transformações no trabalho e desafios ético-políticos: uma análise comparativa Brasil-Itália  
Mais recentemente com a adoção do neoliberalismo a nível mundial, observa-se o  
acirramento dos processos de exploração e de perda de direitos nos dois contextos nacionais  
analisados. A partir do final dos anos de 1980, a Itália começa a adotar medidas de flexibilização  
e precarização das relações de trabalho, com o objetivo de atender às exigências do Tratado de  
Maastricht (1992)7 e garantir sua inserção no bloco da União Europeia. Segundo Oliveira  
(2017), o neoliberalismo italiano apresentou contornos mais suaves, em comparação àquele  
brasileiro, mas foi igualmente caracterizado pela liberalização do mercado financeiro, pela  
adoção de diversas contrarreformas nas políticas sociais e pela flexibilização da legislação  
trabalhista. Destaca-se ainda que tais medidas aconteceram principalmente durante os governos  
de Silvio Berlusconi, sob a influência de grupos e partidos de extrema-direita, como a Lega  
Nord.  
Dentre os marcos legais desse processo, destaca-se o chamado “Pacote Treu”, de 1997,  
que representou uma inflexão normativa no sentido da flexibilização do mercado de trabalho  
italiano. Em 2003, a Lei nº 30 aprofundou esse caminho, ao instituir novas tipologias contratuais  
e multiplicar as formas de trabalho parcial e precarizado.  
No Brasil, o movimento não foi diferente. Desde a promulgação da Constituição Federal  
de 1988, observa-se um processo de mudanças constitucionais “pelo alto”, principalmente via  
aprovação de Emendas Constitucionais e Medidas Provisórias. Nos anos 1990, durante o  
governo de Fernando Henrique Cardoso, consolidou-se a implementação do receituário  
neoliberal definidos desde o Consenso de Washington (1989). Como destaca Netto (2012, p.  
417), o projeto neoliberal fundamentava-se em três eixos principais: a “flexibilização” da  
produção e das relações de trabalho; a "desregulamentação" das relações comerciais e dos  
circuitos financeiros; e, da "privatização" do patrimônio estatal, que seguiram as orientações do  
Banco Mundial (BM) e do Fundo Monetário Internacional (FMI). Mesmo nos governos de  
esquerda do Partido dos Trabalhadores (PT), durante as gestões dos governos de Luiz Inácio  
Lula da Silva e Dilma Rousseff, assistimos a uma continuação da implementação de políticas  
que refletiam o ideário neoliberal, embora com características diferenciadas em comparação  
aos governos anteriores.  
661  
No contexto do governo ilegítimo de Temer, foi aprovada a Lei nº 13.429/2017,  
conhecida como contrarreforma trabalhista. Seus efeitos sobre a classe trabalhadora têm se  
mostrado as mais nefastas possíveis, aprofundando a precarização das relações de trabalho. Para  
7
O Tratado de Maastricht estabeleceu medidas a serem adotadas pelos países europeus em consonância com o  
Consenso de Washington (1989), a adoção do Euro subordina a economia nacional dos países europeus aos ajustes  
propostos pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) (Oliveira, 2017, p. 78).  
Salyanna de Souza Silva; Gisele Caroline Ribeiro Anselmo; Francesca Cubeddu  
Martins, Feres e Beluzzi (2017), essa normativa se estrutura a partir de quatro diretrizes  
principais: (1) a supremacia das negociações diretas entre empregados e empregadores sobre as  
normas trabalhistas, ou seja, a primazia do negociado sobre o legislado; (2) a ampliação a  
ampliação das possibilidades de terceirização, incluindo atividades-fim e atividades-meio; (3)  
a flexibilização dos contratos e das jornadas de trabalho, com modalidades ajustáveis; e (4) a  
imposição de limites ao acesso e à atuação da Justiça do Trabalho.  
Em pouco tempo após a entrada em vigor da referida legislação, observaram-se  
aumentos dos indicadores de desemprego e subemprego, bem como o crescimento da  
informalidade nas contratações e a supressão de direitos historicamente conquistados. Dados  
do IBGE (2020) sinalizam que, entre os anos de 2012 e 2014, houve um aumento de 7,3% nas  
ocupações formais. Contudo, no período de 2017 a 2019, tal aumento ocorreu nas ocupações  
informais, com variação de 6,1%. Para Passos e Lupatini (2020), o avanço da informalidade  
não apenas compromete a estabilidade das relações de trabalho, como também reduz o acesso  
da classe trabalhadora aos direitos assegurados pela seguridade social, especialmente no que se  
refere às políticas públicas de saúde e previdência social8.  
Dilemas da profissão em tempos de generalização da precarização do trabalho.  
O surgimento do Serviço Social enquanto profissão está diretamente associado ao  
momento histórico em que as multifacetadas refrações da “questão social” passaram a ser objeto  
de intervenção por parte de legislações e políticas sociais. Conforme analisa Netto (2001), esse  
processo ocorre no marco do desenvolvimento do Estado monopolista.  
662  
Enquanto trabalhadoras(es) assalariadas(os), mediadas(os) pelo mercado de trabalho,  
assistentes sociais têm a compra e venda de sua força de trabalho intermediada pela relação  
dinheiro/salário. Nesse sentido, segundo Raichelis (2020), as/os assistentes sociais, na condição  
de integrantes da classe trabalhadora, estão igualmente submetidas(os) aos processos de  
degradação das relações laborais e de violação de direitos que atingem o conjunto da classe  
trabalhadora. Iamamoto (2008) destaca entre esses processos a alienação, a precarização dos  
vínculos de trabalho e a degradação do próprio local institucional de atuação, principalmente,  
no âmbito do setor público.  
8Sobre as demais políticas sociais destacamos duas outras grandes contrarreformas, são a Emenda Constitucional  
(EC) 95/2016, que instituiu um novo regime fiscal com limite para os gastos da União para as próximas duas  
décadas, e a EC nº 103/2019 logo no primeiro ano do (des)governo de Jair Bolsonaro, que expressou uma  
verdadeira perda de direitos previdenciários.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 654-671, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço Social, transformações no trabalho e desafios ético-políticos: uma análise comparativa Brasil-Itália  
Outro elemento que reverbera no desenvolvimento da profissão em cada país são  
aqueles relacionados a seu objeto e principal lócus de atuação: as respostas historicamente  
construídas às multifacetadas expressões da “questão social”.  
No tocante ao Serviço Social brasileiro, Raichelis (2020) evidencia que novas formas  
de trabalho e contratação tendem a tornar-se cada vez mais frequentes. Assistentes Sociais  
passam a ser recrutadas por meio de realização de pregões, por intermédio de “cooperativas de  
trabalhadores, trabalho temporário, empresas de prestação de serviços internos e externos, e  
principalmente as chamadas PJs (personalidade jurídicas)” (Raichelis, 2020, p. 25).  
A autora sublinha que as transformações do “mundo do trabalho” deixaram de ter  
caráter residual para assumir um papel central e generalizado, alcançando diferentes campos de  
atuação. Essas mudanças ocorrem não apenas no âmbito empresarial, mas também no interior  
das organizações estatais, com repercussões diretas para o significado da profissão, suas  
atribuições, competências, respostas profissionais e implicações éticas.  
As repercussões da reestruturação produtiva e da generalização da precarização no  
trabalho da/o assistente social podem se expressar na intensificação do tempo de trabalho, na  
rotinização das atividades, na padronização dos processos de intervenção, no fortalecimento de  
mecanismos de controle dos serviços e benefícios, bem como na crescente burocratização das  
atividades desempenhadas. (Raichelis, 2020, p. 33).  
663  
Assim como no Brasil, na Itália o Serviço Social também é reconhecido com uma  
profissão regulamentada, respaldada pela Lei nº 84, de 23 de março de 1993. Possui caráter  
autônomo e está estruturado em torno de conselhos profissionais em nível nacional e regional.  
O atual Código Deontológico do Serviço Social italiano foi lançado em 20209.  
Os/as assistentes sociais italianos/as são organizados/as em dois registros; Seção A e  
Seção B. A Seção A abrange os/as profissionais que cursaram o mestrado profissional em  
Serviço Social e Políticas Sociais10, enquanto a Seção B corresponde àqueles/as com formação  
trienal em Serviço Social (três anos)11. O exercício legal da profissão exige aprovação no  
Exame de Ordem e inscrição no respectivo Conselho Regional. De modo geral, os/as  
profissionais da Seção A tendem a ocupar cargos de gestão e administração, além de  
9 Sobre o debate dos fundamentos do Serviço Social brasileiro e italiano vide o artigo de Silva (2020) e Anselmo  
e Silva (2021).  
10Curso de pós-graduação com a duração de dois anos, assim como os mestrados acadêmicos brasileiros (classe  
LM-87 — Laurea Magistrale in Servizio Sociale e Politiche Sociali).  
11Curso de graduação que após a reforma universitária de unificação do sistema de ensino superior europeu  
(Declaração de Bolonha, 1999) passou a ter a duração de três anos, assim como todos os demais cursos de  
graduação na União Europeia (classe: L-39 — Laurea triennale in Servizio Sociale).  
Salyanna de Souza Silva; Gisele Caroline Ribeiro Anselmo; Francesca Cubeddu  
apresentarem, frequentemente, maior tempo de atuação e experiência laboral em comparação  
àqueles/as da Seção B.  
Uma pesquisa realizada em 2010 sobre o trabalho das assistentes sociais da Região de  
Lácio evidenciou que os vínculos laborais da Seção B são significativamente mais precarizados  
em relação aos/as profissionais da Seção A. Como destaca Burgalassi (2012, p. 37):  
A seção A, se diferencia pela presença muito consistente de trabalhadores a  
tempo indeterminado (78,6%), sobretudo na faixa etária de 50 a 59 anos  
(50%), e uma porcentagem modesta, 8,9%, de precarizados (assistentes  
sociais com contrato a tempo determinado) (...). Na seção B, pelo contrário, a  
análise associada das duas características evidencia uma situação  
completamente diferente a respeito da seção A, evidenciando as dificuldades  
dos jovens assistentes sociais a entrarem no mundo do trabalho e/ou de ter  
condições trabalhistas mais estáveis (Burgalassi, 2012, p. 37, tradução nossa).  
Conforme observado no item anterior, notamos que tal dado dialoga com a realidade  
nacional italiana, na qual as recentes contrarreformas neoliberais realizadas foram no sentido  
de generalizar os vínculos de trabalho precarizados, impactando principalmente entre mulheres  
e jovens.  
Ao analisar o exercício profissional frente à crise do chamado “Welfare italiano”,  
Burgalassi (2012, tradução nossa) afirma que o Serviço Social é uma profissão particularmente  
sensível à crise societária vivenciada atualmente. Diante uma fase de graves dificuldades  
socioeconômicas, a/o assistente social enfrenta uma dupla dificuldade: de uma parte, se depara  
com o aumento de demandas consideradas já tradicionais da realidade italiana, somadas a novas  
formas e situações de vulnerabilidades específicas do atual cenário; de outra parte, deve atuar  
em um quadro caracterizado pela redução dos recursos e serviços públicos.  
664  
Na Itália, assim, os assistentes sociais se encontram atualmente de frente a um  
desafio. Por definição, o mandato do Serviço Social é aquele de promover o  
bem-estar das pessoas e da comunidade e nos últimos anos a eficácia das suas  
ações foi fortalecida (...). Porém, em um cenário no qual começam a delinear-  
se os efeitos de uma inversão de tendências, o trabalho dos profissionais se  
confronta com carências, dificuldades e obstáculos que podem condicionar e  
comprometer suas orientações e operacionalizações (Burgalassi, 2012, p. 20,  
tradução nossa).  
Nesse sentido, durante a entrevista com o observador privilegiado, foi destacado que,  
embora nas últimas duas décadas tenha havido um avanço na valorização do Serviço Social e  
no reconhecimento da profissão dentro da rede de proteção social, (devido aos avanços no  
âmbito de legislação e normatização como vimos no item anterior12), tal processo não implicou,  
necessariamente, um aumento efetivo do número de profissionais no sistema público.  
12 Vale sinalizar para Lei 178/2020 (Lei Orçamentária para 2021), que em seu artigo 1º, parágrafo 797 e seguintes,  
previa um número definido de assistentes sociais por número de habitantes, especificamente um trabalhador para  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 654-671, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço Social, transformações no trabalho e desafios ético-políticos: uma análise comparativa Brasil-Itália  
(..) isto é, o número de assistentes sociais que trabalham dentro do sistema  
público não cresceu muito, enquanto a componente de assistentes sociais que  
trabalham no terceiro setor por sua vez cresceu muito, porque os atores  
institucionais, o sistema público, o Estado, as Regiões, as Comune13 cada vez  
mais delegam ao terceiro setor a realização dos serviços. Dessa forma, os  
serviços são ainda financiados pelos Comune e pelos sujeitos públicos, mas  
são cada vez mais realizados dos sujeitos externos, pelas organizações  
externas. Logo, tivemos um crescimento complexivo no sistema dos serviços,  
um crescimento da componente dos assistentes sociais e do reconhecimento  
da importância de seu trabalho, que, contudo, é um pouco realizado na rede  
pública e muito realizada no setor privado, no profit (Burgalassi, 2022,  
tradução nossa)14.  
O professor Marco Burgalassi, nosso observador privilegiado, afirma em entrevista  
concedida a uma das autoras que o movimento de delegação de responsabilidades do Estado ao  
terceiro setor, frequentemente identificado como processo de “externalização dos serviços  
sociais”, tem se intensificado nos últimos anos. Segundo ele, tal dinâmica resultou em um  
expressivo crescimento no número de assistentes sociais atuando no terceiro setor na Itália.  
Essa realidade também foi apontada no grupo focal realizado em novembro de 2022,  
em Roma. Na ocasião, as/os participantes destacaram a carência de profissionais nas estruturas  
municipais, em decorrência de cortes no Fundo Nacional de Políticas Sociais e da fragilidade  
do marco regulatório regional.15  
A administração pública tende a externalizar os serviços sociais (...) Estes  
continuam serviços públicos, cujo o Comune decide a finalidade, o  
financiamento, as regras, porém a realização concreta é atribuída à sujeitos  
externos, assim o Comune evita todos os problemas ligados (...) às admissões,  
às substituições, logo a tendência é aquela de ter um núcleo cada vez mais  
reduzido de profissionais do setor público e do outro lado ter uma parte cada  
vez maior de profissionais no setor privado (Burgalassi, 2022, tradução  
nossa)16.  
665  
No Brasil, essa lógica também se evidencia. Dados da pesquisa nacional do CFESS  
(2022) sobre o perfil de assistentes sociais no Brasil destacam um momento de realização de  
“parcerias” entre o setor público e privado para oferta de serviços, o que se expressa na  
contratação de profissionais via instituições sociais. Assim, “essa situação explosiva alimenta  
cada 5.000 habitantes / 4.000 habitantes.  
13 O Comune é uma autoridade local territorial autônoma de acordo com o artigo 114 da Constituição da República  
Italiana. Ele pode ser subdividido em frações (partes muito pequenas do território ligado ao Comune), que, por sua  
vez, podem ter poder limitado graças a assembleias eletivas especiais. Um município também pode ter o título de  
cidade.  
14 Entrevista concedida a Salyanna de S. Silva em novembro de 2022.  
15  
As funcionárias contratadas por meio de cooperativas, mas que atuam na Comune de Roma, possuem um  
endereço de e-mail distinto, utilizado especificamente para indicar que estão colaborando com a administração  
municipal, embora não integrem a equipe interna da Prefeitura.  
16 Entrevista concedida a Salyanna de S. Silva em novembro de 2022.  
Salyanna de Souza Silva; Gisele Caroline Ribeiro Anselmo; Francesca Cubeddu  
a dinâmica de privatização do bem público e de contratação indiscriminada de trabalhadores/as  
temporários/as, terceirizados/as e/ou comissionados/as” (CFESS, 2022, p. 99).  
Particularmente, na cidade de Vitória (ES), esse fenômeno se expressa de forma  
concreta. Segundo Girelli (2023), em 2021 a Secretaria Municipal de Assistência Social  
(SEMAS) mantinha 15 Termos de Colaboração com cinco Organizações da Sociedade Civil  
(OSCs). Nesse mesmo ano, o número de trabalhadoras(es) era de 978 pessoas, sendo que 809  
possuía vínculo indireto, via Termos de Parceria, e apenas cerca de 10% eram servidoras(es)  
efetivas(os).  
Os dados da pesquisa de campo indicam que o 84% (21) das(os) assistentes sociais que  
responderam ao questionário tinham vínculo celetista via convênio/termo de colaboração com  
entidades, particularmente com a Organização da Sociedade Civil (OSC) Agência Adventista  
de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais (ADRA), entidade vinculada à Igreja Adventista  
do Sétimo Dia. Apenas 16% (04) assistentes sociais afirmaram que seu vínculo é via  
contratação direta com a Prefeitura (Designação Temporária - DT)17. A forma de ingresso nesse  
caso se dá via seleção simplificada, a verba para contratação de tais profissional é via Edital  
público do Governo de Estado.  
Embora a SEMAS conte com servidoras(es) concursadas(os)18, entre as/os assistentes  
sociais que atuam diretamente nos CRAS, se evidencia a prevalência de vínculos de trabalho  
via Termo de Colaboração e Designação Temporária. As diferentes formas de contratação  
das/os profissionais implicam não apenas em cargas horárias diversas, mas em diferenciações  
no acesso à direitos trabalhistas no interior de uma mesma equipe. Por exemplo, entre as(os)  
profissionais concursadas(os) e que ingressam via DT a carga de trabalho semanal é de 40  
horas; enquanto as(os) profissionais contratadas(os) via ADRA tem uma carga horária de 30  
horas, com acesso a plano de saúde e odontológico, além do vale transporte não ser descontado.  
Tanto na realidade italiana quando na brasileira, observa-se um processo de negação do  
papel do setor público com garantidor de direitos, com crescente substituição por uma lógica  
empresarial voltada à eficiência e à competitividade.  
666  
Nesse sentido, Dardot e Laval (2016) destacam a reconfiguração da ação pública sob o  
neoliberalismo, marcada por uma mercadorização da instituição pública obrigada a funcionar  
17 A SEMAS firmou um Termo de Colaboração com ADRA (Termo nº 121/2019 – Processo nº 1890554/2019 que  
foi prorrogado até 31 de julho de 2023), através de tal mecanismo a ADRA disponibiliza profissionais que atuam  
diretamente nos serviços da proteção social básica do município, dentre esses os CRAS, o parâmetro para tal  
atuação é Plano de Trabalho presente no Termo.  
18 O último concurso público para SEMAS foi realizado em 2008. Em 2012 a Prefeitura realizou ainda um concurso  
para Secretaria de Saúde.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 654-671, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço Social, transformações no trabalho e desafios ético-políticos: uma análise comparativa Brasil-Itália  
de acordo com as regras empresariais” (Dardot; Laval, p. 275). Os autores observam que o  
Estado foi reestruturado em duas direções:  
[...] de fora, com privatizações maciças de empresas públicas (...), mas  
também por dentro, com a instauração de um Estado avaliador e regulador,  
que mobiliza novos instrumentos de poder e, com eles, estrutura novas  
relações entre governo e sujeitos sociais (Dardot; Laval, 2016, p. 273).  
Na entrevista, o professor Burgalassi sinalizou que em torno de dez mil assistentes  
sociais atuam atualmente no terceiro setor em toda a Itália. Em geral, os contratos duram de três  
a cinco anos. Tal situação cria uma precariedade, as/os profissionais nessa condição trabalham  
sabendo que um dia o contrato acaba.  
Essa dinâmica comporta precariedade, porque se uma pessoa tem a certeza de  
estar em seu posto de trabalho também nos próximos anos, trabalha com o  
espírito sereno, quem sabe não satisfeito, mas sereno, sobretudo porque pode  
fazer projetos futuros, com a certeza de poder comprometer-se, comprar uma  
casa, criar uma família (Burgalassi, 2022, tradução nossa)19.  
Na primeira década dos anos 2000 a Itália apresentou um crescimento nos níveis da  
pobreza e miséria. Tal processo não foi seguido do crescimento no âmbito das políticas sociais,  
o que reverbera no trabalho das/os assistentes sociais.  
As necessidades crescem, entretanto, depois de uma fase favorável, entre  
2013-2014 os serviços sociais desaceleram e também o trabalho dos  
assistentes sociais se transforma complexo e cansativo, porque passa a existir  
cada vez mais emergências e situações complexas (...) os próprios assistentes  
sociais tiveram que assumir problemas cada vez mais complexos,  
especialmente na frente da pobreza e marginalização onde tivemos um  
crescimento exponencial. Na Itália, em poucos anos, o número de pobres  
estimado em cerca de dois milhões e meio passou para cerca de cinco milhões  
em situação de pobreza absoluta, abaixo do limiar de subsistência. Assim  
grandes problemas, grandes necessidades, com recursos muito modestos  
(Burgalassi, 2022, tradução nossa)20.  
667  
O referido professor Burgalassi chama atenção para os riscos futuros ao Serviço Social  
que tange a seus fundamentos ético-políticos. As transformações nas diretrizes do Welfare, tais  
como o enfraquecimento da universalização, a redução da socialização das necessidades e  
riscos ligados à desigualdade de natureza socioeconômica, o declínio da solidariedade  
distributiva e o crescimento do papel do chamado terceiro setor21 podem implicar em tensões  
éticas relevantes nos fundamentos da profissão (Burgalassi, 2012, tradução nossa).  
19 Entrevista concedida a Salyanna de S. Silva em novembro de 2022.  
20 Entrevista concedida a Salyanna de S. Silva em novembro de 2022.  
21  
A Itália historicamente apresenta uma forte tradição em relação à atuação e oferta de serviços de caráter  
assistencialistas e caritativos principalmente através de organizações religiosas, com destaque para a Caritas e a  
Comunidade Sant’Egídio.  
Salyanna de Souza Silva; Gisele Caroline Ribeiro Anselmo; Francesca Cubeddu  
Dessa forma, observa-se que o avanço das contrarreformas neoliberais e a ampliação da  
lógica de externalização dos serviços sociais, tanto no Brasil quanto na Itália, têm repercutido  
diretamente nas condições de trabalho das/os assistentes sociais e nos fundamentos que  
orientam sua prática. As diferentes formas de precarização, a fragmentação dos vínculos e o  
reordenamento das responsabilidades públicas colocam em xeque não apenas os direitos sociais  
conquistados, mas também os princípios ético-políticos que sustentam o projeto profissional do  
Serviço Social.  
Embora no âmbito do Serviço Social brasileiro possamos falar de um Projeto  
Profissional Ético-Político, que se constituiu historicamente, ancorado nos diferentes fóruns  
coletivos das entidades representativas do Serviço Social, nos Conselhos Federal e Estaduais  
(Conjunto CFESS/CRESS), na Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social  
(ABEPSS) e no Movimento Estudantil de Serviço Social (MESS), nas Diretrizes Curriculares  
de 1996 da ABEPSS e no Código de Ética Profissional de 1993, não podemos esquecer que a  
conjuntura internacional em que vivemos se apresenta com um intenso acirramento das bases  
histórico-político sob as quais tal projeto foi construído. Seguindo as palavras de Santos (2007),  
é imprescindível não superdimensionamos tal direção e fazermos uma leitura realista de tais  
desafios conjunturais. Concordamos com Silva (2023) ao afirmar que:  
Em tempos de ataques constantes à democracia, ultraneoliberalismo e  
conservadorismo, as/os assistentes sociais, por atuarem diretamente nas  
políticas sociais junto às parcelas da população mais subalternizada, precisam  
ter com imperativo de seu fazer profissional o conhecimento crítico da  
realidade, da política social em qual atua, mas principalmente o domínio dos  
elementos que envolvem a direção e posicionamento ético-político (Silva,  
2023, p. 233).  
668  
É nesse cenário de intensas transformações que se impõe a necessidade de resistência,  
análise crítica e reafirmação do compromisso com a universalização dos direitos e com a justiça  
social. Trata-se dessa forma de um desafio ético-político que vai além da boa e eficaz execução  
da política social, mas orienta-se na direção de uma emancipação humana.  
Considerações finais  
Ao longo deste artigo, procuramos apresentar alguns dados preliminares de uma  
pesquisa comparativa que tem como objetivo geral analisar quais as atuais transformações no  
âmbito da precarização do trabalho e suas possíveis implicações ético-políticas para a atuação  
das/os assistentes sociais inseridas na política de assistência social no Brasil e na Itália.  
A partir de um levantamento bibliográfico sobre aspectos estruturantes da formação  
social de cada país, foi possível evidenciar a existência de algumas particularidades nacionais  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 654-671, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço Social, transformações no trabalho e desafios ético-políticos: uma análise comparativa Brasil-Itália  
relevantes. Se na Itália, graças à adoção de pacto fordista- keynesiano e da força do movimento  
sindical operário, o mercado de trabalho contou com maior proteção social; no Brasil, ao  
contrário, a precarização, a informalidade e a flexibilização sempre estiveram presentes nos  
elementos estruturantes da relação capital–trabalho. Com a adoção de medidas neoliberais, a  
precarização/flexibilização do trabalho passou a ser adotada como uma exigência condicionante  
ao “apoio” financeiro de organismos internacionais (Oliveira, 2017).  
Tanto na realidade brasileira quanto italiana, observou-se um movimento de  
“externalização dos serviços sociais”, evidenciando uma tendência mundial de transformação  
e mercadorização da ação pública (Dardot; Laval, 2016). O que por sua vez reverbera no acesso  
ou não à estabilidade e aos direitos trabalhistas para a/o assistente social que atuam nas políticas  
sociais. Temos dentro de um mesmo serviço profissionais que atuam com cargas horárias e  
acesso a direitos trabalhista diferentes, pois muitas vezes seu vínculo trabalhista e suas  
atribuições é atrelado às organizações sociais.  
Diante das transformações em curso no mundo do trabalho, torna-se necessário que as  
reafirmando o compromisso com o projeto ético-político profissional, pautado na defesa dos  
direitos sociais, na ampliação da cidadania e na luta coletiva pelos interesses da classe  
trabalhadora.  
669  
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671  
La formación de Trabajo Social en el proceso de  
modernización y construcción democrática en  
España  
The training of Social Work in the process of modernization and  
democratic construction in Spain  
Miguel Angel Oliver*  
Virgínia Alves Carrara**  
Rosana Matos–Silveira***  
Allana Alcântara Guimarães****  
Resumo: En la década de los años ochenta, los  
estudios de Trabajo Social en España son  
reconocidos como Diplomatura y pasan a  
ofertarse por las Universidades. A partir de las  
Directrices del Real Decreto 1850/1981, se  
aprueban por parte de diferentes universidades  
públicas, los planes de estudio que,  
posteriormente, son homologados por el  
Consejo de Universidades. Todo ello tiene lugar  
en el contexto histórico de cambio en España,  
que se pone también de manifiesto con la  
creación y desarrollo de los servicios sociales,  
la aprobación de las distintas leyes autonómicas  
de servicios sociales y la realización de  
diferentes congresos profesionales de la  
Abstract: In the 1980s, Social Work studies in  
Spain were recognized as Diplomas and began  
to be offered by universities. Following the  
Guidelines of Royal Decree 1850/1981, various  
public universities approved curricula, which  
were subsequently approved by the Council of  
Universities. All of this took place within the  
historical context of change in Spain, also  
reflected in the creation and development of  
social services, the approval of various regional  
laws on social services, and the holding of  
various professional conferences on the  
discipline that reflected the interests and  
concerns of social workers during those years.  
The qualitative research methodology used was  
based on a documentary search of the Social  
Work curricula approved in the 1980s, within  
the framework of a process of change and  
modernization of the structures of Spanish  
society with an impact on the university system.  
The results highlight the new professional  
profiles sought with the Diploma, which are  
more technical in nature and offer training  
designed for social intervention rather than  
research.  
disciplina que plasman los intereses  
y
preocupaciones de las trabajadoras sociales en  
esos años. La metodología de investigación  
utilizada, de tipo cualitativo, se sustenta en una  
búsqueda documental de los planes de estudio  
de Trabajo Social aprobados en la década de los  
años ochenta, en el marco de un proceso de  
cambio y modernización de las estructuras de la  
sociedad española con repercusión en el sistema  
universitario. Los resultados destacan los  
* Universitat de les Illes Balears. E-mail: mangel.oliver@uib.es  
** Universidade Federal de Ouro Preto. E-mail: vcarrara@ufop.edu.br  
*** Universidad de Granada. E-mail: rosanadm@ugr.es  
**** Universidade Federal de Ouro Preto. E-mail: allanaalcantara@gmail.com  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.50766  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 06/11/2025  
Aprovado em: 09/12/2025  
La formación de Trabajo Social en el proceso de modernización y construcción democrática en España  
nuevos perfiles profesionales que se pretenden  
con la Diplomatura, de carácter más técnico, y  
con una formación pensada para la intervención  
social y no para la investigación.  
Palavras-chaves: Formación en Trabajo  
Social; Planes de estudio; Proceso de  
Modernización; Democratización; España.  
Keywords: Training in Social Work; Studs  
Plans; Modernization Process;  
Democratization; Spain.  
Introducción1  
En la formación de Trabajo Social en España, la década de los años ochenta del siglo  
XX resultó un período trascendental. Tiene lugar en esos años la creación del Título de  
Diplomado en Trabajo Social y el establecimiento de las directrices para la elaboración y  
aprobación de los planes de estudio de las diferentes universidades en el marco de la Ley  
Orgánica 11/1983, de 25 de agosto, de Reforma Universitaria. Todo ello se produce en un  
contexto de cambios sociales y políticos en el país que persiguen, en su conjunto, la  
modernización de diferentes aspectos de la sociedad española tras el fin de la etapa franquista.  
Con la Ley de Reforma Universitaria se pretende democratizar también el sistema universitario  
en el que se ha venido produciendo, además, desde la década de 1970, un aumento significativo  
en el número de estudiantes. Esta Ley señala que serán las universidades las que elaborarán y  
aprobarán sus planes de estudio, recogiendo también las materias que deberán ser cursadas para  
la obtención de los títulos bajo las directrices aprobadas por el Ministerio de Educación y  
Ciencia.  
673  
Este trabajo analiza los planes de estudio de Trabajo Social aprobados por diferentes  
universidades públicas y posteriormente homologados por el Consejo de Universidades en la  
década de los años ochenta, en el contexto histórico de cambio en España y en relación con  
otros acontecimientos fundamentales que tuvieron lugar en ese período: la creación y desarrollo  
de los servicios sociales con la aprobación de las distintas leyes autonómicas de servicios  
sociales y la realización de diferentes congresos profesionales de la disciplina que plasman los  
intereses, preocupaciones y dificultades de las trabajadoras sociales y de la propia profesión en  
esos años. El estudio pretende contribuir a la comprensión de las tendencias profesionales  
presentes en el Trabajo Social en España en los años ochenta, en este caso, a través de su  
vertiente formativa, recordando una etapa fundamental de la misma como fueron los primeros  
1 Este trabajo se enmarca en un subproyecto integrado en una investigación más amplia denominada “O Serviço  
Social na história: questão social, movimentos e lutas sociais - América Latina e Europa (1960-2020)”, aprobado  
por la Chamada Universal 2023 del CNPq, bajo la coordinación del Dr. Maurílio de Castro Matos.  
Miguel Angel Oliver; Virgínia Alves Carrara; Rosana MatosSilveira; Allana Alcântara Guimarães  
años de la transición democrática. Esta conllevó, entre el conjunto de cambios que tuvieron  
lugar en la sociedad española, la aprobación de iniciativas fundamentales para el desarrollo de  
los servicios sociales y de la profesión de Trabajo Social.  
Metodología  
Este trabajo tiene por objetivo analizar la formación de Trabajo Social en la década de  
los años ochenta del siglo XX en España, con eje en los planes de estudio que fueron aprobados  
por las distintas universidades, su relación con el contexto social y los cambios de tipo  
normativo que, en el ámbito de la política educacional y en materia de servicios sociales, se  
producirán en esos años. El enfoque cualitativo utilizado en esta investigación, habitual en  
estudios con una finalidad exploratoria, descriptiva e interpretativa (Pérez Serrano, 2007), parte  
de una revisión bibliográfica sobre los cambios que tienen lugar en el período analizado en  
relación a la enseñanza superior, los servicios sociales y la profesión de Trabajo Social en  
España. Para esto último, además de la consulta de normativas y documentos públicos, destaca  
como uno de los elementos también importantes en este análisis, los contenidos de los  
congresos profesionales de la disciplina que tuvieron lugar en esos años en España, de los cuáles  
las autoras de este trabajo ya trataron en un artículo anterior. Al centrarse en los aspectos  
formativos de la disciplina, la búsqueda documental se ha focalizado en un segundo momento  
en identificar las universidades que imparten los estudios de Trabajo Social en España en la  
década de los años ochenta. Se ha accedido a veintidós planes de estudios de Trabajo Social de  
los años ochenta, de diferentes escuelas universitarias de las cuales veinte eran públicas y dos  
privadas. Se ha llevado a cabo una preselección de estas escuelas a partir del criterio de  
distribución territorial de las mismas en las diferentes regiones o Comunidades Autónomas del  
Estado español, y se han recogido los contenidos de los planes de estudio de ocho de estas  
universidades que, a través del Consejo de Universidades se han ido aprobando entre los años  
1983 y 1989. Se han analizado los planes de estudio a través de las disciplinas que se imparten  
vinculadas a cada una de las áreas de conocimiento, resultando los diferentes números del  
Boletín Oficial del Estado (BOE) correspondientes a la década analizada, uno de los principales  
documentos de consulta para el acceso a la información.  
674  
La Reforma Universitaria y el desarrollo de los Servicios Sociales en el marco del  
proceso de modernización del Estado español.  
Modernización e integración representan ideas fundamentales en España en los años  
ochenta, con la apertura del país y su incorporación - en 1986 - a la Comunidad Económica  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 672-694, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
La formación de Trabajo Social en el proceso de modernización y construcción democrática en España  
Europea (CEE). Este proceso estableció las bases para una España progresista y plural, que  
buscaba alejarse de su reciente pasado dictatorial. Bajo una monarquía constitucional, la  
Constitución Española (CE) de 1978 garantizó el Estado de derecho, al mismo tiempo que  
respetaba la diversidad cultural de las distintas regiones de España. Con su peculiar formación  
socio-histórica, compuesta por distintas regiones y sus respectivas lenguas oficiales: gallego,  
euskera, catalán y castellano, reconocidas oficialmente por la CE, se refuerza desde los tiempos  
remotos la particularidad de España como país plurinacional. El contexto social, económico,  
político y cultural de los años ochenta estaba enmarcado por los rasgos del difícil proceso de  
la transición democrática. Estado y sociedad experimentaban el movimiento de apertura con  
el reconocimiento de libertades y derechos fundamentales, y la construcción del Estado Social  
en España, pero en un escenario marcado por el recetario neoliberal impulsado por el Reino  
Unido y los Estados Unidos, así como por las determinaciones del Banco Mundial. La  
economía española necesitaba incorporarse al comercio internacional después de años de  
retraso significativo en todas las áreas, una vez que el sistema autárquico en la dictadura  
franquista 2aisló a España de la Europa desarrollada.  
En el proceso de modernización y con su incorporación a la CEE, España desarrolló  
cambios en la enseñanza superior bajo la Ley Orgánica 11/1983, de 25 de agosto de 1983, de  
Reforma Universitaria. Con anterioridad a la Ley Orgánica de Reforma Universitaria de 1983,  
estuvo vigente en España, desde 1943 y hasta 1970, la Ley de Ordenación Universitaria  
(LOU), que establece la naturaleza católica de la universidad e integrándose ideológicamente  
con el Estado afirma que su misión es “la de formar a la juventud para la vida humana, el  
cultivo de la ciencia y el ejercicio de la profesión al servicio de los fines espirituales y del  
engrandecimiento de España” (Boletín Oficial del Estado, núm. 212, de 31 de julio de 1943).  
Posteriormente, ya en 1970 se aprueba la Ley General de Educación (LGE), que reorganizó el  
sistema universitario y representó un cierto avance en la modernización de la universidad.  
Durante todo el período de la dictadura franquista, la universidad española estaba altamente  
centralizada y controlada por el Estado desde el Ministerio de educación, que regulaba todos  
los procesos internos de gestión, organización y gobierno de la universidad, sin que esta  
pudiera apenas tomar decisiones sobre cuestiones estratégicas (Sánchez-Ferrer, 1996;  
675  
2
La dictadura franquista fue un largo período de la historia de España (desde 1939 a 1975), que comportó un  
aislamiento internacional durante sus primeros veinte años. Se caracterizó por el nacionalcatolicismo, con la Iglesia  
Católica ejerciendo un papel fundamental en la vida pública y la educación; por la existencia de un partido único,  
el Movimiento Nacional (la Falange Española); el autoritarismo en torno a la figura de Franco - que ostentó el  
título de "Caudillo" -; y la represión política a movimientos sociales y sindicatos, que forzó a miles de personas al  
exilio.  
Miguel Angel Oliver; Virgínia Alves Carrara; Rosana MatosSilveira; Allana Alcântara Guimarães  
Fernández, 2025).  
Como recoge el Boletín Oficial del Estado (BOE, Nº 209, p. 24034), en ella se declara  
que “la incorporación de España a las sociedades industriales avanzadas pasa necesariamente  
por su plena incorporación al mundo de la ciencia moderna”. Se asume que es la Universidad  
la institución social mejor preparada para asumir el reto del desarrollo científico-técnico, tal  
como la experiencia de los países próximos ha demostrado. En ese sentido, se justifica la  
necesaria reforma universitaria, “para impulsar el desarrollo de la mentalidad y el espíritu  
científico en España”, aunque esta se debe también a otros factores: “el creciente número de  
estudiantes que exigen un lugar en las aulas [...] la previsible incorporación de España al área  
universitaria europea supondrá una mayor movilidad de titulados españoles y extranjeros”.  
El desarrollo científico, la formación profesional y la extensión de la cultura son  
señaladas como las tres funciones básicas que la renovada Universidad española en su proceso  
de democratización de la educación, debe cumplir rumbo al siglo XXI. La Universidad con  
esta reforma tuvo el objetivo de ofrecer calidad docente e investigadora. La Ley disponía que  
eso “sólo se podrá ofrecer sí le garantizan condiciones de libertad y de autonomía, pues sólo  
en una Universidad libre podrá germinar el pensamiento investigador, que es el elemento  
dinamizador de la racionalidad moderna y de una sociedad libre” (BOE, Nº 209, p. 24034). De  
acuerdo con Monedero (2017, p. 225), “España se incorporaba a la modernidad cuando la  
posmodernidad conservadora estaba haciendo sus estragos.”  
676  
Es importante remarcar que la Ley de Reforma Universitaria buscó alinear la  
enseñanza superior a las nuevas exigencias de Europa y, por tanto, la necesidad de introducir  
estándares capaces de garantizar una calidad mínima homogénea para todas las universidades.  
Esta Reforma Universitaria, ya prepara de alguna manera el terreno para lo que serán los  
importantes cambios que tendrán en el siglo XXI con la creación del Espacio Europeo de  
Educación Superior, conocido como Proceso de Bolonia3, al ser uno de los ejes de la Ley de  
Reforma Universitaria: “la adaptación de los planes de estudio y la flexibilización de los títulos  
que se ofertan en el mercado de trabajo”.  
Considerada como el servicio público de la educación superior, las funciones de la  
Universidad van desde la creación, desarrollo, transmisión y crítica de la ciencia, de la técnica  
3 El Proceso de Bolonia de 1999, con el objetivo de unificar la enseñanza superior europea, reorganizó los estudios  
universitarios españoles para que fueran compatibles con el Espacio Europeo de Educación Superior (EEES).  
Tanto las licenciaturas, hasta entonces de 5 años de duración de los estudios, como las diplomaturas, de tres años  
de duración, pasaron con algunas excepciones, a tener cuatro años, denominándose todos ellos grados  
universitarios, mientras que los másteres universitarios, generalmente de un año de duración, se consolidaron  
(Fernández, 2025).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 672-694, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
La formación de Trabajo Social en el proceso de modernización y construcción democrática en España  
y de la cultura, a la preparación para el ejercicio profesional, apoyo social, científico,  
económico y tecnológico, tanto nacional como de las comunidades autónomas, y la extensión  
de la cultura universitaria al servicio de la sociedad. Heredera del pacto constitucional, la Ley  
de Reforma Universitaria introdujo competencias propias de las universidades, al incorporar  
una cierta autonomía universitaria respecto a las administraciones públicas (Estado y  
autonomías). Por otro lado, de acuerdo con Farrerons Vidal (2005, p. 7) es la primera ley en  
España que reconoce con carácter general la creación de universidades privadas. A finales de  
la década de los ochenta se inició una expansión de la oferta universitaria en España, con la  
creación de universidades a lo largo del territorio, tanto de titularidad pública como de  
titularidad privada. Con el proceso de transferencia de competencias desde el Estado central  
español para las regiones autonómicas, y con la Reforma Universitaria, las universidades  
fueron poco a poco transferidas y las comunidades autónomas fueron promulgando leyes de  
ordenación de sus sistemas universitarios (Farrerons Vidal, 2005, p. 8).  
En este contexto de inversión por parte del Estado español en la educación superior,  
el Trabajo Social logró su incorporación a las universidades con el Real Decreto 1850/1981 de  
20 de agosto. Con las nuevas exigencias de la Orden de 12 de abril de 1983 por la que se  
establecen las directrices para la elaboración de los Planes de Estudio de las Escuelas  
Universitarias de Trabajo Social, la profesión pasó a ser reconocida como Diplomatura, y entró  
a formar parte de la cultura universitaria en el contexto de reforma de la Universidad.  
En el ámbito social, una particularidad de esta modernización se da a comienzos de  
los años ochenta cuando se aprueban, en distintas regiones del Estado español, las leyes  
autonómicas de servicios sociales4. A pesar de la heterogeneidad existente - dado las  
peculiaridades de cada territorio - , se destacan de estas leyes varios elementos en común, como  
la estructuración del sistema en dos niveles: el especializado, dirigido a situaciones que exigen  
una alta especialización interdisciplinar y técnica, y los servicios sociales comunitarios o de  
atención primaria, de gestión pública y como primera línea de atención, es decir, en el ámbito  
municipal, teniendo como atribuciones las de detectar las situaciones de necesidad y prevenir,  
informar, asesorar e intervenir desde la complementariedad con la atención especializada.  
Con la aprobación de la Ley de Bases de Régimen Local en 1985, se incorporan un  
gran número de trabajadores/as sociales a la administración pública, al mismo tiempo que se  
irá progresivamente consolidando la colaboración entre el Estado, Tercer Sector y entidades  
677  
4
A partir de la promulgación de la Constitución Española, la asistencia social pasa a ser competencia de las  
Comunidades Autónomas (art. 148.1.20), dejando de depender los servicios sociales de organismos centrales en  
aspectos relativos a la financiación, planificación y gestión de los mismos.  
Miguel Angel Oliver; Virgínia Alves Carrara; Rosana MatosSilveira; Allana Alcântara Guimarães  
mercantiles. Para los profesionales, esta puesta en marcha de los nuevos servicios sociales  
municipales se vive como un gran desafío, al participar estos de forma notable, en los procesos  
de planificación.  
En 1988 se crea el Ministerio de Asuntos Sociales, asumiendo el Estado la  
responsabilidad en la ejecución de la política de acción social para el conjunto del país  
(Picornell-Lucas et al., 2022). La inexistencia de una ley de servicios sociales de ámbito  
estatal se compensa con la aprobación, en el mismo año, del Plan Concertado de Prestaciones  
Básicas de Servicios Sociales, que permite garantizar unas prestaciones mínimas a toda la  
población (Subirats et al., 2007).  
Todas estas reformas y aprobación de leyes que se llevan a cabo, permiten el paso de  
una atención asistencial y paternalista de la etapa franquista, a la creación de un sistema de  
protección de vocación universalista, integral, polivalente y arraigado en el territorio, inspirado  
en las propuestas de los Estados de Bienestar europeos. No obstante, este importante desarrollo  
del Sistema Público de Servicios Sociales (SPSS) no logra superar del todo la tradición  
asistencialista, consolidándose un modelo gerencialista que continúa “recibiendo un cierto  
mandato social de atender a los pobres” (Aguilar, 2013, p. 11), que hace que estos mantengan  
elementos de continuidad con el modelo de la beneficencia pública. El modelo de Estado de  
Bienestar español, para Rodríguez (2007), se crea a partir de una combinación entre la  
privatización creciente y la asistencialización de la protección social, reflejando las ideologías  
de tipo neoliberal que contemplan la incompatibilidad del mismo a largo plazo, con el  
crecimiento económico y la centralidad del mercado.  
678  
Las nuevas exigencias en el proceso de modernización en el Estado español se  
constatan también en las demandas y preocupaciones de las profesionales de Trabajo Social  
que acompañan el movimiento de otras esferas de la sociedad. Ello se refleja en los tres  
Congresos Estatales de Asistentes Sociales realizados durante la década de los ochenta, que se  
enmarcan en este contexto de democratización. Por consiguiente, sus contenidos han  
fortalecido no solo el proceso de consecución de los derechos ciudadanos, sino también los  
cambios en la propia profesión, tanto a nivel formativo como profesional. En el IV Congreso  
Estatal realizado en Valladolid (1980), se evidencia la lucha por el reconocimiento de los  
estudios de Trabajo Social como estudios universitarios de primer ciclo. Se reivindicaba,  
además, la incorporación de las trabajadoras sociales a los niveles de planificación y dirección  
de programas de acción social y la ampliación de las funciones profesionales en el ámbito de la  
Administración central y local. En el V Congreso realizado en Vizcaya (1984), se defendió la  
importancia de impulsar un Sistema de Bienestar Social que respondiera a las necesidades  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 672-694, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
La formación de Trabajo Social en el proceso de modernización y construcción democrática en España  
reales de la población española. Y, por último, el VI Congreso, que se llevó a cabo en Oviedo  
(1988) se centró principalmente en la articulación entre el Trabajo Social y los Servicios  
Sociales desde el marco de la Política Social, resaltando la importancia del desarrollo de una  
intervención científica y rigurosa en la realidad social, en un marco en el que predominan los  
discursos sobre Bienestar Social. En este mismo Congreso, una de las tres ponencias marco  
tratará sobre la formación profesional y, en relación al tema, se presentarán asimismo cinco  
comunicaciones. En todos estos encuentros se evidencia la preocupación por la formación de  
los futuros profesionales centrándose en aspectos como la diversidad de planes de estudio  
existentes y la calidad de las enseñanzas. Sobre este esfuerzo del colectivo de profesionales  
cabe recordar, finalmente, que este se llevará a cabo dentro de los límites de una profesión que  
ingresa en la Universidad con el inicio de la década y que, hasta 1991, no será reconocida como  
área de producción de conocimiento (Oliver; Alves-Carrara; Matos-Silveira, 2024; Alves-  
Carrara; Oliver; Matos-Silveira, 2025; Moran-Carrillo, M.; Jiménez, 2016).  
Los años ochenta: una década clave en la formación de Trabajo Social en España  
Como ya hemos señalado, la década de los años ochenta resultó trascendental para la  
formación y consolidación disciplinaria en Trabajo Social. Si en febrero de 19805 se crea el  
Título de Diplomado en Trabajo Social, un año después, las Escuelas de Asistentes Sociales  
pasarán a conocerse como Escuelas Universitarias de Trabajo Social6. La denominación de  
“asistentes sociales” se cambiará por la de “trabajadores sociales” en 19817, adaptándola al  
marco internacional. Ambos acontecimientos son el resultado de las resistencias y las luchas de  
las trabajadoras sociales que estuvieron presentes en la historia, con sus acciones y  
producciones, y que se articularon con el “movimiento de la sociedad española que buscaba  
modernizarse y situarse en sintonía con el resto de países que conforman una Unión Europea  
en proceso de construcción” (Carrara; Matos-Silveira; Oliver, 2025, p. 51).  
679  
Coincidimos con Banda Gallego (2017) al afirmar que todas estas conquistas fueron  
fruto de un proceso largo y laborioso de la categoría profesional:  
Si el reconocimiento de las Escuelas de Asistentes Sociales había supuesto un  
esfuerzo durante catorce años, la transformación de estas en Escuelas  
Universitarias se consiguió tras doce años de trabajo continuado. Esta larga  
lucha, y esta larga espera, nos indican lo inalcanzable que se veía, pero, a su  
vez, lo creíble que resultaba. No nos queda más que reconocer que lo  
5 Proposición No de Ley aprobada por el Pleno del Congreso de los Diputados el 25 de febrero de 1980. Madrid,  
B.O.E de las Cortes Generales nº 161-II, de 28 de febrero de 1980.  
6
Real Decreto 1850/1981 de 20 de agosto, Ministerio de Educación y Ciencia. Madrid, B.O.E. nº 206 de 28 de  
agosto de 1981.  
7 Decreto 1850 del 20 de agosto de 1981.  
Miguel Angel Oliver; Virgínia Alves Carrara; Rosana MatosSilveira; Allana Alcântara Guimarães  
conseguido hasta aquí ha sido gracias a la creencia en las potencialidades del  
Trabajo Social, por ello, pensamos que debemos estar sumamente agradecidos  
con todas aquellas personas que creyeron, con un alto nivel de convencimiento  
y un elevado nivel de persistencia, que el lugar del Trabajo Social estaba en la  
universidad, al igual que otras profesiones sociales (p. 153).  
Con el paso de Estudios de Asistentes Sociales a Escuelas Universitarias de Trabajo  
Social, el Ministerio de Educación y Cultura exige la fijación de directrices que deberían  
presidir la elaboración de los Planes de Estudio. En abril de 1983 se publican las directrices  
para la elaboración de los Planes de Estudio de las Escuelas Universitarias de Trabajo Social8,  
cuyo objetivo fue servir de marco general dentro del cual cada Universidad pudiera proponer  
su propio plan “pretendiéndose, al mismo tiempo, que mediante estas directrices los Planes de  
Estudio posean la necesaria homogeneidad; de modo que se permita al alumnado el posterior  
desarrollo de sus funciones profesionales en todo el ámbito nacional” (BOE, Nº 93, de 1983, p.  
10799). Como recoge el propio Boletín Oficial del Estado de 1983, con la aprobación de estas  
directrices se ha pretendido que “el contenido de las enseñanzas estuviese orientado al logro  
por los alumnos de los conocimientos y capacidades necesarias para desempeñar eficazmente  
sus funciones en el campo del Trabajo Social y de los servicios sociales, mediante el estudio de  
las áreas fundamentales para alcanzar los citados objetivos”. Como se ha destacado en el  
apartado anterior, la profesión impulsó y fue impactada por el movimiento socio-histórico de  
la realidad española, especialmente en lo que se refiere a las políticas sociales públicas en  
proceso de desarrollo. Analizamos que eso generó también una “relación ambivalente”  
(Nebreda y Cabrero, 2021, p.209) desde una simbiosis entre la profesión de Trabajo Social y  
los servicios sociales, lo que se puede verificar en las estructuras curriculares aprobadas en el  
Boletín Oficial del Estado (BOE), que fueron investigadas en el proceso de elaboración de este  
trabajo.  
680  
Las directrices para la elaboración de los Planes de Estudio fueron aprobadas en el  
contexto de la CE de 1978 pero todavía bajo el paraguas del artículo 37.1 de la Ley General de  
Educación, de 4 de agosto de 1970, una ley enmarcada en los años de la dictadura fascista de  
Franco. Con la Ley Orgánica de Reforma Universitaria, de 25 de agosto de 1983, se legitima  
una modernización del sistema universitario con trazos marcados todavía por la ideología  
franquista. La Ley hace hincapié en la autonomía de las universidades, regulando los ejercicios  
del profesorado y estableciendo sus cuerpos: profesores titulados y catedráticos.  
En este contexto, el programa curricular de los estudios de Diplomado en Trabajo  
Social, consistía en un total de tres años de formación, a diferencia de otras titulaciones, las  
8 Orden de 12 de abril de 1983, Ministerio de Educación y Ciencia. Madrid, B.O.E. nº 93 de 19 de abril de 1983.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 672-694, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
La formación de Trabajo Social en el proceso de modernización y construcción democrática en España  
licenciaturas, que constaban de cinco años. La Diplomatura estaba estructurada en seis  
semestres, con asignaturas teóricas y prácticas, favoreciendo una integración entre la  
experiencia profesional y el aprendizaje académico. Se distribuyó en tres áreas, con especial  
atención a la específica del Trabajo Social, constituida como área vertebradora e integradora  
de las enseñanzas. Cabe destacar que el análisis que aquí desarrollamos se centra en las  
estructuras curriculares de los estudios de Trabajo Social aprobadas9 en las directrices recogidas  
en la Orden de 12 de abril de 1983 que, haciendo referencia a las distintas universidades, fueron  
publicadas en los Boletines Oficiales del Estado. En el Área del Trabajo Social se estudia la  
naturaleza y forma de organización de los Servicios Sociales, así como la metodología y  
técnicas propias del Trabajo Social, posibilitando al alumnado un conocimiento global de las  
necesidades y recursos sociales existentes. En el Área de las Ciencias Básicas se estudian las  
ciencias del comportamiento humano, tanto a nivel individual como social, así como los  
fundamentos jurídicos en cuyo marco se encuadran, y que capacitan al alumnado para la  
comprensión de las necesidades y aspiraciones humanas en su proceso de desarrollo ante el  
medio natural y social. Finalmente, el Área de las Ciencias complementarias consistía en  
disciplinas que, por su contenido, implican la formación en sectores complementarios e  
instrumentales de carácter básico para una mejor comprensión del campo del Trabajo Social.  
En cuanto a la formación práctica, esta se realiza progresivamente a lo largo de los tres cursos  
que integran los estudios, siendo su finalidad posibilitar al alumnado la aplicación y verificación  
de los conocimientos adquiridos, así como poder desarrollar las aptitudes y competencias  
prácticas de la profesión.  
681  
El número de asignaturas obligatorias señaladas por las universidades para la totalidad  
de los cursos que componen el Plan de Estudios no podía ser superior a diecisiete. El Plan  
incluyó, asimismo, un número de asignaturas optativas, de las que el alumnado debería elegir  
necesariamente entre un número de tres y un máximo de cinco, de manera que el número total  
de asignaturas del Plan de Estudios no fuera inferior a dieciocho y no supere las veinte. La  
distribución de las asignaturas optativas se realiza, de forma equilibrada, entre el segundo y el  
tercer curso, sin que en ningún caso el número total de asignaturas por curso pudiera ser superior  
a ocho.  
9 Para este artículo, no fueron analizados los contenidos de los Planes de enseñanza de las asignaturas. La búsqueda  
de los mismos es una tarea que está en proceso de cara a una futura publicación.  
Miguel Angel Oliver; Virgínia Alves Carrara; Rosana MatosSilveira; Allana Alcântara Guimarães  
Tabla 1: Asignaturas obligatorias (15) que deben incluir los Planes de Estudios de las Escuelas Universitarias de  
Trabajo Social  
Áreas  
Primer curso  
Segundo curso  
Tercer curso  
- Psicología General, Evolutiva y - Psicología Social (obligatoria)  
Ciencias Básicas  
Diferencial (obligatoria)  
- Sociología General  
- Estructura Social Contemporánea  
(obligatoria)  
(obligatoria)  
- Fundamentos de Derecho para  
el Trabajo Social (obligatoria)  
- Introducción a los Servicios  
Sociales (obligatoria)  
- Trabajo Social I (obligatoria)  
- Servicios Sociales I (obligatoria)  
- Trabajo Social II (obligatoria)  
- Servicios Sociales II (obligatoria)  
- Trabajo Social III (obligatoria)  
- Política Social y de Bienestar Social  
(obligatoria)  
Trabajo Social  
- Estadística y Técnicas de  
Investigación Social  
(obligatoria)  
- Derecho Administrativo  
(obligatoria)  
- Economía aplicada al Trabajo  
Social (obligatoria)  
- Antropología Social y Cultural (no  
obligatoria)  
- Ética General y del Trabajo Social  
(no obligatoria)  
Ciencias  
Complementarias  
Fuente: BOE, núm. 93, de 19 de abril de 1983.  
Las cinco asignaturas del Área de Ciencias Básicas son de carácter obligatorio y se  
imparten a lo largo de los dos primeros años de la carrera. En el primer año, la asignatura  
Psicología General, Evolutiva y diferencial tiene como finalidad desarrollar en el alumnado  
competencias relacionadas con el conocimiento de todas las etapas del desarrollo humano  
conductual, los conceptos psicológicos fundamentales (personalidad y su estructura, sensación  
y percepción, motivación y capacidades, conducta, vida afectiva, etc.), así como sus  
tratamientos en diferentes corrientes psicológicas. Por su lado, en Sociología General se  
estudian las categorías sociológicas básicas desde una visión metodológica, las sociedades  
humanas en general y los distintos fenómenos sociales. Se incluye también dentro del primer  
curso la asignatura Fundamentos de Derecho para el Trabajo Social, teniendo como contenido  
el estudio sobre de Derecho Constitucional, Derecho Civil (Derecho de Familia en especial),  
Derecho Penal (en especial lo relativo a medidas de privación de libertad y régimen  
penitenciario) y Derecho Laboral (instituciones de la Seguridad Social, especialmente). Estos  
contenidos permiten al alumnado acceder al conocimiento de conceptos, instituciones y normas  
de ordenamiento jurídico indispensables para el ejercicio del Trabajo Social en la realidad  
española.  
682  
En el segundo curso, se imparten también contenidos de psicología, pero ahora  
articulando la conducta humana al ámbito social. La asignatura denominada Psicología Social  
busca así desarrollar competencias relacionadas con la comprensión de las distintas formas de  
interacción de la profesión tanto a nivel social como micro-institucional. La segunda asignatura,  
Estructura Social Contemporánea, ofrece conocimientos sobre los rasgos, conflictos y procesos  
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La formación de Trabajo Social en el proceso de modernización y construcción democrática en España  
estructurales básicos que caracterizan a la sociedad contemporánea (y, en particular, a la  
española), así como el análisis de los agentes sociales que inciden en la misma.  
Todas las asignaturas vinculadas al Trabajo Social y los Servicios Sociales son  
obligatorias y se imparten desde el primer curso. Como queda recogido en el Boletín Oficial  
del Estado (BOE, Nº 93, p. 10800), el objetivo con estas materias es el de permitir a los  
estudiantes “conocer la formas históricas y evolución de la intervención profesional” [...]  
contemplando “los principios metodológicos y la iniciación a las técnicas instrumentales  
propias del Trabajo Social”. Destaca desde el primer curso, el acercamiento del alumnado a la  
formación práctica con el contenido de las asignaturas de Trabajo Social: metodologías para la  
intervención individualizada, con grupos y comunidades, centradas en el uso de las técnicas e  
instrumentos. La asignatura de Servicios Sociales se centra en permitir al estudiante “conocer  
el concepto, naturaleza, evolución histórica, objetivos y clasificación de los Servicios Sociales,  
con especial incidencia en sus dos áreas fundamentales: la comunitaria [...] y la sectorial”. En  
cuanto a la primera, el contenido versaba sobre los instrumentos básicos de información,  
orientación y asesoramiento respecto de los derechos y recursos sociales existentes, y la  
sectorial se centraba en desarrollar “programas especiales en los campos de la familia, infancia  
y juventud; consideración de la mujer; tercera edad, minusvalías físicas y psíquicas; reinserción  
social de marginados, etc”. Durante el segundo curso se profundiza en el conocimiento global  
de las estructuras e interrelaciones de las materias, una vez que el conocimiento básico fue  
adquirido en el primer curso. Se pretende dotar a los estudiantes “de una metodología científica  
que le permita el análisis de la situación y de los procesos de desarrollo que se manifiesten en  
las relaciones humano-sociales, en las necesidades sociales y en la organización y  
funcionamiento de los recursos y servicios sociales”. En ese sentido, el contenido de Trabajo  
Social II comprenderá la Metodología del Trabajo Social, el Proceso del Método con sus etapas  
(análisis-diagnóstico; planificación; ejecución y evaluación), y las Técnicas Instrumentales (el  
informe social; investigación y fuentes documentales, y organización administrativa del  
Trabajo Social). La asignatura de Servicios Sociales en el segundo curso, de acuerdo con las  
directrices, proporcionará al alumnado los instrumentos y técnicas cualitativas y cuantitativas  
para que estos sean capaces de realizar análisis de las instituciones prestadoras de Servicios  
Sociales de la Administraciones Públicas, las gubernamentales y no gubernamentales existentes  
y los modelos de evaluación de resultados. En el tercer curso en general, las materias y  
asignaturas deben capacitar a los futuros trabajadores sociales para la aplicación de la  
metodología y las técnicas de Trabajo Social, en los Servicios Sociales, la Política Social y de  
Bienestar Social. La especial atención aquí recae sobre los programas y sistemas de Bienestar  
683  
Miguel Angel Oliver; Virgínia Alves Carrara; Rosana MatosSilveira; Allana Alcântara Guimarães  
Social como Seguridad Social, Salud Pública, Educación, Cultura, Ocio y Vivienda, entre otros.  
La asignatura de Trabajo Social III, se desarrolla a través de seminarios en los que participarán  
servicios de distintas áreas y para el desarrollo de contenidos relativos a técnicas de  
intervención: comunicación social, dinámica de grupos, animación comunitaria, organización  
y movilización social y, metodología en equipos interdisciplinares y en programas  
institucionales.  
El área de las Ciencias Complementarias consta de cinco asignaturas, tres de ellas  
obligatorias - Estadística y Técnica de Investigación Social, Derecho Administrativo y  
Economía Aplicada al Trabajo Social - cuyos contenidos son ofertados a partir del primer curso.  
Estas materias proporcionan, fundamentalmente, conocimientos básicos para la investigación  
social y para el conocimiento de las instituciones de servicios sociales. Por otro lado, dos  
asignaturas del área de Ciencias complementarias, Ética General y del Trabajo Social y,  
Antropología Social y Cultural, no figuran como asignaturas obligatorias.  
Análisis de resultados y discusión  
Las ocho universidades públicas seleccionadas para el análisis de sus respectivos  
planes de estudio han sido las siguientes: la Universidad de Valencia, U. de Valladolid, U. de  
Alicante, U. de Madrid (U. Complutense), U. de Huelva (adscrita a la U. de Sevilla), U. de  
Tarragona (adscrita a la U. de Barcelona), U. de Zaragoza y U. del País Vasco. La definición  
de las asignaturas y la descripción de sus correspondientes contenidos mínimos de las  
directrices para la elaboración de los planes de estudio en Trabajo Social, se vincula a “la  
necesidad de fijación de los mismos como estudios dotados de una conexión con otras  
disciplinas (Sociología, Psicología, Derecho, etcétera), que permitan la configuración de un  
campo académico y profesional propio” (BOE, Nº 93, de 19 de abril de 1983). Los contenidos,  
de acuerdo con el referido documento fueron determinados por dos principios:  
684  
por la necesidad, para el trabajador social de conocer las necesidades humanas  
desde el punto de vista individual y colectivo, así como los recursos,  
institucionales o no, de que dispone la sociedad para atenderlas; y por otro  
lado la necesidad de que trabajador social utilice una metodología específica  
que permita abordar los problemas propios de su actividad con unos métodos  
adecuados y no utilizando sistemas o enfoques propios de otras disciplinas  
(BOE, Nº 93, de 19 de abril de 1983).  
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La formación de Trabajo Social en el proceso de modernización y construcción democrática en España  
Tabla 2: Año de homologación del plan de estudios por el Consejo de Universidades.  
Fuente: BOE, Nº 93, de 19 de abril de 1983. Elaboración propia.  
De las Escuelas Universitarias de Trabajo Social aquí analizadas, a partir de las nuevas  
exigencias impuestas por las directrices para elaboración de los Planes de Estudio, se observa  
que en el año siguiente al de la publicación de la Ley, en 1984, la Escuela Universitaria de  
Valladolid será la primera en tener aprobado su Plan de Estudios, seguida por la de Madrid, en  
1985, Alicante en 1986, y Valencia en 1987. En los dos últimos años de la década de los  
ochenta, cuatro escuelas se adecuarán a las nuevas exigências para la formación de trabajadores  
sociales: la de San Sebastián, adscrita a la Universidad del País Vasco, y la de Huelva, adscrita  
a la Universidad de Sevilla, ambas en el año de 1988; y la Escuela universitaria de Trabajo  
Social San Vicente de Paul, adscrita a la U. de Zaragoza y la de Tarragona, ambas en 1989.  
685  
Tabla 3: Área de conocimiento de Ciencias Básicas (asignaturas).  
Fuente: BOE, Nº 93, de 19 de abril de 1983. Elaboración propia.  
Miguel Angel Oliver; Virgínia Alves Carrara; Rosana MatosSilveira; Allana Alcântara Guimarães  
Consideramos que las directrices y contenidos del Área de Ciencias Básicas en  
Trabajo Social ofrecen una formación académica que prima discusiones de las ciencias sociales  
desde su vínculo con cuestiones sociológicas, políticas y económicas desde el marco del  
contexto histórico contemporáneo de ampliación de derechos sociales. De hecho, la teoría sobre  
derechos civiles, penales, laborales y constitucionales - a través del conocimiento de  
ordenamientos jurídicos son aplicados desde la academia al desarrollo del ejercicio  
profesional del Trabajo Social y en consonancia con el reciente contexto de aprobación de la  
CE y el proceso de democratización del país. Los contenidos de psicología también van más  
allá, es decir, no solo se centran en aspectos de la conducta humana a nivel individual sino  
también desde una perspectiva social, complementados por conocimientos que profundizan en  
las causas estructurales de los problemas sociales.  
Tabla 4: Área de conocimiento de Ciencias Básicas (número de horas).  
686  
Fuente: BOE, Nº 93, de 19 de abril de 1983. Elaboración propia.  
Las Escuelas Universitarias de Madrid, Huelva y País Vasco son las que disponen de  
más horas para las asignaturas de Ciencias Básicas, privilegiando las áreas de Psicología  
General y Evolutiva, y Sociología General, con entre tres y cuatro clases semanales. La Escuela  
Universitaria de Zaragoza, por su parte, es la que menos horas asignaba.  
El Trabajo Social al incorporarse a la Universidad como Diplomatura participa  
también de los debates y la cientificidad propia de la ciencia moderna, desarrollando en los  
estudiantes la mentalidad y el espíritu científico en relación a la intervención. La  
profesionalización de la acción social busca distanciarse de la beneficencia, lo que en el ámbito  
universitario exigía laicizar y capacitar a los futuros trabajadores sociales de las metodologías  
y técnicas necesarias para ello. Los Servicios Sociales, aunque carezcan de una Ley Estatal, se  
consagran como el espacio socio-ocupacional “natural” de las trabajadoras sociales, en un  
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La formación de Trabajo Social en el proceso de modernización y construcción democrática en España  
momento trascendental en el desarrollo de las políticas sociales y de conquista de los derechos  
sociales de los ciudadanos. La sociedad española y el Estado Español reconocieron la profesión  
como una necesidad social.  
Tabla 5: Área de conocimiento Trabajo Social (número de horas).  
Fuente: BOE, Nº 93, de 19 de abril de 1983. Elaboración propia.  
En los ocho Planes de Estudio las asignaturas de Trabajo Social presentes en todas las  
universidades son: Trabajo Social I, II y III; Introducción a los Servicios Sociales, Servicios  
Sociales I y Servicios Sociales II; Política Social y de Bienestar Social; Prácticas Primer,  
Segundo y Tercer Curso. Las asignaturas obligatorias presentes en las ocho Escuelas  
universitarias de Trabajo Social exponen diferencias en la carga horaria de las mismas. En  
cuatro Planes de Estudio las asignaturas de Trabajo Social y Servicios Sociales poseen una  
mayor concentración de horas, con un total de veintiuna en los casos de Tarragona, Alicante,  
Huelva y Madrid. En la Escuela Universitaria de Trabajo Social San Vicente de Paul, adscrita  
a la U. de Zaragoza, encontramos la menor cantidad de horas dedicada a la materia de Trabajo  
Social. Como las directrices no definen la carga horaria para cada asignatura, cada escuela podrá  
proponer el diseño de su estructura curricular en función del perfil de profesional que se desee  
formar, pudiendo situar una mayor presencia de otras materias dependiendo también del cuadro  
docente de cada universidad. Recordemos que, en ese periodo, Trabajo Social todavía no está  
reconocido como área de conocimiento, lo que solo será una realidad en los años noventa. Ello  
incide en que buena parte del profesorado de la Diplomatura pertenecía a disciplinas diferentes  
a la de Trabajo Social, como Psicología, Pedagogía, Sociología o Derecho.  
687  
Miguel Angel Oliver; Virgínia Alves Carrara; Rosana MatosSilveira; Allana Alcântara Guimarães  
Tabla 6: Enseñanzas prácticas (número de horas).  
Fuente: BOE, Nº 93, de 19 de abril de 1983. Elaboración propia.  
Las prácticas en Trabajo Social, como materia fundamental en la formación de las  
estudiantes, han estado siempre presentes en los planes de estudio del conjunto de universidades  
españolas, introduciendo al alumnado en el rol profesional, procurando en el mismo una  
reflexión sobre la intervención y sobre la realidad social, y contribuyendo con todo ello a la  
construcción de su identidad profesional (Oliver, 2024).  
Las enseñanzas prácticas en los estudios de Diplomado en Trabajo Social se  
desarrollan de forma progresiva a lo largo de los tres cursos de la carrera y se llevarán a cabo  
dentro de la propia institución docente a través de talleres o prácticas de laboratorio, así como  
en instituciones de servicios sociales, preferentemente en segundo y tercer curso, representando  
en su conjunto más del 40% de las enseñanzas impartidas. Durante el período de prácticas de  
campo el alumnado contará con supervisiones que, en el marco de un proceso educativo de  
apoyo al estudiante, estas permiten también valorar los aprendizajes que se van adquiriendo y  
que serán llevadas a cabo por parte de profesionales de Trabajo Social del centro docente así  
como de las instituciones.  
688  
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La formación de Trabajo Social en el proceso de modernización y construcción democrática en España  
Tabla 7: Área de conocimiento de Ciencias Complementarias (asignaturas).  
Fuente: BOE, Nº 93, de 19 de abril de 1983. Elaboración propia.  
De las asignaturas de Ciencias Complementarias, destacar que la materia de Ética  
General y del Trabajo Social, que no figura como obligatoria, es ofertada por cuatro de las  
Escuelas Universitarias analizadas: País Vasco, Zaragoza, Valladolid y Alicante, con dos horas  
semanales de clase en cada una de ellas. La cuestión de la ética profesional, resulta importante  
en estos años, y como tal es reconocida en el VI Congreso de Trabajo Social de 1988, celebrado  
en Oviedo, en el que se trata la importancia de la ética en la formación de las profesionales  
dentro del eje que hace referencia a la formación profesional.  
689  
Tabla 8: Área de conocimiento de Ciencias Complementarias (número de horas).  
Fuente: BOE, Nº 93, de 19 de abril de 1983. Elaboración propia.  
Las escuelas de formación profesional en Trabajo Social con una mayor carga horaria  
para las Ciencias Complementarias son aquellas que, más allá de las asignaturas obligatorias,  
incorporaron también Antropología Social y Cultural, y Ética General y del Trabajo Social  
(Tabla 1), como son los casos de la Escuela de Valladolid y Alicante con diez horas de carga  
Miguel Angel Oliver; Virgínia Alves Carrara; Rosana MatosSilveira; Allana Alcântara Guimarães  
lectiva en su Plan de Estudios. En la Escuela de Madrid, no están presentes las asignaturas no  
obligatorias citadas anteriormente, mientras que Fundamentos Médicos para el Trabajo Social  
e Historia de las Ideas y Movimientos Sociales, figuran en el Plan de estudios con once horas.  
Por otro lado, en el caso de la Escuela de Tarragona, adscrita a la Universidad de Barcelona,  
materias como Estadística y Técnicas de Investigación Social y Economía Cálculo de Gastos  
de Proyectos Sociales, son las asignaturas adoptadas como complementarias a la formación de  
los futuros profesionales. Las asignaturas complementarias elegidas por las diferentes escuelas,  
muestran también de alguna manera, las tendencias sobre los perfiles profesionales que se  
pretenden formar.  
Tabla 9: Materias optativas (número de horas).  
690  
Fuente: BOE, Nº 93, de 19 de abril de 1983. Elaboración propia.  
Entre el conjunto de asignaturas optativas ofrecidas por las diferentes universidades  
destacar algunos aspectos que muestran también las tendencias de la formación en esos años.  
Por un lado, la concurrencia de universidades (cinco de las ocho analizadas) que tienen entre  
sus asignaturas optativas, materias que hacen referencia a la historia (social, económica o  
política), de la región autonómica en la que se ubican las universidades, con la que se enfatiza  
para las futuras profesionales la importancia del conocimiento del contexto en el que estas, de  
forma mayoritaria, desarrollarán su profesión. También en cinco de las ocho universidades  
analizadas, se ofrecen asignaturas vinculadas al ámbito de la salud, que representa uno de los  
campos de conocimiento más destacados en la relación de materias optativas con asignaturas  
como Salud Pública, Medicina Social, Salud y Trabajo Social o Psiquiatría.  
La conexión de los contenidos de la carrera de Trabajo Social con otras disciplinas se  
evidencia también en relación a las asignaturas optativas, donde materias como Antropología  
(social) está presente en la mitad de las universidades analizadas, además de figurar también en  
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La formación de Trabajo Social en el proceso de modernización y construcción democrática en España  
diferentes planes de estudio como asignatura obligatoria vinculada al área de conocimiento de  
Ciencias Básicas o Complementarias.  
Apuntar, por último, el escaso peso que representan materias como Desarrollo  
Comunitario, que no estando presente de manera específica como asignatura obligatoria en  
ninguno de los planes de estudio analizados - los contenidos de la misma se incluirán en todo  
caso junto a otros dentro de materias como Trabajo Social -, figura únicamente como materia  
optativa en tres de las ocho universidades, incluyendo las dos que llevan por título Animación  
Sociocultural. En este sentido cabe recordar, en línea con Colomer (2009), Ramos Feijóo (2000)  
o Domènech (2008), el lugar central del trabajo comunitario, con connotaciones ideológicas,  
en la práctica profesional del asistente social en las décadas de los años sesenta y setenta en  
España y que, con su escasa relevancia en los nuevos planes de estudio, se evidencia alguna de  
las tendencias de ruptura en relación a etapas anteriores que se pretenden en la formación de  
nuevos profesionales.  
Conclusiones  
En la formación de Trabajo Social en España, la década de los años ochenta del pasado  
siglo constituye un período fundamental al llevarse a cabo una serie de cambios que, en línea  
con el proceso modernizador que tiene lugar en la sociedad española en su conjunto, incidirán  
notablemente en la profesión. Los cambios se reflejan también a través de los Congresos de  
Trabajo Social que tienen lugar en esa década, en los que se abordan aspectos relativos a la  
formación como las reformas universitarias, los planes de estudios, o las propias necesidades  
de formación de las profesionales de Trabajo Social. En los Congresos destaca, junto a la  
preocupación por el alcance de los derechos ciudadanos, el interés por el desarrollo de  
instrumentos y técnicas que contribuyan también, junto a lo anterior, al distanciamiento de un  
modelo asistencialista y a la imagen de beneficencia que continuaba vigente en la profesión.  
En los planes de estudio de Trabajo Social de diferentes universidades públicas en la  
década de los años ochenta en España, destaca la vinculación de los aspectos teóricos y  
prácticos de la profesión, con la que pretende la integración de la experiencia profesional y el  
aprendizaje académico, con el área de Trabajo Social como eje central si bien es evidente entre  
el conjunto de contenidos de la carrera, la conexión que esta mantiene con otras disciplinas. En  
los años ochenta tiene lugar una ampliación de los espacios profesionales en los que las  
trabajadoras sociales desarrollarán su labor, y del mismo modo, se produce un notable  
incremento en el número de profesionales. Todo ello posibilitará que se amplíen igualmente los  
691  
Miguel Angel Oliver; Virgínia Alves Carrara; Rosana MatosSilveira; Allana Alcântara Guimarães  
campos de prácticas, con instituciones y servicios pertenecientes a distintos ámbitos, y no  
únicamente al de los servicios sociales.  
La nueva Diplomatura en Trabajo Social, por otra parte, refleja de forma clara, los  
nuevos perfiles que se quieren formar a partir de ese momento, dotados de un carácter más  
técnico de la profesión y alejados de perspectivas ideológicas, con una tendencia general en  
enfatizar los aspectos instrumentales en la formación. Junto a otro tipo de factores, ello incidirá,  
sin duda, en el hecho de que cada vez más profesionales dedicarán buena parte de su tiempo a  
ejercer como gestores de recursos en contextos profesionales progresivamente burocratizados.  
Los contenidos de los planes de estudio, evidencian al mismo tiempo, el interés en formar a  
profesionales para la intervención social, y no para el desarrollo de tareas de investigación,  
excepto para aquellas más elementales relacionadas con la propia intervención a llevar a cabo.  
Cabe recordar que las investigaciones sobre problemas sociales serán llevadas a cabo  
mayoritariamente en España en esos años, desde disciplinas afines, y prácticamente hasta que  
los estudios continúen manteniendo el carácter de diplomatura universitaria, que impide el  
acceso directo desde esta a estudios de máster y doctorado, lo que no se producirá hasta la  
segunda década del siglo XXI.  
Los contenidos de la formación muestran su relación con los determinantes históricos  
y socioculturales presentes en la realidad española en la década de los ochenta, especialmente,  
en relación con la reivindicación de los derechos sociales, con materias que tratan aspectos de  
Derecho Constitucional, o de Política y Bienestar Social, que estudia las políticas sociales de  
los distintos sistemas estatales e internacionales. Todo ello en sintonía, además, con los  
discursos que se recogen en los diferentes congresos profesionales de la época, y que reflejan  
al mismo tiempo, las luchas por la democracia de las que venían participando las trabajadoras  
sociales.  
692  
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Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 672-694, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
30 años de debates sobre instrumentalidad:  
reflexiones desde la experiencia docente e  
investigativa del Trabajo Social en Costa Rica  
30 Years of Debates on Instrumentality: Reflections from Teaching and  
Research Experience in Social Work in Costa Rica  
Freddy Esquivel Corella*  
Resumo: El presente artículo retoma el debate  
sobre instrumentalidad que alcanzó 30 años de  
madurez y expansión en el Trabajo Social de  
América Latina, repercutiendo en los procesos  
formativos, investigativos y de reproducción del  
ejercicio profesional. En Costa Rica -como en el  
resto de Centroamérica- adquirió un lugar  
fundamental que ha debido enfrentar  
Abstract: This article resumes the debate on  
instrumentality, which has matured and  
expanded for 30 years in Latin American social  
work, impacting academic, research, and  
professional reproduction processes. In Costa  
Rica—as in the rest of Central America—it has  
acquired a fundamental position, but has had to  
confront certain intellectual, academic,  
political, and ethical conditions that challenge  
the rigor, depth, and analytical rigor inaugurated  
by Dr. Yolanda Demetrio Guerra's masterpiece  
in 1995.  
determinadas  
condiciones  
intelectuales,  
académicas, políticas y éticas que desafían el  
rigor, la profundidad y el asidero analítico que  
se inauguró con la obra maestra de la profesora  
Dra. Yolanda Demetrio Guerra en 1995.  
Palavras-chaves: Instrumentalidad, Trabajo  
Keywords: Instrumentality; Social Work;  
Social; Marxismo; Historia; Costa Rica.  
Marxism; History; Costa Rica.  
A modo de introducción y remembranza:  
El presente escrito fue elaborado para su exposición en la celebración del treinta  
aniversario1 de la obra “A Instrumentalidade do Serviço Social”, de la profesora visitante de la  
Universidad Federal de Juiz de Fora (Brasil) Dra. Yolanda Guerra, publicado por primera vez  
en 1995 por la Editora Cortez (São Paulo, Brasil).  
* Universidad de Costa Rica. E-mail: freddy.esquivel@ucr.ac.cr  
1 Dicha actividad académica se llevó a cabo los días 2 y 3 de julio del 2025, en las instalaciones de la Universidad  
Federal de Juiz de Fora (Minas Gerais), con el apoyo de la Universidad Federal Fluminense (Río das Ostras), de  
la Universidad Federal de Rio de Janeiro, teniendo financiamiento de FAPEMIG y el respaldo de la Asociación  
Brasileña de Enseñanza y Pesquisa en Servicio Social, en tanto conmemoración previa a la celebración de los 100  
años de fundación de la primera Escuela de Servicio Social en América Latina (Santiago, Chile, 1925).  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.49487  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 17/07/2025  
Aprovado em: 13/11/2025  
Freddy Esquivel Corella  
Las páginas que continúan, se sustentan en bibliografía especializada sobre el tema, pero  
también, en algunas narraciones de la propia experiencia de quien escribe, en razón de la  
trayectoria de acompañamiento que se ha tenido sobre el debate de la instrumentalidad en el  
contexto costarricense, y que, a la vez, permite rememorar estas tres décadas de idas y venidas  
alrededor del lugar y el sentido del ejercicio del Trabajo Social.  
Inicialmente cabe situar que debatir acerca de instrumentalidad en la categoría  
profesional, solamente ha sido posible a partir del camino recorrido, con fracturas y  
prolongaciones, en el sentido más amplio que direccionó el llamado Movimiento de  
Reconceptualización, en tanto evidencia tangible, con el paso de las décadas, de los esfuerzos  
de maduración, diversidad y pluralidad en el campo del Trabajo Social, planteando, desde  
entonces, una confrontación con las posiciones conservadoras y positivistas hegemónicas, al  
tenor de un estudio más riguroso, profundo y complejo, tanto de la obra marxiana, como, entre  
otras vertientes, del inédito aporte del filósofo húngaro G. Lukács (Sousa, 2016; Faria; Silva,  
2021).  
Desde la experiencia de quien escribe, derivada desde el istmo centroamericano, la faena  
de familiarizarse y asimilar el debate de instrumentalidad, en absoluto ha sido sencillo; se  
constituyó en un desafío personal, intelectual, político, académico y profesional.  
En América Central el llamado Movimiento de Reconceptualización, fue el contacto más  
intenso que esta región de Latinoamérica alcanzó con el patrimonio de los avances  
profesionales de Suramérica, como con los sustentos que aún perduraban del Servicio Social  
europeo (Faleiros, 1976).  
696  
La consolidación de las primeras experiencias académicas y las complejidades  
derivadas por legitimar y sustanciar el mundo laboral y profesional de dicha categoría en  
Centroamérica, tuvieron como base fundacional el Social Work, una praxis impregnada del  
proyecto societal norteamericano yanqui, forjada en los emporios metropolitanos  
industrializados y financieros de New York, Chicago, Columbia, entre otros (Luquet; Monroe,  
2022).  
Dichos entornos, se distanciaban completamente de las devastadas naciones  
centroamericanas, sometidas a la invasión y el etnocidio español, el constante asedio británico,  
y el filibusterismo norteamericano, maniobrando para someter este estrecho, pero estratégico  
territorio, al llamado “Destino Manifiesto” (Fonseca, 2013), lo cual, se potenció con la  
expansión del capitalismo monopolista y su materialización en una economía desigual y  
combinada como explicó Marini (1981).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 695-716, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
30 años de debates sobre instrumentalidad:  
reflexiones desde la experiencia docente e investigativa del Trabajo Social en Costa Rica  
El Social Work, en tanto praxis fenomenológicamente diferenciada del Servicio Social europeo  
y sus ramificaciones en América del Sur (Esquivel, 2024), se caracterizó desde inicios del siglo  
XX, por tratar de responder al proyecto capitalista norteamericano (Devine, 1922), cuyos  
marcos filosóficos y teórico-sociales eran próximos al pragmatismo, al utilitarismo, al  
conductismo, al estructuralismo, al funcionalismo, y también, transversalizado por influencias  
teológico protestantes anglosajonas, donde más adelante, el psicoanálisis clásico fue  
adquiriendo preponderancia (Yelolly, 1980; Payne, 2005).  
En términos del debate que aquí nos convoca, los basamentos para Centroamérica  
fueron tendencialmente derivados de la racionalidad lógico formal abstracta (Gutiérrez;  
Miranda, 2014), encuadrado ello en la prolongación de la decadencia ideológica, como  
explicaba Lukács (1968), pero aún más exacerbada, sumado a las antinomias de vectores  
deontológicos cargados de referenciales puritanos y protestantes, que tomaron lugar en una  
ética ya bastante bien caracterizada por Max Weber (2004).  
En esas condiciones, el debate marxista, a lo sumo, fue colocado como nota al pie en  
algunas clases de desarrollo y teorías económicas, acentuando aquel sesgo economicista, ya  
debatido en bastante literatura más cercana a los análisis ontológicos. Durante la llamada Guerra  
Fría2, ese contenido prácticamente se fue disolviendo (Rojas; Solano, 2018), junto a la  
nomenclatura “cuestión social”, que había llegado a estas latitudes por influjos anarquistas,  
socialistas, reformistas, y con ciertos representantes de un liberalismo social de las oligarquías  
locales, mostrando, al mismo tiempo, poca evidencia de su lugar en el discurso de la Iglesia  
Católica, debido a la carencia de una capa de intelectuales del clero formados en doctrina social  
(Brenes, 2019).  
697  
Existe importante literatura profesional que explica que el marxismo que se filtró  
durante el Movimiento de Reconceptualización, estuvo signado por el estructuralismo francés,  
el uso de segundas fuentes, mostrando una importante positivización, siendo interpretado en un  
2
El contexto donde se desarrolla más cercanamente la defensa de la racionalidad instrumental. Según Guerra  
(1995), es en la pos Segunda Guerra Mundial, cuando el imperialismo norteamericano pasa a comandar la  
hegemonía internacional, donde su racionalidad reposa al nivel de una política capaz de mantener la dominación  
necesaria y la sobrevivencia del sistema capitalista. Léase: El contexto de la crisis de hegemonía del imperialismo  
norteamericano, que desarrolla en los países capitalistas dependientes formas agresivas y represivas de control,  
aquella razón racionalista, tecnocrática, instrumental es colocada en cuestión, ya que el foco de análisis pasa a ser  
las consecuencias y costos sociales que derivan del desenvolvimiento de las fuerzas productivas (Guerra, 1995, p.  
74). En ese mismo entorno histórico, la autora subraya que se encuentra la presencia de un nuevo interlocutor en  
la crisis de los paradigmas, el cual es el neo-irracionalismo, que se apoya en la racionalidad formal, cayendo en el  
escepticismo de las posibilidades de la razón, a saber: “La consecuencia es, conforme observa Lukács (1968), la  
destrucción de la razón, dado que la ataca en sus fundamentos constitutivos y disuelve su perspectiva universalista,  
excluye la necesidad del concepto, niega la objetividad, transformándolos en elementos exógenos al sistema”  
(Guerra, 1995, p. 70).  
Freddy Esquivel Corella  
sentido doctrinario, militante y de activismo armado (Iamamoto; Dos Santos, 2021), lo cual, en  
terrenos como el Centroamericano, recibió poca resistencia, debido al escaso arco intelectual  
que pudiera hacer frente a esos sesgos (Esquivel, 2021).  
Se sumó a ello, el entorno convulso de inestabilidad política y persecución ideo-  
partidaria y sindical, impulsado también desde el imperialismo norteamericano, con el que  
comulgaban bastantes oligarquías de la zona (Pérez, 1990; Fonseca, 2013), como a su vez,  
porque el aguante conservador en Trabajo Social3, ganó terreno para neutralizar y confinar sus  
cuestionados avances, revalidando, modernizando y maniobrando bajo los entonces discursos  
progresistas del desarrollo humano, la calidad de vida, el combate a la pobreza y los derechos  
humanos, en ambientes de reconstrucción democrático electorales (Esquivel; Silva, 2025).  
Una conclusión interesante, es que en lugar de una “virada”, en estos procesos  
académicos y gremiales en Centroamérica, más bien se intensificó el sincretismo, que según  
Netto (1995), ha caracterizado genéticamente a esta profesión, posteriormente oxigenado por  
el neopositivismo, el neoconservadurismo, el postestructuralismo y la posmodernidad, en un  
difuso entramado con el neodesarrollismo y los primeros influjos neoliberales; las posturas más  
críticas hasta ahora localizadas, fueron ciertas oscilaciones desde algunos referentes de la  
llamada Escuela de Frankfurt y la obra de Habermas (Esquivel, 2021, 2024).  
Todo lo expuesto, ilustra las condiciones imperantes y las implicaciones que ello  
generaba para, en primer lugar, tener un acercamiento, no quisiera escribir casual, con las obras  
producidas principalmente en Brasil y ahí con la tradición marxista.  
698  
Fue en Guatemala en 1995, en el XV Seminario Latinoamericano de Escuelas de  
Trabajo Social y Servicio Social, que se materializó el contacto con la producción de Cortez  
Editora; tanto para El Salvador, Guatemala y Costa Rica, ese espacio brindó el primer marco  
de acercamiento a la Biblioteca Latinoamericana de Servicio Social, coordinada en ese entonces  
por el profesor Dr. Carlos Montaño de la Universidad Federal de Río de Janeiro (Brasil); no  
circulaba aún en castellano4 el libro de la profesora Dra. Yolanda Guerra sobre  
instrumentalidad5.  
3
Es un imperativo hacer mención, que, a pesar de ese entorno, por un corto tiempo operó desde la Universidad  
Autónoma de Honduras, la Maestría Latinoamericana de Trabajo Social, que se constituyó en un brazo de densidad  
académica para esta región, aunque luego pasó ser absorbida por los direccionamientos neodesarrollistas, que han  
moldeado un número importante de programas de posgrado de dicha rama en Centroamérica (Esquivel, 2021).  
4
En castellano empezó a circular en 2007, nuevamente gracias al esfuerzo de Cortez Editora, bajo el tesonero  
trabajo de traducción de la profesora Dra. Kattia Marro y el profesor Dr. Ramiro Dulcich.  
5 Sin embargo, fue tal el impacto de ese intercambio, que para el año 1996 se celebró en San José de Costa Rica,  
el I Congreso Universitario Internacional de Estudiantes de Trabajo Social, que fue un evento pensado para  
conectar nuevas generaciones estudiantiles, animar la organización universitaria en América Latina y definir una  
agenda de posibles eventos, gracias a los recursos de las universidades públicas de la región; la consigna de ese  
encuentro fue: “El Trabajo Social en el contexto de las políticas neoliberales”.  
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30 años de debates sobre instrumentalidad:  
reflexiones desde la experiencia docente e investigativa del Trabajo Social en Costa Rica  
La profesora Yolanda Guerra donó en ese tiempo ejemplares de su recién publicada obra  
sobre instrumentalidad en lengua portuguesa; a lo cual, es menester remembrar, que no se había  
localizado contemporáneamente, evidencia significativa, de un diálogo histórico desde  
Centroamérica con Brasil, en materia de debates académicos y profesionales; quizás, porque  
fue ahí uno de los epicentros del Movimiento de Reconceptualización que habían combatido  
las fuerzas conservadoras del Trabajo Social centroamericano, a su vez, porque aún se  
localizaban influencias marxistas, o bien, debido a que se privilegiaba la bibliografía  
norteamericana, o de otras ramas de las llamadas ciencias sociales, humanas o de la filosofía  
expresamente positivizada6.  
Cabe aclarar que para entonces circulaban en esta región obras del Centro  
Latinoamericano de Trabajo Social (CELATS), órgano de investigación y formación de la  
entonces Asociación Latinoamericana de Escuelas de Trabajo Social (ALAETS) (CELATS,  
1983), así como selectas producciones de la Editorial Hvmanitas, Ecro y Espacio Editorial; en  
esos años, el acceso a internet era extremadamente restringido y con poco contenido si se le  
compara con la actualidad.  
Se logró, con el paso del tiempo, tener más acceso a la bibliografía en castellano de la  
Biblioteca Latinoamericana de Servicio Social como la obra de Pereira (2002), Netto (1995) e  
Iamamoto (1995), así como algunos libros y revistas en portugués, sin embargo, se adolecía de  
muestras de su calado en los procesos formativos, debates gremiales o estudiantiles, que, casi  
al finalizar la década del noventa del siglo pasado y los inicios del presente, tenían poca  
sustancia relacionada con las agendas de discusión profesional.  
699  
A pesar de ello, un limitado grupo estudiantil colocó la necesidad de aprender a leer  
portugués con la finalidad de ampliar el acervo bibliográfico que circulaba en el país, para junto  
a ello, tratar de resolver ciertas demandas académicas vinculadas con sus trabajos finales de  
graduación de licenciatura, aspirar a intercambios con universidades brasileñas y abonar a las  
tareas docentes con nuevos insumos.  
Sin embargo, uno de los desafíos más determinantes que la obra de Guerra (1995) planteaba,  
en absoluto se lograba resolver sin un esfuerzo intelectual y político mayor: estudiar  
6
Por ejemplo, para ese entonces en Costa Rica era explicada como: “(…) una disciplina y una profesión con  
objetivos de cambio social, mediante la intervención asistencial, terapéutica, promocional, educativa y  
concientizadora en la búsqueda de la realización de los derechos humanos en todas sus formas y manifestaciones.  
Para ello explícita tres dimensiones de estudio e intervención: a) el subsistema microsocial que comprende  
individuos, familias, grupos y organizaciones de base; b) el subsistema intermedio o mezzosocial que supone la  
gerencia de programas sociales públicos y privados y c) el subsistema macrosocial al que corresponde la  
formulación y evaluación de políticas sociales (Molina y Romero, 1994, p. 14) Aunado a lo anterior, se recalca la  
hegemonía de los presupuestos positivistas, que siguiendo a Guerra (1995), se apoyan en la racionalidad  
instrumental, que es la racionalidad substantiva del orden social burgués. (Al respecto ver Netto et al., 1992).  
Freddy Esquivel Corella  
directamente la obra de Marx, así como identificar sus influencias en el campo profesional  
costarricense.  
Dicho proceso ha sido complejo hasta la contemporaneidad, tanto por la notoria  
ausencia de la tradición marxista en las ciencias sociales de esta región, por el rigor y  
sistematicidad que se demanda para penetrar en las obras del pensador alemán, así como para  
intentar confrontar al entorno intelectual antes descrito, que, por ejemplo, para el contexto local,  
se sintetizaba en la hegemonía estructural-funcionalista, sistémica y donde prevalecía la ética  
neotomista con traslapes protestantes (Castro, 2019).  
De tal manera, se recalca que fue en el proceso de investigación de los trabajos finales  
para optar por el grado de licenciatura en Trabajo Social, tramo académico en el que se exige,  
por ejemplo, una tesis inédita, donde se posibilitó filtrar principalmente de “abajo para arriba”  
el debate de la instrumentalidad.  
Destacaron en ese período finisecular, algunos ejes nucleares relacionados con la  
naturaleza de la profesión, los textos de Montaño (1998) y Martinelli (1992), las explicaciones  
de Iamamoto (1995) sobre el Servicio Social y la división social del trabajo, los razonamientos  
de Netto (1995) sobre la categoría profesional y su organicidad con las amplias  
transformaciones del capitalismo monopolista, así como la obra de Pereira (2002) sobre  
necesidades humanas; pero en la particular experiencia de quien escribe, el desafío fue  
recuperar el debate de instrumentalidad de Guerra (1995).  
700  
Instrumentalidad y los desafíos para asimilar el debate en la formación académica  
A partir de lo reconstruido anteriormente, sería mezquino iniciar este breve apartado sin  
dejar de referir a que, al inicio del siglo XXI en la Universidad de Costa Rica, se empezó a  
formular una reforma curricular entonces liderada por la profesora M.Sc. María Lorena Molina;  
en ella se trataban de incorporar algunos de los insumos bibliográficos antes referidos; dicha  
propuesta formativa, se consolidaría en el año 2004 (Molina; Morera; Ruíz, 2005), sin embargo,  
a nuestro entender, cinco aspectos generaron tensiones importantes, y siguen pesando más de  
veinte años después, en especial, para discusiones asociadas a la categoría instrumentalidad.  
El primero refiere a una dispersión, imprecisión y falta de rigor del debate de la tradición  
marxista en la formación académica, ya que, al recuperar las lecciones aprendidas del  
Movimiento de Reconceptualización, cabía preguntarse para esos años, cómo asimilar las obras  
antes mencionadas de la Biblioteca Latinoamericana de Servicio Social, adoleciendo del  
estudio, al menos elemental, pero riguroso y directo, de la obra de Marx.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 695-716, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
30 años de debates sobre instrumentalidad:  
reflexiones desde la experiencia docente e investigativa del Trabajo Social en Costa Rica  
Principalmente, porque, a nuestro entender, dichos contenidos fueron delegados a los cursos de  
sociología, que transformaban el patrimonio marxiano en otra corriente sociológica, donde la  
fuente de referencia que predominaba era el Manifiesto del Partido Comunista (Marx; Engels,  
1970).  
En segundo sitio, la carencia de profesorado que pudiera impartir esos contenidos, tanto  
por la ausencia de personal que hubiese estudiado marxismo (ya que la mayoría se adscribían  
al funcionalismo y la teoría de sistemas), y que validara su lugar indispensable en la formación  
de profesionales en Trabajo Social; junto a ello, que estas docentes también dieran evidencia  
de haber profundizado en las obras de lo que paulatinamente pasó a llamarse más extensamente  
en América Latina: Trabajo Social Crítico7.  
Como tercer aspecto, que fue insalvable, al avanzar en el asunto del fundamento teórico-  
metodológico de dicha reforma, predominaron las formulaciones planteadas por Molina y  
Romero (2001), obra criollamente costarricense, llamada “Modelos de intervención asistencial,  
socioeducativo y terapéutico en Trabajo Social8”, lo cual, generó que ello colisionara con la  
matriz crítica que los debates antes mencionados advertían, y que luego se recalca en la obra de  
Guerra sobre instrumentalidad y la racionalidad formal abstracta.  
Como cuarto asunto, se sitúan las llamadas “prácticas profesionales”, mismas que  
reflejaban una mixtura que arrastraba lógicas de la era del Movimiento de Reconceptualización  
-grupos populares, educación popular, prácticas fuera de las lógicas de la política estatal (con  
influencias formativas abstraídas del análisis del mundo laboral, bajo las reflexiones que  
desataba el estudio de la división social del trabajo que discutía Iamamoto, 1995)-, tratando  
701  
7
Lo cual, se agravó por la carencia de un programa de posgrado que resolviera este asunto, debido a que las  
titulaciones de maestría existentes fueron derivadas también de la fuerte impronta del Social Work, concentrando  
sus contenidos y titulaciones en la intervención terapéutica, la investigación positivista y la gerencia social, este  
último eje, se tornó de importancia para los avances que luego germinarían asociados al tema de la investigación  
sobre instrumentalidad profesional. Léase: Maestría en Trabajo Social: este posgrado (…) plantea tres rutas  
académicas como opciones de los interesados (as) i) Gerencia Social como respuesta al desafío de un Estado que  
fortalecerá la inversión social y sea garante de una mejor administración y que por lo tanto requiere de  
profesionales especializados, ii) Intervención terapéutica: es requerida la especialización en tanto la complejidad  
social y sus repercusiones en lo individual y familiar incrementa la necesidad de profesionales que contribuyan  
con los sujetos en los procesos de esclarecimiento sobre sus sistemas de relaciones-comunicaciones (…) iii)  
Investigación: el tránsito de profesión a disciplina es un desafío actual. Superar interpretaciones e intervenciones  
basadas en el empirismo, sentido común, es un requisito medular en el desarrollo científico y la investigación es  
el vehículo para generar conocimientos y desarrollos teóricos (Molina; Romero, 1994, p. 36-37).  
8 En lo referente a la práctica profesional del Trabajo Social, Guerra (2017) afirma que históricamente su formación  
ha sido limitada a la enseñanza de instrumentos y técnicas de las “llamadas metodologías de acción”. En este  
ámbito la concepción de práctica es la de adiestramiento y entrenamiento. Así como al aprendizaje estricto de los  
campos de acción que contribuye a reforzar la concepción positivista de la “dicotomía entre teoría y práctica”;  
para la autora, la práctica profesional tiene que estar vinculada a las dimensiones técnico-instrumental, teórico-  
intelectual, investigativa, ético-política y formativa.  
Freddy Esquivel Corella  
también de replicar en los espacios donde se desplegaban las experiencias “prácticas”, los  
modelos arriba señalados.  
Finalmente, en quinto sitio, asociado a la prolongación de la carencia de la enseñanza  
rigurosa y analítica de la obra de Marx (incluso sin entrar en el terreno de la producción  
lukacsiana9), de la prevalencia de cuadros académicos con escasa formación actualizada en esos  
debates, que habían heredado en sus licenciaturas estudios neopositivistas y con la intención  
por legitimar los fundamentos teórico-metodológicos desde una propuesta de modelos de  
intervención en los “espacios de práctica”, emergieron importantes antinomias en el debate de  
la ética en la formación, ya que se continuó con una prolongación de la vertiente neotomista y  
protestante, lo cual, tampoco amarraba con los impulsos que para entonces ya eran colocados,  
por ejemplo, en las obra de Barroco y que se tradujo al castellano en el 200410.  
Así las cosas, avanzar en los aportes sobre instrumentalidad, como en lo que respecta al  
análisis de mediaciones, fue más que un proceso materialmente distorsionado, con limitaciones  
de profundización teórica y carente del rigor académico e intelectual que este debate exige.  
En la actualidad, la discusión sobre la instrumentalidad se ha incorporado, con las mismas  
falencias arriba anotadas, incluso como una expresión más de los debates teórico-  
metodológicos contemporáneos, al lado de otras explicaciones modernizadoras, posmodernas  
y decolonizadoras.  
702  
Ahora bien, en lo que respecta a la investigación académica, la instrumentalidad ha  
ganado quizás más terreno, por la impronta de ciertas maniobras de docentes que, habiendo  
hecho estudios doctorales, algunas de ellas en Brasil, así como muy estrechamente vinculadas  
al debate marxista, recuperan su aporte para la aprehensión de los objetos de pesquisa, bajo el  
entendido de que en la mayoría de las ocasiones hay que regresar a subsanar condiciones como  
las expuestas párrafos atrás en la formación del estudiantado.  
Los trabajos finales de graduación asociados a la reproducción socio-laboral de la  
categoría profesional han sido los que latentemente incorporan el análisis de instrumentalidad  
9
Otra de las determinantes en el debate de instrumentalidad es el indispensable estudio directo de la obra del  
filósofo húngaro György Lukács, cuya Ontología del Ser Social aún no se encontraba traducida al castellano; un  
primer texto desprendido de esa monumental producción empezó a circular hasta 2007 en España, editada por  
Akal S.A., bajo el título Marx, ontología del ser social. Para entonces básicamente se tenía acceso a los cuatro  
tomos que publicó Editorial Grijalbo de Estética (1966); luego al conjunto de ensayos intitulados Historia y  
Conciencia de Clase (1969) y El joven Hegel y los problemas de la sociedad capitalista (1970). Capítulos de la  
Ontología del Ser Social fueron paulatinamente traducidos por Ediciones Herramienta de Argentina: Ontología  
del ser social. El trabajo (2004); Ontología del ser social: la alienación (2013). De manera más reciente se publicó  
en castellano Sobre la ontología del ser social/I. Prolegómenos. Cuestiones de principio de una ontología que hoy  
es posible (2024), por parte de Prensas de la Universidad de Zaragoza, España.  
10 Como referencia asociada al debate ético político, ya circulaba en Costa Rica en portugués la obra de Adeodata,  
Vinagre, Apolinari y Gonelli (2001).  
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30 años de debates sobre instrumentalidad:  
reflexiones desde la experiencia docente e investigativa del Trabajo Social en Costa Rica  
en Costa Rica, lo cual, ha potencializado generar conocimientos sobre campos inexplorados  
donde se contratan estos (as) agentes, tales como empresas transnacionales, empresas  
nacionales, cooperativas, fundaciones, asociaciones obreras, así como para comprender el  
mercado general de empleabilidad profesional, la supervisión del trabajo profesional, la  
flexibilización laboral, el desempleo en el gremio, los nuevos nichos socio ocupacionales y el  
debate ético-político.  
Vinculado a ello, también ha sido referente para las investigaciones que analizan  
intervenciones profesionales en materia de violencia contra las mujeres, ámbitos de la  
educación primaria y universitaria, farmacodependencia, elaboración de informes sociales,  
participación social, promoción de la salud, protección del recurso hídrico, cuido, educación  
sexual y política criminológica, entre otras áreas.  
Instrumentalidad como soporte de una experiencia investigativa  
En línea con lo expuesto en las páginas anteriores, corresponde ahora recuperar la  
experiencia de quien escribe, al haber desarrollado la primera investigación directamente  
suplida por la obra de la profesora Guerra (1995) sobre instrumentalidad en el campo  
profesional en Costa Rica, específicamente en materia de gerencia de servicios sociales.  
Para dicha investigación, se colocó la exigencia de un razonamiento11 onto-histórico, entendido  
como aquel que busca comprender la naturaleza material del ser social (objetiva y subjetiva),  
y, por tanto, la totalidad que edifica12 y le mediatiza; para nuestro interés, en la generalidad del  
modo de vida de la sociedad burguesa capitalista y su dialéctico proceso donde se reproduce el  
trabajo (Gonçalves; Rodrigues; Pereira, 2020; Netto, 2023).  
703  
Esa aprehensión onto-histórica, decantó en la demanda analítica de mediatizar y  
desfetichizar el objeto de estudio, o sea, la gerencia de servicios sociales, que se ha colocado  
en los procesos de intervención profesional, más allá de reconocerlos como meros “hechos”;  
por el contrario, exigió profundizarlos en sus movimientos dinámicos, saturados de historia, de  
correlaciones de fuerzas y de antagonismos teleológicos (Netto, 1978).  
11  
Sobre ello se adiciona: “La racionalidad dada por la razón dialéctica es la síntesis de procedimientos activos e  
intelectivos y se torna un adjetivo de la razón que desalinea, desmitifica, niega lo dado en su apariencia y es capaz  
de engendrar acciones que ultrapasan la dimensión manipuladora e instrumental” (Guerra, 1995, p. 44, traducción  
propia).  
12 Guerra (1995) señala que la razón, a lo largo de la historia, se ha vinculado estrechamente con la libertad humana,  
entendida como resultado del dominio sobre la naturaleza y los avances científicos y técnicos. Asimismo, destaca  
cómo la historia se incorpora al contenido de la razón, ya que las personas construyen la historia al responder a los  
desafíos de su tiempo, y a la vez, se constituyen a sí mismas en ese proceso. Esta reflexión se enmarca dentro de  
un debate más amplio y formativo que también ha sido abordado por Lukács (1959).  
Freddy Esquivel Corella  
Guerra (2017) define la instrumentalidad como una categoría propia de la relación entre  
las personas y la naturaleza, que en el orden burgués se transforma en mediación entre personas;  
a la vez, la autora precisa esta noción al considerarla como las propiedades sociales de los  
objetos, atribuidas por las personas en el proceso de trabajo, convirtiéndolos en medios para  
satisfacer necesidades y alcanzar fines, en función de sus posiciones teleológicas.  
En el ámbito del Trabajo Social, la instrumentalidad se presenta como una categoría  
reflexiva que permite identificar las formas de inserción de la profesión, en los espacios socio-  
ocupacionales, como, por ejemplo, las llamadas prácticas gerenciales, así como sus  
competencias y requisitos, conduciendo la comprensión de los vínculos y determinaciones entre  
fuerzas productivas, relaciones de clases, estructura política y expresiones de conciencia en la  
intervención profesional (Guerra, 2000).  
Junto a ello, el debate en cuestión, permitió avanzar en el alejamiento de los tratamientos  
endógenos, eslabonando el análisis al estudio de la reproducción del capital, de sus crisis y del  
significado e implicaciones para la vida social, cuestionando las maniobras de intervención  
imperantes en el campo gerencial, para encubrir o maquillar las devastaciones del mercado en  
la vida social (Vasconcelos, 2015).  
Lo anterior, se recuperó imperativamente, debido a que cuando se abstrae la sustancia  
ontológica del ser social, en el marco de las relaciones sociales instituidas por el modo de  
producción capitalista, se adolece reconocer el conflicto de clases, junto a ello, tampoco se  
identifica a las personas en condiciones de explotación, llegando a refractarse una  
“naturalización” y/o cosificación de las relaciones existentes, como si estuvieran en un “anillo  
de hierro” (Lara, 2017).  
704  
Lo antes expuesto, demandó comprender, según Guerra (1995), la instrumentalidad de  
la práctica profesional13, concatenada al unísono con fundamentos teórico-metodológicos14,  
procedimientos analíticos y categorías intelectivas, a la luz de un proyecto ético-político y de  
sociedad, que extrapolaran el ámbito del Trabajo Social y que interrogaran las racionalidades15  
13 Práctica profesional, es concebida en este escrito como el ejercicio de la praxis profesional del Trabajo Social  
para atender las demandas que la sociedad capitalista burguesa le coloca, bajo un cuerpo de conocimientos al  
amparo de una teoría social, y, por ende, de un proyecto de sociedad, con un colectivamente acordado sustento  
ético-político, que maniobra con recursos técnico-operativos, procedimentales e instrumentales, en escenarios  
altamente contradictorios.  
14 Sobre lo anterior se apunta: Al ser “encuadrado” como profesión de carácter eminentemente técnico, al ejercer  
funciones ejecutivas, el asistente social piensa poder eximirse de la reflexión teórica in totum y fija su foco de  
preocupaciones en su cotidiano profesional, por lo que los modelos analíticos e interventivos, testados y  
cristalizados por sus experiencias y de otros, son suficientes. A esto se combina el elenco de disciplinas que se  
dedican a los hechos de la realidad empírica, que le refuerza un cuadro referencial teórico ecléctico, segregado en  
informaciones parciales, fragmentadas, generalizantes (Guerra, 1995, p. 170, traducción propia).  
15  
Guerra (1995), analiza las diversas matrices fundamentales de la razón moderna, como son el sistema ético-  
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30 años de debates sobre instrumentalidad:  
reflexiones desde la experiencia docente e investigativa del Trabajo Social en Costa Rica  
subyacentes en las formas de ser y pensar de la profesión, así como las finalidades16 colocadas  
en las llamadas praxis gerenciales (Gianna; Mallardi, 2011; Alves; Gianna, 2024).  
Así las cosas, el estudio de Guerra, permitió centrar inéditamente el debate entre la  
instrumentalidad del Trabajo Social y las racionalidades subyacentes en el campo del  
gerenciamiento social, ambas construidas en el campo de las fuerzas en las cuales la profesión  
se reproduce (tomadas como determinaciones diferenciadas de un mismo proceso),  
conduciendo a las comprensiones de las singularidades del Trabajo Social17, en el marco de las  
expresiones universales de la sociedad capitalista consolidada (Soares, 2008).  
El debate sobre instrumentalidad, fue incisivo para develar la racionalidad lógico formal  
para el abordaje de la “cuestión social” desde las llamadas intervenciones gerenciales,  
especialmente en este escenario neoliberal que ha encubierto, entre otros, el traspaso de la lógica  
del Estado a las lógicas del mercado, de pregonar una sociedad civil enlazada a una  
participación social despolitizada y deseconomizada, de legitimar maniobras de hiper-  
focalización, de redistribución asistencialista, de acciones de búsqueda de mayor eficacia,  
eficiencia y maximización de recursos, respaldando los recortes presupuestarios en materia  
social, de flexibilización, desreglamentación y desregulación de los derechos sociales, de  
terciarización de servicios, de desestabilización y destrucción del empleo (Silva, 2021).  
Igualmente, al tenor de estas reflexiones se constató que la valoración, evaluación y legitimidad  
de políticas y servicios sociales, que esas prácticas gerenciales apuntalan, pasaban  
tendencialmente a ser tamizadas reiteradamente según criterios racionalistas lógico-formales,  
que respondían a su “función” de complejos minimizadores de conflictos y reproductores  
parciales de fuerza de trabajo (Pontes; Oliveira; Marinho, 2022).  
705  
Lo cual, trajo a colación que desde su naturaleza, el Trabajo Social históricamente ha  
estado intentado responder a las demandas que el colectivo profesional recibe contextualmente,  
coyunturalmente y epidérmicamente, producto de la sociabilidad imperante y encarnadas en las  
condiciones de vida de camadas expoliadas cada vez más numerosas; teniendo como  
contracara, las presiones de los entes contratantes para gerencialmente, atenuarlas, disimularlas,  
filosófico kantiano y la filosofía especulativa de Hegel, además, incorpora referencias a la razón dialéctica y a su  
contrapunto el racionalismo formal-abstracto, reflexiones que la llevan al estudio del racionalismo burgués  
moderno, como última forma de explicación y organización de la sociedad.  
16  
Entendemos, según escribe Guerra (2017), que la teleología va a estar siempre permeada por dos elementos,  
razón y voluntad; ya que son ellos quienes direccionan las escogencias de “el qué”, “cómo” y “para qué” hacer, de  
ahí que los resultados de las acciones dependen tanto de la existencia de condiciones favorables, como de lo  
coherente de las escogencias y de las intervenciones práctico-críticas a los objetivos y al proyecto ético-político  
que se prioriza, y también de la correlación de fuerzas presentes en el momento.  
17  
Dentro de las contradicciones a las que se enfrenta el Trabajo Social, es necesario ubicar el espacio donde se  
crea y reproduce la profesión, el cual es altamente sincrético, ya que su génesis se ubica en un marco de demandas  
altamente fragmentado y carente de un referente teórico crítico-dialéctico (Netto, 1995).  
Freddy Esquivel Corella  
condicionarlas, anticiparlas y controlarlas, como aparentes respuestas (Gianna, 2015; Lavoratti;  
Costa, 2016; Siqueira, 2023)  
Derivando en la comprensión del colectivo profesional, en su innata condición  
asalariada18; lo cual, es todavía un imperativo mayor, para establecer parámetros de  
movilización en espacios de incertidumbre que arrojan las mediaciones constitutivas de su  
intervención profesional19 (Horst; Freire; CRESS, 2023; Sousa, 2008; Guerra, 2020).  
Por ello, se logró debatir aquellas concepciones que argumentaron que la intervención se  
encuentra regida por procedimientos, criterios, normas y reglamentos previamente definidas  
por las organizaciones sociales, sobre los cuales las (os) agentes profesionales no ejercen  
influencia, resistencia, reconducción o espacios de maniobra alguna (Guerra, 2025; Forti;  
Guerra, 2010).  
Todavía, de manera más delimitada, en especial para una profesión con demandas de  
intervención tan determinantes como lo es el Trabajo Social, y en los llamados espacios  
gerenciales, la investigación de Guerra (1995), auxilió para situar los influjos que han tenido  
preponderancia para ecualizar la comprensión entre naturaleza y sociedad, al limitar el  
conocimiento a la apariencia inmediata, donde el racionalismo formal acaba por trasladar  
procedimientos del método lógico experimental para el análisis de la sociedad, lo que permite  
establecer tanto modelos20 de explicación, como patrones programáticos de intervención social,  
706  
18  
Léase muy detenido lo siguiente: “(porque por favor, no nos hagamos ilusiones, quien entra a trabajar a una  
institución, a una organización, tiene compromisos muy claros y no los puede violar arbitrariamente) (...) Este rol  
mediador no significa ni un aporte a la sublevación o a la insurrección general. Significa (...) colocar una especie  
de piso donde se pueda transaccionar, negociar” (Netto, 1998, p. 48). Debe reconocerse también que el/la  
profesional en Trabajo Social vivencia algunas premisas similares que el resto de las camadas asalariadas en el  
capitalismo, vendiendo sus conocimientos, habilidades interventivas, prácticas privativas por ley, elaboración de  
ciertos productos -peritajes, estudios, diagnósticos, informes, evaluaciones, investigaciones, entre otros ,  
respondiendo por lo tanto a las exigencias de la organización contratante, sea por jornada laboral, resultados,  
cumplimiento de objetivos o entrega de evidencias específicas.  
19  
A lo cual se agrega: “(…) la legitima demanda proveniente de las necesidades sociales de los segmentos  
demandantes de los servicios sociales. La demanda profesional incorpora la demanda institucional pero no se  
restringe a ésta, pudiendo y debiendo ultrapasarla. La construcción de la demanda profesional impone al  
profesional la recuperación de las mediaciones ontológicas e intelectivas que dan sentido histórico a la  
particularidad del Servicio Social en una totalidad dada relativa” (Pontes, 1995, p.174, traducción propia). De no  
aprovechar el trabajo con las mediaciones, el o la profesional pueden ubicarse en lo que se ha llamado el profesional  
domesticado o cínico, o bien el/la héroe, léase: “ La primera es la de, simplemente ejecutar sus atribuciones  
institucionales, o sea, desempeñar aquellas atribuciones que le están asignadas por la institución (...) puede  
simplemente situarse ejerciendo una función unilateral, situarse como un vector ejecutivo de la organización o de  
la institución (...) la segunda, es ejercida por aquel profesional que -aun manteniéndose en el espacio de la  
institución o de la organización- pretende hacerse vector únicamente de las demandas de los usuarios, o sea, una  
sola dimensión en el sentido opuesto (...) Es el profesional heroico, es aquel tipo que está dispuesto incluso a perder  
su trabajo, y casi siempre lo pierde. Y al perderlo, no pierde solamente sus condiciones de reproducción, su salario,  
también pierde el espacio profesional específico, porque es precisamente en este campo de tensión que él puede  
desempeñarse como Trabajador Social. El resto es militancia, muy generosa, muy respetable, pero militancia  
profesional voluntaria, que es una forma de escaparse o ser expulsado del campo profesional” (Netto, 1998, p. 36-  
37).  
20  
A lo cual se adiciona: Este repertorio técnico tiene su racionalidad hipotecada a las regularidades sociales  
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reflexiones desde la experiencia docente e investigativa del Trabajo Social en Costa Rica  
para lo cual se ofrece un conjunto de procedimientos manipulativos e instrumentales que orbitan  
en la positividad de los llamados hechos sociales en el capitalismo (Siqueira, 2022).  
Dos ejemplos de ello, en las prácticas gerenciales, han sido la radical influencia de la  
teoría general de sistemas y sistemas complejos, donde se fortalece la concepción del método  
como el conjunto de procedimientos y/o reglas de conocimiento (cuyo legado de Durkheim es  
ejemplar), o hasta como medio de aplicación prescriptivo del Trabajo Social, y en segundo  
lugar, los referenciales pragmatistas y neopragmatistas que siguen emanando de los influjos  
anglosajones trenzados con la posmodernidad y el posestructuralismo, suspendiendo cualquier  
asidero ontológico de la vida social (Gianna, 2016; Berringer, 2019; Guerra, 2022; Potter,  
2017).  
Guerra (2007) pone de manifiesto que en el colectivo profesional es constante la  
demanda de “nuevos” instrumentos operativos, o bien de la efectiva aplicación de la teoría en  
la práctica, lo cual, se vincula al señalamiento de que en el caso de la gerencia social,  
tendencialmente se ha brindado la ilusión que su ubicación privilegiada en las líneas de mando  
o toma de decisiones, establece una supuesta excepción a otras prácticas tradicionales; sin  
embargo, ello no rompe en absoluto con que él o la profesional se circunscribe a un espacio  
inmediato que captura apenas la forma de aparecer de los hechos y los fenómenos, pero no  
alcanza sus propiedades constitutivas, tampoco su naturaleza contradictoria y las posibilidades  
de revertir que ellas poseen.  
707  
Según el análisis realizado desde la instrumentalidad acerca del gerenciamiento de  
servicios sociales, se comprueba la reiteración de un espectro racional que sigue estimulando  
en el ejercicio profesional la fijación de los hechos en patrones y procedimientos  
predeterminados, lo cual limita la conexión, la articulación, o la vinculación entre las instancias  
socio-económicas, políticas e ideo-culturales, impidiendo rescatar las mediaciones21  
ontológicas22 presentes en el modo de vida en que el capital se reproduce (Morais; Sobral, 2023).  
epidérmicas del orden burgués -tal repertorio es esencialmente la transcripción inmediata de éstas al plano del  
pensamiento formal abstracto. Por eso mismo, en los períodos donde la reproducción de las relaciones sociales se  
da sin revisión crítica de su procesamiento estable (o sea, fuera de las situaciones de crisis), su articulación teórica  
y su instrumentación práctica- tanto sus sistemas de saber cómo sus instrumentos técnicos, se revelan sincronizados  
a las epidermis del movimiento social y aptos sea para aportar una explicación coherente sobre éste, sea para  
encontrar formas interventivas como grados viables, pero efectivos, de eficacia (Netto, 1995, p. 99).  
21 Reconociendo la discusión ontológica e intelectiva de las mediaciones, se pone de relieve que el o la profesional  
en Trabajo Social actúa con y en las mediaciones, pero no es una de las mediaciones, o un/a mediador/a, aunque  
sí un/a articulador y potencializador de mediaciones, en una palabra, escribe Pontes, “(…) él actúa en los sistemas  
de mediaciones que moldan las refracciones de la “cuestión social”, constitutivas de las demandas sociales a la  
profesión” (Pontes, 1995, p. 177, traducción propia).  
22  
Pontes señala al respecto: La búsqueda de la expresión de las leyes universales, presentes en el espacio  
institucional, con la consecuente abstracción de las condiciones singulares que tipifican los problemas sociales que  
demanda acción profesionalizada, conducen al movimiento complejo de la razón en la reconstrucción del objeto  
Freddy Esquivel Corella  
Justamente, parece ser que las maniobras gerenciales, más bien refuerzan esas  
directrices a favor del capital, de las lógicas del Estado, del mercado, de los condicionamientos  
de los organismos internacionales y sus patrones de dirección, con nuevos lenguajes,  
justificaciones, evidencias amoldadas a los fines que se persiguen, operando como un  
importante soporte ideológico (Ver Esquivel, 2022).  
Lo cual, desata una intervención centrada en la búsqueda de la manipulación de  
variables empíricas (vertidas en la cotidianidad), como escenario inmediato de este conjunto de  
agentes profesionales del entramado gerencial, mostrándose aparencialmente como destrezas  
efectivas, amparadas también a particulares marcos éticos23 (Lima; Rodrigues, 2024).  
Por lo cual es valioso subrayar lo que advierte Guerra (1995), cuando acota que en esas  
condiciones, las discusiones sobre el significado social y político de la profesión pasan a  
segundo plano, en detrimento de las formas de realizar la intervención, debido a que al no  
atribuir la debida importancia a las expresiones de representación de la profesión -a su razón de  
conocer-las(os) asistentes sociales, suprimen el contenido social de sus acciones, e incorporan  
(acríticamente) el contenido funcional, social y “naturalmente” atribuido”.  
Lo anterior, en la experiencia de investigación desarrollada, se comprobó en cambios  
promovidos por las propias personas en las nomenclaturas de sus puestos, pasando de ser  
profesionales en Trabajo Social a gerentes regionales, de área o de servicios; más orgánicos a  
la estructuración institucional que a la categoría profesional.  
708  
Tal y como se ha logrado ilustrar, esas expresiones inmediatistas que se contienen  
muchas veces como verdaderas en los nichos ocupacionales, solamente reproducen una  
tendencia simplificadora de la complejidad que se entrama en los procesos de intervención  
profesional.  
Lo anterior, es reforzado al reconocer que la racionalidad positivista hace posible que la  
realidad no se revele tal cual de manera automática; por ello, se exige que los y las profesionales  
de intervención de los sujetos y las refuerzas sociales presentes. Este procedimiento cognitivo no significa un  
abandono de lo empírico, de la dimensión fáctica, sino, la búsqueda de su particularidad ontológica (Pontes, 1995,  
p. 168, traducción propia).  
23 Esa instrumentalización esta mayormente permeada por la racionalidad lógico-formal abstracta, que viene a ser  
respaldada en los sustentos del discurso conservador, y reforzados por la ética neotomista. Esa relación no le  
permite superar el panorama inmediato que se le refuerza ideológicamente, por lo cual, apega su ejercicio  
profesional al cumplimiento de los valores que son fundamento del pensamiento conservador. Por ende, el  
aislamiento de lo político en el ejercicio profesional, según la racionalidad hegemónica, lo torna más científico, y  
por la ideología que lo baña, lo hace supuestamente más neutral. Desde una posición endogenísta y  
neoconservadora, la profesión del Trabajo Social en su referencial ético-político, conserva y reproduce los  
elementos que constituyen un legado ético de las corrientes neotomistas, asimismo, un aislamiento de lo político  
como parte constitutiva de las mediaciones donde los/as profesionales desarrollan su práctica; incluso se acepta  
por parte de algunos grupos que el ejercicio del Trabajo Social no es político, que no son personas políticas y, por  
ende, que lo “político” está fuera de su marco de acción profesional.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 695-716, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
30 años de debates sobre instrumentalidad:  
reflexiones desde la experiencia docente e investigativa del Trabajo Social en Costa Rica  
aprehendan las determinaciones que se generan en la relación capital-trabajo, como una  
totalidad altamente contradictoria, en relación con el movimiento social que emana de los  
conflictos que estas relaciones generan.  
En el espacio de las demandas organizativas ante el intelecto del profesional, éstas  
aparecen sin mediaciones, norteadas por los objetivos técnico-operativos, como un fin en sí  
mismo, y según la experiencia de la investigación desarrollada por quien escribe, bajo  
discursivas de “bien común”, “justicia social”, “democratización”, “participación”,  
“priorización”, “uso racional de los recursos”, “responsabilidad” y “concientización”.  
Por ello, Guerra (1995) coloca de forma innegociable, interrogar a la categoría  
profesional en el debate del mundo del trabajo, de las relaciones de clases, de las  
configuraciones del Estado, de la socialización y la sociabilidad, y de sumo interés, penetrar en  
la recuperación de las políticas sociales, no apenas en cuanto espacio de inserción privilegiado  
del Trabajo Social, si no, sobre todo, en razón de su determinación, ordenamiento y prescripción  
de las formas de intervención  
Sin embargo, Guerra (1995) reconoce que la razón24 no es por sí sola determinante de la  
realidad, pero sí una forma de percibir y comprender lo real; es la vía que, según su argumento,  
reestablece el encuentro entre la persona que conoce y el objeto a ser conocido, lo cual, no se  
debe confundir con identidad, ya que la realidad siempre es más rica de determinaciones que la  
capacidad intelectiva de atraparlos.  
709  
La razón es una condición en el momento en que el pensamiento busca aprehender la  
realidad como movimiento, y es por eso que tiene que recorrer abstracciones más simples, dadas  
por el intelecto, en el sentido de determinarlas por medio de las mediaciones que vinculan los  
hechos a determinados procesos, saturados de determinaciones. Ella lleva en su interior la  
posibilidad de establecer relaciones, reconocer y reconstruir las condiciones objetivamente  
dadas25.  
Al razonar, se incorporan los elementos del sentido común, necesarios para las acciones  
cotidianas, como aquellas construidas por los procedimientos que el intelecto realiza,  
24 Desde luego la razón es capaz de refigurarla por la vía de del pensamiento: “La razón es lo que da inteligibilidad  
a los hechos y estos se constituyen en sus fundamentos, al mismo tiempo en que son constituidos, constitutivos y  
constituyentes de relaciones que obedecen a los principios de causalidad y contradicción” (Guerra, 1995, p. 43,  
traducción propia).  
25  
Pontes (1995) agrega que delante de un cuadro aproximativo del movimiento dialéctico de las categorías  
históricas y de las mediaciones ontológicas, el o la agente profesional podrá participar del proceso intelectivo,  
seguramente, con posibilidades más amplias de alcance de atención de las demandas socio-profesionales. Además,  
el autor explica que pueden existir profesionales que trasciendan y reconstruyan las mediaciones donde  
intervienen, y otros/as que no lo hagan; en ambos casos, éstas se encuentran presentes ya que son ontológicas, y  
no una “opción”.  
Freddy Esquivel Corella  
superándolo; por tanto, se atrapan las conexiones causales de la realidad en la propia praxis,  
que, al engendrar nuevas conexiones en la realidad, permite refigurar la realidad por el  
pensamiento (Netto, 1998).  
Por tanto, deben localizarse histórica y teóricamente el campo de tensiones, oculto en la  
lógica rectilínea de la demanda organizacional, lo cual, implica reconstruir las verdaderas  
demandas socio-profesionales, a través de un análisis de negociación de lo inmediato,  
trascendiendo el elemento empírico26.  
Obliga todo ello a recuperar las conexiones entre la singularidad-particularidad-  
totalidad27, por tanto, se vienen a romper los moldes lógico-formales construidos por medio de  
la razón predominante.  
Por ello se exige la necesidad de que la categoría instrumentalidad asuma un papel  
central en el plano del análisis como de la intervención del profesional, y por ende en la  
propuesta de gerencia social, ya que él o ella se mueven en una totalidad compleja en relación  
con otra más compleja y totalizante.  
Consideraciones finales  
La teoría social marxista, logró adensarse de forma muy diversa en el campo profesional  
luego del Movimiento de Reconceptualización, recuperando las lecciones aprendidas durante  
ese proceso; el debate sobre instrumentalidad justamente es una evidencia destacada que  
requiere un entramado de elementos académicos, intelectuales, políticos y culturales que son  
difíciles de situar a lo largo de los procesos académicos de Trabajo Social en América Latina.  
En Centroamérica, la categoría profesional aún se tiene que desafiar intelectualmente,  
académicamente, profesionalmente y políticamente para calibrar la densidad de estos análisis  
en sus procesos de formación e investigación, caso contrario, vulgariza, positiviza y deforma el  
debate de instrumentalidad.  
710  
A juicio de quien escribe, esta región, junto con la América Insular, es la más vulnerable  
y frágil en términos de la direccionalidad y fundamentos profesionales en el continente, quizás,  
26 De esta manera, en su dimensión ontológica (o sea que existen en el ser social independiente de la razón), estas  
mediaciones que estructuran, informan, permiten movimiento, dan textura histórico-social, colaboran en el pasaje  
entre las instancias constituyentes de la totalidad, a través de racionalidad dialéctica; por ello se pone en relieve  
que: “Este es el movimiento de la razón buscando a través del movimiento de lo abstracto a lo concreto, capturar  
las mediaciones ontológicas en su propia estructura del objeto de conocimiento por el sujeto cognoscente. Este  
movimiento va a permitir el ultrapasaje de la fatalidad, con la recuperación de las categorías históricas (concretas),  
conduciendo al agente profesional a una comprensión relativamente próxima del movimiento y constitución del  
objeto” (Pontes, 1995, p. 175, traducción propia).  
27  
Léase: “La racionalidad dada por la razón dialéctica es la síntesis de procedimientos activos e intelectivos y se  
torna un adjetivo de la razón que desaliena, desmitifica, niega lo dado en su apariencia y es capaz de engendrar  
acciones que ultrapasan la dimensión manipuladora e instrumental” (Guerra, 1995, p. 44, traducción propia).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 695-716, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
30 años de debates sobre instrumentalidad:  
reflexiones desde la experiencia docente e investigativa del Trabajo Social en Costa Rica  
cada vez más expuesta a ser absorbida por las líneas maestras del Social Work neoconservador  
y neopragmatista, en especial, en esta coyuntura de crisis del imperio yanqui, lo que pone en  
juego nuestro sueño de la Patria Grande, en palabras de Simón Bolívar.  
Es una verdad incuestionable que debates como el de instrumentalidad ascienden del  
sur de América, desde Brasil principalmente, para el resto del continente y el mundo, los cuales,  
serían imposibles de haberse logrado en muchos entornos académicos de Trabajo Social como  
el centroamericano y caribeño; razón por la cual, se subraya el cuidado y las salvaguardas que  
implican llevar estos avances a nuestros países; ese es un desafío muy complejo, tal y como se  
ha intentado denotar en este escrito.  
Junto a ello, las bases formativas indispensables que reclama el análisis de  
instrumentalidad, potencian los correctos procesos de investigación, caso contrario, se  
reiteraran las deformaciones demostrando nuevamente la “miseria de la razón”.  
Por su parte, la delimitación explicativa de los objetos de investigación, auxiliados por  
el debate de instrumentalidad, direcciona en gran parte la formulación de los problemas de  
pesquisa saturados de profundos referentes que interrogan la razón, la conciencia, los medios,  
los fines, el asidero ético-político, el proyecto profesional, la sociedad y sus legalidades, así  
como los márgenes de maniobra inmediatos y mediatos.  
Así las cosas, las mayúsculas demandas analíticas desde este asidero son un apasionante  
proceso que estimula la recuperación de los movimientos, los procesos y las contradicciones  
que instituyen la totalidad, con sucesivos acercamientos y direccionamientos precisos.  
La respuesta del entorno profesional y académico a estos análisis, debe también ser  
estimado, en especial en estos tiempos de ultraneoliberalismo, donde el neoconservadurismo,  
el neofacismo y el irracionalismo envuelven importantes parcelas del universo societal-  
profesional.  
711  
Investigar desde la instrumentalidad es una apasionante gesta contestataria, por ello, en  
muchos espacios se nos ha querido acallar…pero aquí estamos, 30 años después, desafiándonos  
nuevamente.  
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Diferentes abordagens sobre fundamentos do  
Serviço Social e a necessidade deste debate  
Different approaches to the foundations of Social Work  
and the need for this debate  
Ana Clara Serpa Cardoso*  
Érica Aparecida dos Santos Francisco**  
Luciana Gonçalves Pereira de Paula***  
Resumo: O presente artigo tem por objetivo  
apresentar diferentes abordagens que se fazem  
presentes no debate dos fundamentos do  
Serviço Social. Estes estudos vêm sendo  
acumulados ao longo de oito anos, mas o recorte  
aqui tratado é fruto direto de dois projetos de  
pesquisa: “Mapeamento sobre o debate dos  
fundamentos, formação e trabalho profissional  
no Serviço Social”; “Serviço Social e seus  
fundamentos: tendências e concepções”. O  
artigo traz, ainda, reflexões sobre a necessidade  
da aproximação e/ou retorno ao debate dos  
fundamentos da profissão, procurando  
demonstrar como eles se fazem imprescindíveis  
para a compreensão do significado social da  
mesma. Por fim, tece algumas considerações  
que apresentam a importância do avanço em  
estudos, pesquisas e produções sobre os  
fundamentos do Serviço Social.  
Abstract: This article aims to present different  
approaches present in the debate on the  
foundations of Social Work. These studies have  
been accumulated over eight years, but the  
section discussed here is the direct result of two  
research projects: "Mapping the Debate on the  
Foundations, Training, and Professional Work  
in Social Work"; and "Social Work and Its  
Foundations: Trends and Conceptions." The  
article also reflects on the need to re-engage  
with and/or revisit the debate on the profession's  
foundations, seeking to demonstrate how they  
are essential to understanding its social  
significance. Finally, it offers some  
considerations that highlight the importance of  
advancing studies, research, and production on  
the foundations of Social Work.  
Palavras-chaves:  
Serviço  
Social;  
Keywords: Social Work; Fundamentals; Social  
Fundamentos; Questão social.  
issues.  
* Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: anaclaracardoso.ufjf@gmail.com  
** Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: erica_dos_santos_jf@hotmail.com  
*** Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: lugppaula@ufjf.br  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.50727  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 03/11/2025  
Aprovado em: 12/11/2025  
Ana Clara Serpa Cardoso; Érica Aparecida dos Santos Francisco; Luciana Gonçalves Pereira de Paula  
Introdução  
Este artigo expressa o acúmulo de, aproximadamente, oito anos de estudos sobre o  
tema dos fundamentos do Serviço Social, por parte de uma das autoras1, e a construção de  
diálogos e parcerias, dentro desta temática, com as demais companheiras que contribuíram  
para a construção das reflexões que serão aqui compartilhadas2. Mas, o recorte temático que  
será apresentado decorre, especialmente, dos estudos realizados no decorrer do  
desenvolvimento de dois projetos de pesquisa: “Mapeamento sobre o debate dos fundamentos,  
formação e trabalho profissional no Serviço Social”3, entre os anos de 2023 e 2024; “Serviço  
Social e seus fundamentos: tendências e concepções”4, iniciada em 2025.  
Em se tratando dos fundamentos do Serviço Social, na primeira pesquisa, uma hipótese  
nos orientou: a de que uma aproximação rasa e superficial com a temática imprime a falsa  
sensação de que tudo o que já foi produzido apresenta consenso; como se todos os autores  
apresentassem uma mesma compreensão sobre o tema; como se tudo já estivesse muito bem  
explicado e, portanto, muito bem compreendido e, por isso, não fossem mais necessários  
estudos ou aprofundamentos sobre a questão. O que em nosso entendimento não seria  
verdadeiro e, portanto, deveria ser refutado com a comprovação de que ainda são necessários  
os estudos e as pesquisas sobre os fundamentos do Serviço Social.  
718  
1
Luciana Gonçalves Pereira de Paula, embora sempre tenha dialogado com o tema do Serviço Social desde sua  
monografia de graduação, passando por dissertação de mestrado e tese de doutorado, iniciou seus estudos sobre  
os Fundamentos do Serviço Social, mais especificamente, no processo de pós-doutorado iniciado em 2017, sob  
supervisão de Yolanda Guerra, no PPGSS/UFRJ. Contribuíram para o amadurecimento de seus estudos nesta área  
as experiências docentes com a disciplina “Fundamentos históricos, teórico-metodológicos e ético-políticos do  
Serviço Social”, ministrada no Doutorado em Serviço Social da UFJF, desde o ano de 2023; e a participação na  
coordenação nacional do GTP “Serviço Social: fundamentos, formação e trabalho profissional” da ABEPSS, nas  
gestões 2023/2024 e 2025/2026.  
2 As interlocuções com Ana Clara Serpa Cardoso e Érica Aparecida dos Santos Francisco se deram, inicialmente,  
por causa da disciplina “Fundamentos históricos, teórico-metodológicos e ético-políticos do Serviço Social”  
(ministrada por Luciana) e se estenderam pelo fato de serem ambas orientandas da mesma docente em seus  
processos de doutoramento. E pela inserção de uma delas no GEPEFSS. Esta parceria já possui alguns frutos,  
como artigos apresentados em eventos da categoria e publicados em periódicos da área.  
3
A pesquisa se propôs a identificar os debates construídos na área do Serviço Social sobre: Fundamentos,  
Formação e Trabalho Profissional. Ancorada no método materialista-histórico-dialético, de natureza quanti-quali,  
debruçou-se sobre os trabalhos publicados nos anais do XVII Encontro Nacional de Pesquisadoras/es em Serviço  
Social (ENPESS), realizado em 2022, no Rio de Janeiro; e sobre as teses e as dissertações, publicadas no catálogo  
da CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, do Ministério da Educação (MEC),  
entre 2019 e 2022.  
4 A pesquisa tem como objetivo compreender as possíveis diferenças e/ou divergências conceituais presentes no  
debate dos Fundamentos do Serviço Social, no Brasil. Para isso, se propõe a localizar, por meio de pesquisa  
bibliográfica, as principais obras publicadas na área do Serviço Social que abordam o debate dos fundamentos da  
profissão; capturar nestas obras as principais tendências no que se refere ao debate dos Fundamentos do Serviço  
Social; identificar as principais tendências no debate dos Fundamentos do Serviço Social, presentes nos trabalhos  
apresentados, neste subeixo temático, no último Encontro Nacional de Pesquisadoras/es em Serviço Social  
(ENPESS), realizado no ano de 2024, em Fortaleza/CE; detectar as perspectivas teórico-metodológicas, ético-  
políticas, bem como a concepção de Fundamentos nas produções da área, através da análise dos produtos dos  
Programas de Pós-graduação em Serviço Social publicadas no banco de teses e dissertações CAPES, no período  
de 2023 a 2024.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 717-739, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Diferentes abordagens sobre fundamentos do Serviço Social e a necessidade deste debate  
A partir da pesquisa bibliográfica realizada, ainda durante a primeira pesquisa,  
identificamos que existem abordagens distintas sobre o tema dos fundamentos do Serviço  
Social nas produções da nossa área. Essas diferentes abordagens também se confirmaram com  
as análises realizadas nos trabalhos publicados nos anais do XVII ENPESS e nas teses e  
dissertações disponíveis e defendidas entre 2019 e 20225. Portanto, identificamos a existência  
de diferentes tratos sobre o tema dos fundamentos do Serviço Social, mas também percebemos  
especialmente nos trabalhos publicados no XVII ENPESS muita imprecisão na abordagem  
da temática. O que nos levou a concluir que o debate dos fundamentos do Serviço Social ainda  
não se encontra plenamente captado e compreendido por nossa categoria profissional.  
Esse foi um dos motivadores que nos levou ao desenvolvimento do segundo projeto de  
pesquisa, com enfoque nos fundamentos do Serviço Social. Nele renovamos a nossa hipótese  
anterior, mas avançamos com a seguinte indicação: embora pareça existir consenso, em meio  
a nossa categoria profissional, quando se trata dos fundamentos do Serviço Social, na realidade  
existem  
diferentes  
abordagens  
sobre  
esta  
temática  
que  
nos  
revelam  
construções/compreensões/concepções distintas sobre o tema6. E, para a comprovação de  
nossa hipótese, nos propusemos ao aprofundamento teórico, realizando estudos sistemáticos  
sobre a bibliografia previamente levantada7.  
Deste modo, o artigo que ora se apresenta tem o objetivo de apontar resultados parciais  
de nossa segunda pesquisa, especialmente no que se refere aos estudos bibliográficos que  
foram realizados sobre os fundamentos do Serviço Social. Nosso intuito é dividir com nosso  
leitor algumas de nossas reflexões, mas essencialmente, a forma como estamos  
organizando/sistematizando nossa compreensão em torno destas como estamos chamando –  
diferentes abordagens sobre os fundamentos do Serviço Social. Este será o objetivo do item  
subsequente a esta introdução.  
719  
Mas porque estudar fundamentos do Serviço Social? Esta é uma pergunta que ronda o  
universo acadêmico e profissional de discentes e assistentes sociais. Não são raras as vezes em  
que ouvimos, em sala de aula, questionamentos sobre a necessidade de tantas disciplinas de  
Fundamentos Históricos e Teórico-Metodológicos do Serviço Social em nossa proposta  
curricular. Também já escutamos de assistentes sociais e docentes, algumas vezes, que o  
5 Esses resultados podem ser encontrados em Lima et al. (2024).  
6
Compreensão reforçada por Silva, Nóbrega e Serpa (2021, p. 57): “É importante destacar que o debate dos  
fundamentos do Serviço Social não goza de consenso entre os diversos/as autores/as que tratam o tema. O que se  
explicita é um debate acerca da compreensão do seu significado”.  
7
Com as principais produções sobre Fundamentos do Serviço Social identificadas na pesquisa bibliográficas,  
organizamos um grupo de estudos semanal no GEPEFSS com o objetivo de aprofundamento, debate e reflexão  
sobre a temática.  
Ana Clara Serpa Cardoso; Érica Aparecida dos Santos Francisco; Luciana Gonçalves Pereira de Paula  
debate dos fundamentos do Serviço Social é algo muito endógeno e que precisamos avançar  
para outras discussões maiores e mais amplas como se este campo fosse menos importante  
que outros.  
Em nossa perspectiva estas percepções encontram-se cravejadas de compreensões  
equivocadas ou de não compreensões acerca dos fundamentos da profissão e da  
importância deste debate. Desse modo, este artigo trará, um segundo tópico cuja proposta será  
demonstrar, mesmo que de forma breve, a necessidade da aproximação ou do retorno aos  
estudos dos fundamentos do Serviço Social.  
Por fim, sinalizamos algumas considerações finais que demonstram o quanto ainda  
precisamos avançar nas reflexões, nas pesquisas e nas produções sobre os fundamentos do  
Serviço Social. Estamos certas de que esta é a única chave que permite o entendimento pleno  
da nossa profissão. Afinal, se você não sabe de onde veio, ou quem é, como irá saber onde  
quer chegar?  
Diferentes abordagens sobre os fundamentos do Serviço Social  
Para melhor desenvolver as reflexões que serão apresentadas neste artigo, se fazem  
necessárias algumas considerações preliminares. Primeiramente, destacamos que as diferentes  
abordagens sobre os fundamentos, que vem sendo construídas por autores do Serviço Social,  
encontram-se todas em um mesmo campo do pensamento, o qual seja o campo marxista. São  
abordagens distintas e apresentam, em alguns momentos, compreensões e/ou concepções  
diferentes sobre os fundamentos do Serviço Social, mas estão todas ancoradas no campo do  
materialismo-histórico-dialético.  
720  
Outro ponto importante de destaque é a demarcação de quando surge este debate sobre  
os fundamentos do Serviço Social. E para esta demarcação encontramos indicações relevantes  
em Guerra (2018) e Teixeira (2019).  
De acordo com Guerra (2018), “o debate sobre os fundamentos no Serviço Social ganha  
centralidade no contexto da análise do currículo de 1982”. A autora nos explica que  
[...] o debate dos fundamentos encontra sua gênese na necessidade de superar  
a tricotomia história/teoria/método resultante da revisão do projeto de  
formação dos anos de 1980, que por sua vez logrou a superação da visão  
tradicional do Serviço Social de Caso, Grupo e Comunidade e consagrou a  
nova direção social assumida pela categoria explicitada nas “Diretrizes  
Curriculares para o curso de Serviço Social”. É a busca em ultrapassar a  
fragmentação posta pela tricotomia mencionada anteriormente que inaugura o  
debate dos fundamentos históricos e teórico-metodológicos no Serviço Social  
(Guerra, 2018, p. 27).  
Em Teixeira (2019, p. 137) encontramos a seguinte argumentação:  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 717-739, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Diferentes abordagens sobre fundamentos do Serviço Social e a necessidade deste debate  
Na busca pela trajetória histórica do debate dos fundamentos do Serviço  
Social, a passagem das disciplinas de Serviço Social de Caso, Grupo e  
Comunidade, para disciplinas mais abrangentes e globalizantes, como  
História, Teoria e Metodologia do Serviço Social, é um avanço. Mas foi  
principalmente na implantação e avaliação desse novo currículo e das  
demandas teórico-metodológicas daí decorrentes que podemos aproximarmo-  
nos da construção dos fundamentos do Serviço Social como unidade  
articulada dos Núcleos de Fundamentação das Diretrizes Curriculares da  
ABEPSS.  
Ambos os autores apontam que a efervescência do debate sobre os fundamentos do  
Serviço Social é impulsionada pelos processos de construção e revisão dos projetos de formação  
profissional nas décadas de 1980 e 1990. Corroboramos com os autores, pois compreendemos  
que mesmo que o termo “fundamentos” já fosse utilizado previamente em debates e produções  
da área do Serviço Social, ele não abarcava as reflexões e compreensões acumuladas nos  
processos desenvolvidos pela profissão nestas décadas. Principalmente, ele não se encontrava  
alicerçado no campo crítico do pensamento marxista, o único capaz de oferecer fundamentos  
ao debate dos fundamentos do Serviço Social, como defenderemos mais adiante. Portanto, sem  
dúvida, no marco histórico dos anos de 1980 e 1990, ele ganha novo peso e monta.  
Apresentadas estas considerações preliminares, traremos em seguida quatro diferentes  
abordagens sobre os fundamentos do Serviço Social. Faremos esta exposição tomando sempre  
um ou dois autores por referência, compreendendo que, em certa medida, há uma centralidade  
de tal abordagem em suas produções. Mas, também procuraremos sinalizar o diálogo destes  
com outros autores que apresentam em suas produções abordagens semelhantes, quando  
possível. Vamos então a elas.  
721  
1 - A abordagem dos fundamentos do Serviço Social em Teixeira (2019) – “Fundamentos  
do Serviço Social como unidade articulada dos Núcleos de Fundamentação das Diretrizes  
Curriculares da ABEPSS”.  
Rodrigo José Teixeira é um intelectual que tem se destacado entre autores de uma nova  
geração que tem tomado o Serviço Social como objeto de estudo e análise. Sua mais relevante  
contribuição para o debate dos fundamentos do Serviço Social, até o momento, é a tese de  
doutorado intitulada “Fundamentos do Serviço Social: uma análise a partir da unidade dos  
Núcleos de Fundamentação das Diretrizes Curriculares da ABEPSS”, do ano de 2019.  
O objetivo central da tese foi “[...] analisar os fundamentos do Serviço Social a partir  
da unidade dos núcleos de Fundamentação das Diretrizes Curriculares da ABEPSS” (Teixeira,  
2019, p. 33). E a tese defendida afirma “[...] que a unidade articulada dos núcleos de  
Ana Clara Serpa Cardoso; Érica Aparecida dos Santos Francisco; Luciana Gonçalves Pereira de Paula  
fundamentação das Diretrizes expressa uma concepção acerca dos fundamentos do Serviço  
Social no trabalho e na formação profissional” (Teixeira, p. 40).  
Desse modo, de acordo com Teixeira (2019, p. 66), “a construção do documento das  
Diretrizes Curriculares é o esforço de explicar o significado social da profissão para formar  
assistentes sociais nesse significado”. E ainda sobre a lógica das Diretrizes Curriculares da  
ABEPSS, o autor afirma que  
O método, ao mesmo tempo, permite analisar as diretrizes curriculares em sua  
lógica, sua estrutura e sua dinâmica. Não significa que as disciplinas de  
História, Teoria e Metodologia do Serviço Social, que se configurou como o  
eixo do currículo de 1982, transformaram-se em uma matéria Fundamentos  
Históricos e Teórico-Metodológicos do Serviço Social. Mas que História,  
Teoria e Metodologia como unidade articulada expressa toda a lógica de  
construção das diretrizes curriculares da ABEPSS. Isso deve ser considerado  
na análise dos fundamentos (Teixeira, 2019, p. 85-86).  
Essa defesa se faz fundamental, pois no próprio autor encontramos o seguinte relato:  
Para as/os discentes, os fundamentos do Serviço Social diziam respeito à  
disciplina Fundamentos Históricos e Teórico-Metodológicos (FHTM) do  
Serviço Social. Estes componentes, muitas vezes, são vistos como cronologia  
histórica no conjunto de 04 ou 05 semestres, distribuídos por períodos  
cronológicos e não pelas respostas profissionais diante das diferentes  
conjunturas nacionais e internacionais, demonstrando que estudavam muito  
mais a historiografia do Serviço Social do que o significado do Serviço Social  
na produção e reprodução das relações sociais no modo de produção  
capitalista (Teixeira, 2019, p. 27).  
722  
E, então, Teixeira (2019, p. 45) aponta: “os fundamentos do Serviço Social, apreendidos  
no projeto de formação, são fundamentos da profissão, uma vez que estão no projeto de  
formação, mas são fundamentos do trabalho de assistentes sociais e da formação profissional,  
em uma perspectiva de totalidade”.  
Nesse sentido, Goin (2019b, p. 03) é uma autora que dialoga com as reflexões de  
Teixeira (2019) quando afirma que “[...] o entendimento dos fundamentos do Serviço Social  
ultrapassa a noção formalista de matéria curricular os conhecidos Fundamentos Históricos e  
Teórico-Metodológicos do Serviço Social para situá-los na totalidade histórica [...]”.  
Na mesma direção, encontramos preocupações semelhantes em Guerra (2018), quando  
a autora defende que um projeto de formação consistente e coerente precisa ser orientado por  
um determinado projeto de profissão. E prossegue apontando que  
[...] é nessa perspectiva que se entende a necessidade de indicar que a ausência  
de ter o Serviço Social no centro e na articulação da formação profissional,  
como eixo estruturante do currículo e engrenagem que movimenta os  
conteúdos dos núcleos de fundamentação, pode levar à formação de  
profissionais com um claro e consistente perfil teórico-político, mas com  
pouca ou nenhuma condição de intervir criticamente na realidade institucional  
[...] (Guerra, 2018, p. 29).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 717-739, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Diferentes abordagens sobre fundamentos do Serviço Social e a necessidade deste debate  
Por fim, o autor reforça suas defesas:  
O desvendar dos fundamentos como unidade articulada dos núcleos exige um  
caminho teórico-metodológico que tenha a totalidade e a mediação como  
condutos para que essa análise da vida social seja particularizada na sociedade  
brasileira e estes no trabalho profissional. Nesse sentido que reafirmamos as  
Diretrizes Curriculares da ABEPSS como um documento vivo, atual, o qual,  
quando considerado sob uma perspectiva crítico-dialética, é uma resistência  
frente aos desafios e contém os elementos que nos permitem construir  
respostas profissionais (Teixeira, 2019, p. 303).  
2 - A abordagem dos fundamentos do Serviço Social em Abreu e Cardoso – “A categoria  
da práxis como fundamento da prática profissional de assistentes sociais”  
Marina Maciel Abreu e Franci Gomes Cardoso são professoras, pesquisadoras e  
intelectuais militantes que se constituíram como referência do chamado “Grupo do Maranhão”  
(Tapiro; Paulo, 2024, p. 193).  
Na tentativa da captura e da compreensão da abordagem de fundamentos do Serviço  
Social nas produções destas autoras, foram analisadas três publicações: Cardoso (2007), Abreu  
e Cardoso (2014) e Abreu (2018)8.  
A análise do texto de Cardoso (2007), nos revela que a autora traz uma importante  
contribuição ao debate dos fundamentos do Serviço Social quando ressalta a necessidade de se  
pensar sobre a estrutura das disciplinas de Fundamentos Históricos e Teórico-Metodológicos  
do Serviço Social (FHTMSS) no processo de formação profissional. Nesta publicação, Cardoso  
(2007) se propõe a discutir o modo como as disciplinas de FHTMSS têm sido organizadas e  
oferecidas nas instituições de ensino, a partir dos núcleos de fundamentação presentes nas  
Diretrizes Curriculares da ABEPSS.  
723  
A autora destaca que, mesmo em instituições comprometidas com uma formação  
profissional crítica e qualificada, fortemente vinculadas à tradição marxista, o debate dos  
fundamentos do Serviço Social tem se mostrado, muitas vezes, impreciso ou incoerente. Nesse  
artigo de 2007, percebemos que as reflexões apresentadas pela autora dialogam muito com as  
preocupações de Teixeira (2019) apontadas acima. No entanto, destacamos Abreu em parceria  
com Cardoso, como autoras que tratam os fundamentos do Serviço Social em uma outra  
abordagem, devido ao texto escrito por ambas e publicado em 2014.  
Neste artigo, Abreu e Cardoso (2014) apresentam o Serviço Social como uma expressão  
da práxis e destacam:  
[...] a reflexão sobre a categoria da práxis ganha importância, a partir da  
referência marxiana e outras referências da tradição marxista com destaque  
8
Tais publicações foram selecionadas porque apresentam em seu título o descritor “fundamentos”; e tratam do  
Serviço Social brasileiro – esses foram os nossos critérios de inclusão/exclusão.  
Ana Clara Serpa Cardoso; Érica Aparecida dos Santos Francisco; Luciana Gonçalves Pereira de Paula  
para Gramsci, como fundamento para pensar o Serviço Social como totalidade  
histórica, ou seja, o Serviço Social como profissão, apreendida a partir das  
mediações que determinam a sua institucionalização e a particularizam no  
movimento real totalizante da práxis, constituindo-se uma expressão desse  
movimento, enquanto uma totalidade em menor nível de complexidade  
(Abreu; Cardoso, 2014, p. 314).  
A análise das autoras parte da categoria da práxis, fundamentada na tradição marxista,  
como chave interpretativa para compreender os desafios históricos que atravessam tanto o  
desenvolvimento da sociabilidade capitalista, quanto o horizonte da emancipação humana. No  
entanto, reconhecem que, no cenário atual, as possibilidades emancipatórias têm sido marcadas  
por retrocessos, especialmente diante da intensificação das desigualdades, da precarização do  
trabalho e do retrocesso das políticas sociais (Abreu; Cardoso, 2014).  
Cardoso e Abreu (2014) destacam que vivemos em um contexto marcado por intensas  
disputas políticas e ideológicas, no qual, diferentemente de outros momentos históricos, não há  
uma efervescência dos movimentos sociais e sindicais. O que observamos é uma atuação  
fragmentada, pontual e esporádica desses sujeitos coletivos. Nesse cenário, as autoras defendem  
a superação de uma concepção instrumental e formal dos fundamentos do Serviço Social.  
Propõem, em seu lugar, uma abordagem crítica e articulada à totalidade da vida social, em que  
o próprio Serviço Social, enquanto prática profissional, seja compreendido como expressão da  
práxis.  
724  
Portanto, no que se refere, em particular, aos fundamentos do Serviço Social, a  
compreensão das autoras assenta-se na categoria da práxis como fundamento da prática  
profissional de assistentes sociais (Abreu; Cardoso, 2014). Nesta perspectiva os fundamentos  
do Serviço Social envolvem uma leitura crítica da realidade social, que reconhece as disputas  
políticas em curso e reafirma o compromisso ético-político da profissão com as lutas sociais.  
Assim, os fundamentos do Serviço Social são entendidos como elementos vivos e dinâmicos,  
que se constituem no interior das contradições sociais e exigem constante atualização teórica,  
crítica e compromisso com a transformação social.  
Para as autoras, os fundamentos do Serviço Social não podem ser entendidos como um  
conjunto estático de conteúdos, mas como expressões vivas de um processo social em constante  
transformação um reflexo da práxis e, portanto, da luta de classes e das contradições  
estruturais da sociedade capitalista (Abreu; Cardoso, 2014).  
O terceiro artigo, escrito somente por Abreu (2018) aponta a trajetória histórica e a  
função política do Grupo Temático de Pesquisa (GTP) “Serviço Social: fundamentos,  
formação e trabalho profissional” da ABEPSS. A autora nos apresenta algumas considerações  
sobre os fundamentos partindo da própria ementa do GTP, que os trata como: “Fundamentos  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 717-739, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Diferentes abordagens sobre fundamentos do Serviço Social e a necessidade deste debate  
teóricos do Serviço Social: historicidade, configuração e paradigmas teóricos na realidade  
nacional e internacional nos âmbitos latino-americano e mundial”. Notamos, desse modo, que  
a própria ementa do GTP, destacada pela autora, apresenta uma concepção que entende os  
fundamentos do Serviço Social de maneira mais próxima à leitura desenvolvida com maior  
centralidade por Yazbek em suas produções esta será a próxima abordagem apresentada.  
A autora ainda sinaliza que nos eventos da categoria, em especial no Encontro Nacional  
de Pesquisadoras/es em Serviço Social (ENPESS), os artigos publicados na ênfase de  
fundamentos incorporam: “[...] os estudos do método e da produção do conhecimento, as  
vertentes teóricas e ideopolíticas presentes no debate da profissão e os estudos sobre a  
trajetória histórica da profissão, bem como o debate do projeto ético-político [...]” (Abreu,  
2018, p. 191).  
3 - A abordagem dos fundamentos do Serviço Social em Yazbek (2009, 2018, 2020, 2024)9  
– “Fundamentos do Serviço Social como matriz histórico-ontológica explicativa da  
realidade e da profissão”  
Maria Carmelita Yazbek é uma das principais referências para o debate dos  
fundamentos do Serviço Social (Lima et al., 2024). É uma das autoras mais lidas e utilizadas  
em produções que versam sobre os fundamentos da profissão.  
725  
No texto mais antigo, por nós analisado, a autora afirma que  
A análise dos principais fundamentos que configuram o processo através do  
qual a profissão busca explicar e intervir sobre a realidade, definindo sua  
direção social, constitui o principal objetivo deste texto. É necessário assinalar  
que essa análise das principais tendências históricas e teórico-metodológicas  
da profissão, sobretudo nas três últimas décadas não é tarefa fácil ou simples,  
pois exige o conhecimento do processo histórico de constituição das principais  
matrizes de conhecimento do social, do complexo movimento histórico da  
sociedade capitalista brasileira e do processo pelo qual o Serviço Social  
incorpora e elabora análises sobre a realidade em que se insere e explica sua  
própria intervenção (Yazbek, 2009, p. 01-02).  
Com as afirmações aqui apresentadas, a autora está abordando fundamentos do Serviço  
Social em duas perspectivas: uma histórica e outra teórico-metodológica. E, embora a autora  
demarque a importância da análise do processo histórico que incide diretamente no Serviço  
Social, sua abordagem irá privilegiar a análise das principais matrizes do pensamento que  
oferecem fundamentação ao exercício profissional de assistentes sociais (Yazbek, 2009).  
Esse é também o caminho construído por Yazbek (2018), quando discorre sobre: o  
pensamento doutrinário, o pensamento conservador, a matriz positivista, o pragmatismo, a  
9
Tais publicações foram selecionadas porque apresentam em seu título o descritor “fundamentos”; e tratam do  
Serviço Social brasileiro – esses foram os nossos critérios de inclusão/exclusão.  
Ana Clara Serpa Cardoso; Érica Aparecida dos Santos Francisco; Luciana Gonçalves Pereira de Paula  
abordagem estruturalista, a matriz marxista, a perspectiva fenomenológica, o pensamento pós-  
moderno. No entanto, na produção de 2018 encontramos uma definição mais explicita acerca  
do que seriam os fundamentos do Serviço Social quando a autora afirma: “[...] entendemos que  
os fundamentos consistem na matriz explicativa da realidade e da profissão, permeando a  
interlocução entre o Serviço Social e a sociedade” (Yazbek, 2018, p. 47).  
E, acerca das perspectivas de análise anteriormente apontadas como histórica e  
teórico-metodológica, em 2009 , no artigo de 2018, encontramos:  
É no âmbito da análise acerca dos fundamentos que se observa a incorporação  
pela profissão de matrizes fundamentais de conhecimento do social na  
sociedade burguesa. Esses fundamentos são constituídos por múltiplas  
dimensões: históricas, teórico-metodológicas, ético-políticas e técnico-  
operativas. Na atualidade, eles se expressam na abordagem histórico-crítica  
fundada na teoria social marxiana (Yazbek, 2018, p. 47).  
Portanto, aqui os fundamentos já aparecem analisados em quatro perspectivas de análise  
tratadas pela autora como dimensões , sendo elas: histórica, teórico-metodológica, ético-  
política e técnico-operativa.  
Na citação destacada acima também surge um outro elemento, da argumentação da  
autora, que será mais bem desenvolvido nas duas últimas produções por nós analisadas: o de  
que esses fundamentos, na atualidade, se expressam por meio do campo marxista.  
No artigo de 2020 essa defesa aparece ainda mais consolidada como podemos verificar:  
726  
[...] em primeiro lugar reafirmo, a centralidade dos fundamentos em minha  
abordagem sobre a profissão, entendendo aqui por fundamentos a matriz  
histórico-ontológica, explicativa da realidade, e da profissão, sob múltiplos  
aspectos, e que permeia a interlocução entre o Serviço Social e realidade.  
Fundamentos que na atualidade se expressam na abordagem histórico-crítica,  
fundada na Teoria Social de Marx e na Tradição Marxista e que se colocam  
como base para o projeto profissional hegemônico, expressando uma direção  
social que se estrutura nas dimensões histórico-ontológicas, teórico-  
metodológicas, ético-políticas e técnico-operativas (Yazbek, 2020, p. 294).  
De acordo com a autora a compreensão dos fundamentos do Serviço Social se faz  
necessária porque “[...] tivemos fortes marcas de fundamentos doutrinários, positivistas e  
sabemos também que o pensamento conservador nos persegue, nos engendra, de múltiplas  
formas” (Yazbek, 2020, p. 296). Essa passagem mais uma vez reforça a centralidade da  
abordagem dessa autora na compreensão dos fundamentos do Serviço Social enquanto matrizes  
do pensamento.  
No artigo de 2024, a autora apresenta uma compreensão de fundamentos definindo-os  
como: “[...] a matriz histórico-ontológica, explicativa da realidade e da profissão, sob múltiplos  
aspectos, e que permeia a interlocução entre o Serviço Social e a realidade” (Yazbek, 2024, p.  
152).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 717-739, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Diferentes abordagens sobre fundamentos do Serviço Social e a necessidade deste debate  
Em outra passagem, ela volta afirmar a centralidade dos fundamentos na matriz analítica  
da Teoria Social Maxiana:  
[...] diz respeito ao núcleo central do debate brasileiro contemporâneo sobre  
fundamentos, que se estrutura sob a perspectiva da Teoria Social Marxiana e  
sua direção a partir de um determinado modo de entender a profissão, no  
âmbito das relações sociais constitutivas da ordem capitalista, consideradas as  
particularidades de sua condição periférica (Yazbek, 2024, p. 153).  
Uma autora também da nova geração que vem se dedicando ao debate dos  
fundamentos do Serviço Social que dialoga com a abordagem construída por Yazbek (2024)  
é Closs (2017). A autora aponta que “tais fundamentos podem ser definidos como uma matriz  
explicativa da realidade e da profissão, particular ao Serviço Social, (re) construída  
processualmente na sua trajetória histórica a realidade brasileira” (Closs, 2017, p. 52).  
No entanto, diferente de Yazbek (2009, 2018, 2020, 2024) a autora destaca que a análise  
dos fundamentos do Serviço Social ocorre quando observamos o acervo teórico-metodológico,  
construído no campo da profissão. Assim, “destaca-se a importância das produções da área nos  
anos 1980 e 1990 para a qualificação deste acervo [...]” (Closs, 2017, p. 26). Closs (2017, p.  
135), afirma que “os fundamentos se assentam na conjugação de método/teoria marxistas e  
valores de cunho emancipatório, na análise histórico-crítica da profissão na realidade brasileira,  
conformando o núcleo central da matriz explicativa hegemônica construída nas últimas  
décadas”.  
727  
Assim, ambas as autoras localizam os fundamentos do Serviço Social, no escopo das  
matrizes explicativas da realidade e da profissão, que incidem na formação e no trabalho de  
assistentes sociais. Mas, há nuances que diferem também as suas abordagens.  
4 - A abordagem dos fundamentos do Serviço Social em Guerra (1997, 2004, 2015, 2018,  
2020, 2023a, 2023b, 2024)10 – “O debate dos fundamentos histórico-ontológicos da  
profissão”  
Yolanda Aparecida Demétrio Guerra, mais conhecida no meio acadêmico como  
Yolanda Guerra, consagrou-se nas últimas décadas como uma autora de destaque no campo do  
Serviço Social. Suas importantes inserções políticas e acadêmico-científicas na ABEPSS e no  
GTP supramencionado fizeram com que ela se tornasse referência indispensável para qualquer  
pesquisador que deseje enveredar nos estudos dos fundamentos da profissão.  
Para compreender o debate de fundamentos do Serviço Social construído por Guerra,  
analisamos oito artigos publicados pela autora, ao longo de 27 anos. É importante enfatizar que,  
10 Tais publicações foram selecionadas porque apresentam em seu título o descritor “fundamentos”; e tratam do  
Serviço Social brasileiro – esses foram os nossos critérios de inclusão/exclusão.  
Ana Clara Serpa Cardoso; Érica Aparecida dos Santos Francisco; Luciana Gonçalves Pereira de Paula  
desde seus primeiros textos, a autora demonstra uma compreensão acerca do Serviço Social  
firmemente ancorada na tradição marxista. Guerra (1997, 2004) já considera o campo marxista  
como sendo o único capaz de nos permitir um mergulho real nos fundamentos do Serviço  
Social.  
Para Guerra (1997) a gênese do Serviço Social articula-se diretamente ao  
desenvolvimento capitalista para “[...] intervir nos conflitos oriundos dos antagonismos de  
interesses das classes (ou segmentos das classes) sociais fundamentais da ordem burguesa  
constituída” (Guerra, 1997, p. 10). E logo após afirma:  
[...] o Serviço Social [...] tem que se reconhecer numa determinada realidade  
sócio-histórica que lhe atribui uma razão de ser e coloca seus objetos de  
intervenção. Se a sua lógica de constituição e se os seus objetos de intervenção  
se vinculam a determinada realidade histórico social, seu substrato material é  
a realidade social (Guerra, 1997, p. 11).  
Desse modo, a autora nos indica que são as determinações sociais que conformam esta  
profissão, do mesmo modo que ainda a legitimam. Portanto, identificamos no trecho destacado  
acima elementos cruciais para o entendimento daquilo que funda o Serviço Social, portanto, de  
seus fundamentos mesmo que esta ainda não seja uma formulação redigida pela autora.  
Vemos concepção semelhante, e cada vez mais refinada, em seus textos seguintes. No  
artigo de 2004, a autora afirma que “ir aos fundamentos” é “recuperar a essência das coisas”  
(Guerra, 2004, p. 21). E pensando, então, o Serviço Social, ela nos diz que:  
728  
[...] pretende-se resgatar a importância da tradição marxista no Serviço Social  
e de seu investimento em compreender as bases histórico-ontológicas que  
fundam a profissão, na apreensão do seu significado social e sua  
funcionalidade, na crítica ao conservadorismo teórico-metodológico e prático-  
político e na construção de um projeto profissional que intencione a ruptura  
com o conservadorismo (Guerra, 2004, p. 25).  
Segundo a autora, a realidade social se apresenta como a base sólida sobre a qual se  
constroem tanto o Serviço Social quanto às teorias que buscam explicá-lo. A partir dessa  
perspectiva, a autora defende que é somente a ontologia do ser social desenvolvida por Marx  
e aprofundada por Lukács que oferece os instrumentos teórico-metodológicos necessários  
para uma análise crítica dos fundamentos da profissão. É nesse contexto que, em Guerra (2004),  
surge pela primeira vez a formulação de que os fundamentos do Serviço Social estão enraizados  
em suas bases histórico-ontológicas. Ou seja, são as categorias marxianas que possibilitam  
compreender, de forma profunda e crítica, os fundamentos que forjam a profissão.  
Guerra (2015, p. 7) nos apresenta uma definição ainda mais precisa acerca dos  
fundamentos do Serviço Social quando aponta:  
Quanto ao Serviço Social, por fundamentos estamos considerando as bases  
sócio-históricas objetivas e subjetivas, bem como as mediações que vinculam  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 717-739, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Diferentes abordagens sobre fundamentos do Serviço Social e a necessidade deste debate  
e permeiam o exercício profissional do assistente social, ambos resultantes das  
determinações societárias mais amplas, as quais se particularizam em  
determinações próprias da cultura profissional (Guerra, 2015, p. 7).  
Neste artigo, Guerra (2015) constrói uma argumentação coerente e comprometida, onde  
insiste na importância de se compreender o Serviço Social no bojo das relações sociais mais  
amplas. E nesse sentido, afirma que:  
[...] podemos captar a profissão como resultado histórico, no confronto de  
interesses antagônicos entre o capital e o trabalho e na mediação entre as  
classes sociais fundamentais e o Estado e as funções deste como administrador  
dos ciclos de crise. Nesta direção, a busca dos fundamentos permite à  
profissão compreender a sua funcionalidade ao projeto societário do capital,  
mas também as possibilidades de questioná-la (Guerra, 2015, p. 9).  
No artigo de 2018 encontramos, pela primeira vez, a menção da autora a existência de  
um debate sobre os fundamentos do Serviço Social, indicando sua percepção de que existem  
diferentes abordagens sendo construídas em torno do tema.  
Ainda neste artigo, Guerra (2018, p. 29) aponta  
[...] que ter a realidade social como fundamento significa que são as condições  
de produção e reprodução da vida social e espiritual dos homens e mulheres  
as suas bases constitutivas, processo construído por meio de sua práxis  
individual e social que, ao mobilizar/enfrentar as contradições de classe,  
constroem a história (Guerra, 2018, p. 37).  
Os fundamentos do Serviço Social compreendidos enquanto histórico-ontológicos,  
inscritos na realidade social são reafirmados em Guerra (2023a). Neste capítulo de livro, a  
autora explicita, pela primeira vez, a compreensão de que existem diferenças entre o que  
compreendemos enquanto fundamentos do e para o Serviço Social, quando afirma que “[...] se  
faz necessário reconhecer que a temática dos fundamentos do/para o Serviço Social ganha  
novos contornos na quadra história que vivenciamos” (Guerra, 2023, p. 34).  
729  
Em Guerra (2023b, p. 45), encontramos, de forma didática, o significado etimológico  
da palavra fundamentos: “[...] princípio sobre o qual se apoia e se desenvolve uma coisa”.  
Com base nessa reflexão, considero fundamento as bases e a razão de ser que  
explica a gênese e a existência da sociedade e da profissão. Trata-se de  
fundamentos histórico-ontológicos enquanto as balizas, pilastras, razão e  
modos de ser constitutivos e constituintes da realidade e da profissão (Guerra,  
2023b, p. 45).  
Em Goin (2019a), encontramos uma abordagem dos fundamentos do Serviço Social que  
dialoga muito com as construções apresentadas acima:  
É nesse bojo de análise que, em síntese, se entende por fundamentos do  
Serviço Social os elementos que (a) alicerçam e assentam as bases da  
formação e do trabalho profissional ao longo de sua trajetória sócio-histórica  
e (b) conferem configuração particular à profissão em face da processual e  
orgânica relação com a realidade, interpondo-lhe a necessária apropriação das  
Ana Clara Serpa Cardoso; Érica Aparecida dos Santos Francisco; Luciana Gonçalves Pereira de Paula  
matrizes de conhecimento do social e do movimento da sociedade para prover  
de direção social e política do trabalho profissional [...] (Goin, 2019a, p. 31).  
E, por tudo o que já foi até aqui exposto, podemos perceber, na abordagem construída  
por Guerra ao longo dos anos, a centralidade que os fundamentos histórico-ontológicos têm.  
Entretanto, a autora também destaca a existência e a importância dos fundamentos teórico-  
metodológicos, compreendidos pela mesma enquanto “[...] formas de interpretar a realidade e  
a profissão”; e os fundamentos ídeo-políticos que em suas palavras: “[...] subjazem  
determinadas concepções de homem e mundo, priorizam determinados valores e afirmam  
determinado projeto de sociedade e de profissão” (Guerra, 2023b, p. 45).  
De modo ainda mais apurado, encontramos em Guerra (2024) a seguinte afirmação:  
Estamos considerando fundamentos, a partir do seu sentido etimológico, como  
base, o alicerce, os princípios que regem realidade e profissão, tanto o que  
funda quanto sua lógica constitutiva; mas, também: as explicações, os  
argumentos de interpretação, a justificativa de existência de ambas (Guerra,  
2024, p. 159).  
No entanto, para Guerra (2024, p. 159), ao se pensar a profissão, os fundamentos  
histórico-ontológicos “[...] tem prioridade em relação aos que buscam explicá-la”. Isto porque  
são produtos da práxis e denotam a “[...] prioridade ontológica da realidade sobre o  
conhecimento, da prática sobre a teoria, dos fundamentos histórico-ontológicos sobre os  
teórico-filosóficos(Guerra, 2024, p. 160). O que não significa dizer que os fundamentos  
teórico-filosóficos são menos importantes. Eles  
730  
[...] são a base de fundamentação sobre a realidade e sobre a profissão. Eles  
têm como objeto os fenômenos e práticas sociais e se constituem em modos  
de explicar a realidade social, buscam a apreensão da sua base material, da sua  
lógica constitutiva e, nesta base, da profissão (Guerra, 2024, p. 160).  
Em Guerra (2020), encontramos a análise mais completa da autora sobre os chamados  
fundamentos teórico-filosóficos. Nesta produção, ela nos oferece importante contribuição ao  
estudo do que convenciona chamar de fundamentos para o Serviço Social.  
Para Guerra (2020) o conhecimento teórico é essencial para orientar “[...] nossa forma  
de ler, de interpretar a realidade” e dá suporte para “pressupostos teórico-metodológicos e  
visões de mundo, cujo substrato é ético e político e nos conduzem a uma determinada postura  
diante do real que pode ser de sua transformação ou manutenção” (Guerra, 2020, p. 32).  
Neste capítulo, a autora faz uma densa incursão sobre os “fundamentos dos  
fundamentos”. Ou seja, Guerra (2020) se propõe a realizar um debate sobre as determinações  
filosóficas e ídeo-políticas contidas nas fundamentações teóricas que influenciam a nossa  
profissão.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 717-739, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Diferentes abordagens sobre fundamentos do Serviço Social e a necessidade deste debate  
Segundo Guerra (2020) no campo do Serviço Social, até os anos de 1980, a produção  
de conhecimento estava assentada em referenciais teóricos ancorados em uma racionalidade  
formal-abstrata. E foi somente com a aproximação da profissão com a produção de Karl Marx  
que se inaugura a possibilidade de uma produção de conhecimento fundamentada em bases  
histórico-ontológicas.  
Dessa forma, nas produções de Guerra encontramos profícuos caminhos para o debate  
dos fundamentos do Serviço Social e para a compreensão da necessidade de apreensão dos  
fundamentos para o Serviço Social. Seus artigos fazem a defesa de que apenas alcançamos os  
fundamentos do Serviço Social por meio dos fundamentos da matriz teórico-filosófica marxista.  
Sendo esta a única fundamentação que nos permite captar a essência do que funda a profissão.  
Seria, portanto, o campo marxista que nos ofereceria os fundamentos para a compreensão dos  
fundamentos do Serviço Social.  
O necessário retorno aos fundamentos do Serviço Social  
O tópico anterior deste artigo se propôs a apresentar o debate dos fundamentos do  
Serviço Social, destacando algumas das suas diferentes abordagens. Mas, qual a relevância do  
estudo e da compreensão dos fundamentos do Serviço Social para o desenvolvimento do nosso  
trabalho profissional, enquanto assistentes sociais? Sinalizar essa relevância ou ao menos  
lançar luzes sobre ela é o nosso intuito nas breves reflexões que se seguem.  
O debate sobre os fundamentos do Serviço Social, mediante as distintas abordagens  
anteriormente apresentadas, se faz imprescindível para a compreensão da profissão na  
atualidade. Portanto, estudar os fundamentos do Serviço Social e/ou retornar a eles, não significa  
visitar o seu passado ou conhecer a sua história; nem apenas elencar as matrizes de pensamento  
que já serviram a assistentes sociais na busca pela compreensão da realidade social. É o estudo  
dos fundamentos do Serviço Social que nos possibilita a apreensão do significado social do  
nosso trabalho profissional movimento indispensável para a elaboração consciente das  
respostas profissionais para o enfrentamento das expressões da “questão social” nos diversos  
espaços ocupacionais.  
731  
Portanto, compreender os fundamentos do Serviço Social significa captar o significado  
social da profissão, inscrita na divisão social, racial, sexual e técnica do trabalho (Escurra;  
Iamamoto, 2020). Para isso, faz-se necessário captar as bases que fundam o Serviço Social  
constituídas por determinações econômicas, políticas, sociais, culturais e ideológicas, inscritas  
na dinâmica concreta da vida social.  
Ana Clara Serpa Cardoso; Érica Aparecida dos Santos Francisco; Luciana Gonçalves Pereira de Paula  
No Brasil, os autores que inauguram essa análise, no ano de 1982, são Iamamoto e  
Carvalho (2014). Os autores, ancorados na perspectiva marxiana, apresentam a compreensão  
do significado da profissão inscrita no processo de reprodução das relações sociais capitalistas  
como um tipo de especialização do trabalho coletivo, partícipe da divisão do trabalho. Buscam  
desvendar as múltiplas determinações que provocam o surgimento do Serviço Social na  
sociedade capitalista, no contexto brasileiro, bem como o caráter contraditório do trabalho  
profissional, ultrapassando a compreensão endógena da profissão voltada para uma análise de  
seus fundamentos a partir de si mesma.  
Em Iamamoto e Carvalho (2014) encontramos, pela primeira vez, a indicação da  
“questão social”11 como elemento fundante do Serviço Social. Desse modo, o Serviço Social  
se institucionaliza e se legitima como uma profissão no processo de desenvolvimento da  
industrialização e expansão urbana no Brasil no contexto de constituição da classe  
trabalhadora e da burguesia industrial enquanto um dos recursos acionados pelo Estado e pelo  
empresariado, com apoio da Igreja Católica para o enfrentamento das manifestações da  
“questão social”, que se revela como a base de justificação da profissão (Iamamoto; Carvalho,  
2014).  
O adensamento deste debate se faz posteriormente com Netto (2011), por meio das  
análises que revelam o surgimento do Serviço Social a partir da constituição de um tratamento  
diferenciado dado às expressões da “questão social” em um determinado momento histórico  
preciso: a conformação do capitalismo monopolista. Segundo Netto (2001), nos diferentes  
estágios da ordem capitalista, a “questão social” é produzida compulsoriamente em diversas  
manifestações. A sua estrutura medular é determinada pela relação capital/trabalho, pelos  
componentes sociais, políticos, culturais e econômicos constituintes do modo de produção  
capitalista.  
732  
Portanto, para o autor, a profissão surge vinculada à ordem monopólica, tendo esse  
momento histórico como seu fundamento. Assim, o Serviço Social torna-se necessário  
mediante aos fatores sócio-históricos que estão postos na realidade. Nesse processo de  
legitimação da categoria profissional, seus agentes são chamados a atuarem frente às expressões  
da “questão social” e na execução das políticas sociais na esfera do Estado.  
11 A questão social se refere ao conjunto das expressões das desigualdades sociais engendradas na sociedade  
capitalista madura, impensáveis sem a intermediação do Estado. Têm sua gênese no caráter coletivo da produção,  
contraposto à apropriação privada da própria atividade humana - o trabalho -, das condições necessárias à sua  
realização, assim como de seus frutos. É indissociável da emergência do “trabalhador livre”, que depende da  
venda de sua força de trabalho como meio de suas necessidades vitais (Iamamoto, 2001, p. 16-17).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 717-739, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Diferentes abordagens sobre fundamentos do Serviço Social e a necessidade deste debate  
Dessa forma, em nosso entendimento, encontramos em Iamamoto e Carvalho (2014) e  
Netto (2011) elementos imprescindíveis para o debate e para a compreensão dos fundamentos  
do Serviço Social assentados na perspectiva marxiana. No entanto, há também nesses autores  
diferenças em suas abordagens.  
A obra de Iamamoto e Carvalho (2014) debruça-se sobre a conjuntura nacional,  
especificamente no começo no século XX, procurando desvendar as determinações concretas  
da gênese do Serviço Social em terras brasileiras. Enquanto em Netto (2011), encontramos o  
esforço teórico-metodológico de compreensão e explicação do momento de transição do  
capitalismo concorrencial para  
o
capitalismo monopolista, em um contexto  
internacional/mundial, na transição do século XIX para o XX.  
Portanto, por mais que estes autores estejam ambos ancorados no referencial marxista e  
no método materialista-histórico-dialético, eles estão nos apresentando análises diferentes sobre  
o surgimento do Serviço Social. Não diferentes enquanto concepção de profissão, mas,  
diferentes leituras de momentos e lugares em que surge o Serviço Social, no intuito de captar  
os seus fundamentos.  
Iamamoto e Carvalho (2014) destacam que as condições que particularizam o trabalho  
profissional de assistentes sociais se processam na dinâmica das relações sociais vigentes na  
sociedade capitalista. O exercício profissional de assistentes sociais é polarizado pelos  
interesses distintos das classes sociais antagônicas presentes nesta sociedade. Isso significa que  
assistentes sociais reproduzem interesses contrapostos ao realizarem qualquer atividade em seu  
cotidiano profissional. Respondem tanto às requisições da classe dominante, quanto às  
necessidades de sobrevivência da classe trabalhadora por meio de qualquer ação que venham a  
desenvolver.  
733  
A razão de ser desta profissão, portanto, é dada pela contribuição que oferece no jogo  
da luta de classes na sociabilidade do capital, o que revela o caráter ideológico do seu  
significado social. Do ponto de vista das requisições da classe dominante, o Serviço Social  
contribui com o controle político-ideológico e/ou repressivo, principalmente por meio do  
aparato burocrático do Estado, facilitando a criação de mecanismos ideológicos favoráveis à  
manutenção das relações sociais capitalistas, no sentido de camuflar as tensões que lhe são  
próprias, como se fossem relações harmônicas e passíveis de conciliação.  
No entanto, pode também atender às demandas da classe trabalhadora para além do que  
lhe é imediatamente solicitado. O Serviço Social tem o papel de contribuir na luta de classes por  
meio da capacidade intelectual de seus agentes, os quais podem utilizar seus conhecimentos  
para imprimir uma direção ético-política à sua ação para favorecer a criação de condições de  
Ana Clara Serpa Cardoso; Érica Aparecida dos Santos Francisco; Luciana Gonçalves Pereira de Paula  
mobilização e de organização política dessa classe, visando contribuir para construção de um  
novo tipo de sociedade.  
Isso significa tomar a “questão social” de fato como fruto de uma contradição posta, que  
sendo o conjunto das desigualdades engendradas pelo modo de produção capitalista revela  
também a potencialidade da resistência e da rebeldia da classe trabalhadora. Portanto,  
assistentes sociais devem buscar construir suas ações não somente para amenizar/minimizar as  
condições de pobreza e miséria da classe trabalhadora, mas, especialmente, para dar voz a estes  
segmentos desfavorecidos, para legitimar a sua inconformidade, para identificar seus focos de  
resistência, para estimular a conformação de consciência crítica, para potencializar a  
organização e a luta dos trabalhadores.  
Em se tratando da “questão social”, Netto (2001) explicita que esta expressão, ganhou  
notoriedade na segunda metade do século XIX, passando a ser usada pelo pensamento  
conservador, na intenção de naturalizar as desigualdades sociais, tornando-as alvo de ações de  
caráter reformista e moralizador12. A intenção era evitar a compreensão de que sua  
determinação se assentava no modo de produção capitalista, na contradição entre  
capital/trabalho.  
Afinal, encontramos em Marx (2008), mais precisamente na lei da acumulação  
capitalista, o fundamento enquanto base de fundamentação capaz de explicar a existência –  
da “questão social”. Por meio dela compreendemos que o avanço dos meios de produção é  
sempre superior à capacidade de absorção dos trabalhadores produtivos disponíveis no  
mercado. Com o incremento tecnológico e científico no processo de produção, os trabalhadores  
acabam produzindo mais em menor tempo. Esse processo advém do interesse dos empresários  
capitalistas em extrair uma quantidade cada vez maior de trabalho de uma parcela cada vez  
menor de trabalhadores. Além disso, amplia-se a jornada de trabalho e as formas de  
intensificação da exploração do trabalho (Iamamoto, 2001).  
734  
Esse quadro contribui tanto na produção das formas de mais-valor, quanto na produção  
de uma população relativamente supérflua para o regime de acumulação do capital. Assim, a  
população de trabalhadores sempre cresce mais rapidamente do que a necessidade de seu  
emprego na dinâmica de valorização do capital. Entretanto, na sociedade capitalista, o  
“trabalhador livre” depende da venda de sua força de trabalho em troca de um salário para a  
12  
O autor sinaliza que a expressão “questão social” surgiu [...] para dar conta do fenômeno mais evidente da  
história da Europa Ocidental que experimentava os impactos da primeira onda industrializante, iniciada na  
Inglaterra no último quartel do século XVIII: trata-se do fenômeno do pauperismo. Com efeito, a pauperização  
[...] massiva da população trabalhadora constituiu o aspecto mais imediato da instauração do capitalismo em  
seu estágio industrial-concorrencial [...] (Netto, 2001, p. 42).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 717-739, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Diferentes abordagens sobre fundamentos do Serviço Social e a necessidade deste debate  
garantia da sua sobrevivência13, ou seja, precisa encontrar espaço no mercado de trabalho.  
Logo, essa dinâmica “gera, [...], uma acumulação da miséria relativa à acumulação do capital,  
encontrando-se aí a raiz da produção/reprodução da questão social na sociedade capitalista”  
(Iamamoto, 2001, p. 15).  
Nestas condições, as demandas da população e dos trabalhadores passam a ser  
parcialmente atendidas e refuncionalizadas para dinamizar os superlucros da ordem  
monopólica. Esse processo foi tensionado por conflitos e contradições em escala global. A  
necessidade de legitimação do Estado encontrou saída na consolidação de políticas voltadas à  
classe trabalhadora, num jogo das forças políticas. Por meio dessas condições, as expressões da  
“questão social” passaram a ser objeto de intervenção por parte do Estado, sendo foco das  
políticas sociais (Netto, 2011). Assim, Netto (2011) afirma que a origem do Serviço Social deve  
ser compreendida nesse período monopolista do capital, especificamente, quando as expressões  
da “questão social” se expandem e o Estado passa a intervir enquanto instrumento de controle  
da mesma, possibilitando alavancar o modo de produção capitalista.  
As políticas sociais são implementadas como respostas institucionalizadas frente às  
expressões da “questão social”, que são recortadas como problemáticas sociais – como o  
desemprego, a fome, a falta de habitação, a ausência de escola, o não acesso aos serviços de  
saúde etc. para assegurar o funcionamento da ordem monopólica. É no âmbito político que  
as políticas sociais são operacionalizadas, enquanto instrumentos de apoio à ordem  
sociopolítica, oferecendo “[...] um mínimo de respaldo efetivo à imagem do Estado como  
‘social’, como mediador de interesses conflitantes” (Netto, 2011, p. 31).  
735  
Portanto, as bases de fundação da profissão estão atreladas aos processos sócio-  
históricos que estão postos na realidade. Conforme Netto (2011, p. 73-74), o Serviço Social se  
funda “[...] indivorciável da ordem monopólica”, pois os profissionais passaram a ser chamados  
para a operacionalização das políticas sociais, e a profissão encontrou sua funcionalidade na  
divisão social e técnica do trabalho: a administração das manifestações da “questão social”.  
A “questão social” está inscrita na dinamicidade das relações sociais capitalistas e se  
reformula sob condições sócio-históricas de produção/reprodução, na órbita do capital. As  
expressões da “questão social” se modificam em razão das configurações das transformações  
societárias, da política, da cultura, das particularidades territoriais, dos aspectos étnico-raciais,  
13  
Aqui, tem-se “[...] a separação do indivíduo das condições de seu trabalho, monopolizadas sob a forma  
capitalista de propriedade – enquanto condição histórica dessa forma de organização social da produção [...]”,  
assim, ele é “[...] excluído de toda a riqueza objetiva, dotado de mera capacidade de trabalho e alijado das condições  
necessárias à sua realização objetiva na criação de seus meios de sobrevivência” (Iamamoto, 2001, p.16).  
Ana Clara Serpa Cardoso; Érica Aparecida dos Santos Francisco; Luciana Gonçalves Pereira de Paula  
das relações de gênero, das disputas ambientais e das lutas sociais, que lhe atribuem uma  
redefinição. Tais expressões alteram-se, mas sem extinguir sua natureza no processo de  
exploração do trabalho e nas respostas do Estado sob égide capitalista, fazendo com que o  
Serviço Social permaneça necessário. A compreensão desse processo se faz imprescindível para  
quem quer, de fato, entender que profissão é essa.  
Considerações finais  
Chegando ao final deste artigo, voltamos a destacar que o nosso intuito foi, a partir das  
reflexões apresentadas, demonstrar como o debate sobre os fundamentos do Serviço Social –  
consensualmente hegemônico em meio a nossa categoria profissional encontra, de fato,  
muitas convergências. Mas, também esconde/revela a existência de diferentes abordagens sobre  
o tema. Essas diferentes abordagens, nem sempre são facilmente percebidas, pois não se  
revelam de maneira tão explícita e imediata. A sua captura exige um mergulho mais profundo  
nos estudos desses fundamentos da profissão.  
Este é apenas um dos muitos elementos que indicam para nós o quanto este debate ainda  
não se esgotou e como se faz necessário que avancemos em nossas pesquisas sobre fundamentos  
para continuar fazendo emergir à superfície aquilo que ainda se encontra submerso.  
Nesse sentido, um ponto a ser destacado que em nossa compreensão merece maiores  
aprofundamentos trata-se do debate sinalizado por Guerra (2024), onde a autora aponta que:  
736  
[...] parece-nos que fazer a distinção (puramente didática) entre os termos  
fundamentos e fundamentação pode dar maior visibilidade à nossa  
argumentação sobre a diferença entre as filosofias e/ou sociologias e a Teoria  
Social de Marx. Todas as filosofias/sociologias podem prestar uma  
fundamentação à realidade e, indiretamente, fornecer explicações à profissão.  
Qualquer uma pode ser objeto de escolha de assistentes sociais, segundo sua  
visão de homem e mundo e o mirante sob o qual captam a realidade. Contudo,  
[...] nem todas as perspectivas teóricas alcançam dos fundamentos da vida  
social. E não o fazem, justamente, por eliminarem as bases concretas das suas  
análises [...] somente a perspectiva da ontologia do ser social inaugurada por  
Marx é capaz de fundar ontologicamente a análise da realidade e da profissão  
(Guerra, 2024, p. 174).  
O debate provocado por Guerra (2024) que já havia aparecido anteriormente em outras  
de suas produções nos leva a pensar se, no âmbito do Serviço Social existe diferença entre o  
que chamamos de fundamento e o que entendemos enquanto fundamentação. Se tratamos todas  
as concepções teórico-filosóficas os campos do pensamento conservador que já foram  
hegemônicos no Serviço Social ao longo da sua trajetória como fundamentos, isso significa  
dizer que os fundamentos da profissão foram se alterando com o seu desenvolvimento? Ou  
ainda, considerando que todos esses campos do pensamento conservador, em maior ou menor  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 717-739, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Diferentes abordagens sobre fundamentos do Serviço Social e a necessidade deste debate  
escala, continuam incidindo no Serviço Social hoje embora não se façam mais hegemônicos  
todos eles seriam fundamentos do Serviço Social?  
A nosso ver, faz-se necessário retomar esse debate e avançar na construção de reflexões  
que possam abrir novos caminhos para a compreensão do que estamos chamando de  
fundamentos do Serviço Social. Afinal  
[...] nem todas as referências teórico-metodológicas que estão na base das  
Teorias Sociais apreendem os fundamentos histórico-ontológicos da realidade  
e da profissão. Aqui se faz necessário estabelecer a distinção entre aquelas  
fundamentações que se detêm na expressão fenomênica da realidade e da  
profissão tomada como a sua base de explicação, aquelas que consideram os  
fundamentos ontológicos da realidade como inacessíveis, aquelas que  
“desconfiam” da distinção entre aparência e essência e aquelas que  
reconhecem o papel da busca dos fundamentos na apreensão da lógica  
constitutiva dos processos e práticas sociais, no movimento que vai da  
aparência para a essência (Guerra, 2023b, p. 46).  
Dessa forma, as produções de Iamamoto e Netto não foram retomadas aqui por acaso.  
É nelas que, ainda, encontramos o cerne do debate sobre os fundamentos do Serviço Social.  
Portanto, conhecê-las ou revisitá-las não é tarefa superada; é missão urgente para assistentes  
sociais que não querem se ver tragados pela aparente falta de perspectiva dos cotidianos  
institucionais. Retornar a estas produções não significa uma volta ao passado, não representa  
olhar para o que foi o Serviço Social. Nas obras aqui mencionadas e em outras que não foram  
abordadas pelos limites deste artigo encontramos profícuos caminhos para olhar adiante e  
compreender que esta é uma profissão que ainda tem muito o que construir pela frente.  
737  
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739  
Os fundamentos do serviço social como  
pressuposto para a construção do projeto de  
trabalho  
The foundations of social work as a prerequisite for the  
construction of the work project  
Claudio Henrique Miranda Horst*  
Resumo: O artigo tem como objetivo recuperar  
os fundamentos históricos e teóricos do Serviço  
Social brasileiro com vistas a contribuir para a  
construção do projeto de trabalho de assistentes  
Abstract: This article aims to revisit the  
historical and theoretical foundations of  
Brazilian Social Work, aiming to contribute to  
the development of social workers' work  
projects in various socio-occupational settings.  
This reflection builds on the systematization of  
professional practice and the support provided  
to teams of social workers, supported by a  
literature review. The chosen emphasis for  
further developing the work project was on  
what we consider to be its first component: the  
conception of the profession; the object/subject  
matter of work; the work objectives; ethical and  
sociais  
nos  
diversos  
espaços  
sócio-  
ocupacionais. Trata-se de reflexão construída a  
partir da sistematização da prática profissional e  
da assessoria a equipes de assistentes sociais,  
articulada com a revisão de literatura. A ênfase  
escolhida para aprofundamento foi em torno do  
que consideramos ser a primeira parte de um  
projeto de trabalho: a concepção de profissão; o  
objeto/matéria de trabalho; os objetivos do  
trabalho; os valores ético-políticos e as  
atribuições e competências profissionais.  
political  
values;  
and  
professional  
responsibilities and competencies.  
Palavras-chaves:  
Fundamentos;  
Serviço  
Keywords: Fundamentals; Social Work; Work  
Social; Projeto de Trabalho.  
Project.  
Introdução  
A discussão sobre a elaboração do projeto/plano1 de trabalho de assistentes sociais tem  
se colocado cada vez mais como fundamental. De imediato, podemos demarcar algumas  
justificativas para sua elaboração: a) porque identificamos o que nos compete naquele espaço  
sócio-ocupacional; b) porque conseguimos nos diferenciar do projeto da instituição (o projeto  
* Universidade Federal de Ouro Preto. E-mail: claudio.horst@ufop.edu.br  
1 A partir daqui tratarei apenas como projeto de trabalho da/do assistente social, considerando que o plano de  
trabalho diz respeito a uma dimensão mais ampla e que precede o projeto de trabalho que é da/os assistentes sociais  
de um setor/equipe. Ou seja, consideramos que o plano de trabalho é da instituição.  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.49622  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 29/07/2025  
Aprovado em: 22/09/2025  
Os fundamentos do serviço social como pressuposto para a construção do projeto de trabalho  
da instituição/política social compõe o arsenal do projeto de trabalho, mas não podemos nos  
resumir a ele); c) porque se torna um importante instrumento de trabalho para o diálogo com as  
demais profissões que compõem a equipe; d) porque pode incorporar as demandas das/os  
usuárias/os; e e) porque pode se transformar em um importante recurso para analisar o exercício  
profissional e os seus resultados (Couto, 2009).  
Desse modo, é importante ressaltar que o projeto de trabalho não é um mero  
instrumento e, muito menos, um manual a ser seguido; ele deve condensar as  
possibilidades e os limites colocados ao profissional para executar suas tarefas  
e deve iluminar sua constante avaliação da eficácia de seus instrumentos,  
técnicas e conhecimentos para atingir as metas propostas, que devem estar  
articuladas aos elementos presentes no espaço sócio-ocupacional, como  
também referendaram os compromissos profissionais (Couto, 2009, p. 4).  
Sendo assim, não temos dúvidas de que a construção de um projeto exige conhecimento  
teórico-metodológico, escolha consciente de valores éticos e políticos, além de competência  
técnico-operativa. Afinal, é a intencionalidade do que objetivamos sempre atravessada pelas  
condições éticas e técnicas que guia nosso planejamento e pode ser capaz de delinear os  
limites e possibilidades do trabalho com clareza e delimitá-los em um projeto de trabalho  
(Horst, 2023).  
Portanto, a elaboração de um projeto de trabalho exige esforços no cotidiano frente a sua  
dinâmica, mas trata-se de uma tarefa inadiável quando se busca avançar com experiências no  
dia-a-dia do exercício profissional cada vez mais sintonizadas com o projeto ético-político  
(PEP). Em nossa perspectiva, é o projeto de trabalho ancorado nos fundamentos do Serviço  
Social que pode ser capaz de revelar o que nos difere de outros projetos de sociedade e de  
profissão.  
741  
Afinal, precisa trazer em si demarcações básicas, como por exemplo: a) a concepção de  
Serviço Social que orienta o referido exercício profissional; b) o objeto de trabalho do Serviço  
Social; c) o objetivo do Serviço Social; e d) os valores ético-políticos que nos orienta; e) bem  
como nossas atribuições e competências, entre outras questões (Horst, 2023).  
Sendo assim, compreendemos que a construção do projeto implica em delimitarmos com  
clareza os fundamentos do Serviço Social, como pressuposto para sua construção na perspectiva  
crítica. Ao tratarmos de fundamentos, estamos considerando dois pilares distintos, mas  
interligados, ao compreendermos que os fundamentos do Serviço Social são constituídos de  
fundamentos sócio-históricos e fundamentos teóricos.  
Nessa direção, apesar de compreendermos que os fundamentos são os pressupostos de  
todo o projeto de trabalho, no presente artigo, aprofundaremos a relação entre os fundamentos  
do Serviço Social e a construção do primeiro “bloco” de um projeto de trabalho de assistentes  
Claudio Henrique Miranda Horst  
sociais, conforme experiência já elaborada pelo autor (2023). O esforço de retomar o debate  
dos fundamentos para a elaboração do projeto de trabalho por parte da/o assistente social e/ou  
equipe é urgente, afinal, conforme destacou Guerra (2023), o debate dos fundamentos está no  
cerne das disputas por um projeto de profissão que envolve a unidade trabalho e formação  
profissional.  
Sendo assim, ao compreendemos que “o planejamento se coloca como instrumento tanto  
de definição como de redefinição da prática, ao exigir estudos, pesquisas, levantamentos”  
(Vasconcelos, 2015, p. 227), elaborar um projeto de trabalho como guia do exercício  
profissional possibilita o enriquecimento de assistentes sociais como sujeitas/os em constante  
formação e comprometidas/os com o aprimoramento intelectual.  
Metodologicamente, o artigo foi construído a partir da sistematização da prática  
profissional, em diálogo com a revisão de literatura. No primeiro momento, recuperamos a  
compreensão sobre os fundamentos do Serviço Social. No segundo momento, aprofundamos o  
debate sobre o projeto de trabalho demarcando a concepção de profissão, o objeto de trabalho,  
os objetivos, valores ético-políticos e as atribuições e competências, com vistas a  
demonstrarmos como certa compreensão dos fundamentos é central para a construção e  
demarcação no projeto de trabalho de assistentes sociais comprometidas/os com o PEP.  
742  
Fundamentos do Serviço, afinal do que se trata?  
A nosso ver, a construção de um projeto de trabalho de assistentes sociais na perspectiva  
do PEP deve partir dos fundamentos históricos e teórico-metodológicos para decifrá-los  
criticamente.  
Nos últimos anos, temos reafirmado, no âmbito da profissão, a necessidade de voltarmos  
aos fundamentos. Seja pelo equívoco em seu trato e entendimento desde a formação profissional  
(Teixeira, 2019); seja pela tendência de a política social ser tomada como fundamento da  
profissão (Guerra, 2019); seja pelo falso consenso em torno do entendimento do que são os  
fundamentos do Serviço Social, como se não houvesse interpretações divergentes (Rezende;  
Paula; Silva, 2025).  
Sendo assim, inicialmente cabe destacar que compreendemos os fundamentos históricos  
da profissão como os fenômenos sócio-históricos (ontológicos) que fundam a profissão. E não  
só fundam a profissão, como permanecem evidenciando a necessidade social da mesma na  
atualidade, bem como incidem sobre a formação e o exercício profissional de assistentes  
sociais. Ou seja:  
Considero fundamento as bases e a razão de ser que explica a gênese e a  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 740-757, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Os fundamentos do serviço social como pressuposto para a construção do projeto de trabalho  
existência da sociedade e da profissão. Trata-se de fundamentos histórico-  
ontológicos enquanto as balizas, pilastras, razão e modos de ser constitutivos  
e constituintes da realidade e a profissão. Sem dúvida, esta concepção  
encontra-se sustentada por determinados fundamentos teórico-metodológicos,  
os quais me permitem considerar que são as bases histórico-ontológicas ou as  
condições histórico-sociais da realidade que fundam a necessidade da  
profissão em determinando momento da sociedade capitalista no seu estágio  
monopolista, com todas as suas determinações constitutivas (ver Netto, 1992),  
bem como as condições que fazem a profissão manter funcionalidade e  
legitimidade social na sua trajetória histórica e na contemporaneidade. E, aqui,  
repito, refiro-me aos fundamentos histórico-ontológicos que explicitam a  
lógica constitutiva dos modos de ser da realidade e da profissão (Guerra, 2023,  
p. 45).  
Diferentemente, os fundamentos teóricos ou fundamentação já se refere à dimensão  
teórico-metodológica, à matriz do pensamento, à perspectiva teórica que a profissão elege para  
explicar os seus fundamentos e a realidade. Nessa direção, compreendemos que somente as  
perspectivas marxistas e o método materialista histórico dialético possibilitam a explicitação  
crítica dos fundamentos históricos do Serviço Social.  
Portanto, estamos destacando no presente texto que existem fundamentos históricos e  
fundamentos teóricos, ou seja, que a fundamentação teórica não é a mesma coisa que os  
fundamentos históricos da profissão. Afinal, o marxismo não é o fundamento da profissão, a  
profissão não surgiu ou se explica por causa do marxismo. Ele, como fundamentação teórica,  
possibilita a leitura crítica dos fundamentos históricos e ontológicos da profissão.  
Nesse sentido, não coadunamos com algumas leituras que concebem os fundamentos  
como sinônimo de história da profissão. Por essas perspectivas, o conjunto de disciplinas que  
tratam dos Fundamentos Históricos, Teóricos e Metodológicos do Serviço Social (FHTM) se  
resume a narrar o histórico da profissão. Conforme demonstrou Teixeira (2019), “os  
Fundamentos do Serviço Social, na maioria das vezes, são compreendidos somente como  
disciplina obrigatória da matriz curricular dos cursos como Fundamentos Históricos e Teórico-  
metodológicos do Serviço Social (FHTM)”. Ou somente quando as disciplinas que,  
equivocadamente, os cursos vinculam ao terceiro núcleo de fundamentação, qual seja: o núcleo  
de fundamentação do trabalho profissional2.  
743  
Também não nos vinculamos à concepção que trata os fundamentos como matrizes do  
pensamento, entendendo que o método materialista histórico-dialético, bem como a teoria  
2
Conforme Teixeira (2019) demonstrou na perspectiva das diretrizes curriculares todos os componentes de um  
currículo precisam garantir os três núcleos de fundamentação no seu interior. Ou seja, as disciplinas, laboratórios,  
oficinas, supervisão, TCC e etc. precisam trabalhar ambos os núcleos: de fundamentação teórico-metodológico da  
vida social; da formação sócio-histórica da sociedade brasileira; e, do trabalho profissional como possibilidade  
de garantir uma leitura correta dos fundamentos do Serviço Social a partir da unidade articulada entre os três  
núcleos de fundamentação.  
Claudio Henrique Miranda Horst  
social marxiana, seriam os fundamentos do Serviço Social na contemporaneidade (Yazbek,  
2018). Consideramos que a profissão já possuiu e possui diversos “fundamentos”, tratando-se  
de fundamentos teóricos (esses sim diversos) sendo a fundamentação o que possibilita a leitura  
dos fundamentos históricos.  
Sendo assim, se o marxismo é a fundamentação que possibilita explicar nossos  
fundamentos históricos, ou seja, explicar as bases sócio-históricas do Serviço Social e sua  
justificação e explicar os fenômenos que incidem sobre a formação e o exercício profissional.  
E considerando que os elementos que fundam esta profissão e que ainda hoje a tornam  
necessária são os fenômenos sócio-históricos, inscritos na realidade. Que fundamentos  
históricos são esses?  
Em nível mundial, a conformação do capitalismo em sua etapa monopolista e a  
“questão social” como base material de surgimento da profissão e suas expressões, como a  
matéria de trabalho de assistentes sociais. Vale lembrar que a “questão social” não determina  
por si só a gênese da profissão, “ela apenas dá base para a emergência da profissão quando se  
transforma em objeto de intervenção do Estado, quando surge uma mediação política entre a  
“questão social” e o Estado; mediação instrumentalizada pelas políticas sociais cujo executor  
terminal é o/a assistente social” (Guerra, 2024, p. 35).  
Sendo assim, conseguimos como profissionais captar o significado social da profissão  
inscrita na divisão social, racial, sexual e técnica do trabalho e recuperar um pressuposto  
central: o serviço social como partícipe no processo de produção e reprodução social. Ou seja,  
a partir das determinações econômicas, políticas, sociais, culturais, ideológicas, etc.  
compreendemos o significado social da profissão na sociedade capitalista.  
744  
Portanto, entendemos que o exercício profissional se realiza em condições de  
assalariamento e submetido às injunções do mundo do trabalho - o que implica limites à  
autonomia profissional e à prestação de um serviço de qualidade. Assim, ao delimitarmos os  
fundamentos da profissão a partir de uma leitura crítica, abre-se uma concepção de profissão:  
Parto da premissa de que o Serviço Social é um trabalho profissional, premissa  
esta que se sustenta na condição concreta e objetiva das e dos profissionais  
enquanto trabalhadoras e trabalhadores assalariados, vendedoras e vendedores  
de força de trabalho, e ainda que possam escolher a quem vender sua força de  
trabalho e sua duração, não detêm a posse dos meios de produção, o que os  
coloca em determinado lugar na divisão social, técnica, sexual e racial do  
trabalho. Inserida como uma especialização nesta mesma divisão do trabalho,  
a profissão responde a uma parcela das necessidades sociais, ao tempo em que  
tais respostas se orientam por fundamentações teórico-metodológicas e tem  
implicações ético-políticas (Guerra, 2023, p. 44).  
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Os fundamentos do serviço social como pressuposto para a construção do projeto de trabalho  
Nessa direção, cabe ressaltar que o exercício profissional envolve uma dupla dimensão:  
a) subjetiva: que diz respeito ao preparo pessoal da/o profissional, à fundamentação teórico-  
metodológica, à capacidade intelectual, seus valores, às condições subjetivas de responder às  
exigências do trabalho, às competências, etc.; b) objetiva: que diz respeito às condições  
materiais, estruturais e financeiras dos espaços sócio-ocupacionais, às dinâmicas da realidade  
brasileira, às correlações de forças, etc.  
Para fecharmos esse primeiro tópico, destacamos abaixo alguns elementos centrais a  
partir da compreensão dos fundamentos históricos e teóricos do Serviço Social:  
a) A fundamentação, a matriz teórica e o método que melhor desvela os elementos  
fundantes e estruturantes da profissão (seus fundamentos históricos) são o marxismo e  
o materialismo histórico-dialético;  
b) Que essa perspectiva não concebe a história como uma sucessão etapista e  
cronológica, nem a profissão a partir de uma leitura endógena, mas sim o Serviço Social  
na história;  
c) O trabalho como um complexo social central que possibilitou o desenvolvimento do  
ser social e o surgimento da humanidade, bem como sua particularidade no capitalismo  
como trabalho assalariado, explorado e alienado;  
d) A “questão social” e suas expressões, a partir da lei geral de acumulação capitalista,  
como base fundante da profissão e matéria do exercício profissional;  
745  
e) O exercício profissional de assistentes sociais inseridas/os em diversos processos de  
trabalho, como trabalho assalariado, é polarizado por interesses de classes distintas.  
Essa contradição não está sob o nosso controle em “abrir mão”, mas em nos  
comprometermos com o fortalecimento de um dos polos: o da classe trabalhadora, ou  
seja, os interesses das/os usuários dos serviços.  
Ao chegarmos até aqui, poderíamos pensar: por que esse debate é importante para a  
construção do projeto de trabalho? Por que retomar o debate dos fundamentos da profissão para  
o planejamento e sua materialização no projeto de trabalho?  
Ora, compreendemos que os elementos que fundam a profissão e a tornam necessária  
ainda hoje são primordiais para um trabalho consciente de seus limites e também de suas  
possibilidades, fugindo da lógica fatalista ou messiânica no exercício profissional. Essa  
compreensão possibilita a construção de estratégias na perspectiva do projeto profissional que  
pretendemos nos vincular e fortalecer, o projeto ético-político.  
Portanto, resgatar a concepção histórica de fundamentos é um exercício  
necessário para se pensar a profissão, pois ele nos permite o entendimento do  
Claudio Henrique Miranda Horst  
Serviço Social inscrito na própria realidade social. Visto ser dela que emanam  
as requisições profissionais, os condicionantes do trabalho e as possibilidades  
de respostas a serem formuladas por assistentes sociais. A partir disso,  
reafirmamos a ênfase na necessidade de aprimorarmos os nossos debates em  
torno da concepção de profissão inscrita no movimento histórico que funda o  
Serviço Social (Cardoso; Paula, 2024, p. 14).  
Concepção construída no processo histórico da renovação profissional no Brasil que  
possibilitou a aproximação com a fundamentação teórico-metodológica já apresentada acima e  
logo, uma leitura coerente dos fundamentos históricos da profissão, inaugurada com a obra  
seminal de Marilda Iamamoto e Raul de Carvalho: Relações Sociais e Serviço Social no Brasil  
(2014).  
Assim, foi possível pensar as condições do trabalho a partir de contradições presentes na  
realidade e que possuem implicações diretas para o exercício profissional, a exemplo: a  
flexibilização e precarização da formação profissional, ameaças e redução dos direitos, e a  
precarização das relações e condições de trabalho. Rompendo com a leitura messiânica e  
endógena de que o exercício profissional comprometido com o PEP depende apenas da boa  
vontade de assistentes sociais3.  
A Análise histórica crítica dos fundamentos da profissão compreende que o Serviço  
Social surgiu como uma especialização do trabalho coletivo, na fase monopolista,  
particularmente quando o Estado passa a enfrentar as expressões da “questão social” por via  
das políticas sociais. Não se trata de uma profissão que se desenvolveu a partir da ajuda e  
caridade, mas que surge como produto histórico, participando da reprodução das relações  
sociais de classes e da relação contraditória entre elas, cujo significado social (sua função  
social) é contribuir na garantia da reprodução da força de trabalho e a reprodução da ideologia  
dominante (Iamamoto; Carvalho, 2014).  
746  
Portanto, o Serviço Social como profissão não pode fugir dessa realidade, uma vez que é  
nela que se realiza o exercício profissional, ou seja, é próprio das relações vigentes. Ao  
reconhecermos que na mesma atividade atendemos e reproduzimos “interesses contrapostos  
que convivem em tensão” (Iamamoto; Carvalho, 2014, p. 81) e que é a partir dessa compreensão  
que “se pode estabelecer uma estratégia profissional e política, para fortalecer as metas do  
capital ou do trabalho (Iamamoto; Carvalho, 2014, p. 81)”, entendemos que a construção de um  
3
Conforme sabemos, a impossibilidade do exercício profissional ser conduzido inteiramente pelo PEP não tem  
relação apenas com a mera vontade e capacidade de assistentes sociais, mas tem a ver com limitações estruturais  
e históricas da realidade e da profissão. As dificuldades de sua realização se dão por questões tanto de ordem  
material-concreta: desfinanciamento de políticas sociais; precarização do trabalho, por exemplo, como de ordem  
subjetiva de profissionais: fragilidade teórico-intelectual; negação dos valores ético-políticos, etc. (Guerra, 2015).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 740-757, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Os fundamentos do serviço social como pressuposto para a construção do projeto de trabalho  
projeto de trabalho profissional pode assumir o papel de orientar um exercício profissional  
comprometido com o horizonte e os interesses das classes trabalhadoras.  
Construindo o projeto de trabalho profissional: aprofundando a primeira parte de  
um projeto.  
Iniciemos nosso tópico delimitando a compreensão de projeto que nos guia, com vistas a  
diferenciar projeto como sinônimo de plano e de projeto de intervenção4. O projeto de trabalho  
é das/os assistentes sociais, e deve expressar um planejamento coletivo quando se tratar de mais  
de  
um/a  
profissional  
ou  
individual  
do  
trabalho  
profissional  
naquele  
setor/instituição/política/projeto.  
Compreendemos o projeto de trabalho como uma organização sistematizada e escrita que  
apresenta as ações técnico-operativas, os fundamentos profissionais, as defesas ético-políticas  
e a forma de responder às expressões da “questão social” que aparecem cotidianamente. Nele  
aparecem a compreensão que temos da profissão, da política social, dos usuários, etc. Ou seja,  
uma elaboração que apresenta de maneira consciente o projeto profissional a que nos  
vinculamos (Horst, 2023).  
Diferentemente do plano, que nos termos de Baptista (2015, p. 99), “delineia as decisões  
de caráter geral do sistema, suas grandes linhas políticas, suas estratégias, suas diretrizes e  
precisa responsabilidade” e é tomado como marco de referência para os setores, serviços e  
instituições, com vistas a elaboração de programas e projetos específicos. O projeto, “é o  
documento que sistematiza e estabelece o traçado prévio da operação de um conjunto de ações”  
(Baptista, 2015, p. 101). É o instrumental mais próximo da execução. E pode ser a setorização  
do plano, um desdobramento do plano, cujos objetivos do setor poderão ser alcançados a partir  
de objetivos específicos do trabalho de assistentes sociais5.  
747  
O processo de elaboração de um projeto de trabalho é tanto um exercício de  
conhecimento e sistematização da realidade alvo do exercício profissional,  
4 “O projeto de trabalho é algo do serviço social (profissional individual, equipe, setor), mas precisamos lembrar  
que os projetos de intervenção já não dizem respeito apenas ao serviço social. Eles podem não envolver toda a  
equipe de assistentes sociais, podem ser elaborados com base nas duplas, equipes multidisciplinares. Um trabalho  
em grupo com mulheres idosas, por exemplo, pode ser conduzido por uma assistente social, uma psicóloga, então  
precisa ser elaborado um planejamento (projeto de intervenção) por ambas” (Horst, 2023, p. 126).  
5 Portanto: “Vale demarcar que estamos partindo do pressuposto que projeto de trabalho não é a mesma coisa que  
projeto de intervenção. Um projeto de trabalho é mais amplo, já que reúne em si a concepção de profissão, a  
concepção da política social com que atuo, além de traçar todas as ações que irei realizar junto às suas  
temporalidades e prazos, por exemplo. Dessa forma, eu posso elaborar um projeto de trabalho, e posteriormente,  
o projeto de intervenção, destrinchando as ações. Nessa direção, temos que o projeto de intervenção detalha mais  
cada ação. Se no projeto de trabalho, eu vou colocar que me reúno com a equipe semanalmente, realizo supervisão  
de estágio, além de reunião com a rede, entrevistas, visitas e relatórios, no projeto de intervenção é o momento em  
que irei qualificar – se eu quiser elaborar mais detalhadamente cada uma destas ações – o horário, os objetivos, o  
público-alvo, o dia, os temas, locais, recursos etc., dessas ações” (Horst, 2023, p. 125).  
Claudio Henrique Miranda Horst  
quanto a sistematização do conjunto das ações profissionais a serem realizadas  
– sua explicitação, justificativa, organização – no contexto das condições e  
relações de trabalho em que se encontra inscrito o assistente social (CFESS,  
2001, p. 48).  
Conforme destacamos desde a introdução, no presente artigo daremos destaque na  
construção do que estamos chamando de “primeira parte de um projeto”, a partir da sugestão  
construída por nós, conforme figura abaixo. Ou seja, daremos ênfase na parte 2 intitulada  
Serviço Social.  
Quadro 1: Tópicos do Projeto de Trabalho Profissional.  
748  
Fonte: Elaborado pelo autor.  
A concepção de Profissão:  
O primeiro tópico que sugerimos nesta parte do projeto pretende demarcar a concepção  
de profissão da/o assistente social e/ou equipe de assistentes sociais. É preciso demarcar de que  
Serviço Social se fala. Portanto, trata-se de delimitá-lo como uma profissão inscrita na divisão  
social, sexual, racial e técnica do trabalho, como trabalho. Com vistas a enfrentar concepções  
de ajuda, de caridade, da ideia de que a profissão seria ciência ou uma técnica, de que seria  
militância ou até mesmo de ser confundida com a política social, como acontece em relação à  
política de assistência social, etc. (Horst, 2023).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 740-757, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Os fundamentos do serviço social como pressuposto para a construção do projeto de trabalho  
Conforme apresentamos no primeiro tópico do texto, a concepção da profissão revela  
seus objetivos, intencionalidades e o projeto profissional que nos vinculamos no âmbito da  
profissão6. Portanto, ao compreendermos o Serviço Social como trabalho, enfrentamos  
perspectivas endógenas que ainda hoje atravessam o significado e a compreensão da profissão,  
compreendendo como evolução da ajuda, vocação, etc.  
Desta forma, nesta perspectiva de análise, o Serviço Social (ou o Trabalho  
Social) "profissional" seria o resultado final do processo de evolução da ajuda.  
Portanto, sua função social seria a prestação de ajuda às populações mais  
vulneráveis, tal como nos seus "precedentes evolutivos", mantendo os  
mesmos fundamentos e funcionalidade que a caridade e a filantropia; apenas  
se diferenciando nas modalidades operativas, na formação profissional ou não,  
e na base técnica e científica. Os mesmos fundamentos e funcionalidade, entre  
o Serviço Social e a caridade e filantropia, mas diferentes características e  
mecanismos de ação (Guerra, 2024, p. 30).  
Na contramão dessa leitura, reforçamos uma análise histórico crítica “onde a profissão só  
pode ser compreendida como um fenômeno, uma particularidade da sociedade capitalista, na  
idade do monopólio, constituída a partir dos fundamentos desta realidade social, e não da  
evolução da ajuda” (Guerra, 2024, p. 48).7  
O objeto de trabalho  
No trabalho de assistentes sociais em diferentes espaços sócio-ocupacionais destacam-se  
as diversas expressões da “questão social” que atravessam o cotidiano e as vidas das/os  
usuárias/os. Como também as violações aos direitos humanos e as desproteções sociais  
consequências, em sua maioria, da dinâmica da lei geral de acumulação capitalista e de um  
modo de produzir e reproduzir a vida que nega a diversidade humana. Compreendemos,  
conforme Iamamoto que:  
749  
A matéria prima do trabalho do assistente social encontra-se no âmbito da  
questão social em suas múltiplas manifestações – saúde da mulher, relações  
de gênero, pobreza, habitação, urbanização etc. – tal como vivenciadas pelos  
indivíduos sociais em suas relações sociais cotidianas, às quais respondem  
com ações, pensamentos e sentimentos (Iamamoto, 2001, p. 100).  
Nesse tópico, portanto, cabe demarcar o que nós, como assistentes sociais  
compreendemos como matéria/objeto do trabalho, com quais expressões da “questão social”  
6
Vale destacar que pesquisas recentes têm levantado as tendências/projetos presentes na profissão, entre eles:  
Projeto de Cariz Tecnocrático; Projeto da Vertente Neoconservadora; Projeto da Vertente Aparentemente Radical;  
O “projeto” do Serviço Social Libertário; O “projeto” das 23 teses pela reforma do Serviço Social; O Projeto do  
Serviço Social Clínico. Que vão apresentar a) fundamentos históricos, teóricos, metodológicos e filosóficos  
distintos; b) diferentes concepções de profissão, do objeto e objetivo de trabalho de Assistentes Sociais; c)  
diferentes valores éticos políticos; d) vinculações a diferentes projetos societários.  
7 Sugerimos duas leituras para o aprofundamento do debate pelas profissionais: o livro “Relações Sociais e Serviço  
Social no Brasil” de Marilda Iamamoto e Raul de Carvalho. Bem como as Diretrizes Gerais para os Cursos de  
Serviço Social da ABEPSS (ABEPSS, 1996).  
Claudio Henrique Miranda Horst  
nos defrontamos e lidamos, para não incorrermos nos equívocos de acreditar que o objeto de  
trabalho é a política social, a proteção social, a família, o risco, a vulnerabilidade etc. (Horst,  
2023).  
Ao mesmo tempo, quando demarcarmos o que são as expressões da “questão social”,  
exige-se a compreensão que assistentes sociais “não intervêm diretamente e pessoalmente nas  
sequelas da “questão social”; tal intervenção remete a um processo institucional, a partir da  
inserção deste profissional na implementação desses instrumentos estatais de intervenção  
social” (Guerra, 2024, p. 69). E conforme sabemos, nossas intervenções nas refrações da  
“questão social” são mediadas por uma modalidade específica de respostas às mesmas: as  
políticas sociais.  
É urgente que assistentes sociais aprofundem a compreensão e dialoguem em equipe para  
delimitarem o objeto de trabalho. Afinal, o entendimento de que “estamos partindo todas/os do  
mesmo lugar” não condiz com uma realidade profissional onde convivem distintas experiências  
de formação profissional, diferentes perfis de assistentes sociais e diversas concepções de  
mundo e profissão.  
Em uma pesquisa recente realizada com assistentes sociais no Estado do Rio Grande do  
Sul, Reidel et al. (2019) apresenta resultados curiosos em relação à pergunta sobre o objeto do  
trabalho profissional dos assistentes sociais. Nela, 1.415 assistentes sociais responderam serem  
as relações sociais e/ou familiares o objeto de trabalho profissional. Em segundo lugar, ficaram  
as expressões da “questão social”. Em terceiro lugar, ficou riscos e vulnerabilidades. Em quarto,  
1.184 assistentes sociais responderam o “empoderamento/fortalecimento de sujeitos sociais”.  
Em quinto lugar, “os problemas sociais”. E em sexto, a “ajuda humanitária” como objeto. E  
ainda, 205 profissionais marcaram outros.  
750  
Assim, compreendido o "objeto" do Serviço Social, não como "problema"  
isolado ou autônomo, mas como particularidade da totalidade social,  
historicamente constituída, como manifestação da "questão social", o  
enfrentamento por parte do assistente social também não constitui um  
processo autônomo, mas sistemático, institucional, atrelado à implementação  
de políticas sociais. Neste sentido, mesmo mudando as condições imediatas  
dos sujeitos envolvidos (o que certamente pode constituir melhora na  
qualidade de vida para a população), compreende-se que os fundamentos  
desse fenômeno, no caso, da pobreza, continuam a se perpetuar. Tanto a  
compreensão do fenômeno, como sua resposta ou enfrentamento, deve ser  
saturada das mediações. Entende-se assim, que a ação profissional do  
assistente social, na implementação das políticas sociais, não elimina os  
fundamentos do "problema", mas pode melhorar as condições imediatas de  
vida; isto é: a política social e a intervenção profissional não eliminam a  
pobreza, mas ameniza seus efeitos para a população. Ou seja, o "objeto" de  
intervenção profissional não  
é
a
"questão social", mas suas  
manifestações, expressões, refrações, sequelas. Desta forma a intervenção  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 740-757, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Os fundamentos do serviço social como pressuposto para a construção do projeto de trabalho  
profissional do assistente social, por via das políticas sociais consegue mudar  
a realidade imediata/cotidiana, a "manifestação", mas não transformar seu  
fundamento, a estrutura social, a chamada "questão social" (Guerra, 2024, p.  
233, grifos nossos).  
Na perspectiva crítica, ancorada nos fundamentos, conforme estamos apresentando, a  
concepção do objeto que não é somente de intervenção, mas também de estudos e pesquisa,  
exige ser pensado a partir de alguns pressupostos, conforme destacou Guerra (2024, p. 231).  
Quais sejam: “(a) os fundamentos da sociedade contemporânea (a “questão social”),  
constituindo e determinando a diversidade de fenômenos e situações cotidianas; (b) os  
fenômenos (ou “situações problema”) como manifestações da “questão social”; (c) a  
intervenção/prática do assistente social sendo mediada pelas Políticas Sociais, numa relação:  
‘Questão Social /Políticas Sociais/Serviço Social”.  
O objetivo do exercício profissional  
Apresentado uma concepção de profissão, bem como seu objeto de trabalho, devemos  
demarcar no projeto quais os objetivos do nosso trabalho. O que requer a intervenção  
profissional e o que pode ser esperado a partir da nossa intervenção. Ou seja, com qual objetivo  
e intencionalidade queremos exercer o trabalho. Essa parte é essencial com vistas, inclusive, a  
não resumir o trabalho à dimensão técnico-operativa. Por exemplo, como se o nosso objetivo  
na instituição fosse realizar visitas domiciliares, elaborar relatórios, etc.  
751  
Trata-se de informar os objetivos gerais da profissão que em outra parte do projeto  
deverão ser mediados com a particularidade do espaço sócio-ocupacional. Por exemplo, como  
assistente social na Vara da Infância e Juventude, trabalhando no setor de guarda e adoção,  
posso demarcar que meu objetivo é trabalhar para viabilizar o acesso de crianças e adolescentes  
a direitos sociais (como um objetivo da profissão mais geral). Naquele setor, meu objetivo pode  
ser: viabilizar o acesso de crianças e adolescentes ao direito à convivência familiar e  
comunitária.  
Nessa direção, destacamos aqui pelo menos três grandes objetivos do Serviço Social na  
perspectiva do projeto ético político: a) viabilizar o acesso aos direitos sociais; b) contribuir nos  
processos de formação, mobilização e organização dos diferentes segmentos das classes  
trabalhadoras que atendemos; c) contribuir na construção de novos valores éticos e morais  
sintonizados com uma perspectiva crítica dos direitos humanos e com a defesa da diversidade  
humana (Horst, 2023).  
Para fecharmos esse tópico, é importante demarcarmos, conforme Guerra (2024) nos  
chamou atenção, que ao pensarmos o horizonte da prática profissional podemos didaticamente  
Claudio Henrique Miranda Horst  
pensá-lo a partir de dois grandes horizontes (ou se quisermos objetivos): um horizonte prático-  
interventivo e um horizonte ídeo-político, “horizontes diferentes, mas também não  
contraditórios. Onde um não se converte mecanicamente no outro, mas o potencializa e  
qualifica” (Guerra, 2024, p. 265).  
O horizonte prático-interventivo é o horizonte possível de ser alcançado no cotidiano do  
trabalho profissional, com nossa intervenção na realidade. Trata-se do horizonte que revela os  
objetivos já destacados acima. Um horizonte possível, mas vale destacar conforme a autora,  
“mas não direta e naturalmente alcançado pela prática profissional” (Guerra, 2024, p. 266). Por  
isso, quando assistentes sociais se comprometem com esse objetivo, estamos tratando de  
questões atreladas à emancipação política. Ou seja, “mesmo não tendo como resultado a  
eliminação das causas estruturais das situações de carência, mesmo não tendo como um efeito  
da sua ação a transformação social, no entanto a prática profissional pode alcançar importantes  
resultados” (Guerra, 2024, p. 265).  
Mas o exercício profissional pode e na perspectiva aqui defendida deve estar  
ancorado em um objetivo, horizonte mais amplo: o horizonte ídeo-político. Este horizonte, para  
assistentes sociais críticos, possui uma perspectiva revolucionária, de superação dos  
fundamentos históricos das desigualdades, opressões, explorações e por isso se vincula à  
emancipação humana.  
752  
Trata-se portanto de um horizonte enquanto "utopia", dos fundamentos  
ideológicos, éticos e políticos que orientam o profissional, de uma perspectiva  
histórica, de superação da ordem, visando a plena emancipação dos homens e  
mulheres. Se no horizonte prático-interventivo a prática profissional crítica  
pode contribuir direta ou indiretamente para a emancipação política; no  
horizonte ídeo-político é a emancipação humana que contribui (inspira,  
orienta) com a prática profissional crítica. Ou seja, por um lado, a prática  
profissional crítica pode contribuir com a emancipação política, representando  
seu horizonte prático-interventivo. Por outro lado, é a emancipação humana,  
como horizonte ídeo-político do profissional, que contribui com a prática  
profissional crítica, dotando-a de perspectiva, de sentido, de esperança, de  
uma utopia (Guerra, 2024, p. 266).  
Valores ético-políticos  
Apresentar no projeto os valores ético-políticos defendidos e que deverão orientar o  
exercício profissional é fundamental para termos clareza da nossa direção ético-política, bem  
como delimitá-la para a instituição, equipe, empregadores. Conforme sabemos, as direções  
ético-políticas estão explicitadas nos princípios fundamentais e ao longo do Código de Ética  
Profissional (1993). Outras defesas éticas da profissão constam no documento online: “Sou  
assistente social e aqui estão minhas bandeiras de luta” (CFESS, 2022, n.p.).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 740-757, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Os fundamentos do serviço social como pressuposto para a construção do projeto de trabalho  
A partir dos nossos fundamentos históricos e teóricos, compreendemos que o exercício  
profissional não é neutro e “isso implica uma prática profissional voltada a contribuir na criação  
de novos valores para a realização da liberdade e do enfrentamento aos preconceitos,  
moralismos e toda forma de opressão e exploração” (Horst, 2023, p. 130). Sendo assim, não há  
intervenção profissional que não seja mediada por um projeto, uma projeção.  
Afinal, a todo o momento fazemos escolhas, projetamos finalidades, construímos meios  
para realizá-las, com invocação de valores que legitimam (ou não) nossas escolhas. Muitas  
vezes, até sem consciência, fazendo escolhas a partir de valores acríticos (desvalores)8.  
Portanto, todo exercício profissional é constituído por uma dimensão ético-política “o que  
envolve [...] a escolha de valores (ético) e a construção de meios para atingir suas finalidades  
(político)” (Cardoso, 2013, p. 76).  
Sendo assim, é preciso demarcar no projeto de trabalho nossas escolhas ético-políticas, já  
que o exercício profissional é constituído, tendo nós consciência, acreditando ou não, pela  
dimensão política.  
Ao atuarmos no movimento contraditório das classes, acabamos por imprimir  
uma direção social às nossas ações profissionais que favorecem a um ou a  
outro projeto societário. Nas diversas e variadas ações que efetuamos, como  
plantões de atendimento, salas de espera, processos de supervisão e/ou  
planejamento de serviços sociais, das ações mais simples às intervenções mais  
complexas do cotidiano profissional, nelas mesmas, embutimos determinada  
direção social entrelaçada por uma valoração ética específica. As demandas  
(de classes, mescladas por várias outras mediações presentes nas relações  
sociais) que se apresentam a nós manifestam‐se, em sua empiria, às vezes,  
revestidas de um caráter mistificador, nem sempre revelando seus reais  
determinantes e as questões sociais que portam, daí que essas demandas  
devem ser processadas teoricamente. Tendo consciência ou não, interpretando  
ou não as demandas de classes (e suas necessidades sociais) que chegam até  
nós em nosso cotidiano profissional, dirigimos nossas ações favorecendo  
interesses sociais distintos e contraditórios (Teixeira; Braz, 2009, p. 6).  
753  
Por isso, é impossível uma prática profissional neutra. Mesmo negando-a, estamos  
trabalhando em uma direção ético-política, a partir de uma determinada projeção, vinculada a  
um projeto profissional e societário. É importante saber de que projeto se trata, com vistas a  
qualificarmos nossa prática profissional, coerente com o que defendemos e legitima a profissão  
no Brasil. Reforçamos que a dimensão política não se trata de militância, seja ela religiosa,  
partidária ou de movimentos sociais. São dimensões distintas. Negar a dimensão política não  
8 Compreendemos como desvalor toda forma de agir que obscurece ou aliene as/os individuas/os. E que, portanto,  
impede a realização de ações éticas que criem liberdade e impeça as violências, o desrespeito, as injustiças e todas  
as formas de opressões e explorações (Barroco, 2010).  
Claudio Henrique Miranda Horst  
faz com que ela desapareça no cotidiano e, ao mesmo tempo, alimenta a despolitização da  
prática profissional9.  
Atribuições e competências  
As atribuições e competências estão previstas na Lei que regulamenta a profissão  
(8.662/1993), particularmente nos princípios 4º e 5º. É a partir desses dois artigos que podemos  
delimitar o que compete ao Serviço Social nos diversos espaços de trabalho. Sempre partindo  
das premissas já indicadas pela legislação e incorporando, desde que coerentes com nossas  
defesas e objeto de trabalho, o previsto na própria instituição (Horst, 2023).  
Conforme Raichellis (2020) nos alertou, debater as atribuições e competências  
profissionais na atualidade é uma tarefa desafiadora. Exige no mínimo apreender a  
reconfiguração dos espaços sócio-ocupacionais diante da nova morfologia do trabalho, num  
contexto de crise do capital e profundo ataque e desmonte contra o trabalho e os direitos.  
Sendo assim, “as definições legal e normativa das atribuições e competências  
profissionais não são suficientes para garantir legitimidade social frente aos/às empregadores/as  
e, principalmente, na relação com os/ as usuários/as dos serviços sociais” (Raichelis, 2020, p.  
12). Deste modo, nos cabe pensar que o reconhecimento de novos espaços, a possibilidade de  
compor novas equipes e setores, e possivelmente sermos requisitados/as para o  
desenvolvimento de novas competências e/ou atribuições, exige uma reflexão que não pode se  
resumir ao texto da lei. Pelo menos por duas questões.  
754  
Primeiro, as competências profissionais previstas na legislação, longe de restringir,  
oferecem um amplo leque de possibilidades de inserções e frentes de trabalho, conforme nos  
provocou Raichelis (2020) ‘desde que nos qualifiquemos para isso’.  
Segundo, o ponto de partida para avaliar uma nova requisição de atribuição e/ou  
competência consiste em identificar se há objeto do Serviço Social: as expressões da “questão  
social”. Isto possibilita ampliar atribuições e competências na perspectiva profissional desde  
que a matéria da profissão seja identificada.  
Deste modo, uma vez que a matéria/objeto profissional está em constante transformação  
na realidade, é possível que novas e velhas demandas se reponham no cotidiano. Cabe a nós  
9 Para a escrita desse tópico sugerimos a inserção dos princípios fundamentais do Código de Ética de 1993 além  
dos outros artigos e incisos presentes no mesmo. Bem como destacar a partir do Documento Bandeira de Lutas,  
quais defesas contidas no mesmo se vinculam ao espaço sócio-ocupacional que trabalho. Por exemplo, se trabalho  
na política de habitação e/ou urbana, posso inserir: “Defesa do direito à cidade, com posicionamento contrário aos  
processos de gentrificação provocados pela especulação imobiliária”.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 740-757, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Os fundamentos do serviço social como pressuposto para a construção do projeto de trabalho  
avaliar quais expressões da “questão social” podem ser objetos de respostas profissionais a  
partir das demandas reais (Iamamoto, 2012).  
Essa perspectiva nos exige refletir sobre as competências profissionais de maneira ampla  
para além do que já está na legislação e definir as novas atividades e objetivos do trabalho em  
vista do fortalecimento da identidade profissional conforme o projeto ético-político (Iamamoto,  
2012). Portanto:  
Mais importante do que a disputa pelo monopólio das atividades privativas  
em si mesmas são as respostas profissionais às demandas e requisições do  
cotidiano institucional, os conteúdos e a direção das atividades realizadas  
no âmbito do trabalho coletivo que assistentes sociais, juntamente com  
outras/os profissionais, realizam no enfrentamento das expressões da  
“questão social”, pela mediação das políticas sociais, em que exercem  
funções de operacionalização, planejamento e gestão (Raichelis, 2020, p. 12,  
grifos nossos).  
Assim sendo, é importante delimitar o que compete ao Serviço Social no espaço sócio-  
ocupacional partindo das premissas já indicadas pela legislação (artigos 4º e 5º) e incorporando,  
desde que coerentes com nossas defesas, o previsto como atribuições e competências na  
instituição.  
Demarcar no projeto as atribuições e competências é uma estratégia para não nos  
resumirmos ao profissional do “não”, nem ao profissional “faz de tudo”, pois ambas as  
tendências prejudicam a profissão (Horst, 2023), sendo necessário pensar formas alternativas  
de responder e enfrentar as requisições indevidas e conservadoras10.  
755  
Finalizando...  
Ao longo do nosso diálogo recuperamos os fundamentos Históricos e teóricos do Serviço  
Social demonstrando sua atualidade e a necessidade desses pressupostos para o exercício  
profissional e a construção do projeto de trabalho. O projeto de trabalho é  
[...] um importante instrumento de negociação diante do avanço de requisições  
indevidas e demandas conservadoras. Trata-se de mais uma estratégia para  
tensionar o alargamento da autonomia profissional, processo que precisa ser  
construído cotidianamente ao longo da vida profissional (Horst, 2023, p. 137).  
O projeto de trabalho não é um mero instrumento ou um manual. Deve condensar limites  
e possibilidades, sendo assim, articular os elementos institucionais e os compromissos  
profissionais. E deve ser um instrumento de constante avaliação. “É fundamental destacar que  
o projeto de trabalho ganha mais qualidade e peso na instituição quando elaborado de maneira  
10 Vale a pena a leitura e aprofundar o debate com os dois livros publicados pelo CFESS: “Atribuições Privativas  
do/a assistente social em questão”, volumes 1 (2012) e 2 (2020).  
Claudio Henrique Miranda Horst  
coletiva por assistentes sociais” (Horst, 2023, p. 126), o que não impede as diversas ações  
isoladas que serão destrinchadas nos projetos de intervenção.  
Finalizamos a presente reflexão com uma breve síntese de Guerra (2024, p. 269) que  
demonstra a urgência em recuperarmos nossos fundamentos, de termos clareza em relação aos  
limites e possibilidades no cotidiano profissional e do necessário protagonismo profissional na  
direção do projeto ético-político como possibilidade de experiências mediadas pelo mesmo.  
Torna-se, portando, essencial a clareza do profissional na correta  
caracterização  
e
compreensão dos fundamentos profissionais, dos  
determinantes histórico-sociais, assim como dos fundamentos teórico-  
filosóficos, e do protagonismo profissional em relação à definição sobre a  
formação, sobre os valores éticos que orientam este último particularmente a  
prática profissional, na produção de conhecimento, na articulação política,  
institucional ou social, mas também nos processos concretos de prática  
profissional, para o exato entendimento dos limites das potencialidades, o que  
permitirá superar as visões tanto fatalistas como messiânicas. Só a clara  
ponderação dos determinantes histórico, por um lado, e do protagonismo  
profissional, por outro, permite a superação do fatalismo e do messianismo.  
Só a correta avaliação dos limites e potencialidades, permite a superação  
dessas visões limitadas e reducionistas da profissão (Guerra, 2024, p. 269).  
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Tecnologias de informação e comunicação e  
assistência social: inflexões no Serviço Social  
Information and communication technologies and social assistance:  
inflections in Social Work  
Vinícius Paulino Lopes da Silva*  
Resumo: O artigo em tela é produto de  
experiências vivenciadas em meio às diversas  
lutas dos usuários dos serviços da Política de  
Abstract: This article is the product of  
experiences lived amidst the various struggles  
of users of Social Welfare Policy (PAS) services  
and of studies developed in the academic space.  
The work aims to contribute to the critical  
debate on the intensification of the use of  
Information and communication technologies  
(ICTs) by the State in PAS, highlighting its  
implications in the scope of social rights and in  
the scope of professional work in Brazil today.  
In addition to starting from the idea of  
technology as originating from labor, this text  
privileges the critique of the appropriation of  
capital over collectively produced technology.  
The harmony between historical and dialectical  
materialism, bibliographical, and secondary  
data reveal that, tendentially, ICTs appear in  
everyday life as sophisticated mechanisms of  
expropriation of rights to the extent that capital  
has intensified abstract formal rationality, thus  
obscuring the legacy culture of the ethical-  
political project.  
Assistencial Social (PAS)  
e
de estudos  
realizados no espaço acadêmico. O trabalho  
objetiva contribuir no debate crítico sobre a  
intensificação do uso das tecnologias de  
informação e comunicação (TICs) pelo Estado  
na PAS, evidenciando suas implicações no  
âmbito dos direitos sociais e no âmbito  
profissional no Brasil atual. Além de partir da  
ideia de tecnologia enquanto originária do  
labour, o texto privilegia a crítica da apropriação  
do capital sobre a tecnologia coletivamente  
produzida. A sintonia entre o materialismo  
histórico e dialético, a pesquisa bibliográfica e  
os  
dados  
secundários  
revelam  
que,  
tendencialmente, as TICs aparecem no  
cotidiano enquanto mecanismos sofisticados de  
expropriação de direitos na medida em que o  
capital tem intensificado a racionalidade formal  
abstrata, ofuscando, portanto, a cultura legatária  
do projeto ético-político.  
Palavras-chaves: Intensificação; Tecnologias  
de informação e comunicação; Trabalho;  
Assistência social; Projeto ético-político.  
Keywords: Intensification; Information and  
communication technologies; Work; Social  
assistance; Ethical-political project.  
* Universidade Federal do Rio de Janeiro. E-mail: vinicius.profpaulino@gmail.com  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.49655  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 31/07/2025  
Aprovado em: 03/11/2025  
Tecnologias de informação e comunicação e assistência social: inflexões no Serviço Social  
Introdução  
O artigo em tela é fruto do acúmulo de experiências vivenciadas junto às lutas travadas  
pela população usuária dos serviços da Política de Assistência Social (PAS), de aproximações  
sucessivas com o estudo bibliográfico, de discussões e de reflexões desenvolvidas no âmbito  
acadêmico. O trabalho tem como objetivo contribuir para o debate crítico sobre a intensificação  
do uso das tecnologias de informação e comunicação (TICs) pelo Estado na PAS, evidenciando  
suas implicações no âmbito dos direitos sociais e do trabalho profissional de assistentes sociais  
no Brasil contemporâneo. O texto contará com a sustentação de três chaves de análises, para  
além dessa introdução, sem a pretensão de exaurir a temática aqui discutida.  
No primeiro ponto, faz-se um esforço de desmistificar a falácia ecoada pelas classes  
dominantes e pelo senso comum de que a tecnologia tem uma “autonomia própria”. Na rota  
inversa desse ideário, argumenta-se que os bens tecnológicos têm uma relação histórica com o  
trabalho, isto, é, a tecnologia expressa o alto grau de desenvolvimento coletivo das forças  
produtivas (Marx, 2013; Vieira Pinto, 2005).  
Privilegia-se o contexto da maquinaria e grande indústria enquanto mediação fulcral  
para a reprodução ampliada do capital ao tornar todas as dimensões da vida social em potenciais  
mercadorias (Marx, 2013). De acordo com Marx (2013), nos escritos do Livro I de O capital,  
intitulado “Processo de produção capitalista”, tal período foi marcado pela incorporação da  
tecnologia pelo capital no chão da fábricas, cuja exploração se dava através da força de trabalho  
de crianças, jovens, idosos, mulheres etc. no sentido de fazer crescer, por um lado e  
exponencialmente, a extração de mais valia, o trabalho morto em relação ao trabalho vivo e a  
valorização desenfreada do valor; e, por outro lado, a materialização da lei geral de acumulação  
capitalista, isto é, o desemprego estrutural e a precarização da vida social.  
759  
No segundo ponto, articulam-se as determinações do movimento mais geral e  
internacional da reestruturação produtiva neoliberal dos anos 1970 (Alves, 2011; Antunes,  
2009; Harvey, 2017) e pós-crise de 2008 (Tonelo, 2021), com o aparecimento das TICs, da  
inteligência artificial (IA) e das novas/velhas tendências no mundo do trabalho, tais como o  
cibertariado (Huws, 2017) e a uberização (Abílio, 2020). Nessa esteira, os ditames impostos  
pela crise capitalista recente têm forçado velhas/novas formas de exploração e subsunção via  
TICs no mundo do trabalho e impulsionado a contrarreforma, a mercadorização e a privação  
dos direitos e serviços sociais públicos no âmbito do Estado. Além disso, no âmbito ideológico,  
o fio condutor da “pós-modernidade” tem ecoado a falsa concepção de perca da centralidade  
do trabalho e da unidade de classe no chão das relações sociais e das metanarrativas e tem  
supervalorizado os signos, a performance individual, a informação e o jogos de linguagem.  
Vinícius Paulino Lopes da Silva  
No terceiro ponto, destaca-se a intensificação do uso das TICs pelo Estado na PAS e  
suas inflexões no âmbito dos direitos sociais e no âmbito do trabalho profissional de assistentes  
sociais na realidade brasileira contemporânea (Boschetti, 2018; Dal Rosso, 2008; Guerra,  
2023b; Iamamoto, 2015; Veloso 2006). Assim sendo, nos últimos tempos, o Estado brasileiro  
tem reforçado o seu caráter racista, machista e conservador frente à questão social ao combinar  
“modernização” e “atraso”.  
Por fim, sem a pretensão de esgotar o debate, tentaremos, nas breves considerações  
finais, apontar as inflexões do uso das TICs no âmbito dos direitos sociais e no âmbito das  
dimensões profissionais que atravessam, dialeticamente, a unidade do modo de ser e de existir  
do Serviço Social brasileiro na contemporaneidade.  
Trabalho, tecnologia e valor: uma relação histórica indivorciável  
Parte-se do pressuposto de que a tecnologia dispõe de uma relação indivorciável com o  
trabalho (Vieira Pinto, 2005), sendo este uma categoria histórica fundante do ser social e de  
todas as suas determinações que, por meio de “[...] sua própria ação, medeia, regula e controla  
seu metabolismo com a natureza” (Marx, 2013, p. 255). Assim sendo, a tecnologia é produto  
coletivo do alto grau de desenvolvimento das forças produtivas; em outras palavras, ela “[...]  
revela o modo de proceder do homem com a natureza, o processo imediato de produção da vida,  
e, assim, elucida as condições de sua vida social e as concepções mentais que delas decorrem”  
(Marx, 2004, p. 428).  
760  
O ser social na mediação com a natureza e com os instrumentos e técnicas laborais  
objetiva um fim determinado que o distingue e o faz superar as barreiras com o mundo natural.  
Por meio do controle de seu sistema cognitivo “autônomo”, da linguagem articulada com os  
demais indivíduos sociais (sociabilidade) e de sua estrutura corpórea, mulheres e homens que  
trabalham passam a vislumbrar um campo de possibilidades a partir de escolhas concretas (em  
situações concretas da existência). Assim sendo, a humanidade cria e atende dialeticamente às  
suas necessidades e condiciona novas necessidades e novas descobertas, passando a construir,  
coletivamente, uma nova história.  
Sobre a distinção entre o ser social e a natureza, Marx (1985, p. 149-150) nos esclarece:  
Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha  
envergonha mais de um arquiteto humano com a construção dos favos de suas  
colmeias. Mas o que distingue, de antemão, o pior arquiteto da melhor abelha  
é que ele construiu o favo em sua cabeça, antes de construí-lo na cera. No fim  
do processo de trabalho obtém-se um resultado que já no início deste já existiu  
na imaginação do trabalhador e, portanto, idealmente (Marx, 1985, p. 149-  
150).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 758-781, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Tecnologias de informação e comunicação e assistência social: inflexões no Serviço Social  
Na esteira desse processo, o acúmulo de conhecimentos, capacidades e habilidades  
próprias da relação fundamental estabelecida entre o trabalho “humano-genérico” e a tecnologia  
tornam-se dimensões constituintes e constitutivas da dinâmica (re)produtiva das relações  
sociais em sua totalidade. A relação em questão é objetivada na medida em que, quanto mais o  
ser social conhece a esfera natural, melhor se aproxima desta, concretiza situações mais  
complexas até então nunca antes experienciadas, e, portanto, qualitativamente, a domina,  
resultando num valor de uso1 (Marx, 2013).  
Sob o lastro da sociabilidade burguesa madura, a tendência geral e internacional das  
relações sociais é caminhar numa outra direção: tornar todas as dimensões objetivas e  
espirituais da vida social em potenciais mercadorias (valor de troca) (Marx, 2013), incluindo o  
trabalho, a ciência e a tecnologia (Vieira Pinto, 2005). Tais dimensões são apropriadas pelo  
capital em relações que se deitam sobre o estranhamento; ou seja, os aparatos tecnológicos  
produzidos coletivamente pelos sujeitos tornam-se cada vez mais alheios a quem os produz. A  
partir disso, objetivam-se processos de alienação entre o produtor e o produto do seu trabalho.  
Dessa maneira, potencializa-se o projeto de dominação capitalista ancorado na relação  
antagônica de exploração entre capital2 e trabalho3, relação esta que busca preservar a sua  
(re)produção ampliada, extrair a mais-valia (D’), e, consequentemente, supervalorizar o valor  
a partir de suas leis tendenciais. Trata-se de leis objetivas que são readaptadas a cada momento  
histórico-conjuntural e são determinadas pelo movimento contraditório da luta de classes por  
hegemonia.  
761  
É no livro O capital, particularmente, nos escritos da Seção IV, Capítulo 13, intitulado  
“Maquinaria e grande indústria”, que Marx (2013) se debruça e identifica, à luz do materialismo  
histórico e dialético, os momentos originários da apropriação capitalista pela tecnologia no  
contexto da Revolução Industrial Inglesa do século XVIII.  
Segundo o autor, o intuito geral da máquina é “[...] baratear mercadorias e a encurtar a  
parte da jornada de trabalho que o trabalhador precisa para si mesmo” (Marx, 2013, p. 7). De  
1
Independentemente do modo de produção e sua forma histórica, mulheres e homens que objetivam o trabalho  
buscam satisfazer as suas necessidades humanas seja de forma direta (meio de subsistência) ou indireta (meio de  
produção). Assim, “[...] os valores de uso constituem o conteúdo material da riqueza, qualquer que seja a forma  
social desta” (Marx, 2013, p. 46).  
2
Expressa a classe burguesa enquanto detentora da propriedade privada e dos meios sociais de produção. Foi  
histórica a consolidação da Revolução Francesa (1789) na medida em que se gestaram as bases para a burguesia  
revolucionar a forma de produção, superando a antiga relação feudal entre suserania (senhor feudal) e vassalagem  
(servos da gleba), como também conservar a reprodução social do capital, imprimindo um novo modo de pensar,  
ser e agir estritamente egoísta.  
3
Diz respeito à classe social formada por um conjunto multifacetado de sujeitos explorados pela classe  
capitalista/burguesa. São despossuídos da propriedade privada, dos meios sociais de produção, e, cotidianamente,  
vendem a sua força de trabalho em troca de um salário (fruto da mais-valia) para manter sua reprodução social.  
Vinícius Paulino Lopes da Silva  
acordo com Harvey (2018, p. 111), Marx buscou analisar “[...] algumas das consequências da  
transformação tecnológica para o lucro e a renda [...]. O seu foco em O capital é o papel da  
tecnologia e da ciência em relação à valorização do capital e à produção de mercadorias”.  
Nesse interim, tal apropriação se deu não para aliviar a classe-que-vive-do-trabalho  
(Antunes, 2009) das exaustivas jornadas laborais nas minas de carvão e nas indústrias; pelo  
contrário: os objetivos do capital, desde o referido período sócio-histórico, já eram explícitos:  
intensificar, via maquinário, a exploração e as jornadas de trabalho em nome dos lucros  
privados; aumentar o trabalho morto; e reduzir significativamente o trabalho vivo (mas não o  
findando):  
A máquina, da qual parte a Revolução Industrial, substitui o trabalhador, que  
maneja uma única ferramenta, por um mecanismo, que opera com uma massa  
de ferramentas iguais ou semelhantes de uma só vez, e que é movimentada  
por uma única força motriz, qualquer que seja sua força. Aí temos a máquina,  
mas apenas como elemento simples da produção mecanizada (Marx, 2013, p.  
11).  
Diante dessas questões, o filósofo alemão percebera metamorfoses operadas nos  
processos de trabalho. Os aspectos mais rudimentares da manufatura (trabalho individual,  
manual, agrícola) já não eram mais suficientes para atender as novas necessidades humanas.  
Com a implementação da maquinaria pelo capital, “[...] o meio de trabalho é metamorfoseado  
de ferramenta em máquina ou em que a máquina difere do instrumento manual” (Marx, 2013,  
p. 7), fazendo aumentar exponencialmente a quantidade de mercadorias produzidas em menos  
tempo possível. Por isso, com base na crítica da economia política, o que passa a determinar o  
preço da mercadoria é o tempo de trabalho socialmente necessário ao capital (Marx, 2013).  
Através da inserção do maquinário nas indústrias, objetivou-se um salto qualitativo na  
sociabilidade burguesa até então. Esse salto fez com que Marx (2013) chegasse à seguinte  
constatação: inevitavelmente, a ferramenta ativa no processo de trabalho seriam mulheres e  
homens compostos por uma força motriz. Já a maquinaria seria uma força complementar a  
exemplo das forças animal, hidráulica, eólica etc. que diverge da força vital da humanidade.  
Nesse sentido, para Marx (2004), a mediação do trabalho (força motriz) com a  
maquinaria (força complementar) resultou no aumento da intensidade e produtividade do  
trabalho por dois motivos: 1) porque o maquinário muda substancialmente a interação e a  
velocidade com que o trabalhador produz as mercadorias a serem vendidas; e 2) porque a  
maquinaria cooptada pelo capital foi responsável pela divisão social do trabalho, que  
reorganizou a produção no chão das fábricas e nos demais espaços laborais existentes na  
sociedade com o fim de explorar, fragmentar e despolitizar as lutas políticas e coletivas de  
trabalhadores.  
762  
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Divergindo de Adam Smith, que atribuiu o conceito de valor ao trabalho realizado nas  
indústrias, e de David Ricardo, que relacionou a teoria do valor ao tempo médio de produção  
(pautados numa perspectiva conservadora), Marx (2004, p. 375) ressalta que “[...] o trabalho  
que se objetiva em valor é trabalho de qualidade social média, exteriorização de força de  
trabalho média”, o que garante que múltiplas mercadorias sejam trocadas. É o trabalho que  
transfere valor aos meios de produção. O primeiro modifica/transforma o segundo; os meios de  
produção estacionados não produzem mais-valia, tampouco são “autônomos” (Marx, 2004).  
Revela-se, assim, o potencial da tecnologia na seara do capitalismo. Marx (2013) supera  
os dois primeiros e preocupa-se em apreender como a maquinaria tendencialmente alongava o  
processo de extração de mais-valia pelos capitalistas. Ao mesmo tempo, o autor reafirmava  
socialmente o seu compromisso humanístico e vislumbrava, a partir das condições concretas  
vivenciadas, a superação estrutural do capital, ancorada na emancipação humana da classe  
trabalhadora em sua diversidade. Sendo assim, é a partir dessa direção teórica e política que nos  
é permitido apreender o real significado da tecnologia fincada no solo árido dessa sociabilidade.  
Com base no legado marxiano, Vieira Pinto (2005) considera que se propagam distintos  
significados ao conceito de tecnologia. Vejamos: 1) “[...] a tecnologia aparece com o valor  
fundamental e exato do lógos da técnica’” (Vieira Pinto, 2005, p. 219). Ou seja, a etimologia  
da palavra “tecnologia” desponta como a teoria e/ou o estudo limitado à técnica, incluindo as  
profissões; 2) a tecnologia, no vocabulário popular e do senso comum, corresponde à pura  
técnica. Há uma generalização da expressão de origem americana know how para privilegiar o  
aspecto do meramente “saber fazer” em todas as dimensões da vida societária; 3) a tecnologia  
é interpretada como o conjunto de todas as técnicas existentes em qualquer fase de  
desenvolvimento da história humana em que se objetiva desde os grupos sociais mais pretéritos  
até os grupos sociais que estabelecem suas relações no bojo da sociedade moderna. Tais grupos,  
nos termos do autor, apresentam um grau potencializado das forças produtivas sob um caráter  
“genérico” e “global”; e 4) considera-se a tecnologia enquanto “ideologização da técnica”, que  
necessita de maior atenção e crítica. Nessa dimensão, é possível encontrar as mediações  
concretas para desmistificar a sua suposta “neutralidade”.  
763  
Em referência à técnica, o autor aprofunda:  
[...] ao conceitua-lo como a característica de uma ação, e a isso se resume todo  
o conteúdo do termo “técne”, o homem quer exprimir que o ato realiza  
enquanto mediação, o fim intencional do agente. Revela-se-nos, com isso, a  
essência da técnica. É a mediação na obtenção de uma finalidade humana  
consciente. Embora esta se origine e se conserve no pensamento do agente, a  
mediação que a deve concretizar tem de ser realizada no plano objetivo, no  
mundo material, pela transformação dos objetos, pela criação de novas  
Vinícius Paulino Lopes da Silva  
substâncias e coisas, o que só pode acontecer com o emprego dos próprios  
corpos e das energias dos fenômenos naturais de que o agente previamente se  
apossou, ao ter formado o universo de representações que os refletem  
veridicamente (Vieira Pinto, 2005, p. 175-176).  
À vista disso, pode-se afirmar que a técnica não é ingênua; ela tem intencionalidade.  
Logo, está carregada de ideologias. Para pensar o projeto tecnológico, se faz necessário articulá-  
lo às dimensões concretas e ideológicas que atravessam os projetos societários e projetos  
profissionais nas arenas de disputa. Nessa seara, por exemplo, é muito banalizado pelo senso  
comum a difusão do termo “explosão tecnológica”. O referido termo foi criado pela burguesia  
e suas frações para ser compreendido e discutido nas relações sociais enquanto algo apartado  
das conexões históricas anteriores, ou seja, uma visão de mundo que está limitada ao campo  
imediato/singular da aparência, distante das macro determinações que a contém.  
Ademais, o foco é direcionado para a superioridade do estágio tecnológico atual como  
se as máquinas e a técnica delas oriundas adquirissem “vida própria”, sem a interação  
indivorciável com o trabalho humano. Evoca-se somente o que está presente no aqui e no agora  
(o presentismo), bastando a tecnologia “em si mesma” para resolver as problemáticas existentes  
no cotidiano. Com isso, objetivam-se duas faces contraditórias: por um lado, é inegável que  
esta representa multiplicidades de conhecimentos/saberes produzidos e acumulados  
coletivamente pela humanidade no seu desenvolvimento sócio-histórico; por outro, a  
(re)produção particular da consciência dominante faz com que as classes subalternas  
incorporem o pensamento de que as tecnologias do tempo presente são determinantes para o  
futuro das próximas gerações.  
764  
Segundo Vieira Pinto (2005), enraíza-se o falso discurso de que virão outras “explosões  
tecnológicas” que serão “inovadoras”, “positivas” e que flertam com o “progresso” e com o  
“desenvolvimento”. Entretanto, o fio condutor de tal consciência é reproduzir o projeto de  
classe que se movimenta concretamente numa constante entre “modernização” e “atraso” para  
a conservação do modo de ser e existir capitalista.  
Ao mesmo tempo em que há, na essência desse sociabilidade, a necessidade de mais  
trabalho para alavancar a produção desenfreada de riquezas, há, também, a preocupação em  
reforçar o desenvolvimento desigual e combinado das cadeias produtivas ditadas pelos países  
imperialistas (Fontes, 2010). Nas últimas décadas, essa ofensiva tem se espraiado  
incansavelmente para todos os países do mundo, assegurando a hegemonia do capital e  
refletindo, de forma mais intensa, nos países periféricos e dependentes, a exemplo de alguns  
países da América Latina (Argentina, Brasil, Costa Rica, Equador, Honduras, Peru, Nicarágua,  
etc.), da África e do Caribe.  
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Esses países são historicamente marcados pela superexploração da força de trabalho,  
pelo racismo estrutural, pelas jornadas de trabalho aviltantes, pelos empregos informais, pela  
desvalorização dos salários, pelo precário sistema de proteção social e pela condição de simples  
exportadores de matérias primas (Marini, 1977). Tais tendências resultam em drásticas  
condições de subsistência desses trabalhadores e suas famílias na medida em que agudiza-se as  
múltiplas expressões da “questão social” (desemprego estrutural, fome, miséria etc.).  
Sob essa lógica, “[...] aos países subdesenvolvidos só resta o recurso de se incorporarem  
à era tecnológica na qualidade de séquito passivo em marcha lenta, consumidores das produções  
que lhe vem do alto, imitadores e no máximo fabricantes do já sabido” (Vieira Pinto, 2005, p.  
44). Por isso:  
Temos de denunciar o lado secreto, maligno do endeusamento da tecnologia,  
aquele que visa unicamente a fortalecer ideologicamente os interesses dos  
criadores do saber atual, a fim de conservá-lo no papel de instrumento de  
domínio e espoliação econômica da maior parte da humanidade, levada a  
trabalhar para as camadas mais altas dos povos senhoriais sob a falsa e  
emoliente impressão de estar participando na única forma em que lhe é  
possível, da promoção do progresso em nosso tempo (Vieira Pinto, 2005, p.  
44).  
Crise do capital, mundo do trabalho e TICs  
Partilha-se das reflexões teóricas e políticas de que a crise capitalista é expressão  
fenomênica de seu “sistema socio-metabólico”. Em outras palavras, ela não se reproduz sem  
momentos de crescimentos e instabilidades, atravessando a base material da existência humana,  
a ideologia, as artes, a cultura, o movimento entre as classes sociais, suas frações e a relação  
dessas com o Estado burguês, afetando a totalidade da sociabilidade (Mészáros, 2011).  
Articulando produção e reprodução social, o referido autor afirma que a crise iniciada nos anos  
1970 é essencialmente estrutural porque: 1) tem um intrínseco caráter universalizante que  
compromete todas as esferas produtivas; 2) sua expansão é cada vez mais global, perpassando  
os diversos países existentes; 3) apresenta uma escala de tempo extensa, continua e permanente  
que diverge das crises cíclicas anteriores; e 4) é marcada por inúmeros colapsos, convulsões,  
abundâncias e escassez no futuro (Mészáros, 2011).  
765  
Nessa ótica, a raiz da crise estava na rigidez fordista4. O fordismo criou “[...] uma nova  
política de controle e gerência do trabalho, uma nova estética e uma nova psicologia, em suma  
um novo tipo de sociedade democrática, racionalizada, modernista, populista” (Harvey, 2017,  
4
No termo gramsciano, o americanismo fordismo surgiu em 1914, cujo principal representante foi Henry Ford,  
quando criou a linha de montagem automobilística nos Estados Unidos da América (EUA). O fordismo tinha como  
base a produção de caráter rígida em massa, o consumo exacerbado, a capacidade do trabalhador em conhecer a  
totalidade do processo produtivo, as atividades laborais repetitivas e a extensa esteira produtiva.  
Vinícius Paulino Lopes da Silva  
p. 125). Exemplo disso é o filme Tempos modernos, protagonizado por Charles Chaplin, que  
expressa a interação desumana entre o trabalhador e a linha de montagem a partir de  
movimentos repetitivos. Essa realidade é síntese histórica da relação universal de  
estranhamento objetivada entre capital e trabalho na sociedade.  
Em consequência a isso, a mediação utilizada pelo capitalismo para responder à sua  
instabilidade foi a reestruturação produtiva de lógica flexível toyotista, cujo fio condutor é a  
redução de custos para a manutenção da valorização do valor. Essa lógica acarretou mudanças  
no campo da produção, do Estado e da ideologia: no âmbito do trabalho, por exemplo, aparecem  
relações intermitentes, polivalentes, precarizadas, informais e terceirizadas, em que se  
valorizou o trabalho morto em relação ao trabalho vivo com a inserção de novas tecnologias —  
círculos de controle de qualidade5 (CCQs), o Kanban e outras formas de controle e gestão.  
Segundo Antunes (2009), o sistema toyotista6 de produção apresenta as seguintes  
particularidades em relação ao fordismo: 1) o foco da produção passa a ser regulado por  
demanda do mercado individual na qual prioriza-se um estoque mínimo; 2) no modelo flexível,  
a produção de mercadorias são cada vez mais heterogêneas, sofisticadas e com força de trabalho  
diversa na qual o trabalhador torna-se um operador de máquinas para expandir  
desenfreadamente a produção, modificando as relações de trabalho; 3) a defesa do “trabalho  
em equipe”, integração entre os colaboradores e a multiplicidade de funções a realizar, cuja  
consequência é a fragmentação da produção (polivalência); 4) incentivo do sistema just-in-time,  
ou seja, a busca do melhor “aproveitamento” do trabalhador em sua jornada de trabalho (a  
realização de mais-trabalho em menos tempo possível, por demanda); e 5) a produção é  
horizontalizada, fragmentada, flexível e descentralizada e as empresas tornam-se “enxutas” e  
prestadoras de serviços, fomentando a terceirização, a privatização e a concorrência  
intercapitalista.  
766  
No âmbito do Estado, tem-se o revigoramento das “contrarreformas”, cujas políticas  
sociais assumem tendências focalizadas, paternalistas, gera “gastos” para a coisa pública e são  
mercantilizadas, pulverizadas e limitadas aos programas de transferência de renda, priorizando  
o fundo público para o pagamento da dívida externa. Esse cenário aprofunda a retirada de  
direitos sociais e a precarização das condições de vida da classe trabalhadora (Behring, 2003).  
5 Na utilização dos CCQs, criam-se grupos de trabalhadores que passam a ser regulados, controlados e avaliados  
pela sua capacidade individual de desempenho e qualidade dos serviços prestados no processo laboral (Antunes,  
2009).  
6
O que também demarca a lógica toyotista de produção é a captura da subjetividade do trabalhador. Criou-se o  
banco de horas, jornadas e dias extras de trabalho e as folgas reduzidas. Em síntese, é um espaço no qual se  
materializa a subsunção real do trabalhador ao capital, se expropria o seu saber e se intensifica a extração de mais-  
valor relativo via inserção de novas tecnologias na produção (Alves, 2011).  
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No âmbito ideológico, por sua vez, o capital, em sua face neoliberal, tem incentivado a  
perspectiva “pós-moderna” (Lyotard, 2009), que se ancora na negação das metanarrativas e  
deslegitima a centralidade do trabalho, suas lutas nas relações sociais e o materialismo histórico  
e dialético. Nesse âmbito, o que vale são os signos, a comunicação, a informação, o micro e  
não o macro —, o presentismo e a falácia do “fimda história (Fukuyama, 1992). Tais valores  
têm revigorado a ofensiva decadente do projeto burguês, objetivando uma nova razão do mundo  
(Dardot; Laval, 2016).  
Por sua vez e de forma ampliada, Harvey (2017) utiliza o conceito de acumulação  
flexível para expressar a superação do regime fordista através de amplo processo de  
transformações nos diversos âmbitos da vida societária no bojo do capitalismo global a partir  
dos anos 1970. O autor sustenta ter havido um novo movimento de “compressão do espaço-  
tempo”, modificando as relações sociais com a abertura de novos mercados, a criação de novos  
estilos e modos de ser e o aparecimento do setor de serviços (imagens, a moda, as transações  
financeiras), cujo objetivo é a necessidade constante de flexibilizar os processos de trabalho e  
fragmentar os sindicatos, os movimentos sociais progressistas e a vida cotidiana.  
O conjunto dessas transformações societárias tem provocado o acirramento da luta de  
classes em escala global que atravessou os anos 1980, 1990, 2000, e, no contexto pós-crise de  
2008, essas transformações nos levam a refletir criticamente sobre a possibilidade de que “[...]  
vivemos uma nova fase de reestruturação do capital das condições de trabalho e produção,  
superando (dialeticamente) o fordismo, o toyotismo e alguns aspectos da acumulação flexível”  
(Tonelo, 2021, p. 158), mas não encerrando esta última. A também chamada crise dos  
subprimes7 foi notada: 1) pelos planos de austeridade fiscal entre os anos (2009-2010) para  
manter a reprodução ampliada do capital; 2) pela histórica questão da imigração; 3) pela função  
da guerra comercial, os conflitos ideológicos e geopolíticos, afetando a divisão internacional  
do trabalho; e 4) pela inserção de novas TICs, a robotização e a IA.  
767  
É nesse lastro histórico neoliberal que emerge na realidade a Indústria 4.08 (ou Quarta  
Revolução Industrial), marcada pelo capitalismo de plataforma (Srnicek, 2014)9, pela expansão  
7 Foram as hipotecas/empréstimos imobiliários concedidos, majoritariamente, pelo Banco Lehman Brothers e pelo  
Bank of América à classe trabalhadora nos Estados Unidos. O não pagamento desses empréstimos motivou o boom  
da crise capitalista, que, por sua vez, refletiu em todas as esferas da vida social em escala mundial (Tonelo, 2021).  
8
A indústria 4.0 teve a sua criação no ano de 2011 em Hannover, na Alemanha. O seu intuito inicialmente era  
pensar como revolucionar a organização, gestão e desenvolvimento das cadeias globais de valor a exemplo da  
criação das “fábricas inteligentes” e automatizadas, com produtos e serviços personalizados, além de criar novos  
modelos operacionais para diminuir custos (Schwab, 2018).  
9 Termo utilizado para expressar modalidades de trabalho e serviços mediadas pelo uso das TICs na atualidade e  
dinamizar os lucros capitalistas, a exemplo das empresas-aplicativos (Ifood, Happie, 99 Food, Uber, UberEats)  
produtos da reestruturação produtiva neoliberal no contexto pós-crise de 2008 (Antunes, 2022; Srnicek, 2014).  
Vinícius Paulino Lopes da Silva  
da gyg economy (economia de bico), pelo domínio de algoritmos, pelo ChatGPT, pelos carros  
elétricos e celulares cada vez mais arrojados com reconhecimento facial e vocal, pela internet  
das coisas, pelo 5G, pela uberização10 (Abílio, 2020) e pelas plataformas digitais Apple  
Music, Amazon, Canva, Deezer, Facebook, Google Play, Instagram, Netflix, Spotify, Tidal,  
Twitter, Youtube etc.  
Tais aspectos até então nunca foram vistos antes pela humanidade. Diante desse salto  
qualitativo, é importante destacar que “[...] o que torna a 4ª Revolução Industrial  
fundamentalmente diferente das anteriores é a fusão dessas tecnologias e a interação entre os  
domínios físicos, digitais e biológicos” (Schwab, 2018, p. 20-21). A tendência do capitalismo  
contemporâneo é “[...] a utilização de novas TICs com a emergência das ‘economias de  
plataforma’ como forma de debilitar decisivamente qualquer elemento de estabilidade laboral”  
(Tonelo, 2021, p. 154).  
Segundo Huws (2017), as relações de trabalho em tempos de crise atual contribuem para  
a formação de um cibertariado (trabalhadores que vendem a sua força de trabalho mediada pelo  
digital) num mundo real, permeado por relações concretas, espirituais e por conflitos de classes,  
que, por sua vez, avolumam “[...] uma oferta necessária de um proletariado livre como os  
pássaros” (Marx, 2013, p. 275). Por isso, reitera-se que, mesmo em tempos de plataformas,  
algoritmos e IA, o capital não sobrevive sem a interferência vital do trabalho humano. É o  
trabalho que produz a tecnologia, e não o oposto.  
768  
Enquanto Tonelo (2021) e Huws (2017) trazem a discussão das TICs articulada ao  
mundo do trabalho e às plataformas digitais, Castells (2020, p. 87)11 caracteriza as TICs12 como  
“[...] um conjunto convergente de tecnologias em microeletrônica, computação (software e  
10 Tendência em curso de generalização das relações de trabalho que compõe diversos setores da economia, níveis  
de ocupações, qualificação e renda, que ganhou notoriedade social com a empresa Uber. O termo uberização  
refere-se às questões que não envolvem somente o nome da tal empresa. Em síntese, materializa-se uma nova  
forma de controle/subordinação, gerenciamento e organização das relações de trabalho, o que diz respeito à  
regulação do Estado na perspectiva de retirada de direitos trabalhistas, na “flexibilização” do trabalho para explorar  
de forma intensa as/os trabalhadoras/es e na banalização de transferência de custos e riscos do trabalho ao  
trabalhador. As empresas-aplicativos se autointitulam como mediadoras de serviços que detém os aparatos  
tecnológicos no sentido de burlar a legislação protetora do trabalho (gerenciamento algorítmico do trabalho),  
(re)produzindo um vasto número de trabalhadores disponíveis para a exploração e atendendo às demandas das  
plataformas (just-in-time) (Abílio, 2020).  
11 O autor preocupou-se em estudar as transformações da cultura na era da informação relacionada ao hipertexto,  
dando continuidade aos estudos que lhe antecederam, a exemplo dos estudos de Vannevar Bush, Ted Nelson,  
William Gibson.  
12 Pierre Lévy (2010), na sua obra intitulada As tecnologias da inteligência, foca a discussão no “fetichismo” das  
TICs a partir do conceito de hipertexto. Para Lévy (2010, p. 20), o hipertexto “[...] é um conjunto de nós ligados  
por conexões, [sendo que os] nós podem ser palavras, páginas, imagens, gráficos ou partes de gráficos, sequências  
sonoras, documentos complexos que podem eles mesmos ser hipertextos”.  
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hardware), telecomunicações/radiodifusão [...], a engenharia genética e seu crescente conjunto  
de desenvolvimentos e aplicações”.  
Na perspectiva de Antônio Casili (2021), para apreender criticamente as plataformas  
digitais como mecanismos que alavancam a reprodução ampliada do capital, são necessários  
alguns conceitos centrais, a saber: o valor qualificação; o valor de monetização; e o valor de  
automação. O primeiro trata do funcionamento das plataformas por meio das quais operam os  
diversos algoritmos. Na empresa Uber, por exemplo, os algoritmos trabalham na mensuração  
dos valores das viagens e serviços nas rotas mais próximas entre motoristas e passageiros; já  
nas redes sociais, o algoritmo ad rank trabalha no acesso, classificação e bloqueio das  
informações no feed (imagens, mensagens, vídeos, propagandas, etc.).  
O segundo conceito diz respeito à quantidade gigantesca de dados que os seres humanos  
produzem, dados estes que são apropriados e transformados em “valor monetário”/“fluxo  
monetário” — nos termos do autor para o capital. O terceiro conceito, por sua vez, diz  
respeito ao modo com que as plataformas expandem a “inovação” e “direção para o futuro” via  
algoritmos ao criar e performar, por meio de IA, novas ferramentas para estimular a  
concorrência entre usuários (trabalhadores) e os grandes conglomerados tecnológicos  
(detentores do capital) (Casili, 2021).  
Diante do exposto, é nesse chão árido, desigual e de disputas entre distintos projetos  
societários e tecnológicos, de plataformização, informalidade, desemprego, precarização do  
trabalho e da vida social que a classe trabalhadora vem, por meio de articulações, lutas coletivas  
e movimentos sociais, pautando melhores condições de subsistência, exigindo publicamente o  
reconhecimento e respostas do Estado frente às expressões da “questão social”. Portanto, o  
Serviço Social enquanto profissão e área de conhecimento inserida na divisão sociotécnica,  
étnico/racial, sexual e geracional do trabalho está no bojo do movimento da realidade,  
vivenciando, na contemporaneidade, as inflexões das TICs nas políticas sociais e nos direitos  
sociais em que atua conforme trataremos no ponto a seguir.  
769  
A intensificação do uso das TICs na PAS: implicações nos direitos sociais e no  
trabalho de assistentes sociais no Brasil contemporâneo  
Na particularidade da realidade brasileira, o Estado, sobre os preceitos neoliberais e de  
acumulação flexível (conforme discutiu-se na seção anterior), começou a implementar as TICs  
tardiamente a partir dos anos 1990. Assim, essas tecnologias são injetadas na burocracia dos  
serviços públicos (e também privados) através da Empresa de Processamento de Dados da  
Previdência Social (Dataprev), criada nos anos 1970. Em seguida, o mesmo ocorreu na política  
Vinícius Paulino Lopes da Silva  
de saúde via Departamento de Informática do SUS (DataSUS). Na Assistência Social, as TICs  
foram implantadas no Sistema Único de Assistência Social (Suas), vinculado à base de dados  
do Sistema do Cadastro Único (CadÚnico), do Sistema de Gestão do Programa Bolsa Família  
(SIGPBF) dentre outros, atravessando os anos 200013 (Santos, 2019).  
No contexto de crise pandêmica da covid-19, o país foi orquestrado por um  
(des)governo, entreguista, ultraconservador, ultraneoliberal, de extrema-direita, machista,  
racista e xenofóbico que negou a ciência e atrasou a compra de vacinas. A partir das frases  
como “é só uma gripezinha!” e “e daí, eu não sou coveiro!”, verbalizadas pelo ex-presidente  
Jair Messias Bolsonaro, além da frase “passar a boiada!” dita pelo ex-ministro do meio  
ambiente Ricardo Salles, sintetizou-se o passado recente de nossa formação social em que o  
poder da burguesia mescla “modernização” e “atraso”, exalando seu ódio de classe contra os  
pobres e tomando decisões “pelo alto” de forma autoritária, travando qualquer participação  
democrática e popular (Fernandes, 1975).  
Resultado da crise estrutural, o capitalismo pandêmico, nos termos de Antunes (2022),  
foi drástico: soou como uma espécie de laboratório para intensificar os processos de exploração  
contra a classe-que-vive-do-trabalho, e, por meio dele, presenciou-se a agudização das  
históricas expressões da “questão social” (o desemprego estrutural, a fome, a miséria, as  
violências, a precarização e a informalidade do trabalho etc.) e da concentração de renda, além  
das milhares de vidas politicamente ceifadas14.  
770  
Nesse contexto, a PAS, por um lado, foi reconhecida pelo Estado e pela sociedade civil  
enquanto um serviço essencial; porém, por outro lado, as condições necessárias para o seu  
qualitativo funcionamento não foram realizadas. O auxílio emergencial no valor de R$ 600,00,  
por exemplo, foi visto pelo governo como uma “benesse” de ajuda aos pobres e necessitados e  
13 Nos últimos anos, as TICs vem sendo legitimadas pelo Estado a partir de uma série de leis e decretos, a saber:  
Lei nº 12. 682, de 9 de julho de 2012, que dispõe sobre a elaboração e o arquivamento de documentos em meios  
eletromagnéticos; o Decreto nº 9.319, de 21 de março de 2018, que institui o Sistema Nacional para a  
Transformação Digital e estabelece a estrutura de governança para a implantação da Estratégia Brasileira para a  
Transformação Digital; o Decreto nº 9.756, de 11 de abril de 2019, que institui o portal único “gov.br” e dispõe  
sobre as regras de unificação dos canais digitais do Governo federal; o Decreto nº 9.854, de 25 de junho de 2019,  
que institui o Plano Nacional de Internet das Coisas e dispõe sobre a Câmara de Gestão e Acompanhamento do  
Desenvolvimento de Sistemas de Comunicação Máquina a Máquina e Internet das Coisas; a Lei Federal nº 14.129,  
de 29 de março de 2021; e mais recentemente, os aplicativos Meu INSS, SouGov, Bolsa Família, dentre outros  
sistemas digitais (Governo [...], 2024).  
14 Um dos primeiros casos de morte causado pelo vírus da covid-19 no Brasil ocorreu na cidade do Rio de Janeiro,  
em 17 de março 2020. A vítima, uma trabalhadora doméstica, idosa, negra, periférica, foi contaminada pelos  
patrões brancos que moravam na Zona Sul da cidade. Tal realidade é produto da estrutura patriarcal-racista-  
capitalista que determina as condições de trabalho (divisão social, racial e sexual), de vida e morte da população  
negra em nosso país (Cisne; Santos, 2018). Até a manhã do dia 26 de fevereiro de 2020, em todo o mundo haviam  
sido confirmados 18.570.858 caso de covid-19. Em relação ao número de mortes, até a referida data, 156.839  
haviam sido confirmadas nos Estados Unidos e 95.819 no Brasil (Johns Hopkins University, 2020).  
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Tecnologias de informação e comunicação e assistência social: inflexões no Serviço Social  
como uma medida de reforço à filantropia, por meio da qual se excluiu o antecessor Programa  
Bolsa Família (PBF).  
Numa perspectiva de totalidade histórica, o auxílio emergencial surgiu enquanto  
produto das lutas sociais, de movimentos sociais progressistas, do debate acadêmico, dos  
usuários da PAS e da correlação de forças entre os partidos políticos de oposição para fazer  
valer o projeto de renda básica no país. Essa medida foi instituída e implementada em caráter  
de urgência a partir da Lei nº 13.982/2020, de 2 de abril de 2020 (Brasil, 2020).  
A alternativa encontrada pelo Estado para o benefício foi a mediação do uso das TICs.  
Tal medida excluiu digitalmente do benefício uma parcela significativa dos usuários, tais como  
desempregados, desalentados, informais, pessoas sem acesso à renda e mães solo. Dizia o  
Artigo 5, Inciso 1º da referida lei, que “[...] a plataforma digital poderá ser utilizada para o  
acompanhamento da elegibilidade ao auxílio emergencial por todos os trabalhadores” (Brasil,  
2020, art. 5, inc. I).  
Essa concepção balizava as desigualdades e o uso das TICs era visto como uma forma  
de “superação da pobreza”. A partir disso, percebe-se o foco no mérito individual e acredita-se  
na tecnologia como responsável pelo bem-estar social e pelo avanço nacional, desarticulando  
as determinações e contradições dos projetos societários e tecnológicos em disputa.  
É importante salientar que não houve sequer prioridade do Ministério da cidadania para  
gerir as condições de vulnerabilidade social. O (des)governo deu aval exclusivo para as decisões  
autoritárias do Ministério da Economia, representado pelo ex-ministro Paulo Guedes (Chicago  
boy), seguindo o plano de cortes de gastos desde a PEC nº 95, aprovada no ano de 2016, que  
congelou por 20 anos o investimento nas políticas de seguridade social.  
771  
Na realidade, trabalhamos com a possibilidade de que o auxílio emergencial/Auxílio  
Brasil (e demais aplicativos utilizados nas políticas sociais), mediado pelo uso das TICs,  
apareceu na realidade enquanto mecanismos sofisticados de expropriações15contemporâneas de  
direitos sociais. Segundo Boschetti (2018), a partir dos escritos de Marx (2013), as  
expropriações contemporâneas são concebidas como o momento predominante em que o capital  
submete a classe trabalhadora à lei geral de acumulação, corroendo todas as condições de  
trabalho e existência humana. A autora também nos elucida questões para pensar na atualidade  
o projeto “competente” do Estado brasileiro para a inserção da Assistência Social no circuito  
15 Classicamente tratada por Marx (2013) em O capital, mais especificamente no capítulo 24 intitulado “A assim  
chamada acumulação primitiva”. Trata-se de um contexto histórico marcado pela violência, por cerceamentos, por  
saques dos bens da Igreja Católica e pela expulsão dos servos das terras feudais, transformando-os em  
trabalhadores assalariados e reféns da propriedade privada. Em síntese, nesse período, objetivou-se a separação  
entre trabalhadores e os meios de produção.  
Vinícius Paulino Lopes da Silva  
de reprodução ampliada da financeirização do capital, que impôs “goela abaixo” aos usuários  
a abertura de contas digitais via aplicativo Caixa Tem, desconsiderando as determinações  
sociais, econômicas, educacionais, sanitárias e culturais da população mais pauperizada  
(Boschetti, 2018).  
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) coletados pelo  
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no quarto trimestre de 2019 mostraram  
que, na conjuntura que a Sars-CoV-2 chegou ao Brasil, cerca de 12,6 milhões de domicílios não  
utilizavam a internet (IBGE, 2020). As motivações para o não uso eram duas: 26, 2% afirmavam  
que o acesso era caro e 25,7% disseram que nenhum morador sabia manusear o uso de internet  
e tecnologias (IBGE, 2020). Ainda segundo a PNAD, no último trimestre de 2019, somente  
40,6 % dos domicílios entrevistados tinham computador, 44,8% tinham tablet e mais de 90%  
tinham celular móvel (IBGE, 2020). A partir desses dados, as famílias que possuíam esses  
recursos tecnológicos tinham uma renda acima de R$1.000, 00 e as famílias que não tinham  
celular o rendimento foi de R$557,00 (IBGE, 2020). Ou seja, foram essas últimas famílias as  
mais pauperizadas as que sofreram os maiores impactos na pandemia, junto ao avanço  
predatório das expropriações atuais do capital.  
A Controladoria Geral da União (CGU) verificou inconsistências na análise dos  
cadastros para o requerimento do auxílio emergencial. Segundo a CGU (2022), a análise era  
realizada por robôs e comandadas por IA, que realizava o cruzamento do banco de dados do  
Governo Federal. A partir de estudos realizados pela Fundação Getúlio Vargas (FGV),  
identificou-se que 23% das classes D e E, ou seja, as mais pauperizadas da classe trabalhadora,  
não conseguiram acessar o auxílio emergencial por questões limitadas de acesso à internet  
(FGV, 2021). Além disso, 28% desses sujeitos não acessaram o aplicativo (APP), 18% não  
sabia baixar o app, 22% apresentavam dificuldades de internet e 22% não tinha celular (FGV,  
2021).  
772  
A PAS, fruto das lutas e movimentos sociais pós-Constituição Federal de 1988,  
compondo o tripé da seguridade social ao lado da política de saúde e da Previdência Social, foi  
refém da ganância dos bancos. O Estado se eximiu para os bancos atuarem na criação, gestão e  
implementação da transferência de renda, e, com isso, objetivou-se a transição da esfera da  
política pública e dever do Estado (direito) para a esfera dos serviços via acesso restrito as  
plataformas digitais, os algoritmos e o mercado “[...] ao restringir o uso do fundo público para  
as políticas sociais e sistemas de seguridade social. O que determina estas formas de  
expropriação contemporânea é a reprodução ampliada do capital em larga escala” (Boschetti,  
2018, p. 159).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 758-781, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Tecnologias de informação e comunicação e assistência social: inflexões no Serviço Social  
No ano de 2023, o rendimento dos domicílios que tinham acesso a serviços de  
streaming16 de vídeo foi de R$ 2.731,00, valor que representa quase o dobro das famílias que  
recebem R$1.245,00 em relação a tal serviço. As famílias que têm acesso aos canais fechados  
de televisão via internet tinham o rendimento médio de R$ 3.603,00 (IBGE, 2024).  
Em relação à existência de microcomputador ou tablet nos domicílios, a pesquisa da  
PNAD evidenciou que, do ano de 2016 ao ano de 2023, houve uma pequena queda. No ano de  
2015, o percentual era de 45,9%. Anos mais tarde, em 2022, o percentual foi de 40,2% e 39,0%  
no ano posterior (IBGE, 2024). Segundo a referida pesquisa, o acesso ao tablet por essas  
famílias acaba sendo de maior facilidade em relação ao microcomputador pelo fato de este ser  
um equipamento mais caro e não acompanhar o orçamento familiar (IBGE, 2024). Além disso,  
a pesquisa trata das disparidades regionais no que diz respeito aos equipamentos tecnológicos  
entre o âmbito urbano e o âmbito rural (IBGE, 2024).  
Ainda no ano de 2023, a ausência de telefone fixo manteve-se elevada nas regiões  
Nordeste (5,25%) e Norte (3,8%), enquanto que, nas demais regiões do Brasil, o percentual não  
passou de 2% (IBGE, 2024). Já o acesso a telefone móvel celular tem apresentado aumento  
desde o ano de 2016 93,1% havendo estabilidade apenas nos anos de 2022 (96,6%) e  
2023 (96,7%). Nesse mesmo período, o percentual de acesso ao celular foi significativamente  
maior: 91,2% em 2022 e 97,5% em 2023; e o telefone fixo teve como percentuais 2,8% em  
2022 e 10,5% no ano de 2023 (IBGE, 2024).  
773  
Diante da realidade apresentada, é perceptível que o acesso restrito à renda pela classe  
trabalhadora aparece no chão do cotidiano como uma das principais determinações do processo  
de reprodução de desigualdades, dada a pequena parcela de trabalhadores que tem as condições  
objetivas para o usufruto das plataformas e dos equipamentos tecnológicos cada vez mais  
socialmente produzidos. Aliado a isso, a mediação política e ideológica do Estado neoliberal  
influencia diretamente no processo de como a tecnologia, os serviços, os programas e benefícios  
sociais acoplados nessas plataformas digitais irão chegar (ou não) a viabilizar os direitos da  
população usuária das diversas políticas sociais.  
Dentre essas políticas, tem-se a PAS, que, majoritariamente, trabalha com menos  
orçamento público com a população usuária que é racializada e composta por mulheres de  
periferia que vivenciam o cotidiano da informalidade do trabalho, da fome e do analfabetismo,  
16 O streaming diz respeito à transmissão de dados (áudio, imagens, vídeos etc.) mediada pelo uso da internet sem  
necessariamente fazer o download do conteúdo. Em outras palavras, trata-se da reprodução on-line de um produto  
(filme, série, telenovela etc.) que é encaminhado em tempo real ao dispositivo que está sendo transmitido (celular,  
notebook, tablet, Ipad etc.) Netflix, Spotify, Prime Video, HBO Max, Apple TV e outras plataformas são exemplos  
dessas transmissões.  
Vinícius Paulino Lopes da Silva  
além de terem o universo tecnológico muito distante da vida social ou seja, a classe social  
historicamente expropriada de direitos, e, portanto, os mais pauperizados da sociedade. Assim,  
há, por um lado, a intencionalidade política de metabolizar sem pudores via tecnologia a  
expropriação de direitos e da vida social dos mais pobres; e, por outro, o anseio de fazer crescer  
a centralização e a concentração dos lucros das empresas detentoras dos meios tecnológicos de  
produção capitalista em nossos tempos.  
Em virtude disso, a relação TICs e expropriação contemporânea na PAS revela um  
novo/velho “[...] processo de subtração de condições históricas de reprodução da força de  
trabalho mediadas pelo Estado [...] por meio da reapropriação, pelo capital, de parte do fundo  
público” (Boschetti, 2018, p. 158). Essa reapropriação, vale ressaltar, é fruto do trabalho social  
da classe trabalhadora e passa a ser autoritariamente imposta pelo Estado brasileiro, destinado  
ao pagamento dos juros da dívida pública, em especial do capital imperialista norte-americano.  
Tais adaptações e disputas tecnológicas vem contraditoriamente afetando a totalidade  
das inúmeras profissões e dos seus processos de trabalho dentre essas, o Serviço Social, que  
atua no enfrentamento às expressões da “questão social” no chão das políticas sociais. Na PAS,  
as/os assistentes sociais historicamente “[...] são consideradas[os] agentes públicos [...] que  
concretizam atenções e cuidados para superar desproteções sociais e garantir direitos de  
cidadania” (Sposati, 2021, p. 251).  
774  
Desde o contexto pós-crise de 2008, e, em seguida, a crise pandêmica de covid-19, o  
capital financeiro reavivou, de forma intensa, a nova morfologia do trabalho no Serviço Social  
(Raichelis; Arregui, 2021), intensificando as nossas relações de trabalho e a vida social através  
do home office. O teletrabalho, inclusive, direcionou os custos do trabalho para os  
trabalhadores, a exemplo das compras de equipamentos tecnológicos, da internet wi-fi, pacotes  
de dados moveis, smartphones, fones de ouvido, webcam e ring light (luz do anel) para a  
realização de reuniões e atendimentos com os usuários via plataforma Google Meet, Zoom,  
Lives, dentre outras plataformas17. Intensificar o trabalho sempre fez parte do projeto de  
lucratividade burguês.  
A partir do conceito de intensidade, a relação capital, trabalho e TICs, o contexto de  
isolamento social impôs à categoria (e ao conjunto de trabalhadores inseridos na divisão social,  
técnica, étnico/racial, sexual, geracional e territorial do trabalho) tanto um esforço corporal  
quanto da “[...] acuidade de sua mente, a afetividade despendida ou os saberes adquiridos  
17 Destaca-se que o contexto pandêmico exacerbou as desigualdades estruturais e digitais. Nem todos os usuários  
tinha condições econômicas para acesso aos bens tecnológicos, tais como internet wi-fi, pacotes de dados moveis  
4G ou 5G, tampouco letramento digital para manusear celulares, computadores etc.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 758-781, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Tecnologias de informação e comunicação e assistência social: inflexões no Serviço Social  
através do tempo ou transmitidos pelo processo de socialização” (Dal Rosso, 2008, p. 21). No  
âmago dessas tendências, a intensificação do uso das TICs está objetiva e subjetivamente  
contido nos valores e interesses de classe baseados na reificação e na reprodução da “razão  
formal abstrata”, que, tendencialmente, recai em respostas profissionais burocráticas, limitadas  
às rotinas institucional, pragmáticas e conservadoras que reiteram a ordem burguesa, controlam  
e intensificam o ritmo, as formas de contratação, a produtividade e o tempo do trabalho de  
assistentes sociais na contemporaneidade.  
Com isso, corroeu-se por dentro os legados da Política Nacional de Assistência Social  
(PNAS), dos conselhos e conferências municipais, estaduais e federais de Assistência Social —  
espaços de ricos debates públicos e fortalecimento dos serviços , dos programas e benefícios  
sociais (cestas básicas, auxilio funeral, auxilio enxoval etc.), do CadÚnico, do Serviço de  
Proteção e Atendimento Integral à Família (Paif), do Acessuas Trabalho, do Centro de  
Referência de Assistência Social (Cras) e do Centro de Referência Especializado em  
Assistência Social (Creas), sendo esses equipamentos essenciais para a socialização de  
informações e direitos sociais.  
Por um lado, percebe-se a coalisão entre a racionalidade mecanizada dos algoritmos, da  
indústria 4.0 e das plataformas digitais na atualidade, que busca, cotidianamente, quantificar  
dados e prometer respostas prontas, acabadas e esvaziadas de mediações. O processo em  
questão tem interferido nos fundamentos da relativa autonomia (Iamamoto, 2015) e no sigilo  
profissional, atingindo o núcleo das atribuições privativas e competências e aprofundando a  
subsunção do saber ao capital e do revigoramento de práticas punitivistas, acríticas e fatalistas.  
Desta maneira:  
775  
O que é certo é que as alterações substantivas nas requisições e uso de  
tecnologias e plataformas digitais, orientadas por algoritmos, estabelecem o  
controle e gerenciamento sobre as trabalhadoras assistentes sociais, extraindo-  
lhes sobretrabalho e conduzindo suas ações a determinados resultados  
antecipadamente programados a partir de cálculo racional. Chamamos a  
atenção sobre a racionalidade do algoritmo ou “a receita”, que através do  
passo a passo, produz uma determinada resposta ao problema apresentado,  
impondo uma tomada de decisão automatizada (Guerra, 2023b, p. 12).  
Por outro lado, tem-se o direcionamento social e estratégico contido nas reservas de  
forças legatária do projeto ético-político (desde a “virada” de 1979) que se articula entre as  
dimensões teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa, cuja finalidade é a  
materialização de respostas críticas, propositivas, qualificadas e teleologicamente orientadas  
típicas da instrumentalidade profissional.  
Vinícius Paulino Lopes da Silva  
Sobre a dimensão teórico-metodológica, a palavra “fundamento” origina-se do latim  
fundamentum, cujo o significado é “princípio sobre o qual se apoia e se desenvolve uma coisa”  
(Guerra, 2023a, p. 45), podendo ser sinônimo de “base”, “pilastra” e/ou “fundação”. Em outras  
palavras, “fundamento” diz respeito à forma de ser, à explicação de algo. A partir desse  
entendimento, tal dimensão se particulariza pelos fundamentos histórico-ontológicos que  
explicam o movimento de gênese e (re)produção da sociabilidade e da profissão na captura da  
totalidade, das contradições, das macrodeterminações para além da aparência reificadora da  
realidade.  
Trata-se da fundamentação adotada pela profissão e pela profissional que lhes  
permite apreender a realidade social e nela a profissão. Nessa concepção  
também se considera os fundamentos ideo-políticos — aos quais subjazem  
determinadas concepções de homem e mundo, priorizam determinados  
valores e afirmam determinado projeto de sociedade e de profissão (Guerra,  
2023a, p. 45).  
Os fundamentos teórico-metodológicos do Serviço Social são produtos de uma extensa  
luta histórica da categoria profissional e da classe trabalhadora no seio do Movimento de  
Reconceituação Latino-americano. Este, por sua vez, ultrapassa as perspectivas caritativas,  
positivistas e fenomenológicas típicas da reprodução da ordem capitalista e se coaduna com um  
determinada apreensão/forma político-crítica de ser na sociedade e no mundo, de concepção de  
Estado, de cultura, de política social, de ideologia e de valores que reafirmam um novo projeto  
de sociedade e de profissão.  
776  
A dimensão ético-política, por sua vez, é o campo em que se manifesta politicamente o  
direcionamento social e estratégico da profissão acumulados historicamente, que advoga contra  
a neutralidade, a reprodução de conservadorismos e expressões de dominação/opressão e  
exploração de raça/etnia, classe, gênero, território e geração, que por sua vez, extrapola os  
marcos jurídicos-legais, a exemplo, do Código de Ética de 1993 e da Lei de Regulamentação  
nº 8.662/1993. Trata de finalidade profissional — o “para que fazer”?  
Essa direção tem chão nos fundamentos ontológicos que possibilitam “[...] a elevação  
aos valores humano-genéricos, mas sua necessária abstração teórica não a isola da práxis”  
(Barroco, 2001, p. 55) contra concepções e ações moralistas e moralizantes da vida social. A  
concepção de liberdade é o nosso valor ético central.  
O conceito em questão se pauta na possibilidade de escolhas concretas entre condições  
concretas de existência e não a liberdade, fadada ao direito de manutenção da propriedade  
privada burguesa. Além disso, defende a bandeira da democracia articulada ao pluralismo de  
ideias e da emancipação humana. Em sintonia com tais princípios, o conjunto composto pelo  
Conselho Federal de Serviço Social (CFESS), pelos conselhos regionais de Serviço Social  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 758-781, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Tecnologias de informação e comunicação e assistência social: inflexões no Serviço Social  
(Cress), pela Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (Abepss) e pela  
Executiva Nacional de Estudantes de Serviço Social (Enesso) representa as entidades  
representativas da categoria profissional que se posicionam e são criticamente comprometidas  
com a formação e com o exercício profissional.  
Por fim, tem-se a dimensão técnico-operativa18, que é a forma com que a profissão  
aparece no campo singular da aparência em que se disputam as políticas sociais, o Estado e a  
população usuária dos serviços sociais públicos e privados existentes por direitos. É nessa seara  
que “[...] emana a imagem social da profissão e sua autoimagem” (Guerra, 2012, p. 40).  
A partir dessa concepção, materializa-se a síntese do exercício profissional para intervir  
no emaranhado do cotidiano marcado pelo fragmento, pela parcialidade, pela tentativa de  
“neutralidade”. Entretanto, visamos “[...] o nosso trabalho como resultado de uma totalidade  
que engloba diversos elementos” (Paula, 2023, p. 85) que atravessam as múltiplas  
determinações da vida em sociedade.  
Na perspectiva de Santos, Filho e Backx (2012, p. 19):  
[...] a dimensão técnico-operativa não pode ser reduzida à questão dos  
instrumentos e técnicas. Ela mobiliza as dimensões teórico-metodológicas —  
para analisar o real e investigar novas demandas — e ético-políticas —  
permitindo avaliar prioridades, as alternativas viáveis para a realização da  
ação, bem como projetar a ação em função dos valores e finalidade e avaliar  
as consequências da ação —, além das condições objetivas do trabalho e as  
condições subjetivas dos agentes profissionais (Santos; Filho; Backx, 2012, p.  
19).  
777  
Em outras palavras, a unidade no diverso que constituem e são constitutivas das  
dimensões profissionais até então apresentadas “[...] permite a passagem de análises  
macroscópicas, genéricas e de caráter universalista às singularidades da intervenção  
profissional, em contextos, conjunturas e espaços historicamente determinados” (Guerra, 2000,  
p. 23), reconstruindo cotidianamente o nosso objeto de intervenção, isto, é, a “questão social”  
e as suas múltiplas expressões que ganham terreno no bojo das políticas sociais, típicas da  
sociabilidade burguesa.  
De acordo com o Código de Ética Profissional de 1993, mais especificamente no  
Capítulo I, Art. 5, Alínea C, devemos, na rota inversa dos interesses do capital, “[...]  
democratizar as informações e o acesso aos programas disponíveis no espaço institucional,  
como um dos mecanismos indispensáveis à participação dos/as usuários/as” (CFESS, 2011, p.  
18 No contexto de crise capitalista, “[...] há na atualidade o predomínio de outro perfil de profissional, o do ‘técnico  
treinado para intervir num campo de ação determinado com a máxima eficácia operativa’, que historicamente tem  
sido priorizado na profissão e que se encontra perfeitamente adequado ao projeto educacional do neoliberalismo e  
à sua racionalidade instrumental” (Guerra, 2002, p. 17).  
Vinícius Paulino Lopes da Silva  
29). Por isso, reforçamos que o trabalho das/os assistentes sociais, mediado pelo uso da TICs,  
deve ser apreendido enquanto uma “[...] possibilidade de constituir-se com um dos recursos que  
podem ser utilizados para o aprofundamento e a consolidação deste projeto profissional”  
(Veloso, 2011, p. 121), estimulando a articulação com movimentos sociais progressistas,  
objetivando o conjunto de valores ético-políticos estimulados desde a formação profissional e  
vislumbrando uma nova ordem societária para além das opressões e dominações de gênero,  
classe, raça/etnia e geracional, ecoadas pela generalização do capitalismo decadente.  
Considerações finais  
Com base no exposto, defendeu-se que a tecnologia expressa o alto grau de  
desenvolvimento das forças produtivas, isto é, da relação fundamental entre o trabalho,  
teleologicamente realizado entre homens e mulheres, com a natureza. No âmago da  
sociabilidade burguesa, o trabalho alienado, a ciência e a tecnologia passaram a ser dimensões  
de valorização do valor, especificamente em tempos de plataformas digitais, da uberização, da  
indústria 4.0, da IA e do domínio de algoritmos.  
Essas transformações societárias têm afetado as relações de trabalho e as políticas  
sociais onde em que as/os assistentes sociais, sobretudo na PAS. A articulação entre o  
materialismo histórico e dialético, a pesquisa bibliográfica e qualitativa e os dados secundários  
demonstraram que a apropriação das TICs pelo Estado neoliberal reforça, por um lado, a  
expropriação contemporânea de direitos sociais, e, por outro, a valorização do valor para as  
grandes empresas detentoras de tecnologias em escala global.  
778  
Na esfera do trabalho profissional, o cotidiano, marcado pela burocratização,  
focalização, precarização, sucateamento, mercadorização e virtualização dos serviços sociais  
públicos, tem colidido com o legado da instrumentalidade que baliza historicamente o projeto  
ético político profissional. Com isso, reiteramos que: 1) embora as tecnologias sob o crivo do  
capital financeiro tenham reforçado o consenso de que elas prometem performar a  
automatização das respostas profissionais e facilitar os processos de trabalho, de forma alguma  
essas tecnologias substituem a necessidade da unidade das dimensões teórico-metodológica,  
ético-política e técnico-operativa, político-pedagógica e interventiva; 2) a formação continuada  
é fundamental para que as intervenções profissionais via TICs sejam críticas, criativas e  
propositivas sob o norte da qualidade dos serviços prestados à população usuária, propiciando,  
assim, materialidade à dimensão investigativa/produção de conhecimento; e 3) tratar a relação  
entre as TICs e a unidade das dimensões profissionais é pensar na ligação entre essas  
tecnologias e os interesses da classe trabalhadora, levando em consideração a socialização de  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 758-781, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Tecnologias de informação e comunicação e assistência social: inflexões no Serviço Social  
informações e o acesso aos direitos e buscando reafirmar, no miúdo do cotidiano, os valores  
contidos historicamente no nosso PEP crítico (dimensão político-pedagógica).  
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Demandas e desafios no atendimento  
socioassistencial a jovens na Amazônia  
Marajoara  
Demands and challenges in the social assistance services  
for youth in the Marajoara Amazon  
Raquel Correia de Oliveira*  
Roselene de Souza Portela**  
Resumo: Este artigo analisa as demandas das  
juventudes e as dificuldades para sua inserção  
como sujeitos de direito nos programas,  
serviços e projetos desenvolvidos pelos Centros  
de Referência da Assistência Social de Breves,  
no Marajó/PA. A pesquisa, de natureza  
qualitativa, fundamenta-se na teoria social  
crítica, com base na tradição marxista. Para a  
produção dos dados empíricos, utilizou duas  
técnicas: a observação sistemática e oito  
entrevistas semiestruturadas com profissionais e  
jovens usuárias dos CRAS. A análise se deu por  
meio da análise de conteúdo, na modalidade  
temática. Os resultados evidenciam a urgência  
da participação juvenil no planejamento das  
ações - atualmente centralizado na gestão  
municipal - e a necessidade de um trabalho  
intersetorial que amplie o acesso às políticas  
sociais. A identificação dos CRAS como  
espaços de promoção de direitos contribui para  
pesquisas futuras, além de subsidiar o debate  
sobre a demanda pela efetivação de políticas  
públicas para a juventude.  
Abstract: This article examines the needs of  
young people and the challenges they face in  
being recognized as subjects of rights within the  
programs, services, and projects carried out by  
the Social Assistance Reference Centers  
(CRAS) in Breves, located in the Marajó region  
of Pará. The qualitative study is grounded in  
critical social theory, drawing on the Marxist  
tradition. To produce the empirical data, two  
techniques were used: systematic observation  
and eight semi-structured interviews with  
professionals and young female CRAS users.  
The analysis was conducted using thematic  
content analysis. The results highlight the  
urgent need for youth participation in planning  
activities  
-
currently centralized within  
municipal management - and the importance of  
intersectoral work to broaden access to social  
policies. Identifying the CRAS as spaces for the  
promotion of rights contributes to future  
research and supports ongoing debates on the  
need to implement effective public policies for  
youth.  
Palavras-chaves: Juventudes; Proteção social;  
Keywords: Youth; Social protection; Social  
Assistência Social.  
Assistance.  
* Universidade Federal do Pará. E-mail: raquelco@ufpa.br  
** Universidade Federal do Pará. E-mail: roseleneportela@yahoo.com.br  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.48366  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 21/04/2025  
Aprovado em: 11/12/2025  
Demandas e desafios no atendimento socioassistencial a jovens na Amazônia Marajoara  
Introdução  
O presente trabalho é parte dos resultados de uma dissertação desenvolvida no Programa  
de Pós-Graduação em Serviço Social (PPGSS) da Universidade Federal do Pará (UFPA), em  
que foi realizado um estudo com profissionais que compõem as equipes técnicas dos CRAS e  
com jovens atendidas.  
A partir da constituição da juventude como objeto de estudo, surge pela primeira vez a  
possibilidade de compreender processos que impactam de forma específica a vida dos(as)  
jovens. No entanto, como aponta Weisheimer (2009), o tema nunca se consolidou como campo  
de estudos capaz de mobilizar um grande número de pesquisadores e, por isso, não produziu  
conceitos compartilhados de forma consensual entre aqueles que se dedicaram a esse campo  
como disciplina. Para o autor, esses dois aspectos dificultaram a institucionalização da  
disciplina em larga escala. No entanto, esse cenário se alterou nas últimas décadas, fazendo  
com que a Sociologia da Juventude, como disciplina acadêmica e linha de pesquisa,  
experimentasse um grande impulso iniciado no século XXI (Weisheimer, 2009).  
Nesse sentido, debate sobre as juventudes enquanto categoria social e sua interface com  
as políticas sociais, especialmente nas áreas que lidam com demandas específicas, ganhou  
relevância não apenas no âmbito governamental, mas também na academia, passando a figurar  
como um campo de estudos consolidado (Castro, 2009). Com o aumento dos estudos nos anos  
2000, o(a) jovem como sujeito de direitos tornou-se o paradigma predominante (Castro, 2009).  
No centro deste debate estão as políticas públicas sociais para as juventudes, em que o  
acirramento da (des)proteção social entre jovens da classe trabalhadora é o mote. Para Scherer  
(2015, p. 26), as políticas sociais “[...] devido ao sociometabolismo do capital, sob sua feição  
neodesenvolvimentista, acarretam um processo contínuo de (des)proteção social que,  
dialeticamente, movimenta o fetiche das juventudes como instrumento de desenvolvimento  
social”.  
783  
Sendo assim, as reflexões levantadas neste trabalho possibilitam compreender como a  
dinâmica de reprodução do capital, que impacta a vida de todo o conjunto de trabalhadores,  
potencializa, cada vez mais, a desigualdade social entre as juventudes. Desse modo, tem-se o  
intento de apresentar reflexões a respeito de como esse quadro de (des)proteção social se  
acentuou no contexto do capitalismo contemporâneo, considerando-o como resultado de uma  
sociabilidade que compreende os jovens enquanto segmento que deve ser controlado, de modo  
a cumprir com papéis pré-determinados.  
Decidiu-se, assim, abordar a temática política social e juventudes, considerando a  
importância de adensar os debates que tratam de problemáticas relacionadas ao  
Raquel Correia de Oliveira; Roselene de Souza Portela  
recrudescimento da pobreza, violência, drogadição, desemprego estrutural, entre outros, que  
atingem o cotidiano dos(as) jovens (Scherer, 2013). Traz-se à baila a realidade marajoara, que  
também apresenta demandas relacionadas às violações de direitos, que são agravadas por  
desafios relacionados à extensão territorial e a estruturação desigual do capital nos territórios  
periféricos (Guimarães, 2021).  
Contudo, por mais que os estudos ressaltem a importância de abordar a diversidade  
(Gershenson; Scherer, 2016), ainda existe um processo de mistificação presente em uma  
dualidade no entendimento do que é ser jovem. Ao mesmo tempo em que há uma exaltação da  
juventude, há também um movimento que atribui a ela uma série de problemas que devem ser  
foco de intervenções (Scherer, 2013).  
As políticas públicas sociais têm dificuldade em promover ações que atendam às  
juventudes em suas particularidades (Costa, 2018). Desse modo, a relevância social deste  
estudo reside na possibilidade de discutir uma realidade que é invisibilizada. Por outro lado,  
oportuniza a produção de conhecimento a respeito do atendimento das juventudes pela Política  
de Assistência Social (PAS) e, a partir disso, contribui para que profissionais que atuam com  
jovens conheçam as demandas e as limitações do atendimento.  
Questiona-se: como a PAS, por meio dos programas, serviços e projetos desenvolvidos  
nos CRAS do município de Breves, efetiva ações para os(as) jovens, que atualmente se  
apresentam enquanto sujeitos de direito com necessidades e anseios próprios das juventudes?  
O objetivo é conhecer as demandas dos(as) jovens e as dificuldades presentes na sua inserção  
enquanto sujeitos de direito nos programas, serviços e projetos desenvolvidos nos CRAS de  
Breves, localizado no Arquipélago do Marajó, estado do Pará.  
784  
Quanto à estrutura do artigo, após esta introdução, apresenta-se o referencial teórico,  
que traz sínteses da literatura sobre juventudes e políticas sociais. Na sequência, apresentam-se  
as seções de método, resultados e discussão. Considerações finais e referências bibliográficas  
encerram o texto.  
Contextualização histórica sobre juventudes  
Para a compreensão das demandas dos(as) jovens e das dificuldades que surgem a partir  
de sua inserção enquanto sujeitos de direito das políticas sociais, é necessário, primeiramente,  
refletir sobre o conceito de juventudes, explicitando a complexidade presente nas construções  
que definem o que é ser jovem, bem como as divergências teóricas que surgem. Tal  
complexidade está relacionada ao fato de que não se trata de um grupo homogêneo de sujeitos,  
mas diverso em suas formas de existência.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 782-805, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Demandas e desafios no atendimento socioassistencial a jovens na Amazônia Marajoara  
Refletindo sobre a abordagem histórica do francês Phillipe Ariès (1981), Weisheimer  
(2009) afirma que, em síntese, a noção de juventude conhecida atualmente resulta de processos  
iniciados pela modernidade, que implicaram no crescimento da racionalização e da  
individualização das práticas sociais, promovendo a distinção entre a esfera privada (família) e  
a esfera pública (escola).  
É nesse contexto que a juventude, enquanto categoria construída social e historicamente,  
se diferencia dos demais grupos etários, inicialmente no âmbito das elites entre os séculos XVII  
e XVIII, expandindo-se como fenômeno social por meio da nuclearização das famílias e da  
universalização do ensino para todas as classes sociais (Weisheimer, 2009).  
Para Barbiani (2007), após a Segunda Guerra Mundial, a juventude passou a ocupar  
lugar de destaque em diversos campos, tais como: ciência, Estado, Igreja, mercado e mídia.  
Consolidou-se, então, um discurso jurídico, um discurso escolar e uma florescente indústria que  
reivindicaram a existência dos(as) jovens como sujeitos de direito e também como sujeitos de  
consumo.  
Ao refletir sobre a juventude como questão social, Aquino (2009) afirma que, na  
contemporaneidade, isso ocorre a partir de duas abordagens. A primeira se dá pela via dos  
“problemas” geralmente associados aos(às) jovens – como a delinquência, comportamentos de  
risco e drogadição, entre outros que demandam medidas de enfrentamento por parte da  
sociedade. Por outro lado, tradicionalmente, a juventude foi tematizada como uma fase  
transitória para a vida adulta, que exigia um esforço coletivo, principalmente da família e da  
escola, para “preparar o jovem” para se tornar um adulto ajustado e produtivo na sociedade  
(Aquino, 2009).  
785  
No entanto, de acordo com Scherer (2013), é necessário considerar as múltiplas  
determinações e expressões da juventude na atualidade e, para isso, é preciso pensá-la e referi-  
la no “plural”. Assim, o uso do termo “juventudes” não tem o objetivo de abranger todas as  
especificidades do segmento, mas identificar a existência de uma ampla gama de possibilidades  
(Pais, 1993 apud Esteves; Abramovay, 2008).  
No interior das diferentes instituições observa-se que há um desconhecimento das  
juventudes enquanto categoria social, identificando-se a figura do(a) adolescente, o que acaba  
contribuindo para um processo de invisibilidade social. Ao refletir sobre isso, Scherer (2013, p.  
25-26) argumenta que “[...] tem-se a necessidade de olhar para a universalidade da categoria  
juventudes e, ao mesmo tempo, olhar para as situações e demandas particulares, pois a realidade  
se mostra de modo diferente [...]”.  
Raquel Correia de Oliveira; Roselene de Souza Portela  
Para a construção de um conceito de juventude ancorado na perspectiva da diversidade,  
é preciso, em primeiro lugar, não a prender a critérios rígidos, mas considerá-la como parte de  
um processo de crescimento mais totalizante, que ganha contornos específicos no conjunto das  
experiências vivenciadas no contexto social. A juventude integra um processo amplo de  
constituição de sujeitos, no qual estão presentes especificidades que marcam, de modo distinto,  
a vida de cada um (Dayrell, 2007).  
Há uma tendência de definir juventude principalmente pela faixa etária, mas, conforme  
Esteves e Abramovay (2008), trata-se de uma construção social produzida pelas formas como  
a sociedade percebe os(as) jovens, articulando estereótipos, contextos históricos e diferentes  
condições de classe, gênero, etnia, grupo etc. Adota-se esse entendimento porque pensar as  
juventudes exige ir além do critério etário.  
Políticas sociais e juventudes  
Segundo Scherer (2015), há um contexto de (in)segurança que se apresenta de forma  
fragmentada, mas que tem como raiz comum a relação estrutural de produção e reprodução de  
valor no capitalismo contemporâneo. Para ele, a demanda por proteção social entre os(as)  
jovens é significativa, uma vez que os impactos dessa conjuntura são alarmantes.  
Para Pereira (2016), o termo “proteção social” carrega um ardil ideológico ao sugerir  
um caráter sempre positivo, o que exige superar interpretações lineares sobre o tema. Isso  
porque a proteção social está inserida em uma totalidade contraditória própria da sociabilidade  
capitalista, podendo ao mesmo tempo responder a necessidades sociais e permanecer  
estruturalmente vinculada aos interesses das classes dominantes.  
786  
Nesse sentido, observa-se que ao longo do tempo as políticas sociais, que deveriam atuar  
na garantia de direitos, acabam assumindo um caráter neodesenvolvimentista e “[...] acarretam  
um processo contínuo de (des)proteção social que, dialeticamente, movimenta o fetiche das  
juventudes como instrumento de desenvolvimento social” (Scherer, 2015, p. 26).  
Esse contexto se agrava com o aprofundamento da crise estrutural do capitalismo, em  
curso desde meados da década de 1970. Para Macário, Júnior e Silva (2016), essa crise teve  
origem em três dimensões internas do capitalismo, caracterizando uma tripla fratura: produção,  
consumo e circulação de produtos, o que evidencia limites intransponíveis ao grande capital,  
como o desemprego estrutural e a destruição dos recursos naturais.  
Foi exigida, então, a adoção de novas estratégias para recuperação das taxas de lucro,  
com destaque para a reestruturação produtiva, a mundialização da economia e o ajuste  
neoliberal, os quais impulsionaram uma nova sociabilidade e uma nova política (Yazbek, 2010).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 782-805, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Demandas e desafios no atendimento socioassistencial a jovens na Amazônia Marajoara  
Os processos de “reforma” do Estado, decorrentes dos planos de ajuste estrutural,  
principalmente na década de 1990, são representativos desse período e adotam as determinações  
da agenda neoliberal (Behring, 2003).  
De acordo com Iamamoto (2012), houve um processo de mundialização do capital que  
impulsionou a generalização das relações mercantis, com um redimensionamento das lutas  
sociais, resultando em uma conjuntura de regressão de direitos sociais e políticas públicas  
correspondentes, afetando até mesmo as condições e relações sociais.  
Para Macário, Júnior e Silva (2016), o projeto neoliberal implementado na América  
Latina articulou o capitalismo dependente latino-americano às novas exigências do capital  
imperialista em um cenário de crise estrutural. Esse projeto seguiu um conjunto de orientações  
políticas e macroeconômicas formuladas no âmbito do Consenso de Washington, com ajustes  
no campo econômico, político e ideológico, sob a justificativa de modernizar e dinamizar as  
economias locais para competir no mercado mundial.  
Em tempos de avanço do ultraneoliberalismo, as políticas sociais sofrem os impactos  
dos cortes orçamentários realizados com o objetivo de conter a crise fiscal do Estado, o que  
acaba por precarizar os serviços prestados à população mais vulnerável. Ao analisar os impactos  
dessas ações no campo social, observa-se que “[...] os resultados foram ainda mais desastrosos,  
por causa da vertiginosa concentração de renda nas frações mais ricas das classes dominantes  
locais e forâneas, aumentando a desigualdade, além de ter precipitado índices alarmantes de  
desemprego, pobreza e violência” (Macário; Júnior; Silva, 2016, p. 128).  
787  
Esse contexto de incertezas também afeta as juventudes, pois “[...] a contenção salarial,  
somada ao desemprego e à instabilidade do trabalho, acentua as alterações na composição da  
força de trabalho, com a expansão do contingente de mulheres, jovens, migrantes, minorias  
étnicas e raciais, sujeitos ao trabalho instável e invisível, legalmente clandestino” (Iamamoto,  
2012, p. 119, grifo nosso).  
A questão social assume novas roupagens, destacando-se uma enorme fratura entre o  
desenvolvimento das forças produtivas do trabalho social e as relações sociais. Nesse contexto,  
os(as) trabalhadores(as) são os principais atingidos, uma vez que “[...] além do segmento  
masculino adulto de trabalhadores urbanos e rurais, penalizam-se os velhos trabalhadores, as  
mulheres e as novas gerações de filhos da classe trabalhadora, jovens e crianças, em especial  
negros e mestiços” (Iamamoto, 2012, p. 145, grifo nosso).  
Partindo dessas reflexões, considera-se a existência de uma conjuntura de (des)proteção  
social para as juventudes brasileiras, uma vez que há um crescimento exponencial no número  
de jovens que têm seus direitos violados, e as políticas sociais que deveriam garantir proteção  
Raquel Correia de Oliveira; Roselene de Souza Portela  
e acesso às condições materiais para seu pleno desenvolvimento, acabam por reproduzir ações  
focalizadas e de pouca qualidade.  
Nossa compreensão de política social está ancorada em Pereira (2016, p. 79), que a  
define como “processo de desenvolvimento e implementação de medidas geridas pelo Estado  
e demandadas pela sociedade como direitos devidos para suprir necessidades sociais e  
promover o bem-estar dos cidadãos”.  
Percurso metodológico da pesquisa  
Este artigo apresenta um estudo exploratório, cujo objetivo geral consiste em conhecer  
as demandas dos(as) jovens e as dificuldades presentes em sua inserção enquanto sujeitos(as)  
de direito nos programas, serviços e projetos desenvolvidos nos CRAS de Breves/Marajó-PA.  
Para alcançá-lo, recorreu-se a uma estratégia de pesquisa qualitativa, cuja centralidade permite  
a apreensão mais aprofundada do objeto em estudo.  
A adoção da abordagem qualitativa permitiu considerar as trajetórias de vida e as  
experiências sociais dos sujeitos, contemplando, na análise, sua participação (Martinelli, 1999).  
Adotou-se o método dialético, que possui uma perspectiva teleológica e traz para o processo  
investigativo um equilíbrio entre as condições subjetivas e objetivas do objeto, nas quais há um  
movimento de contradição na constituição dos fenômenos sociais, interligados à totalidade  
(Prates, 2016).  
788  
A pesquisa de campo foi realizada na Secretaria Municipal de Assistência Social  
(SEMTRAS) e em três CRAS da cidade de Breves-PA, município com a maior população de  
todo o Arquipélago do Marajó e com a maior infraestrutura de equipamentos públicos da região.  
Ressalta-se que a pesquisa foi realizada durante a pandemia da COVID-19, o que demandou  
modificações na metodologia do trabalho, principalmente quanto à limitação do número de  
participantes e à redução das observações.  
A pesquisa seguiu todos os princípios éticos recomendados pelas Resoluções do  
Conselho Nacional de Saúde nº 196, de 10/10/96, e nº 251, de 07/08/97, tendo sido aprovada  
pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP). Quanto aos participantes, foram  
selecionados(as) usuários(as) e profissionais que atuam na Política de Assistência Social. No  
caso dos(as) profissionais, adotou-se como critério de inclusão que os(as) integrantes da Equipe  
de Gestão e das Equipes Técnicas estivessem atuando há pelo menos um ano nesses espaços,  
em razão da alta rotatividade de profissionais existente na SEMTRAS e nos CRAS. Já o critério  
para inclusão dos(as) jovens era que tivessem sido atendidos(as) em pelo menos um programa,  
serviço ou projeto de um dos CRAS pesquisados. A coleta de dados contou com duas técnicas  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 782-805, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Demandas e desafios no atendimento socioassistencial a jovens na Amazônia Marajoara  
distintas: observação sistemática e entrevistas semiestruturadas, aplicadas de forma simultânea  
durante os três meses de trabalho de campo.  
A observação sistemática foi realizada junto a gestores(as), assistentes sociais,  
pedagogos(as), orientadores(as) sociais e jovens. Compreende-se que “[...] observar não é um  
simples olhar, mas destacar de um conjunto aquilo que é específico, prestando atenção em suas  
características; é abstrair do contexto dimensões singulares” (Prates, 2010, p. 17). A observação  
sistemática foi utilizada na fase exploratória, durante visita a um CRAS, e, posteriormente, no  
momento das entrevistas.  
Além das observações, foram realizadas oito entrevistas semiestruturadas cinco com  
profissionais das equipes técnicas e de gestão, e três com jovens atendidas nos CRAS. Essa  
técnica “[...] parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses que  
interessam à pesquisa e que, em seguida, oferecem amplo campo de interrogativas, fruto de  
novas hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem as respostas do informante”  
(Triviños, 2011, p. 146).  
Antes da realização das entrevistas, procedeu-se à apresentação do Termo de  
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) aos(às) participantes. Na ocasião, foram  
informados(as) sobre os objetivos, riscos e benefícios da pesquisa, com ênfase na  
voluntariedade da participação e no sigilo das informações pessoais, acessíveis apenas às  
pesquisadoras. Após a leitura e o esclarecimento de eventuais dúvidas, os(as) participantes  
assinaram o TCLE, recebendo uma via do documento.  
789  
Os dados obtidos foram analisados por meio da técnica de análise de conteúdo temática,  
compreendendo três etapas: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados  
(inferência e interpretação) (Bardin, 1977). De acordo com Prates (2010), a análise de conteúdo  
se destaca como a principal técnica para a sistematização dos dados, pois consiste em um  
conjunto de estratégias que facilitam o processo de interpretação da comunicação. Segundo a  
autora, esse tipo de análise volta-se aos produtos resultantes da ação humana, que se explicitam  
por meio das ideias, e não apenas pelas palavras em si.  
O Arquipélago do Marajó  
O Arquipélago do Marajó possui um vasto território situado ao norte do Estado do Pará,  
banhado pelos rios Amazonas e Tocantins, além do Oceano Atlântico. Sua extensão é de  
aproximadamente 50.000 km², com uma população de 591.064 (quinhentos e noventa e um mil  
e sessenta e quatro) habitantes, conforme o Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de  
Geografia e Estatística (IBGE) de 2022. A mesorregião do Marajó está dividida em três  
Raquel Correia de Oliveira; Roselene de Souza Portela  
microrregiões (MRG): Arari, Furos de Breves e Portel. O arquipélago é composto por 171  
municípios: Afuá, Anajás, Bagre, Breves, Cachoeira do Arari, Chaves, Curralinho, Gurupá,  
Melgaço, Muaná, Oeiras do Pará, Ponta de Pedras, Portel, Salvaterra, Santa Cruz do Arari, São  
Sebastião da Boa Vista e Soure.  
Segundo o Plano de Desenvolvimento Territorial Sustentável do Arquipélago do Marajó  
(PDTSAM) do ano de 2007, o Marajó é uma região extremamente rica em recursos hídricos e  
biológicos, sendo a maior ilha flúvio-marítima do mundo. O documento destaca que sua  
realidade está intrinsecamente ligada ao contexto amazônico, tanto pelas características  
ambientais quanto pela história marcada por intensas transformações econômicas e sociais, que  
influenciaram a organização familiar e as estratégias de sobrevivência da população local.  
Destarte, infere-se que o Marajó também tem sua história marcada pelos ciclos de  
desenvolvimento. Nesse sentido, os ciclos de exploração da borracha e da madeira são os  
principais, pois de acordo com Tavares (2008), muitos seringais se localizavam na região do  
Marajó, sendo que até a década de 1870 os municípios de Breves, Anajás e Melgaço se  
destacavam na exploração deste produto. Já a exploração da madeira é praticada há bastante  
tempo como meio de complementar a renda das famílias ribeirinhas. Entretanto, nos anos 2000  
a exploração se intensificou e grandes madeireiras passaram a se fixar na região. Em 2004 a  
produção de madeira chegou a atingir o montante de 11,2 milhões m³, representando 46% do  
total produzido na Amazônia Legal (Veríssimo apud Brasil, 2007).  
790  
Segundo o Relatório Analítico do Marajó (2012) nos municípios marajoaras as  
condições de vida e de reprodução são estruturadas por baixos padrões de qualidade, uma vez  
que a falta de acesso às políticas públicas faz com que o potencial de desenvolvimento  
econômico existente não seja aproveitado. Isso gera dependência dos programas sociais, no  
entanto, é através deles que ainda é possível reduzir as vulnerabilidades sociais enfrentadas  
cotidianamente pelas famílias (UFPA; MDA, 2012).  
Como principais atividades econômicas o PDTSAM (2007) destaca a atividade agrícola,  
que se volta principalmente para a subsistência e tem como principal produto a mandioca; a  
pecuária bovina e bubalina; a suinocultura; a pesca; o extrativismo vegetal, com grande  
destaque para a madeira e o açaí; e o turismo, visto que a região tem nas suas praias, igarapés,  
bem como nas atividades culturais importantes atrativos. Às atividades ligadas à pecuária,  
especialmente à bubalina, estão mais presentes na porção do arquipélago em que os campos  
1 A inclusão do município de Oeiras do Pará foi feita por meio do Decreto nº 2.129, de 20 de janeiro de 2022,  
editado pelo governo estadual.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 782-805, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Demandas e desafios no atendimento socioassistencial a jovens na Amazônia Marajoara  
naturais são predominantes. Já as atividades relacionadas ao extrativismo concentram-se nas  
áreas de florestas (UFPA; MDA, 2012).  
Analisando as grandes problemáticas educacionais que o Marajó enfrenta, Rodrigues  
(2016) fala que a região possui um histórico de déficit social, onde a economia se assenta no  
setor primário e depende de repasses financeiros do governo federal. Destaca que a população  
marajoara é essencialmente jovem, que cresce exponencialmente e demanda políticas públicas  
que considerem suas particularidades, favorecendo suas potencialidades de modo a produzir  
melhoras em suas condições de vida (Rodrigues, 2016).  
A partir desta contextualização acerca do Arquipélago do Marajó, segue uma  
caracterização do município de Breves, lócus da pesquisa de campo, que se destaca por ser a  
maior cidade do Marajó, tanto em termos populacionais quanto na infraestrutura de serviços.  
Segundo dados do IBGE (2019), o município de Breves tem uma área territorial de  
9.566,572 km² e faz parte da microrregião chamada de Furos de Breves, contando, no ano de  
2022, com uma população total de 106.968 (cento e seis mil novecentos e sessenta e oito)  
habitantes. Está dividida em 4 (quatro) distritos: Antônio Lemos, Breves, Curumú e São Miguel  
dos Macacos. Assim como os demais municípios do Arquipélago do Marajó, o acesso a Breves  
se dá predominantemente por via fluvial, sendo que as viagens de navio que partem diariamente  
de portos localizados em Belém têm duração mínima de 12 horas. A demora desse  
deslocamento configura um dos principais desafios para quem precisa sair ou chegar ao  
município.  
791  
O município de Breves possui uma conformação territorial que além de comportar a  
sede do município, também é marcada pela existência de muitas localidades2 que se  
desenvolveram ao longo dos furos de rios e que concentram grande parte da população do  
município. Como a maioria das cidades amazônicas, Breves também foi construída às margens  
de um rio, que neste caso é o Parauaú.  
Um dos elementos considerados mais importantes para desvendar a realidade desse  
município é a análise do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), que, no ano  
de 2010, era de 0,5033. Com esse índice, Breves figura entre o grupo de municípios que  
apresentam desenvolvimento humano baixo (IDHM entre 0,500 e 0,599)4.  
2 Breves (2015 apud Rodrigues, 2016) afirma que no meio rural brevense existem aproximadamente 170 (cento e  
setenta) localidades.  
3 De 1991 a 2010, o IDHM do município passou de 0,284, em 1991, para 0,503, em 2010, enquanto o IDHM da  
Unidade da Federação (UF) passou de 0,493 para 0,727. No município, a dimensão cujo índice mais cresceu em  
termos absolutos foi Educação (com crescimento de 0,233), seguida por Longevidade e por Renda. (PNUD; IPEA;  
FJP, 2013).  
4
Os municípios que compõem o Marajó Ocidental são os seguintes: Afuá, Anajás, Bagre, Breves, Chaves,  
Raquel Correia de Oliveira; Roselene de Souza Portela  
Nesse cenário, as juventudes correspondem a 29,39% da população brevense (IBGE,  
2022) constituindo o maior segmento populacional, que é um dos mais afetados pelo aumento  
da insegurança, caracterizada por condições de violação de direitos que impedem a garantia de  
cidadania.  
Para Guimarães (2021), os municípios marajoaras apresentam oportunidades limitadas  
para que as juventudes acessem o nível médio e superior, onde a ausência de planos municipais  
de saneamento básico, bem como a ausência de políticas de cultura e lazer contribuem para o  
acirramento das desigualdades.  
No que tange às demandas das juventudes, a temática da inserção no mundo do trabalho  
é uma das que mais se destacam. No entanto, o direito ao trabalho passa longe de ser garantido  
no contexto da realidade brevense uma vez que há um “baixo grau de estruturação dos seus  
mercados de trabalho evidenciado pela maior incidência de trabalho desprotegido” (Silva;  
Lima, 2019, p. 49).  
Perfil das jovens e suas demandas para o atendimento nos CRAS de Breves-  
Marajó/PA  
Conhecer o perfil das jovens entrevistadas promoveu uma aproximação com a realidade  
em que vivem. As entrevistas foram realizadas com três jovens pertencentes ao grupo com  
idades entre 18 e 24 anos que foram atendidas pelos CRAS5. Nesse sentido, a seguir destaca-se  
o perfil dessas jovens:  
792  
Quadro 01: Identificação das jovens entrevistadas  
Idade  
Bairro  
Estado civil  
Número de filhos  
Com quem mora Escolaridade  
22  
Jardim  
Tropical  
Jardim  
Tropical  
Jardim  
Solteira  
1
Filho  
Ensino Médio Incompleto,  
cursando o 1º ano  
20  
21  
Casada  
Casada  
0
0
Marido  
Marido  
Ensino Médio Incompleto,  
cursando o 3º ano  
Ensino Superior Incompleto,  
cursando o 2º semestre de  
Ciências Naturais  
Tropical  
Fonte: Elaboração própria (2021).  
Sobre o estado civil, 1 se declarou solteira e as outras 2 informaram ser casadas. Além  
disso, 1 morava com o filho e as demais moravam com seus maridos em suas próprias casas.  
Curralinho, Gurupá, Melgaço, Portel e São Sebastião da Boa Vista.  
5 A Jovem 1 foi atendida no Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV), Projeto Construindo  
o Amanhã, Projeto Nascer e recebeu Benefícios Eventuais, principalmente quando necessitava de cesta básica; a  
Jovem 2 foi atendida no programa ACESSUAS Trabalho e cursos profissionalizantes; a Jovem 3 foi atendida no  
Projeto Construindo o Amanhã.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 782-805, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Demandas e desafios no atendimento socioassistencial a jovens na Amazônia Marajoara  
Com relação à escolaridade, 2 estavam cursando o Ensino Médio6 uma no 1º ano e outra no  
3º ano ambas com as atividades escolares suspensas no período em que as entrevistas foram  
realizadas, em razão da pandemia de Covid-197. Apenas 1 entrevistada estava matriculada no  
Ensino Superior, cursando Ciências Naturais.  
As jovens são moradoras do bairro Jardim Tropical, localizado na periferia do referido  
município e no momento da entrevista todas estavam estudando. Oriundas do meio rural  
marajoara, migraram com suas famílias para Breves, em busca de melhores condições de vida.  
Ao chegar à cidade, passaram a morar com suas famílias em ocupações que sofrem com a  
ausência de água potável, postos de saúde, escolas, saneamento básico e condições de  
habitacionais adequadas.  
Apresentam um perfil com destaque para o atraso escolar vivenciado pelas Jovens 1 e 2  
e a precarização do trabalho, cujos baixos salários se destacam. Esta precarização ocorre  
especialmente no âmbito do trabalho em “casas de família”, que foi apontado enquanto  
alternativa frente à impossibilidade de inserção no mercado de trabalho formal, mesmo que o  
salário fosse de, no máximo, R$300,00 (trezentos reais) por mês conforme elas informaram.  
São essas vivências que as levaram a buscar atendimento no CRAS, pois reconhecem  
nesse espaço um lugar onde podem acessar seus direitos. A Jovem 1 frequenta o CRAS desde  
os dez anos de idade, quando foi inscrita por sua mãe nos serviços:  
793  
Desde quando eu era pequena. Eu era, eu estudava desde que eu tinha, desde  
quando eu tinha 10 anos eu comecei no CRAS, aí com 16 a gente saía, né. Aí,  
participei de muitas coisas, fez muita apresentação, aí mudava. O primeiro que  
eu participei foi em frente à câmara, depois quando ainda não tinha aqui o do  
Jardim Tropical, aí nós fomos pro do Santa Cruz (Jovem 1, 2021).  
Na época da pesquisa, essa jovem então com 22 anos de idade vinha sendo atendida  
no CRAS havia 12 anos, com persistência das demandas que a levaram a procurá-lo pela  
primeira vez. Ela listou os diversos cursos que fez no âmbito do CRAS: garçonete, doces e  
salgados natalinos e informática básica.  
Após a identificação do perfil das jovens, indagou-se sobre suas percepções quanto a  
efetivação de ações para jovens, no âmbito dos programas, serviços e projetos desenvolvidos  
nos CRAS. A Jovem 1 refletiu que a cidade tem muitos jovens, pouco aprendizado e que “não  
6 Apesar das jovens não terem concluído a Educação Básica até os 18 anos, ambas não cursavam o ensino médio  
na modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA).  
7 A pandemia de covid-19 foi declarada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) no dia 11/03/2020, momento  
em que os casos da doença já haviam se espalhado por muitos países, o número de mortos já era de 4.291 (quatro  
mil duzentos e noventa e um) e a preocupação quanto a disseminação da doença era muito grande.  
Raquel Correia de Oliveira; Roselene de Souza Portela  
tem algo ligado pros jovens” (Jovem 1, 2021), destacando a ausência de uma política pública  
para as juventudes.  
Relatam que nunca tiveram dificuldade para conseguir atendimento nos CRAS.  
Entretanto, afirmam que as dificuldades surgiram quando já estavam participando das  
atividades. Sobre a estrutura disponível para atendimento, as entrevistadas avaliaram como  
inadequada, uma vez que se trata de prédios alugados, que não foram construídos para funcionar  
como CRAS e que, por isso, não contam com salas suficientes para atender a população. Outra  
questão levantada é a insuficiência de materiais para o desenvolvimento das atividades, o que  
acaba prejudicando o andamento dos serviços e projetos.  
Destacaram que nunca tinham sido atendidas por outros programas ou serviços voltados  
para as juventudes fora da PAS. Sobre as necessidades diferenciadas que se apresentam para as  
juventudes, refletiram que “[...] Precisa de mais atenção acho, pros jovens brevenses, a gente  
tem pouca oportunidade aqui… em todas as áreas, de todas as maneiras [...]” (Jovem 1, 2021).  
Nas entrevistas, trouxeram a percepção de que existem poucas iniciativas para atender  
às juventudes, pois mesmo as que são desenvolvidas pelos CRAS não conseguem dar conta das  
demandas, principalmente no que diz respeito aos cursos de preparação para o mundo do  
trabalho, que, segundo elas, não proporcionam experiências práticas.  
As jovens 2 e 3 não consideraram de imediato as necessidades específicas, mas tiveram  
outra percepção quando foram indagadas se para jovens era mais difícil conseguir trabalho, por  
exemplo. Segundo a Jovem 2 “[...] com certeza é mais difícil. Tem... eu já fui, tipo aqui na  
Padaria Kauã, eu fui levar um currículo lá [...] só que eles não queriam daquela idade, que eu  
acho que era de dezenove, dezoito anos, entendeu? [...] (Jovem 2, 2021). Observa-se que as  
jovens identificam todas as dificuldades que as juventudes têm que enfrentar. Entretanto, elas  
não haviam refletido sobre as especificidades que fazem as necessidades serem diferenciadas  
ao ponto de demandarem a implementação de uma rede de atendimento.  
794  
A Jovem 2 fez uma abordagem mais ligada às possibilidades de trabalho que os cursos  
podem trazer. Para ela, tais possibilidades, no que condiz ao trabalho, são muito remotas,  
porém, seu cadastro junto ao CRAS lhe dá prioridade para a participação nos cursos ofertados.  
Elas consideram que tiveram suas necessidades atendidas em parte, destacando o  
conhecimento que adquiriram por meio das atividades em que participaram. A Jovem 2 reitera  
que sua maior expectativa ainda não atendida era a inserção no mundo do trabalho. Segundo  
ela, tal expectativa não pôde ser contemplada devido às formações terem como objetivo a  
geração de emprego e renda por meio do empreendedorismo, que para ela não era possível  
devido a ausência de recursos financeiros para investir na abertura do próprio negócio.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 782-805, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Demandas e desafios no atendimento socioassistencial a jovens na Amazônia Marajoara  
A partir de suas experiências com os atendimentos recebidos, as entrevistadas refletiram  
sobre as limitações nas ações para os(as) jovens. A principal limitação apontada referiu-se ao  
fato de que as ações voltadas à formação para o mundo do trabalho cujo maior representante  
são os cursos de geração de renda não contemplam uma parte prática que segundo elas seria  
essencial para que tivessem mais oportunidades.  
Esse contexto faz aumentar o número de jovens que desejam mudar de cidade em busca  
de melhores oportunidades. A Jovem 1 fala “[...] Indo embora, aqui é uma cidade muito boa de  
se viver, em relação a vida, as coisas de, tipo as coisas que a gente gosta de comer. [...] mas em  
relação a tu ter teu emprego, ter teu trabalho, te sustentar, ter o teu ganho próprio é muito  
dificultoso. [...] (Jovem 1, 2021). A jovem fala que muitas vezes o trabalho existe, mas os(as)  
jovens não estão qualificados. Tal reflexão remete a uma realidade cujo acesso dos(as) jovens  
brevenses ao ensino superior ainda é limitado, quando comparado ao número de jovens que  
concluem o ensino médio todos os anos. Diante disso, postos de trabalho que exigem maior  
qualificação quase sempre são ocupados por pessoas vindas de fora.  
Análise das limitações dos serviços socioassistenciais para jovens nos CRAS  
A categoria “Limitações no atendimento das juventudes” emerge da análise das  
entrevistas com profissionais da gestão e das equipes técnicas dos CRAS, abordando questões  
relacionadas às dificuldades para a realização do trabalho com os(as) jovens dentro dos CRAS.  
No que diz respeito às limitações, seis temas se destacaram em termos de frequência, com  
recursos e infraestrutura sendo o mais mencionado, seguido pela falta de subsídios financeiros,  
ausência de acompanhamento, ausência de formação para trabalhar com jovens, falta de  
planejamento específico e ausência da secretaria de juventude.  
795  
Quadro 02 - Análise de conteúdo: limitações no atendimento das juventudes  
Categorias empíricas  
Registro das expressões classificatórias  
Recursos e  
infraestrutura  
“[...] E... essa infraestrutura também limita né, o trabalho. Aí tem a questão dos  
recursos né, a Assistência a gente sabe que ela é a prima pobre, que a gente fala,  
então já há um recurso é... menor de que das outras políticas né. Comparando,  
então é um recurso básico pra desenvolver os serviços” (Participante 5, 2020).  
“[...] Ora, se as pessoas, o público-alvo são pessoas em vulnerabilidades sociais e  
econômicas, teoricamente essas pessoas, elas não têm um recurso inicial. Então,  
por exemplo, dum público de vinte, cinco vão tentar iniciar por conta própria.  
Outras, vai ficar ali, o diploma, o certificado engavetado, porque não tiveram  
oportunidade, não tiveram o incentivo financeiro inicial” (Participante 1, 2020).  
“[...] E outra coisa, é o acompanhamento e a assistência contínua... da política  
pública, da assistência... entendeu, porque essas famílias, elas precisam ser  
inseridas em acompanhamento, pra vê de que forma ela tá conseguindo trabalhar  
com isso” (Participante 1, 2020).  
Falta de subsídios  
financeiros  
Ausência de  
acompanhamento  
dos(as) jovens  
Raquel Correia de Oliveira; Roselene de Souza Portela  
Ausência de formação  
para trabalhar com  
jovens  
“Acho que também um dos, além desses que eu te falei dos recursos, da estrutura  
é... vamo dizer assim, a falta de... até mesmo pra gente, uma formação pra gente  
trabalhar, entendeu” (Participante 4, 2020).  
Falta de planejamento  
específico  
“Não tem uma autonomia de pensar e aí tu automaticamente poderia incluir  
questões dessa juventude. [...] Então, nós temos que reinventar isso aí e aí eu penso  
que o nosso principal problema são essas limitações impostas pela gestão, que  
acaba não tendo um planejamento específico pra determinadas ações [...]”  
(Participante 3, 2020).  
Ausência da Secretaria  
da Juventude  
“Hoje, nós não temos uma Secretaria da Juventude [...]. E isso já é um grande  
problema, porque por exemplo, se tu tens uma necessidade específica, então o  
governo já tinha que ter mandado um projeto de lei pra Câmara, criando a questão  
da secretaria, estabelecendo políticas pra juventude e criando efetivamente ações  
direcionadas pra esse segmento, pra que os CRAS possam atuar de forma  
verdadeira” (Participante 3, 2020).  
Fonte Elaboração própria (2021).  
Os recursos e infraestrutura limitados foram apontados como um dos principais  
obstáculos existentes na realização do trabalho com jovens. Há um entendimento de que a  
redução de recursos para a PAS, bem como a infraestrutura cada vez mais precarizada, fazem  
com que a qualidade do atendimento caia consideravelmente, o que também leva a uma redução  
no número de serviços implementados e de usuários(as) atendidos(as). Para as juventudes, que  
ainda não tem uma política de atendimento consolidada, isso reflete na redução dos programas,  
serviços e projetos específicos.  
796  
Outra limitação relatada foi a falta de subsídios financeiros para os(as) jovens que  
concluem os cursos de geração de renda, pois, conforme relata o(a) Participante 1, eles(as) não  
têm condições financeiras de iniciar um negócio por conta própria. Assim, muitos(as) concluem  
os cursos, mas não conseguem colocar em prática a qualificação recebida. Observa-se que  
os(as) jovens fazem os cursos com a esperança de que possam ter uma ocupação, mas quando  
se deparam com a realidade de falta de subsídios, percebem que terão apenas mais um  
certificado “engavetado”, e que segundo suas próprias narrativas, nada mudará em suas vidas.  
Compreende-se que a limitação de recursos destinados a PAS contribui para que esses  
subsídios não sejam disponibilizados, pois a realidade demonstra que as ações são cada vez  
mais focalizadas e não contam com o orçamento necessário, o que torna cada vez mais difícil a  
implementação destas ações.  
Junto à falta de subsídios financeiros, está a ausência de acompanhamento dos(as)  
jovens que participam das atividades de qualificação profissional. Segundo o(a) Participante 1,  
existem muitas dificuldades para que esse acompanhamento aconteça, e isso é reflexo da falta  
de recursos adequados, que faz com que as equipes técnicas que trabalham nos CRAS sejam  
reduzidas e não consigam realizar esse acompanhamento.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 782-805, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Demandas e desafios no atendimento socioassistencial a jovens na Amazônia Marajoara  
Outra questão pontuada foi a ausência de formação para trabalhar com jovens,  
considerando que por se tratar de um público específico, existem particularidades que precisam  
ser observadas, até mesmo para que não se corra o risco de reproduzir estigmas. Quando a(o)  
Participante 4 afirma sentir falta de que a gestão promova uma formação para que os(as)  
profissionais possam trabalhar com jovens, está destacando justamente a necessidade de  
conhecer as especificidades desse público.  
A falta de planejamento específico para pensar o atendimento do segmento também é  
um fator que limita o trabalho que vem sendo realizado. Percebe-se que os(as) participantes  
reconhecem limitações na questão do planejamento que são impostas pela gestão, que acaba  
não contemplando as juventudes.  
Uma outra limitação identificada é a inexistência, na prática, de uma secretaria  
específica para a juventude no município. Embora o site da Prefeitura de Breves registre a  
Secretaria Municipal de Juventude, Esporte e Lazer (SEMEL), não há disponibilidade de  
informações básicas de contato. Considerando suas atribuições formais e os dados de campo,  
verifica-se que não ocorre trabalho em rede entre a SEMEL e a assistência social, pois os(as)  
profissionais entrevistados(as) desconhecem ações ou serviços da secretaria voltados ao  
atendimento das juventudes.  
797  
Discussão  
Os achados da análise de conteúdo convergem com a perspectiva crítica apresentada  
por Scherer (2015), cujas reflexões apontam que as políticas sociais de atendimento para as  
juventudes assumem uma feição neodesenvolvimentista que tensiona um processo de  
(des)proteção social. Neste trabalho tal assertiva foi evidenciada pela baixa efetividade no  
atendimento de demandas das jovens usuárias dos CRAS e o acesso limitado às políticas  
setoriais. Nesse sentido, a insuficiência de políticas voltadas à garantia de proteção social  
contribui para um cenário de insegurança, marcado pela ausência de políticas específicas para  
garantia de direitos das juventudes.  
Essa realidade observada dialoga diretamente com a crítica desenvolvida por  
Gershenson e Scherer (2016), para quem as políticas destinadas às juventudes operam sob uma  
“promessa civilizatória perversa". Para os autores, tal promessa está “[...] calcada em um  
constructo ideológico fetichizado que refere que, por meio do acesso ao emprego, as  
manifestações da (des)proteção serão enfrentadas [...]” (Gershenson; Scherer, 2016, p. 167).  
Assim, é como se a qualificação profissional fosse suficiente para assegurar a inserção no  
mundo do trabalho e, consequentemente, garantir segurança e proteção.  
Raquel Correia de Oliveira; Roselene de Souza Portela  
Nesse contexto, a assistência social também é atravessada por essa racionalidade,  
operando sob a lógica da promessa civilizatória que privilegia respostas focalizadas e voltadas  
à empregabilidade. É justamente essa dinâmica que se evidencia no atendimento  
socioassistencial às jovens em Breves, pois embora estejam inseridas em uma política que  
deveria assegurar “atendimento às necessidades básicas” (Brasil, 1993), o que acessam são  
ações fragmentadas, cursos precarizados e oportunidades restritas, que não correspondem às  
suas expectativas de formação profissional nem às necessidades concretas de inserção no  
mundo do trabalho.  
Embora as juventudes tenham vivenciado avanços importantes nos mecanismos de  
garantia de proteção social especialmente com a criação da Política Nacional de Juventude  
(2005) e do Estatuto da Juventude (2013) persistem situações de pobreza, violência e  
precariedade no acesso ao trabalho, revelando os limites impostos pela sociabilidade capitalista  
(Gershenson; Scherer, 2016). Para os autores, esses avanços não eliminam a lógica de  
(des)proteção presente nas políticas sociais brasileiras, marcada por ações fragmentadas,  
pontuais e precarizadas que, em vez de assegurar direitos, acabam por reforçar a lógica de  
reprodução do capital.  
Assim, um dos principais desafios para que as políticas sociais de atendimento às  
juventudes sejam efetivadas diz respeito à dificuldade para garantir uma articulação  
intersetorial entre tais políticas (Gershenson; Scherer, 2016). Quanto a isso, os achados da  
pesquisa indicam que no que se refere a PAS, não é realizado um trabalho intersetorial junto às  
demais secretarias, o que contribui para o agravamento das situações de violações de direitos  
humanos. A PAS recebe inúmeras demandas específicas, as quais não consegue atender em  
virtude não só da falta de orçamento, mas também porque as ações não são planejadas de modo  
a compreender as particularidades desse público, tampouco se fala em participação efetiva  
desses sujeitos nos espaços de tomada de decisão.  
798  
Nesse sentido, Pereira (2016) aponta que a acumulação simultânea de riqueza e pobreza,  
própria do capitalismo, obriga o capital a criar estratégias para enfrentar suas crises, seja pela  
legitimação, por meio de medidas socialmente protetivas, seja pela reprodução, convertendo  
tudo em mercadoria. Inserido nessa totalidade contraditória, o campo do bem-estar atende a  
interesses diferenciados, ainda que estruturalmente vinculado às classes dominantes. Assim, a  
proteção social deve ser entendida não como sinônimo dos serviços socioassistenciais da  
proteção básica, mas como um conjunto mais amplo de políticas sociais inscritas nesse contexto  
contraditório.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 782-805, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Demandas e desafios no atendimento socioassistencial a jovens na Amazônia Marajoara  
Essa contradição apontada por Pereira (2016) abre a possibilidade para que os(as)  
profissionais que atuam nas políticas de proteção social em suas múltiplas áreas (educação,  
saúde, assistência, trabalho) sejam críticos e propositivos, pois as disputas internas tensionam  
se as ações empreendidas irão caminhar para o atendimento das necessidades sociais dos  
sujeitos ou se serão pautadas pela lógica da meritocracia com o implemento de ações  
focalizadas.  
Corroborando essa concepção ampliada e contraditória de proteção social, os achados  
da pesquisa indicam que no interior dessa proteção social, a assistência social materializada  
nos CRAS desempenha um papel estratégico, pois pode ser trabalhada de modo a contribuir  
para o fortalecimento das lutas sociais, uma vez que muitos jovens acessam seus direitos por  
meio deles. Tem-se nos espaços pesquisados uma série de contradições, onde há o entendimento  
de que as lutas e os direitos conquistados pelas juventudes são legítimos, mas ao mesmo tempo  
observa-se a implementação de políticas focalizadas e voltadas quase que em sua totalidade  
para o incentivo ao empreendedorismo, que é alardeado como a principal saída para compensar  
a ausência de uma política de trabalho.  
Os serviços e os projetos do CRAS são percebidos pelas jovens entrevistadas enquanto  
oportunidade de terem acesso a conhecimento, tanto no que se refere à formação cidadã, quanto  
à uma formação voltada para o mundo do trabalho. No entanto, Scherer (2015) destaca que no  
âmbito da PAS enquanto uma das dimensões específicas da proteção social, predominam  
programas e ações voltadas à transferência de renda e à qualificação profissional, por meio de  
cursos voltados para a geração de emprego e renda, conforme os achados desta pesquisa  
também indicam.  
799  
Compreende-se que há necessidade de maiores avanços no que diz respeito ao trabalho  
em rede dentro dos CRAS, articulados à uma política de trabalho implementada em âmbito  
municipal para garantir o direito dos(as) jovens ao trabalho. Estes avanços também perpassam  
pela criação de uma política de atendimento para as juventudes, bem como pelo fortalecimento  
de grupos que trabalham em defesa dos direitos e da participação dos(as) jovens nos diferentes  
espaços.  
No entanto, as ações específicas para as juventudes não contam com o investimento  
necessário, o que torna a experiência limitada, principalmente no que diz respeito à oferta de  
cursos alinhadas às suas expectativas, qual seja uma formação crítica que esteja voltada para o  
mundo do trabalho, e não apenas à geração de renda por meio da venda de doces e salgados,  
crochê etc.  
Raquel Correia de Oliveira; Roselene de Souza Portela  
Segundo Costa (2018), apesar de constatar-se que a PAS incorpora várias políticas  
públicas que impulsionam os direitos das juventudes, tais ações demonstram uma aparente  
limitação no que diz respeito à intersetorialidade. Tal afirmação se sustenta no fato de que  
grande parte da demanda da secretaria analisada por ela, concentra-se no gerenciamento dos  
serviços socioassistenciais previstos na Política Nacional de Assistência Social (PNAS) e nas  
suas palavras, ainda existe um distanciamento e pequena participação de outras secretarias  
existentes no município na elaboração e execução das atividades para jovens (Costa, 2018).  
Corroborando tal afirmação, observa-se que de fato ocorre uma secundarização das  
ações para as juventudes. Na realidade marajoara, a secundarização, citada por Costa (2018),  
também está presente quando se verifica que em grande parte dos municípios não há uma  
secretaria de juventude para planejar e implementar ações, conforme também se verificou no  
caso do município de Breves.  
Outro ponto diz respeito a falta de reconhecimento das juventudes, que faz com que o  
segmento não tenha suas demandas contempladas dentro dos serviços socioassistenciais. As  
particularidades de raça, gênero, classe e território são pouco trabalhadas, em um contexto que  
não oportuniza aos(às) jovens condições de acessar os bens de consumo coletivos  
indispensáveis ao seu desenvolvimento humano (Gershenson; Scherer, 2016).  
A ampliação de iniciativas que possam contemplar os grupos identificados como  
“jovem-jovem” e “jovem-adulto” ainda é um desafio, na medida em que há uma reduzida oferta  
de programas e projetos para os(as) jovens de 18 a 29 anos, somado ao fato de que o segmento  
de 15 a 17 anos conta com projetos socioassistenciais que são ofertados no âmbito da PAS, mas  
que são planejados para crianças e adolescentes (Costa, 2018).  
800  
Nesse sentido, a análise do Plano Municipal de Assistência Social 2018-2021 revelou  
apenas uma ação específica voltada às juventudes no eixo da Proteção Social Básica: o  
fortalecimento de iniciativas destinadas a jovens em situação de vulnerabilidade, com foco na  
permanência escolar e na inserção no mercado de trabalho (Breves, 2018). O fato de essa ser a  
única ação direcionada ao segmento evidencia a prioridade dada pela gestão ao entendimento  
de que a educação deve ser reforçada como meio para viabilizar o ingresso dos(as) jovens no  
trabalho. Nesse sentido, o plano estabelece como meta a articulação em rede, prevista por meio  
de parcerias e cooperação intersetorial.  
Segundo Baptista (2008), as abordagens presentes nas políticas sociais destinadas às  
juventudes revelam a própria disputa de interesses no interior do Estado. Historicamente, essas  
políticas reproduzem uma hierarquia de classe ao definir projetos educativos e profissionais  
distintos, nos quais jovens ricos têm acesso a uma formação de qualidade, enquanto os jovens  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 782-805, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Demandas e desafios no atendimento socioassistencial a jovens na Amazônia Marajoara  
pobres recebem uma formação técnica e aligeirada voltada às demandas do mercado. Nesse  
sentido, torna-se necessário refletir sobre como se estruturam as ações voltadas à inserção  
dos(as) jovens das camadas populares no mundo do trabalho, considerando que tais iniciativas  
esbarram nos limites do próprio modo de produção e, portanto, não podem ser tomadas como  
único critério para assegurar esse direito.  
Nesse ínterim, as ações direcionadas para as juventudes voltam-se para a qualificação  
profissional voltada para uma possível inserção em um mercado de trabalho que a cada dia está  
mais restrito. Nessa conjuntura, mais do que nunca é necessário o desenvolvimento de ações  
específicas para as juventudes, levando em consideração suas particularidades em todos os  
níveis de complexidade (Scherer, 2015).  
No caso do município de Breves, para que a ação proposta no Plano Municipal de  
Assistência Social 20182021 pudesse ser desenvolvida, identificamos duas outras ações que  
estão a ela relacionadas, ambas inseridas na área da Gestão. São elas: “Desvinculação da  
política de Trabalho da SEMTRAS e criação da Secretaria Municipal do Trabalho e Renda”  
(Breves, 2018, p. 44) e “Firmar parcerias com instituições provedoras de oportunidades de  
acesso à qualificação profissional” (Breves, 2018, p. 45).  
Para propor a desvinculação, o plano prevê como atividade principal a tramitação e  
aprovação de uma lei municipal que ordene a PAS e a Política de Trabalho no município.  
Assim, a meta era de que a implementação da política de trabalho no município fosse feita no  
período de 2019 a 2020. Entretanto, verificou-se que a política de trabalho continua a ser  
desenvolvida em conjunto com a assistência social, por meio de uma mesma secretaria.  
Esta vinculação da Política de Trabalho à PAS é uma realidade que está presente até  
mesmo a nível estadual, conforme já observado por Carneiro, Vieira e Araújo (2019), na análise  
da realidade institucional da gestão da PAS no norte e nordeste. Nos três estados pesquisados a  
PAS é associada a outras políticas setoriais. No caso do estado do Pará, o órgão era denominado  
Secretaria de Estado de Assistência Social, Trabalho, Emprego e Renda, ou seja, agrega as  
políticas de Trabalho e Assistência Social (Carneiro; Vieira; Araújo, 2019).  
801  
As autoras analisam que o fato de as políticas sociais, no caso em questão as políticas  
de trabalho e assistência social, estarem em um único lócus de execução de políticas públicas,  
pode facilitar a integração e a complementaridade das ações entre elas. Entretanto, destacam  
que, conforme explica Boschetti (2016), identifica-se uma tensão inerente entre trabalho e  
assistência social. Essa tensão também está presente no planejamento da SEMTRAS, onde  
existe a percepção de que há a necessidade de criação de uma secretaria de trabalho e renda.  
Raquel Correia de Oliveira; Roselene de Souza Portela  
Outra questão relevante refere-se a formação de parcerias institucionais para a  
implementação de ações para o atendimento das juventudes. Nesse sentido, os achados  
corroboram as reflexões de Cristo (2017), que destaca a existência de uma ênfase na formação  
de parcerias institucionais, que eram vistas enquanto uma oportunidade de fortalecimento de  
projetos e serviços. Entretanto, a autora ressalta que as parcerias institucionais não podem ser  
compreendidas como sinônimo de trabalho intersetorial, uma vez que vai muito além disso,  
pois se relaciona ao fazer juntos as ações que possuem um objetivo em comum, podendo até  
mesmo ser previsto formalmente (Cristo, 2017).  
Assim, compreende-se que firmar parcerias institucionais é importante para o  
desenvolvimento do trabalho nos CRAS pesquisados. Entretanto, o trabalho intersetorial não  
se resume a isso, pois o público com que a PAS trabalha é constituído por sujeitos que sofrem  
os impactos de diversas expressões da questão social. Portanto, necessitam que as políticas  
sociais trabalhem de forma articulada, com o fim de garantir o seu acesso aos serviços de modo  
permanente.  
No que diz respeito à formação de parcerias com as instituições, destaca-se como  
atividade a ser desenvolvida, a criação de convênios de cooperação técnica com instituições  
federais e estaduais de ensino, como o Instituto Federal do Pará, a Universidade Federal do Pará  
e a Escola Tecnológica, com o fim de promover a realização de cursos voltados para a formação  
profissional de famílias que vivem em situação de vulnerabilidade.  
802  
Importa observar que o fortalecimento das ações para as juventudes mais do que nunca  
esbarra em desafios relacionados à lógica do sistema capitalista, que não busca garantir direitos  
para todos(as). Scherer (2015) afirma que nessa conjuntura o trabalho intersetorial é  
imprescindível e não deve ter como foco o “desenvolvimento econômico”, tampouco a  
“formação de capital social”, mas estar ancorado na perspectiva do desenvolvimento integral,  
de modo a trazer possibilidades para a efetivação do acesso das juventudes aos serviços de que  
necessitam.  
Considerações finais  
O presente trabalho teve como objetivo conhecer as demandas dos(as) jovens e as  
dificuldades que se apresentam na sua inserção enquanto sujeitos de direito dos programas,  
serviços e projetos desenvolvidos nos CRAS do município de Breves/Marajó-PA. Os achados  
da pesquisa revelaram que as ações socioassistenciais para o atendimento das juventudes se dão  
de modo limitado e restrito, pois a realização de um trabalho intersetorial ainda é um desafio.  
Além disso, a análise indica que o atendimento ofertado não parte do reconhecimento das  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 782-805, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Demandas e desafios no atendimento socioassistencial a jovens na Amazônia Marajoara  
especificidades dos(as) jovens, cujas demandas mais desafiadoras estão relacionadas com a  
formação profissional e o ingresso no mundo do trabalho.  
As narrativas de jovens e profissionais indicam que, mesmo em uma conjuntura  
regressiva que fragiliza a garantia de direitos humanos, houve avanços no reconhecimento das  
juventudes como sujeitos de direito no âmbito da PAS. No entanto, no contexto marajoara, as  
dificuldades para implementar serviços que contemplem a integralidade dos territórios são  
ainda mais intensas. Esse quadro se agrava diante do sucateamento das estruturas dos CRAS,  
da interrupção de projetos e do risco de fechamento de equipamentos sociais por falta de  
recursos.  
As demandas que permanecem sem atendimento e as limitações do atendimento  
socioassistencial tensionam um processo de insegurança. O contexto de regressão das garantias  
de direitos evidencia contradições inerentes à implementação das políticas sociais: embora haja  
avanços no reconhecimento dos(as) jovens como sujeitos de direito, a invisibilidade social  
continua se reproduzindo dentro dos próprios equipamentos públicos. Esse processo é reforçado  
pelo desconhecimento das particularidades socioculturais da região e pelas restrições de acesso  
aos programas, serviços e projetos, o que contribui para o acirramento das desigualdades sociais  
no Marajó.  
No que se refere às contribuições deste estudo, espera-se oferecer subsídios para o  
atendimento no âmbito da PAS, especialmente no que diz respeito ao fortalecimento do  
protagonismo juvenil nos programas, serviços e projetos dos CRAS, considerando a  
importância de que estes possam dialogar e interferir de forma contínua no planejamento.  
Quanto às limitações da pesquisa, decorrem, em parte, da pandemia de Covid-19, que  
reduziu o alcance do trabalho de campo ao interromper os serviços dos CRAS e dificultar o  
contato com os(as) jovens. Soma-se a isso o fato de somente mulheres jovens terem participado  
do estudo, o que, embora não fosse o foco da análise, evidencia como o marcador de gênero  
incide nas trajetórias dessas jovens, influenciando aspectos como o acesso aos cursos ofertados  
e a continuidade dos estudos. Essa constatação demonstra a existência de demandas para que  
pesquisas futuras trabalhem questões relacionadas ao gênero.  
803  
A realização de investigações que tenham a finalidade de elucidar questões pertinentes  
às demandas de proteção das juventudes que vivem na Amazônia apresenta grande relevância,  
uma vez que evidenciam o quanto ainda é necessário caminhar para a garantia do acesso à  
oportunidades para o desenvolvimento integral. Nesse sentido, destaca-se a importância da PAS  
na viabilização de ações socioassistenciais que tenham centralidade nas juventudes, efetivando  
o seu reconhecimento como sujeitos de direito.  
Raquel Correia de Oliveira; Roselene de Souza Portela  
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A atuação do assistente social na saúde frente à  
disputa de hegemonias: uma análise gramsciana  
The practice of the social worker in health care amidst the dispute for  
hegemony: a gramscian analysis  
Joseane Barbosa de Lima*  
Resumo:  
O
artigo analisa  
o
exercício  
Abstract: This article analyzes the professional  
practice of social workers in public health in  
light of Gramsci’s thought and the foundations  
of the Ethical-Political Project of Social Work.  
Through the critical appropriation of categories  
such as hegemony, counter-hegemony, and  
organic intellectuals, Social Work is discussed  
as a counter-hegemonic praxis committed to the  
interests of the working class. The analysis is  
situated within societal disputes over the  
Brazilian Unified Health System (SUS),  
marked by neoliberal and neoconservative  
offensives, and emphasizes the ethical-political  
dimension of professional practice as a  
mediation between structure and subjects. It  
concludes that critical intervention in the health  
field enhances the construction of a new  
hegemony, by articulating everyday resistance,  
social participation, and the unwavering  
defense of rights.  
profissional do assistente social na saúde  
pública à luz do pensamento de Gramsci e dos  
fundamentos do Projeto Ético-Político do  
Serviço Social. Apartir da apropriação crítica de  
categorias como hegemonia, contra-hegemonia  
e intelectual orgânico, discute-se a atuação do  
Serviço Social como prática contra-  
hegemônica, comprometida com os interesses  
da classe trabalhadora. A análise situa-se no  
contexto das disputas societárias em torno do  
SUS, marcado por ofensivas neoliberais e  
neoconservadoras, e enfatiza a dimensão ético-  
política do trabalho profissional como mediação  
entre estrutura e sujeitos. Conclui-se que a  
intervenção crítica no campo da saúde  
potencializa a construção de uma nova  
hegemonia, articulando resistência cotidiana,  
participação social e defesa intransigente dos  
direitos.  
Palavras-chaves: Hegemonia; Projeto Ético-  
Keywords  
Hegemony;  
Ethical-Political  
Político; Serviço Social; Saúde.  
Project; Social Work; Health.  
Introdução  
Este artigo tem como objetivo analisar o exercício profissional do assistente social no  
campo da saúde pública, à luz do pensamento de Antônio Gramsci e dos fundamentos do  
Projeto Ético-Político do Serviço Social. Parte-se da concepção gramsciana de hegemonia  
como direção política, moral e cultural das classes dominantes, construída no âmbito da  
* Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: joseane.lima@ufjf.br  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.49631  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 29/07/2025  
Aprovado em: 02/12/2025  
A atuação do assistente social na saúde frente à disputa de hegemonias: uma análise gramsciana  
sociedade civil por meio do consenso e da articulação de alianças. Em contrapartida, sustenta-  
se que as classes subalternas são capazes de elaborar um projeto societário alternativo,  
fundamentado em práticas contra-hegemônicas enraizadas nas condições concretas da vida  
social.  
Trata-se de uma pesquisa qualitativa, de natureza teórico-reflexiva, fundamentada em  
revisão bibliográfica. Foram mobilizados autores clássicos e contemporâneos do Serviço Social  
e da tradição marxista, com ênfase no referencial gramsciano, com o objetivo de contribuir para  
o debate crítico sobre os desafios e potencialidades do trabalho profissional na saúde como  
mediação estratégica na luta por uma sociabilidade emancipada.  
A apropriação crítica da obra de Gramsci especialmente das categorias de  
hegemonia, intelectual orgânico e filosofia da práxis foi determinante para o processo de  
renovação do Serviço Social brasileiro a partir da década de 1980. Nesse contexto, a profissão  
redefine sua direção social, assumindo um compromisso ético-político com a emancipação  
humana e com a construção de uma ordem social pautada na justiça, na equidade e na  
universalização dos direitos. Ao articular teoria e prática, ética e política, o projeto profissional  
adquire um caráter pedagógico, com potencial transformador, afirmando-se como crítica à  
ordem vigente e como força promotora de novas formas de organização e consciência coletiva.  
Com base nesse referencial teórico-crítico, o artigo analisa os fundamentos ético-  
políticos que sustentam o projeto profissional do Serviço Social e examina a atuação do  
assistente social na saúde como espaço permeado por contradições, disputas de projetos  
societários, resistência e afirmação de práticas contra-hegemônicas. Essa análise se insere no  
contexto das ofensivas neoliberais e ultraconservadoras que vêm incidindo sobre o Sistema  
Único de Saúde (SUS) e os direitos sociais, tensionando o trabalho profissional e os princípios  
que o orientam.  
807  
Diante do avanço do conservadorismo, da intensificação das desigualdades e do  
recrudescimento dos ataques aos direitos sociais e às liberdades democráticas, reafirma-se a  
centralidade do Projeto Ético-Político do Serviço Social como instrumento de resistência e  
defesa intransigente da democracia, dos direitos historicamente conquistados. Ao fazê-lo, o  
artigo busca fortalecer o posicionamento crítico dos/das assistentes sociais frente às disputas  
ideológicas contemporâneas, reafirmando o compromisso da profissão com as lutas da classe  
trabalhadora pela transformação social.  
Joseane Barbosa de Lima  
Hegemonia e contra-hegemonia1 em Gramsci: a disputa de projetos societários  
A hegemonia, no pensamento de Antônio Gramsci, constitui um conceito-chave para a  
compreensão das formas de dominação e das possibilidades de transformação na sociedade  
capitalista. Diferentemente de uma concepção reducionista baseada apenas na coerção estatal,  
Gramsci entende hegemonia como a capacidade de uma classe dirigir as demais por meio do  
consenso ativo, construído na sociedade civil, mediante a difusão de uma concepção de mundo  
que se torna dominante (Gramsci, 2002).  
Trata-se de uma forma de direção político-ideológica que articula coerção e  
convencimento, sendo exercida não apenas no campo institucional, mas, sobretudo na cultura,  
na moral, na linguagem e nas práticas cotidianas (Neves, 2017). Assim, a hegemonia não é  
sinônimo de dominação, mas um processo de liderança ética e intelectual, sustentado na  
construção de consenso e na interiorização de valores que legitimam a ordem vigente.  
Segundo Dias (2005), é no terreno da totalidade social — compreendida como o  
conjunto articulado de práticas, representações, relações sociais e estruturas de poder — que se  
travam os embates entre distintos projetos hegemônicos. A teoria política gramsciana, portanto,  
recusa a separação entre economia, cultura e política, entendendo-as como dimensões  
interligadas da realidade. Como enfatiza o autor, “a teoria política seria um discurso vazio se  
examinada como exterioridade em relação à totalidade social ou como mero epifenômeno do  
‘econômico’” (Dias, 2005, p. 21). Assim, faz-se necessário articular o real a partir da reflexão  
sobre as práticas e os discursos dos dominados, bem como das ideologias dominantes, visando  
à superação destas e à construção do campo hegemônico das primeiras.  
808  
A luta por hegemonia envolve, portanto, a construção de um projeto societário  
alternativo, fundado nas experiências históricas das classes subalternas e na elaboração de uma  
concepção de mundo própria. Para Gramsci (2002), esse processo se inicia antes mesmo da  
tomada do poder estatal, por meio da atuação nos espaços da sociedade civil, da persuasão  
contínua e da disputa cultural. A hegemonia é, nesse sentido, um processo pedagógico de  
construção de consciência coletiva, que visa formar sujeitos históricos capazes de romper com  
a ordem vigente.  
Nessa direção, a conquista da hegemonia, segundo Gramsci (2002), exige uma reforma  
intelectual e moral, ou seja, uma transformação profunda nas formas de pensar e agir que  
1 Embora amplamente empregado na tradição marxista contemporânea, o termo “contra-hegemonia” não aparece  
de forma literal no vocabulário político-conceitual formulado por Antonio Gramsci. Seu uso, contudo, não se  
distancia dos fundamentos teórico-políticos gramscianos que subsidiam a compreensão das disputas de hegemonia  
e dos processos de direção moral, política e intelectual na sociedade.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 806-826, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A atuação do assistente social na saúde frente à disputa de hegemonias: uma análise gramsciana  
permita superar interesses corporativos e particulares, rumo à constituição de um projeto  
universalizante, característico de uma classe que se pretende dirigente no sentido histórico. Essa  
reforma não se limita a mudanças individuais ou culturais isoladas, mas envolve a conformação  
de um novo sujeito histórico, alinhado a um projeto coletivo de transformação da ordem social  
vigente.  
No âmbito desta análise, destaca-se a centralidade da filosofia da práxis. Como aponta  
Souza (2018), ao revisitar a obra de Gramsci (1975), essa filosofia representa uma concepção  
de mundo que orienta o processo de reforma intelectual e moral, articulando teoria e prática  
como dimensões indissociáveis da luta social. Parte do reconhecimento de que toda concepção  
de mundo emerge de condições históricas concretas e somente adquire força transformadora  
quando é capaz de responder aos desafios de sua época, convertendo-se em prática viva,  
incorporada ao cotidiano das massas.  
Para Gramsci, uma concepção só se revela verdadeiramente transformadora quando se  
enraíza na experiência coletiva, influenciando valores, atitudes e ações. Isso significa que a  
reforma intelectual e moral deve expressar-se em mudanças efetivas na cultura e na organização  
das classes subalternas, possibilitando a construção de uma nova hegemonia a partir de baixo  
(Souza, 2018).  
Dessa forma, a proposta gramsciana de reforma intelectual e moral articula  
transformação cultural, política e ideológica, reconhecendo o papel estratégico da formação da  
consciência crítica e da organização coletiva das classes subalternas na disputa pela direção  
moral e política da sociedade.  
809  
Com base nessa compreensão de hegemonia como construção ativa de um novo  
consenso social, Gramsci aprofunda sua crítica à ordem burguesa, especialmente ao refletir  
sobre a estrutura do poder na sociedade capitalista. A partir disso, desenvolve uma leitura  
inovadora do Estado, que ultrapassa sua dimensão institucional e coercitiva, considerando-o  
como um terreno ampliado de disputas sociais e ideológicas  
Para além da crítica ao liberalismo como ideologia legitimadora da burguesia, Gramsci  
compreende o Estado como uma totalidade ampliada, que abrange tanto a sociedade política —  
vinculada aos mecanismos de coerção — quanto a sociedade civil — relacionada à produção  
do consenso. Nessa formulação, o Estado é um espaço de disputas e contradições, onde  
diferentes projetos societários se enfrentam (Dias, 2005).  
Nesse contexto, a hegemonia opera em duas frentes fundamentais: de um lado, como  
crítica teórico-prática às formas de dominação; de outro, como condição de possibilidade para  
a transformação social (Dias, 2005). Tal formulação permite compreender a hegemonia não  
Joseane Barbosa de Lima  
apenas como uma forma de legitimação da ordem vigente, mas também como um campo de  
disputa no qual se constroem alternativas históricas.  
A teoria liberal, segundo análise de Dias (2005), cumpre um papel essencial na  
manutenção da ordem capitalista ao apresentar a cidadania como um campo homogêneo e  
consensual. Com isso, oculta os antagonismos de classe e inviabiliza a formulação de uma visão  
de mundo autônoma por parte das classes subalternas, contribuindo para a fragmentação das  
lutas sociais e a individualização das contradições.  
A superação dessa lógica exige a constituição de um novo bloco histórico, sustentado  
por intelectuais orgânicos sujeitos coletivos que emergem das próprias classes trabalhadoras  
e expressam seus interesses históricos. A ausência desses intelectuais compromete a autonomia  
política das classes subalternas, favorecendo sua adesão passiva à lógica hegemônica (Dias,  
2005).  
Portanto, é necessário que essas classes rompam com os discursos e práticas  
dominantes, apresentando-se como forças revolucionárias capazes de construir sua identidade  
e de se colocarem, nas palavras de Dias (2005, p. 30), “como sujeito fundador da possibilidade  
de um novo bloco histórico”. Essa ruptura está diretamente ligada à constituição de seus  
próprios intelectuais que, tendo por norte a filosofia da práxis, sejam capazes de enfrentar a  
hegemonia dominante.  
810  
Os intelectuais exercem funções organizativas e articuladoras essenciais na constituição  
e na manutenção da hegemonia do grupo social ao qual estão organicamente vinculados. De  
acordo com Gramsci (1975 apud Souza, 2018), esses sujeitos atuam como “funcionários” do  
grupo dirigente, sendo responsáveis por funções subalternas tanto no âmbito da hegemonia  
social quanto no exercício do governo político.  
Essa atuação se desdobra em dois eixos centrais. O primeiro diz respeito à produção de  
um consenso aparentemente “espontâneo” por parte das amplas massas populares em relação à  
direção política e moral exercida pelo grupo hegemônico. Tal consenso é historicamente  
construído com base no prestígio e na confiança atribuídos a esse grupo, em função de sua  
posição estratégica no processo de produção e de sua capacidade dirigente.  
O segundo eixo refere-se à mediação exercida pelo aparato estatal de coerção, cuja  
função é garantir a disciplina dos setores que não aderem ao consenso, seja de forma ativa ou  
passiva. Essa coerção é operacionalizada juridicamente por meio da legalidade, estruturando-  
se de modo a atuar preventivamente em toda a sociedade especialmente em contextos de  
crise de direção, quando o consenso espontâneo tende a se enfraquecer (Gramsci, 1975 apud  
Souza, 2018).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 806-826, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A atuação do assistente social na saúde frente à disputa de hegemonias: uma análise gramsciana  
Dias (2005) analisa que um dos principais elementos de subordinação das classes  
subalternas reside na dificuldade de elaborarem sua identidade própria, já que:  
O seu saber/pensamento é construído errática e fragmentariamente a partir de  
sua inserção subordinada na estrutura social. As classes subalternas têm que,  
em um processo permanente de luta contra essa dominação/saber, dar  
respostas concretas. É, normalmente, no interior, no próprio cerne destas  
práticas, e discursos (...) que as respostas das classes subalternas se  
configuram como não-saberes” (Dias, 2005, p. 31).  
Romper com a ideologia dominante significa, nesse contexto, superar as condições  
materiais e simbólicas que sustentam a opressão de classe. No pensamento de Gramsci, essa  
superação exige uma crítica contundente à separação entre sociedade civil e sociedade política,  
uma vez que tais esferas são compreendidas como dimensões interdependentes da totalidade  
social. Como observa Dias (2005, p. 32), “pensar a sociedade civil separada da sociedade  
política significa desconhecer as condições reais das lutas de classes”.  
Gramsci (2002) argumenta que, enquanto a sociedade política se manifesta por meio  
dos aparatos coercitivos do Estado, a sociedade civil representa o terreno do consenso,  
englobando instituições privadas, práticas culturais e mecanismos de reprodução da hegemonia.  
É nesse espaço que se desenvolve a chamada "guerra de posição", característica das sociedades  
capitalistas avançadas, em contraste com a "guerra de movimento", típica de contextos de  
revolução. Nessa perspectiva, a transformação social não se dá por meio de rupturas abruptas,  
mas por meio de uma disputa prolongada e estratégica nos campos da educação, cultura, religião  
e comunicação, exigindo das classes subalternas uma atuação planejada e persistente (Neves,  
2017).  
811  
Por outro lado, a perspectiva liberal tende a estabelecer uma dicotomia artificial entre  
essas duas esferas. Nessa concepção, a sociedade política é reduzida ao Estado, cuja função  
seria garantir a ordem, a propriedade privada e os contratos; enquanto a sociedade civil é  
idealizada como um espaço neutro de cidadania e consenso. Tal visão, no entanto, desconsidera  
os antagonismos de classe que perpassam a vida social, obscurecendo as desigualdades  
estruturais próprias do modo de produção capitalista. Ao adotar essa noção de cidadania  
homogênea, corre-se o risco de suprimir os conflitos sociais e, consequentemente, desmobilizar  
a crítica à ordem vigente. Como adverte Dias (2005, p. 33), esse processo implica “eliminar os  
antagonismos, construir os caminhos da derrota e da incorporação à ordem capitalista”.  
Dessa forma, a cidadania, sob a ótica das classes subalternas, não deve ser concebida  
como um ideal abstrato ou um campo neutro, mas como um espaço historicamente atravessado  
por contradições, onde se travam lutas por direitos e por transformações sociais efetivas. Ignorar  
Joseane Barbosa de Lima  
tais contradições significa reforçar a aparência de igualdade formal, contribuindo para a  
manutenção da exclusão e da desigualdade sob a fachada da cidadania universal.  
A hegemonia deve ser compreendida, simultaneamente, como direção política e  
processo pedagógico. Trata-se da construção de uma nova concepção de mundo, enraizada nas  
experiências e necessidades históricas das classes subalternas, orientada à constituição de uma  
cultura contra-hegemônica (Neves, 2017). Como observa Dias (2005, p. 64), esse processo  
exige a estruturação de um campo de lutas, alianças e estratégias que componham o “horizonte  
ideológico e simbólico” da classe trabalhadora, permitindo-lhe disputar a direção da sociedade  
em sua totalidade.  
É nesse complexo terreno de disputas por projetos societários, travadas no interior da  
sociedade civil, que o Serviço Social brasileiro também atua, sobretudo a partir da consolidação  
de seu Projeto Ético-Político. A apropriação crítica do pensamento gramsciano, especialmente  
a partir da década de 1980, foi decisiva para a reconceituação da intervenção profissional como  
práxis — compreendida como mediação entre as determinações estruturais da sociabilidade  
capitalista e a ação concreta dos sujeitos sociais (Neves, 2017). Nessa perspectiva, a profissão  
passa a reconhecer seu papel ativo nas lutas sociais, assumindo uma direção ético-política  
orientada à construção de alternativas emancipatórias no interior das contradições do Estado e  
da sociedade.  
812  
Os fundamentos ético-políticos do Serviço Social como projeto contra-hegemônico  
A compreensão da hegemonia como síntese entre direção cultural e transformação  
material tem sido central nas aproximações entre o pensamento gramsciano e o Serviço Social.  
Segundo Simionatto (1995), ao pensar a hegemonia como fenômeno político-cultural e  
econômico, Gramsci oferece subsídios teóricos para compreender a profissão como um espaço  
de disputa por um novo projeto de sociedade. A partir dessa chave analítica, o Serviço Social  
crítico se constitui como uma práxis contra-hegemônica, vinculada aos interesses históricos das  
classes trabalhadoras e comprometida com a construção de uma nova direção ético-política no  
interior da ordem social vigente (Neves, 2017).  
No entanto, é importante destacar que essa perspectiva crítica não está presente na  
origem da profissão no Brasil. A institucionalização do Serviço Social nos anos 1930 deu-se em  
um contexto de modernização conservadora do Estado, marcado pelo autoritarismo e pela  
consolidação da hegemonia burguesa no período do Estado Novo. Nessa conjuntura, a profissão  
assumiu feições técnico-burocráticas, fortemente influenciada pela doutrina social da Igreja,  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 806-826, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A atuação do assistente social na saúde frente à disputa de hegemonias: uma análise gramsciana  
atuando como mediadora da questão social, mas sem questionar suas determinações estruturais  
(Iamamoto; Carvalho, 2008).  
A crítica a esse modelo ganha força a partir dos anos 1960, impulsionada pelas lutas  
populares na América Latina e, sobretudo, pela incorporação das contribuições do marxismo.  
No Brasil, esse movimento se intensifica na década de 1980, com o processo conhecido como  
“intenção de ruptura” (Netto, 2011), que marca o esforço coletivo de revisão dos fundamentos  
teórico-metodológicos, ético-políticos e técnico-operativos da profissão. Nesse contexto, o  
pensamento gramsciano passa a ocupar lugar de destaque, contribuindo com categorias centrais,  
como bloco histórico, intelectual orgânico, sociedade civil e filosofia da práxis, orientando a  
construção de um novo projeto profissional vinculado à emancipação humana.  
Segundo Simionatto (2021, p. 11),  
A presença de Gramsci no Serviço Social se amplia na década de 1980, com  
conquistas importantes na discussão teórico-metodológica, com a implantação  
do currículo de 1982, na direção social da formação e da prática profissionais,  
afirmadas na disputa da hegemonia com o conservadorismo e o pragmatismo,  
mas também na atuação e na organização política da categoria. A inovadora  
contribuição de Gramsci ao marxismo, através da filosofia da práxis,  
impulsionou o aprofundamento dos estudos sobre o método crítico dialético,  
a imprescindível unidade entre teoria e prática, entre pensamento e ação  
(Abreu; Cardoso, 1989). Defendida por Gramsci como instrumento de  
combate ao positivismo e suas incrustações no marxismo, a filosofia da práxis  
configura-se como uma teoria da ação-político cultural necessária para  
apreender e, ao mesmo tempo, reorganizar o mundo em busca da sua  
transformação.  
813  
Nessa perspectiva, os confrontos políticos mais significativos entre os setores  
conservadores da profissão e aqueles alinhados à perspectiva crítica se intensificam nos  
processos de reformulação do Código de Ética Profissional, especialmente nos anos de 1986 e  
1993. Conforme Barroco (2009), nesse período, tanto a práxis política quanto a produção  
teórica passaram a desempenhar um papel decisivo na consolidação de um novo ethos  
profissional, de caráter crítico e democrático, orientado para a superação do irracionalismo, do  
conservadorismo e do tradicionalismo que historicamente marcaram o Serviço Social.  
O Código de Ética de 1986 constitui um marco nesse processo, ao compreender a ética  
profissional, pela primeira vez, como elemento constitutivo de um projeto coletivo. Essa  
concepção rompe com a perspectiva anterior, que restringia a ética ao plano da moral individual.  
Ainda que os fundamentos éticos não tenham sido plenamente explicitados, o documento já  
expressava uma importante inflexão: a política, antes subordinada à moral, passa a ser  
compreendida como subordinada à ética política. Isso indicava o surgimento de uma nova  
Joseane Barbosa de Lima  
práxis política, marcada por um distanciamento da lógica individualista e moralizante até então  
predominante (Barroco, 2009).  
O ano de 1986, portanto, inaugura um novo ciclo, que será aprofundado na década de  
1990. Nos debates que culminaram na formulação do Código de Ética de 1993, essa articulação  
entre ética e política se aprofunda, com o aporte de novos fundamentos teóricos e filosóficos,  
inspirados em autores da filosofia política, em referências marxistas contemporâneas e nas  
fontes originais do pensamento marxiano.  
As entidades representativas da categoria passaram a desenvolver ações voltadas à  
capacitação, à reflexão crítica e ao debate sobre ética, sempre em diálogo com a política,  
reafirmando a indissociabilidade entre essas duas dimensões no interior do projeto profissional.  
Com isso, consolida-se, a partir de 1993, a formulação do chamado Projeto Ético-Político, que  
expressa, de forma mais orgânica, essa articulação entre ética e política como fundamento para  
a atuação crítica do Serviço Social (Barroco, 2009).  
Nas palavras de Netto (1999) o significado sócio histórico e ideo-político do referido  
projeto,  
Tem em seu núcleo o reconhecimento da liberdade como valor ético central –  
a liberdade concebida historicamente, como possibilidade de escolher entre  
alternativas concretas; daí um compromisso com a autonomia, a emancipação  
e a plena expansão dos indivíduos sociais. Consequentemente, o projeto  
profissional vincula-se a um projeto societário que propõe a construção de  
uma nova ordem social, sem dominação e/ou exploração de classe, etnia e  
gênero. A partir destas escolhas que o fundam, tal projeto afirma a defesa  
intransigente dos direitos humanos e a recusa do arbítrio e dos preconceitos,  
contemplando positivamente o pluralismo – tanto na sociedade como no  
exercício profissional (Netto, 1999, p. 104-105).  
814  
Assim, o projeto ético-político do Serviço Social constitui-se como um projeto contra-  
hegemônico. Ao se orientar pela defesa dos direitos sociais, pela radicalização democrática e  
pela emancipação humana, ultrapassa os limites de uma atuação técnico-administrativa e  
assume uma dimensão política fundamental. O/a assistente social, inserido/a nas trincheiras da  
sociedade civil e política, atua como um/a intelectual orgânico/a das classes subalternas,  
contribuindo para a construção de novos consensos alinhados aos interesses da classe  
trabalhadora (Simionatto, 1995).  
Essa prática, contudo, se dá em meio a contradições. Como observa Jacinto (2017), a  
atuação profissional ocorre em instituições que operam majoritariamente para a reprodução das  
relações capitalistas. Portanto, mesmo orientado por um horizonte emancipador, o projeto ético-  
político enfrenta limites impostos pela hegemonia burguesa que se atualiza nas formas  
institucionais. Esse tensionamento é intensificado no contexto contemporâneo, marcado pelo  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 806-826, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A atuação do assistente social na saúde frente à disputa de hegemonias: uma análise gramsciana  
avanço do conservadorismo, pelo esvaziamento dos movimentos populares e pela fragmentação  
das lutas sociais.  
Nesse cenário, o desafio do/a assistente social é construir práticas que articulem o ético  
ao político, o imediato ao histórico, e a mediação às finalidades últimas do projeto profissional.  
Como destaca Neves (2017), trata-se de disputar os sentidos da intervenção profissional no  
interior das instituições e da sociedade civil, atuando estrategicamente na "guerra de posição"  
gramsciana. A prática profissional, assim, adquire uma dimensão pedagógica, ideológica e  
política, mediando demandas concretas com os projetos coletivos de transformação social.  
Não se trata, no entanto, de uma atuação previamente roteirizada. Gramsci (2000)  
adverte que o papel do intelectual orgânico exige uma constante dialética entre saber e sentir  
— uma unidade entre teoria, emoção e ação histórica, só possível mediante o enraizamento nas  
experiências vividas pelos sujeitos populares. A ausência desse vínculo abre espaço para a  
burocratização da prática e o distanciamento entre profissionais e os sujeitos históricos da  
transformação.  
Nesse sentido, o intelectual cumpre uma função estratégica na construção e na  
manutenção da hegemonia. Gramsci (2007) destaca que os intelectuais exercem um papel  
organizativo fundamental, articulando o consenso social e o domínio político do grupo  
dirigente. Segundo o autor:  
815  
Os intelectuais têm uma função na ‘hegemonia’ que o grupo dominante  
exercita em toda a sociedade e no ‘domínio’ sobre ela que se encarna no  
Estado, e esta função é precisamente ‘organizativa’ ou conectiva: os  
intelectuais têm a função de organizar a hegemonia social de um grupo e o seu  
domínio estatal, isto é, o consenso dado pelo prestígio da função no mundo  
produtivo e o aparato de coerção para aqueles grupos que não ‘consentem’  
nem ativamente nem passivamente ou para aqueles momentos de crise de  
comando e de direção em que o consentimento espontâneo passa por uma  
crise. Desta análise resulta uma extensão muito grande do conceito de  
intelectuais, mas apenas assim me parece possível chegar a uma aproximação  
concreta da realidade (Gramsci, 2007, p. 476).  
Nesse marco, é possível compreender o/a assistente social como um intelectual orgânico  
vinculado às classes subalternas, cuja prática profissional se insere nas disputas pela direção  
moral e política da sociedade. A apropriação do pensamento gramsciano pelo Serviço Social,  
portanto, não se reduz ao uso instrumental de categorias analíticas, mas constitui uma  
orientação ética e política. Ao afirmar os fundamentos do seu projeto ético-político, o Serviço  
Social se posiciona contra a lógica mercantil da vida e reafirma seu compromisso com a  
dignidade humana, a justiça social e a construção de uma nova hegemonia.  
Esse compromisso se concretiza nas mediações cotidianas do trabalho profissional.  
Desde o atendimento direto até a elaboração de pareceres, passando pela articulação com redes  
Joseane Barbosa de Lima  
e equipes e pela formulação de políticas públicas, cada ato profissional carrega escolhas ético-  
políticas. Como sublinha Simionatto (2021, p. 14), a atuação do/a assistente social tem função  
pedagógica e política fundamental, promovendo o acesso a direitos e contribuindo para a  
organização da cultura e da consciência social elementos centrais na luta pela hegemonia. À  
luz da perspectiva gramsciana, esse profissional não se limita a uma atuação neutra ou  
tecnicista, mas se insere de maneira ativa nas disputas ideológicas, culturais e políticas do seu  
tempo histórico. Seu trabalho implica participar da produção de sentidos sociais e na construção  
de hegemonias vinculadas aos interesses da classe trabalhadora.  
Como afirmam Santos e Mancini (2021, p. 130), trata-se de um exercício profissional  
atento à totalidade social, o que exige a apreensão crítica da “lógica do capitalismo  
contemporâneo, o papel do Estado, as dinâmicas da gestão pública e a luta de classes”. Tal  
compreensão é indispensável para que a intervenção profissional supere respostas imediatistas  
ou meramente adaptativas, assumindo uma postura ético-política propositiva e comprometida  
com a emancipação social.  
No contexto atual, caracterizado pela intensificação das expressões da questão social,  
pelo avanço de forças conservadoras e pelo desmonte das políticas públicas em prol da  
financeirização do capital, essa atuação crítica torna-se ainda mais necessária. Como analisa  
Silva (2022), observa-se a produção de uma imagem distorcida da realidade, acompanhada por  
um discurso de mudança que, sob a lógica do ultraneoliberalismo, apresenta falsas soluções  
para a crise estrutural do capitalismo. A esse discurso se soma a retórica moralizante de cunho  
fundamentalista religioso, promovida por setores das igrejas neopentecostais, que constroem a  
figura do comunismo como inimigo interno e ameaça à “família tradicional” e seus valores  
morais.  
816  
Essa articulação ideológica atua sobre o senso comum, consolidando visões de mundo  
simplificadas que moldam as condutas e as formas de pensar das massas. Silva (2022, p. 17)  
aponta que tais argumentos “aderem e sedimentam-se no senso comum, modelando convicções  
e operando sobre a vida prática”. Essa perspectiva encontra eco em Gramsci, para quem “nas  
massas como tais, a filosofia não pode não ser vivida como uma fé” (Gramsci, 2007, p. 1390).  
Ou seja, as ideias difundidas por determinados intelectuais se tornam forças materiais quando  
vivenciadas como crenças, orientando práticas e consolidando projetos societários. Por isso, o  
senso comum é um campo de disputa central na construção da hegemonia, sendo moldado tanto  
por intelectuais comprometidos com a transformação social quanto por aqueles que contribuem  
para a sua estagnação.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 806-826, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A atuação do assistente social na saúde frente à disputa de hegemonias: uma análise gramsciana  
Nesse último caso, destacam-se os chamados “intelectuais medíocres”, cuja atuação  
obscurece os elementos estruturais da realidade, reforçando respostas reacionárias diante das  
crises. Conforme analisa Schlesener (2017, p. 156), “os intelectuais medíocres [...] conseguem  
obscurecer em vez de esclarecer os movimentos de massa, ou porque não dominam a teoria ou  
porque não entendem sua posição na luta de classes ou, ainda, porque partem de saída de uma  
posição de elite (são medíocres e arrogantes)”. Tais sujeitos operam como difusores de um senso  
comum conservador, impedindo a elevação da consciência crítica dos setores subalternizados.  
No caso brasileiro, como destacado por Silva (2022), a desorganização da cultura  
nacional foi um dos fatores que possibilitou o surgimento de um movimento de massas  
reacionário, viabilizando a ascensão do bolsonarismo. Ainda que a atual conjuntura não possa  
ser explicada exclusivamente pela ação desses intelectuais, seu papel na conformação do bloco  
histórico dominante é decisivo. O crescimento do discurso da “ditadura cultural marxista”, os  
ataques sistemáticos à ciência, à educação, à democracia e à soberania nacional são expressões  
do avanço de formas intelectuais que Gramsci criticou duramente. Referindo-se a esse tipo de  
atuação ideológica, afirmou: “os grupos intelectuais que exprimiam questões lorianas2, na  
realidade, desprezavam, não só a lógica, mas a vida nacional, política e tudo mais” (Gramsci,  
2007, p. 2335).  
Diante desse cenário, o/a assistente social, enquanto intelectual orgânico da classe  
trabalhadora é desafiado a disputar sentidos no cotidiano profissional, contribuindo para  
desnaturalizar a ordem vigente e fomentar a construção de uma nova hegemonia, pautada nos  
valores da justiça social, da emancipação humana e da radicalização da democracia.  
Dessa forma, o Serviço Social é chamado a atualizar permanentemente seu  
compromisso com as classes subalternas. Reler Gramsci, como alerta Neves (2017), não  
significa repetir fórmulas, mas recriar sua teoria à luz das contradições do presente. É por meio  
dessa práxis viva e historicamente situada que a profissão se afirma como força ativa na  
construção de um novo projeto societário. A disputa entre projetos antagônicos segue presente  
— tanto na sociedade quanto na profissão — e exige que o Serviço Social se posicione de forma  
clara, crítica e coerente com os fundamentos que sustentam sua identidade.  
817  
Nesse horizonte, compreender o projeto ético-político do Serviço Social como  
expressão de uma racionalidade contra-hegemônica implica reconhecer a prática profissional  
como espaço de mediações históricas, políticas e ideológicas. Essa concepção torna-se ainda  
2 Gramsci utiliza o termo lorianismo para criticar intelectuais que carecem de rigor teórico, metodológico e ético,  
buscando prestígio por meio do diletantismo e da distorção dos fatos. Refere-se especialmente a Loria, mas  
também a autores como Einaudi, Ferri, Lombroso e Orano (Schlesener, 2017)  
Joseane Barbosa de Lima  
mais relevante quando analisamos o exercício profissional em áreas estratégicas, como a saúde.  
É nesse campo, marcado por disputas em torno da concepção de direitos, do papel do Estado e  
da forma de organização das políticas públicas, que se materializam muitas das contradições  
enfrentadas pelo Serviço Social. Assim, no próximo item, analisaremos o trabalho do assistente  
social na saúde como uma mediação crítica e um espaço de resistência, à luz dos fundamentos  
discutidos até aqui.  
O exercício profissional do Assistente Social na Saúde: Resistência e Construção de  
Hegemonia no SUS  
O campo da saúde pública brasileira, estruturado pelos princípios do Sistema Único de  
Saúde (SUS) — universalidade, integralidade e equidade — configura uma conquista histórica  
dos movimentos sociais e sanitaristas, expressando a materialização de disputas por hegemonia  
no interior do Estado brasileiro.  
À luz do pensamento gramsciano, a criação do SUS pode ser compreendida como  
resultado de um processo de disputa hegemônica na sociedade civil, no qual distintos grupos  
buscaram afirmar projetos antagônicos para a saúde pública no país. Nesse contexto, a Reforma  
Sanitária emergiu como um projeto contra-hegemônico, empenhado em construir uma nova  
direção moral e intelectual ao afirmar a saúde como direito universal e dimensão da cidadania.  
Assim, as lutas sociais em torno da concepção de saúde  
818  
[...] Buscam construir uma contra-hegemonia, [...] pauta um projeto  
emancipador para a humanidade e evidência a necessidade de enfrentamento  
dos desafios postos por uma realidade permeada de contradições e interesses  
destrutivos do capital, as quais determinam socialmente a situação de saúde  
da coletividade em uma dada sociedade (Carvalho, 2019, p. 14).  
Forjado nesse processo, o SUS rompe com modelos biomédicos, assistencialistas e  
mercantilistas, instituindo a saúde como direito social e dever do Estado. Entretanto, desde sua  
institucionalização, o sistema permanece atravessado por contradições estruturais, enfrentando  
permanentes investidas do capital, expressas na mercantilização da atenção, no  
subfinanciamento/desfinanciamento crônico, na precarização das condições de trabalho e na  
adoção de modelos gerenciais alinhados à lógica da acumulação capitalista.  
Segundo Bravo (2020), o SUS é tensionado por três projetos distintos: o projeto da  
Reforma Sanitária, que propõe um sistema público, estatal, universal e com controle social por  
meio da participação popular; o projeto privatista, que busca subordinar a saúde ao mercado; e  
o projeto da Reforma Sanitária flexibilizada, que tenta conciliar os princípios do SUS com as  
exigências do neoliberalismo.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 806-826, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A atuação do assistente social na saúde frente à disputa de hegemonias: uma análise gramsciana  
Esses três projetos materializam, em termos gramscianos, distintas estratégias de  
hegemonia no interior do Estado ampliado. Enquanto o projeto da Reforma Sanitária busca  
expandir a direção democrática da classe trabalhadora, o projeto privatista expressa a tentativa  
de restauração da hegemonia neoliberal. Já o projeto da Reforma Sanitária flexibilizada  
evidencia a convivência contraditória entre projetos antagônicos, revelando a complexidade da  
disputa hegemônica na área da saúde.  
A inserção do Serviço Social na saúde se intensifica com a criação do SUS, momento  
em que essas disputas passam a moldar sua institucionalização. Esse processo repercute na  
profissão ao evidenciar a tensão entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social, suas bases  
vinculadas à Reforma Sanitária Brasileira e as demandas cotidianas de trabalho ainda  
fortemente condicionadas pelo modelo hospitalocêntrico e curativista (Carvalho, 2019).  
Nesse cenário permeado por conflitos e disputas ideológicas, o trabalho do/a assistente  
social se insere como possibilidade de mediação crítica, articulando as determinações  
estruturais do capitalismo, os limites impostos pelas políticas públicas e as demandas concretas  
dos sujeitos sociais.  
Ao incorporar uma compreensão ampliada das determinações sociais do processo  
saúde-doença, o/a assistente social passa a tensionar os debates acerca da questão social que  
atravessa as condições de vida dos/as usuários/as do SUS, promovendo um diálogo essencial  
com a equipe multiprofissional de saúde. Nessa direção, sua atuação contribui para o  
enfrentamento das perspectivas conservadoras no campo da saúde, articulando a defesa dos  
direitos sociais à necessária politização da prática profissional. Desse modo, o trabalho do/a  
assistente social pode se configurar como uma prática contra-hegemônica, fortalecendo a  
construção de uma nova hegemonia, nos termos gramscianos, que afirme a integralidade do  
cuidado, a equidade e a transformação social.  
819  
Considerando essa inserção crítica, torna-se evidente que o/a assistente social ocupa um  
lugar estratégico no interior da política de saúde, dada a complexidade das demandas que  
chegam ao serviço e a necessidade de apreensão ampliada das necessidades sociais e de saúde.  
De acordo com Carvalho (2019), o contato permanente com situações multifacetadas e com a  
dinâmica cotidiana do SUS, confere à profissão um acúmulo técnico, ético e político singular.  
Quando esses elementos são elaborados de forma crítica, à luz dos fundamentos ético-políticos  
e dos referenciais teórico-metodológicos que orientam o projeto profissional, convertem-se em  
base para práticas que disputam projetos no interior do próprio SUS.  
Nesse contexto, o/a assistente social pode se configurar, em termos gramscianos, como  
um intelectual orgânico da classe trabalhadora, na medida em que produz, organiza e difunde  
Joseane Barbosa de Lima  
concepções críticas sobre a realidade social e o processo saúde-doença. Essa condição se  
expressa na capacidade de articular elaboração teórica, direção política e prática educativa,  
intervindo de modo qualificado nas contradições presentes nos serviços de saúde.  
A contribuição da categoria na composição de um movimento contra  
hegemônico na saúde, que tem a perspectiva da determinação social da saúde  
como eixo norteador, é um forte indicativo da nossa capacidade teórica e  
política de questionar movimentos ideológicos que pretensamente busquem  
direcionar pressupostos, métodos e práticas sociais em função de interesses  
que diferem da direção social do nosso Projeto Ético Político hegemônico,  
contribuindo inclusive com o revigoramento da direção social crítica que  
fundamentou a saúde coletiva, face aos desafios enfrentados pelo movimento  
sanitário na atualidade (Carvalho, 2019, p. 79).  
Assumir uma prática profissional que se contraponha à lógica dominante nos serviços  
de saúde requer, portanto, construir mediações capazes de negar a subordinação do trabalho  
do/a assistente social aos projetos societários que se fortalecem no contexto neoliberal. Esse  
compromisso ético-político implica enfrentar não apenas a racionalidade gerencialista e  
produtivista que atravessa o SUS, mas também as expressões do conservadorismo, dos  
preconceitos e das práticas discriminatórias que se reproduzem nos serviços — seja na forma  
de moralização das demandas dos/as usuários/as, na patologização das desigualdades sociais  
ou na naturalização das violências que afetam, sobretudo, populações negras, pobres, mulheres,  
pessoas LGBTQIA+ e pessoas com deficiência. Nesse sentido, como destaca Vasconcelos  
(2015), a práxis profissional requer apreender criticamente as determinações sociais que  
conformam essas expressões e produzir respostas que afirmem a centralidade do ser social na  
construção do cuidado.  
820  
Ao mesmo tempo, o exercício profissional do/a assistente social, longe de ser  
homogêneo, apresenta elementos tanto de reprodução das relações sociais conservadoras  
quanto de possibilidades para a construção de práticas críticas e emancipadoras. Como destaca  
Netto (2006), embora o conservadorismo tenha perdido o monopólio na direção do Serviço  
Social, suas expressões permanecem presentes, convivendo e confrontando-se com projetos  
profissionais críticos, em razão da heterogeneidade da categoria e do contexto democrático.  
Dessa forma, o exercício profissional crítico se desenvolve sob a constante ameaça da  
despolitização, da moralização das intervenções e da adaptação às lógicas neoliberais. Barroco  
(2011) alerta para o avanço de uma racionalidade tecnocrática e gerencial nas instituições,  
inclusive na área da saúde, que privilegia a produtividade, a competitividade e a lucratividade.  
Sob essa lógica, o trabalho do/a assistente social tende a ser reduzido a tarefas burocráticas e  
repetitivas, dificultando a construção de uma práxis crítica.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 806-826, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A atuação do assistente social na saúde frente à disputa de hegemonias: uma análise gramsciana  
Desse modo, o corpo profissional também está submetido às contradições do capital,  
sofrendo com a precarização do trabalho, o adoecimento, a intensificação das exigências  
produtivas e a instabilidade dos vínculos laborais. A fragilidade da formação política, somada  
à busca por soluções imediatistas e à ausência de mediações coletivas, favorece o fortalecimento  
do conservadorismo e compromete a construção de projetos profissionais emancipatórios  
(Barroco, 2011, p. 212).  
Essa racionalidade gerencial pode ser compreendida, à luz de uma leitura gramsciana,  
como um dos mecanismos de manutenção da hegemonia neoliberal, ao produzir consensos  
institucionais que naturalizam práticas tecnicistas e fragmentam capacidades coletivas de  
resistência. Ao reduzir a complexidade do trabalho profissional a rotinas operacionais e  
mensuráveis, busca-se neutralizar sua dimensão política e restringir sua potência contra-  
hegemônica.  
É nesse sentido que a formulação de Gramsci sobre o exercício da hegemonia —  
entendida como articulação entre coerção e consenso torna-se elucidativa para compreender  
a adesão institucional a tais racionalidades. Como afirma o autor, a hegemonia consiste em  
“uma combinação da força e do consenso que se equilibram, sem que a força suplante em muito  
o consenso; ao contrário, [a força] aparece apoiada pelo consenso da maioria, expresso pelos  
assim ditos órgãos da opinião pública” (Gramsci, 1975 apud Aliaga; Silva, 2017, p. 24).  
Nessa perspectiva, o gerencialismo não opera apenas como exigência administrativa,  
mas como produção ativa de consenso que legitima formas de organização do trabalho  
alinhadas à racionalidade neoliberal, dificultando a construção de práticas profissionais críticas  
e emancipadoras.  
821  
Entretanto, é justamente na capacidade de reconhecer e tensionar essas contradições que  
se inscreve a potencialidade contra-hegemônica da prática profissional do/a assistente social. A  
construção de alianças com sujeitos coletivos e a disputa de sentidos das políticas públicas  
constituem estratégias fundamentais na afirmação da defesa da vida, dos direitos sociais e da  
emancipação humana.  
Diante do atual cenário de ofensiva conservadora, aprofundamento das desigualdades e  
precarização das políticas sociais, torna-se imperativo que a atuação profissional do/a assistente  
social na saúde esteja alicerçada em uma perspectiva crítica e totalizante, capaz de apreender  
as expressões da questão social e intervir de forma articulada. Disputar a hegemonia na área da  
saúde exige mais do que resistências pontuais: requer organização coletiva, fortalecimento do  
projeto ético-político profissional e articulação entre os espaços institucionais e os movimentos  
Joseane Barbosa de Lima  
sociais. O trabalho profissional deve se afirmar como instrumento na luta por um projeto  
societário fundado na equidade, na justiça social e na universalização dos direitos.  
O enfrentamento ao conservadorismo exige, assim, uma dupla estratégia: por um lado,  
o fortalecimento da organização política da categoria, por meio de ações junto às entidades  
representativas, unidades formadoras, profissionais e estudantes; por outro, a articulação com  
movimentos sociais, sindicatos e partidos comprometidos com os interesses da classe  
trabalhadora (Barroco, 2011). Essa mobilização coletiva é fundamental para resistir às  
tendências conservadoras e gerencialistas que, associadas à intensificação das desigualdades,  
expressam um projeto de sociedade excludente e autoritário.  
Essas tendências conservadoras e gerencialistas não se limitam a conjunturas isoladas,  
mas têm se aprofundado nas últimas décadas, especialmente em contextos de crises  
econômicas, políticas e sociais que afetam diretamente a organização e o financiamento das  
políticas públicas. Momentos de inflexão histórica, como a pandemia de Covid-19,  
evidenciaram de forma contundente as contradições do sistema capitalista e os limites do  
modelo de saúde vigente.  
A crise sanitária global escancarou as desigualdades sociais e destacou, de maneira  
incontornável, tanto a centralidade do Sistema Único de Saúde (SUS) na proteção da vida  
quanto o papel estratégico do/a assistente social no enfrentamento às múltiplas expressões da  
questão social. Como destaca Matos (2021, p. 144):  
822  
O cotidiano profissional do assistente social, durante a pandemia, explicitou a  
centralidade da questão social no campo da saúde e escancarou as  
desigualdades sociais que atravessam a população usuária. O trabalho  
profissional teve que lidar com demandas urgentes, com o sofrimento social  
intensificado, mas também se constituiu como espaço de denúncia, resistência  
e articulação com os movimentos sociais e usuários na defesa do SUS.  
Do ponto de vista gramsciano, crises dessa magnitude tendem a abalar o bloco histórico3  
dominante e podem abrir brechas para a reconfiguração hegemônica, tornando ainda mais  
evidente a importância de práticas profissionais capazes de disputar sentidos e afirmar projetos  
societários comprometidos com a vida e com os direitos sociais.  
Diante dessa conjuntura, reafirmou-se o compromisso da categoria com os direitos  
humanos, a justiça social e a defesa intransigente do SUS como política pública universal. A  
pandemia também expôs como as desigualdades de classe, raça, território e gênero impactam  
de forma desigual a morbimortalidade da população, evidenciando a necessidade da defesa de  
3 Para Gramsci (2002), a crise orgânica emerge quando a classe dirigente fracassa em seu projeto de direção política  
ou quando as massas passam da passividade à ação, abrindo fissuras na hegemonia.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 806-826, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A atuação do assistente social na saúde frente à disputa de hegemonias: uma análise gramsciana  
uma concepção ampliada de saúde e de uma atuação profissional crítica, capaz de compreender  
o adoecimento como expressão das determinações sociais da vida.  
A intervenção profissional do assistente social na saúde, orientada pelos fundamentos  
do Projeto Ético-Político, encontra respaldo nos Parâmetros para Atuação de Assistentes  
Sociais na Saúde (CFESS, 2010), os quais reafirmam sua perspectiva política e crítica. Em  
especial, o eixo 3.2.2 Mobilização, Participação e Controle Social orienta a categoria a  
fomentar o protagonismo dos sujeitos coletivos, fortalecer os espaços de deliberação  
democrática e contribuir para a democratização da gestão das políticas públicas. Essa diretriz  
se concretiza por meio de práticas como a escuta qualificada, a mediação institucional, a  
produção de documentos críticos e a atuação efetiva em conselhos e conferências de saúde.  
Nesse contexto, a atuação interdisciplinar se apresenta como estratégia fundamental  
para disputar concepções políticas de cuidado, promover abordagens integrais e coletivas e  
enfrentar tanto o tecnicismo quanto a lógica fragmentada que ainda permeiam os modelos  
gerenciais no setor saúde. É nesse movimento que se insere a práxis do/a assistente social, como  
expressão de resistência e de construção de alternativas ético-políticas no interior das  
instituições. Como afirma Carvalho (2019): “Materializar uma práxis contra-hegemônica e  
emancipatória é desvelar as demandas do cotidiano, no sentido de problematizá-las na direção  
dos reais interesses da classe trabalhadora […]”.  
823  
A articulação político-teórico-prática que marca essa atuação se fortalece com a  
participação de assistentes sociais em coletivos e frentes de luta, como a Frente Nacional contra  
a Privatização da Saúde (FNCPS), que reúne movimentos sociais, universidades, sindicatos e  
entidades empenhadas na defesa de um SUS público, estatal e de qualidade (Bravo; Pelaez;  
Menezes, 2020). Nesse mesmo horizonte, as entidades representativas da categoria — CRESS,  
CFESS e ABEPSS — desempenham papel central ao produzirem diretrizes, defenderem  
direitos sociais e se articularem com movimentos sociais na afirmação de um projeto  
profissional crítico e transformador.  
Em síntese, o trabalho do/a assistente social na saúde configura um espaço estratégico  
de mediação crítica e disputa política. Ao posicionar-se de forma ética e comprometida com os  
interesses da classe trabalhadora, o/a profissional tensiona os limites institucionais e contribui,  
no interior das lutas sociais, para a construção de um projeto societário contra-hegemônico  
baseado na radicalização da democracia, na justiça social e na universalização dos direitos.  
No entanto, tal construção exige vigilância constante e organização coletiva diante das  
ofensivas conservadoras que buscam cooptar o Projeto Ético-Político do Serviço Social e  
restringir sua capacidade de afirmação crítica nas instituições. Embora o conservadorismo  
Joseane Barbosa de Lima  
avance em articulação com a lógica do capital em escala global, os sujeitos históricos seguem  
tensionando essa ordem por meio de práticas coletivas que, mesmo permeadas por contradições,  
apontam para possibilidades concretas de resistência e de reconfiguração da sociabilidade.  
Considerações finais  
O exercício profissional do/a assistente social na saúde pública brasileira desenvolve-se  
em um terreno permeado por profundas contradições estruturais. De um lado, o Sistema Único  
de Saúde (SUS) constitui uma conquista histórica das classes subalternas, fruto da luta coletiva  
por direitos sociais e por uma nova direção política para a sociedade. De outro, vivencia-se a  
intensificação de ataques à saúde pública por meio da lógica mercantil, da racionalidade  
gerencialista e da precarização do trabalho, expressões do avanço do neoliberalismo, sobretudo  
no contexto de fortalecimento do conservadorismo de extrema direita que se instalou no Brasil  
a partir do governo Bolsonaro e que ressoa em escala global, impondo retrocessos às políticas  
sociais e à democracia.  
Nesse cenário, o Serviço Social, ao se orientar por um projeto ético-político alinhado  
aos interesses da classe trabalhadora, reafirma sua posição como profissão comprometida com  
as lutas sociais, atuando no bojo das disputas por hegemonia no interior do Estado e da  
sociedade civil. Nessa perspectiva, a atuação profissional crítica pode ser compreendida, à luz  
de Gramsci, como uma prática contra-hegemônica, na medida em que enfrenta os valores  
dominantes do capital como o individualismo, a culpabilização da pobreza, a meritocracia e  
a medicalização da vida e afirma, cotidianamente, os princípios da universalidade, da  
equidade, da dignidade humana e da justiça social.  
824  
Ao assumir a dimensão política e pedagógica de sua prática, o/a assistente social se  
coloca como um intelectual orgânico da classe trabalhadora, conforme formulado por Gramsci  
nos Cadernos do Cárcere: aquele que, inserido nos processos sociais concretos, contribui para  
a elaboração de uma nova consciência coletiva, vinculando o saber à ação transformadora.  
Trata-se de um intelectual que não atua “do alto”, mas emerge das próprias contradições da  
vida social, articulando sujeitos, fomentando a crítica e disputando sentidos no cotidiano  
institucional.  
Apesar dos intensos limites institucionais e materiais que marcam a política de saúde —  
e que foram agravados pelas reformas ultraneoliberais, evidenciadas por cortes orçamentários  
e pelo desmonte do SUS , o trabalho do/a assistente social guarda um potencial  
emancipatório. Para que tal potencial se atualize, é necessário que a atuação profissional  
permaneça ancorada nos fundamentos teóricos, éticos e políticos da profissão, recusando  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 806-826, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A atuação do assistente social na saúde frente à disputa de hegemonias: uma análise gramsciana  
adaptações funcionais às lógicas do capital e afirmando sua direção em defesa da transformação  
social.  
Portanto, reafirmar esse projeto profissional crítico e emancipador é mais do que uma  
tarefa técnica: é uma escolha política estratégica, que envolve a defesa da saúde como direito,  
o fortalecimento do SUS público e estatal e a aposta na construção de uma nova hegemonia  
social. Tal projeto exige, ainda, a ampliação e o fortalecimento dos movimentos sociais, da  
participação popular e das redes de resistência que, em meio às contradições do presente,  
apontem para a construção de uma outra sociabilidade possível fundada na solidariedade, na  
equidade e no direito universal à vida digna.  
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826  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 806-826, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Ainda estou aqui”: análise do Ciclo de  
Memórias do Serviço Social na Ditadura  
“I’m still here”: an analysis of the Cycle of Memories of  
Social Work during the Dictatorship  
Graziela Scheffer*  
Karla da Silva Apolinario**  
Sara Beatriz Silva de Oliveira***  
Resumo: O artigo apresenta o resultado da ação  
extensionista denominada “Ciclo de Memórias  
Serviço Social na Ditadura Civil-Militar". A  
extensão é derivada da pesquisa sobre o Serviço  
Social e as lutas democráticas no Rio de Janeiro  
no período de 1964-1985. As ações foram  
realizadas no formato de ciclo de debates por  
meio de depoimentos de estudantes, docentes e  
profissionais cujas experiências formativas e/  
ou profissionais ocorreram no período  
ditatorial. Este estudo incidiu na análise de 6  
depoimentos realizados nas atividades. Os  
procedimentos utilizados para realização das  
ações extensionistas envolveram o contato via  
correio eletrônico contendo a carta-convite, o  
termo de consentimento informado e roteiros  
organizados a partir dos eixos da investigação  
sobre a incidência das lutas democráticas na  
profissão. Entendemos que os depoimentos  
foram uma importante estratégia pedagógica de  
resgate das memórias coletivas acerca das  
formas das resistências profissionais na ditadura  
civil militar. A memória profissional foi uma  
estratégia pedagógica de sensibilização da  
consciência histórica junto ao segmento  
acadêmico.  
Abstract: This article presents the results of an  
extension action called “Cycle of Memories of  
Social Service during the Civil-Military  
Dictatorship”. The extension is derived from  
research on Social Service and democratic  
struggles in Rio de Janeiro between 1964 and  
1985. The actions were carried out in the format  
of a debate cycle through testimonies from  
students, teachers and professionals whose  
formative and/or professional experiences  
occurred during the dictatorship. This study  
focused on the analysis of 6 testimonies given  
during the activities. The procedures used to  
carry out the extension actions involved contact  
via e-mail containing the invitation letter, the  
informed consent form and a script organized  
based on the axes of the investigation on the  
incidence of democratic struggles in the  
profession. We understand that the testimonies  
were an important pedagogical strategy for  
recovering collective memories about the forms  
of professional resistance during the civil-  
military dictatorship. Professional memory was  
a pedagogical strategy for raising awareness of  
historical awareness among the academic  
segment.  
Palavras-chaves: Serviço Social; Consciência  
Histórica; Ditadura; Memória Coletiva.  
Keywords:  
Consciousness;  
Memory.  
Social  
Work;  
Historical  
Collective  
Dictatorship;  
* Universidade do Estado do Rio de Janeiro. E-mail: graziela.uerj@gmail.com  
** Universidade do Estado do Rio de Janeiro. E-mail: karla.s.apolinario@gmail.com  
*** Universidade do Estado do Rio de Janeiro. E-mail: sbeatriz020@gmail.com  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.49676  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 01/08/2025  
Aprovado em: 12/12/2025  
Graziela Scheffer; Karla da Silva Apolinario; Sara Beatriz Silva de Oliveira  
Introdução  
O título do artigo faz referência ao filme brasileiro Ainda estou aqui1 que ganhou, em  
2025, o tão cobiçado Oscar hollywoodiano, abordando as memórias dos familiares dos/as  
desaparecidos/as na ditadura civil-militar e a luta por justiça na responsabilização do Estado  
brasileiro. A memória hegemônica2 sobre a ditadura brasileira não foi amplamente  
compartilhada pela maioria da sociedade. A Lei de Anistia (1979), significou o silenciamento  
e a impunidade. Essa lei foi um evento emblemático que circunscreveu a memória sobre a  
ditadura, no sentido que impôs limites para a investigação e punição de violações a direitos  
humanos praticados nesse período, deixando marcas que até hoje não foram superadas  
plenamente (Napolitano, 2022). Sob esse fio de memória das feridas ainda abertas das violações  
aos direitos humanos, o filme tece uma interessante metáfora acerca da memória na sociedade  
brasileira ao retratar a jornada de Eunice Paiva em busca pela verdade do desaparecimento do  
seu marido, o ex-deputado Rubens Paiva. Avançando, no fim da vida da protagonista, na  
atualidade da sociedade brasileira, Eunice Paiva é apresentada com a doença Alzheimer, tendo  
breves lampejos de lembranças do marido enquanto assiste uma matéria jornalística sobre  
Comissão da Verdade na TV. O filme é representativo da luta por memória, verdade e justiça,  
incentivando o debate na sociedade brasileira sobre a necessidade de lidar com as injustiças  
ocorridas no regime militar.  
828  
Mesmo passados 40 anos da ditadura civil-militar, ainda persistem as heranças  
autoritárias que se evidenciam na polarização social no cenário político brasileiro. É nesse  
contexto fecundo de conflitos e disputas em torno das memórias na ditadura que desenvolvemos  
a atividade extensionista3 denominada, “Ciclo de Memórias sobre o Serviço Social na  
ditadura”. O objetivo da atividade foi debater expressões na profissão dos processos de  
repressão-resistência no Rio de Janeiro de 1960-1980, visando contribuir no fortalecimento da  
consciência histórica junto à comunidade acadêmica. As ações extensionistas ocorreram por  
meio de depoimentos de convidados que foram estudantes, professores e profissionais no  
1 O filme aborda através da trajetória de Eunice Paiva, esposa do ex-deputado Rubens Paiva, desaparecido e morto  
pela ditadura civil-militar, o roteiro toca em temas importantes relativos à memória e luta por justiça a partir do  
impacto da ditadura militar na vida de uma família e na sociedade brasileira. A obra oferece aos espectadores a  
possibilidade de refletir sobre o passado e a importância de não esquecer as violações na ditadura.  
2 A “memória hegemônica” pode ser definida como a narrativa sobre o passado que predomina na esfera pública,  
instituições político-jurídicas, imprensa, movimentos sociais, sistema artístico e sistema escolar de uma sociedade.  
Pode haver variáveis ideológicas entre estas instituições diversas, mas a tendência é ficar preservado um núcleo  
valorativo e ético para dar sentido social aos eventos que pautam a narrativa (Napolitano, 2015). Ademais, é  
importante salientar que a questão da memória sobre a ditadura brasileira é na atualidade uma arena de conflito e  
disputa.  
3
O Ciclo de Memórias é uma atividade de extensão derivada da pesquisa intitulada Serviço Social e as lutas  
democráticas no Rio de Janeiro no período de 1964-1985, submetida à Plataforma Brasil em 25 de agosto de 2023.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 827-847, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Ainda estou aqui”: análise do Ciclo de Memórias do Serviço Social na Ditadura  
período da ditadura, abrangendo as décadas de 1960, 1970 e 1980. A extensão foi uma via de  
articulação entre o ensino e a pesquisa em Fundamentos Históricos Metodológicos do Serviço  
Social, circunscritas às reflexões sobre as incidências das lutas democráticas na profissão.  
Consideramos que a extensão é significativa ao tempo presente, ancorados aos visíveis ataques  
vivenciados à democracia brasileira, sendo essencial mobilizar a memória profissional  
enquanto uma via pedagógica para novas gerações profissionais alinhadas à defesa dos valores  
democráticos, considerando a necessidade de enfrentamento ao avanço das “(...) ideias e  
práticas conservadoras, reacionárias e fundamentalistas no Brasil e no mundo onde os mínimos  
direitos humanos de grupos historicamente excluídos têm sido violentados” (Alves, 2024, p.  
92).  
O artigo se estruturou em dois itens: no primeiro abordamos as concepções teóricas que  
orientaram as atividades extensionistas. No segundo, apresentamos a sistematização e a análise  
de trechos dos seis depoimentos realizados nos eventos extensionistas do ciclo de memórias.  
Tempo, compositor de destino”: Serviço Social, memória coletiva e consciência  
histórica  
E quando eu tiver saído  
Para fora do teu círculo  
(...) Não serei nem terás sido  
Tempo, tempo, tempo, tempo  
Ainda assim acredito  
829  
Ser possível reunirmo-nos  
Tempo, tempo, tempo, tempo  
Num outro nível de vínculo.  
(Oração do Tempo - Caetano Veloso, 1979).  
Para Álvaro Vieira Pinto (1960) a consciência histórica permite desencadear um  
processo de compreensão da realidade social que contribui para que os sujeitos se situem no  
mundo e possam transformá-lo. Ainda em sua visão, a consciência histórica era essencial para  
a libertação dos oprimidos e para a construção de uma sociedade mais justa. A consciência que  
investiga a si mesma, tem como núcleo de todas as suas estruturas e reações esta propriedade:  
a de ser uma consciência histórica. Ou seja, a autopercepção do ser é histórico, sua  
representação é condicionada por uma circunstância objetiva constituída pelo real enquanto  
presente de um tempo histórico e, portanto, seus enunciados não possuem a vigência de  
verdades perenes, mas refletem o momento que lhe dá origem. Seguindo nessa trilha, Paulo  
Freire (1983), sob inspiração do mesmo autor, apresenta a mesma concepção de consciência  
histórica, porém apontando que a educação deveria favorecer este processo por meio do  
fortalecimento da capacidade de compreensão da realidade histórica e social dos oprimidos.  
Graziela Scheffer; Karla da Silva Apolinario; Sara Beatriz Silva de Oliveira  
A consciência histórica, portanto, era vista enquanto instrumento de libertação, pois  
possibilita que os oprimidos reconheçam sua situação de opressão e se organizem para  
transformá-la. Sendo que a consciência histórica deveria ser desenvolvida por meio de uma  
educação dialógica, que envolvesse a participação ativa dos sujeitos na construção do  
conhecimento. Portanto, uma abordagem pedagógica que permitisse que os sujeitos se  
apropriassem de sua história e não apenas objetos de uma história imposta. Para o autor:  
(...) só aprende verdadeiramente aquele que se apropria do aprendido,  
transformando-o em apreendido, com o que pode, por isto mesmo, reinventá-  
lo; aquele que é capaz de aplicar o aprendido-apreendido a situações  
existenciais concretas (Freire, 1983, p. 15).  
Neste sentido, acreditamos que conhecer e dar visibilidade à história do Serviço Social,  
articulada à construção de uma política de memória e documentação histórica é essencial para  
projetar perspectivas profissionais diante dos desafios atuais, ou seja:  
Rever o passado para iluminar o presente, elucidando as constelações que  
ligam presente e passado, é um movimento heurístico fundamental para  
compreender tanto o passado recente quanto o ineditismo das atuais condições  
históricas e para recriar a práxis de enfrentamento a esses tempos de regressão  
conservadora, contribuindo para formas de resistência política (Iamamoto;  
Santos, 2021, p. 27-28).  
Entretanto, cabe ponderar que consciência histórica, assim como a consciência de  
classe, apresenta limites, conforme aponta Iasi:  
830  
Não basta ter consciência das determinações históricas do mundo em que  
vivemos e a certeza de que podemos nos converter em sujeitos de uma nova  
sociedade; é preciso construir os caminhos práticos da emancipação nas  
condições históricas dadas (Iasi, 2022, p. 17).  
Em nosso ponto de vista, o trabalho extensionista com base nos depoimentos  
profissionais vincula-se à concepção de memória coletiva, ou seja:  
(...) um novo campo de significações para a memória coletiva. Esta se refere  
não apenas a este processo de registro de acontecimentos pela experiência  
humana, mas também à construção de referenciais sobre o passado e sobre o  
presente de diferentes grupos sociais e sob a perspectiva de diferentes grupos  
sociais, ancorados nas tradições e intimamente associados a mudanças  
culturais. O processo de registrar a história é imprescindível, uma vez que  
todos nós somos sujeitos históricos (Andrade et al., 2024, p. 5).  
Além disso, compreendemos que as atividades de extensão de memórias da ditadura  
criaram um espaço de troca de experiências entre passado e presente que possibilitou  
desencadear um processo de conscientização na formação profissional. Também, nesse sentido,  
favorece a construção de uma cultura histórica que privilegie a geração de novas experiências  
por meio da aprendizagem do conviver na diversidade humana, com vistas à preservação e  
fortalecimento da democracia brasileira, tão atacada na atualidade (Alves, 2024). Nesta trilha,  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 827-847, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Ainda estou aqui”: análise do Ciclo de Memórias do Serviço Social na Ditadura  
vinculamos os ciclos à função pedagógica desenvolvida pela profissão, que se insere no campo  
das atividades educativas formadoras da cultura, ou seja, são ações formadoras de um modo de  
pensar, sentir e agir. Sendo que entre as estratégias de mobilização que o/a assistente social  
pode utilizar incluem-se a linguagem escrita e audiovisual, para impulsionar uma consciência  
crítica capaz de desmistificar e desencadear ações coletivas que se contraponham à cultura  
domesticadora, difundida pela mídia hegemônica empresarial e outros meios de comunicação  
(Abreu, 2009). Portanto, vai além de descrever o passado (Andrade et al., 2024), mas valorizar  
a trajetória dos sujeitos que integram os movimentos sociais e o serviço social, possibilitando  
mediações com o presente e miradas para o futuro das lutas contra as opressões dentro e fora  
da profissão. Ademais, trabalhamos nos ciclos de memórias:  
A unidade dialética entre a consciência que nos move e os muros de pedra que  
se apresentam como barreiras constituem os dois elementos da práxis daqueles  
que entenderam que fazem história, mas não a fazem como querem, nem em  
circunstâncias de sua escolha (Iasi, 2022).  
Além disso, temos que reconhecer as disputas em torno das memórias, conforme aponta  
Gómez (2020). A questão da memória sobre a repressão da ditadura supõe reconhecer uma  
pluralidade de memórias no processo demorado e inacabado com acerto de contas com o  
passado violento, que agrega diferentes sujeitos sociais e instituições estatais. Ou seja, são  
memórias que entram em confronto em seus sentidos e marcos interpretativos desse passado no  
tempo presente que aspiram tornar-se hegemônicas, de modo que, por sua historicidade, sofrem  
modificações nas próprias lembranças, esquecimentos e silêncios, produto das mudanças  
(políticas, jurídicas, ideológicas e culturais) nacionais e internacionais. Apesar dessa  
pluralidade das memórias em disputa, isso não apaga o fato da legitimidade até os dias atuais,  
da transmissão das experiências subjetivas. Na próxima seção apresentaremos a atividade  
extensionista e seus resultados.  
831  
“O tempo é sua morada”: pesquisa /extensão em Fundamentos históricos  
metodológicos do Serviço Social  
Trago no peito costuradas  
Contas de memória fresca  
(O tempo é sua morada Francisco el Hombre)  
O ciclo de memórias do Serviço Social na ditadura foi realizado de setembro de 2023  
até novembro de 20244. Os procedimentos para sua realização foram: contato via correio  
4
O título faz referência à música “O Tempo é sua morada” da banda Francisco el Hombre, que traz uma reflexão  
poética sobre a passagem do tempo e a forma como as memórias e o luto são processados.  
Graziela Scheffer; Karla da Silva Apolinario; Sara Beatriz Silva de Oliveira  
eletrônico contendo a carta-convite, o termo de consentimento informado e roteiro,5  
organizados a partir dos eixos da investigação da incidência das lutas democráticas na  
profissão6 a serem tratados na apresentação durante a atividade. A metodologia utilizada na  
extensão perpassou pelos pressupostos da pesquisa-ação enquanto um caminho prático da  
investigação, a partir de depoimentos públicos realizados de forma aberta aos inscritos na  
atividade de extensão denominada Ciclos de Memória. Tais depoimentos foram sistematizados  
por meio de transcrições e submetidos à análise de conteúdo (Bardin, 2002), considerando os  
eixos previamente estabelecidos no roteiro. Os ciclos implicaram em uma dupla função:  
primeiro enquanto processo de democratização da memória profissional na ditadura, cujo  
objetivo prático foi desencadear um processo de conscientização histórica. Já a segunda, atende  
ao objetivo da pesquisa em obter informações por meio de depoimentos, da memória  
profissional no período da ditadura (Thiollent, 2018).  
Portanto, a atividade extensionista buscou colaborar no processo de consciência  
histórica junto à comunidade universitária por meio do debate das expressões das lutas  
democráticas7 na trama das memórias profissionais atrelados aos processos de repressão-  
resistência no Rio de Janeiro de 1964-1985. Entendemos que,  
A história, enquanto construção de homens e mulheres, remete a um conjunto  
de ações e fenômenos que se processam na sociedade. Embora tenham  
existido, nem todas as ações estão registradas, documentadas, catalogadas,  
razão pela qual a historiografia se faz tão importante para a produção científica  
e para a vida das sociedades. Com a historiografia, torna-se possível o registro  
da história, por meio do acesso a diferentes tipos de fontes: livros, artigos,  
cartas, documentos, pessoais, fotografias, entre outras (Andrade, et al., 2024,  
p. 3).  
832  
Durante a execução da atividade buscamos a problematização da temática relativa ao  
aprofundamento de elementos abordados na pesquisa. Entendemos que “a problematização é a  
reflexão que alguém exerce sobre um conteúdo, fruto de um ato, ou sobre o próprio ato, para  
agir melhor, com os demais, na realidade” (Freire, 1983, p. 50). Neste sentido, a extensão  
enquanto uma ação comunicativa e dialógica deve considerar:  
5 O roteiro foi elaborado abordando os seguintes aspectos: identificação; lutas democráticas e militância; formação  
e trabalho vinculados aos impactos da ditadura; organização política; movimento estudantil; estágio e trabalho de  
conclusão de curso.  
6
O objetivo geral da pesquisa é analisar o Serviço Social no Rio de Janeiro em seu enlace com as lutas  
democráticas visando identificar processos críticos de erosão dos fundamentos tradicionais e conservadores da  
profissão nas décadas 1960, 1970 e 1980. A investigação teve como base: revisão bibliográfica, coleta de  
documentos históricos na Faculdade de Serviço Social e a organização digital do material no google drive com a  
intenção de construir um acervo.  
7
Compreendemos que as lutas democratizantes e suas experiências concretas jamais se circunscrevem apenas à  
forma de governo: referem-se ao conjunto das relações sociais nas quais emergem. Elas tendem a questionar o  
controle dos meios sociais de produção e, sob o capitalismo, evidenciam a distância crescente entre a socialização  
da produção e o controle privado do capital sobre os meios de existência (Fontes, 2019).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 827-847, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Ainda estou aqui”: análise do Ciclo de Memórias do Serviço Social na Ditadura  
Esta problematização, que se dá no campo da comunicação em torno das  
situações reais, concretas, existenciais, ou em torno dos conteúdos  
intelectuais, referidos também ao concreto, demanda a compreensão dos  
signos significantes dos significados, por parte dos sujeitos interlocutores  
problematizados (Freire, 1983, p. 45).  
Além disso, o projeto visou contribuir no adensamento do ensino em Fundamentos  
Históricos Metodológicos do Serviço Social, no qual o uso da memória profissional foi um  
recurso pedagógico de sensibilização da consciência histórica junto à comunidade acadêmica.  
Concordamos com Freire (1983, p. 33), que ressalta:  
(...) o fato histórico não pode ser simplesmente narrado com este gosto  
excessivo pelo pormenor das datas, reduzido assim a algo estático que se põe  
no calendário que o fixa. (...) é necessário problematizar o fato mesmo ao  
educando. Necessário que ele reflita sobre o porquê do fato, sobre suas  
conexões com outros fatos no contexto global em que se deu. Poder-se-ia dizer  
que esta é a tarefa própria de um professor de História; a de situar, na  
totalidade, a “parcialidade” de um fato histórico. Parece-nos, entretanto, que  
sua tarefa primordial não é esta, mas a de, problematizando a seus alunos,  
possibilitar-lhes o ir-se exercitando em pensar criticamente, tirando suas  
próprias interpretações do porquê dos fatos.  
O trabalho de extensão e comunicação se concentrou nas memórias coletivas  
relacionadas a eventos históricos no Rio de Janeiro, abrangendo as experiências de seis  
depoentes como estudantes, professores e profissionais. Essas experiências ocorreram em  
diferentes momentos da ditadura, entre 1964 e 1985.  
833  
Buarque (2008) aponta que no final dos anos de 1950 a Europa vivenciava uma  
sequência inédita de guerras de descolonização, que transformaram o perfil não só econômico,  
mas sobretudo cultural do chamado "Primeiro Mundo". No Brasil, a juventude dos anos de  
1960, impulsionada pela experiência social e pelo engajamento na luta cultural, atualizou, à sua  
maneira, a luta internacional pelas minorias. Como resultado, a produção cultural brasileira do  
início dos anos de 1960 alcançou um patamar crescente de engajamento, sendo diretamente  
marcada pelos temas do debate político. Para Buarque (2008, p. 206), "seja nas produções de  
traços populistas, seja na produção das vanguardas experimentais, os temas da modernização,  
do nacionalismo ou da 'fé no povo' informam a urgência de uma arte participante e a crença no  
alcance revolucionário da arte e da palavra poética".  
A cidade do Rio de Janeiro foi importante sede do movimento estudantil da União  
Nacional dos Estudantes (UNE), de modo que abrigou diferentes experiências dos Centros  
Populares de Cultura (CPC) sob o comando da UNE. Esse movimento reuniu um conjunto de  
jovens artistas (dramaturgos, atores, compositores, cineastas, artistas plásticos, poetas), líderes  
estudantis e pessoas interessadas que possuíam um projeto intelectual comum: a elaboração  
Graziela Scheffer; Karla da Silva Apolinario; Sara Beatriz Silva de Oliveira  
imperiosa de uma “cultura popular” em confronto com as expressões artísticas vigentes  
(Berlinck, 1984, p. 05). Nesse período, houve avanço das práticas de cultura popular e  
alfabetização no Rio de Janeiro pela Campanha de Alfabetização da UNE e pelo Plano Nacional  
de Alfabetização, com implantação iniciada na Baixada Fluminense. Também, enquanto antiga  
capital do país, abrigou importantes segmentos da intelectualidade, das artes e do movimento  
estudantil8 da UNE.  
Em 1962 foi criada a Executiva Nacional de Estudantes de Serviço Social (ENESS),  
vinculada à UNE9. No Serviço Social brasileiro, a militância estudantil se devolveu por meio  
das organizações católicas, muitas vezes marcada pela trajetória de participação ainda no ensino  
secundarista na Ação Católica (JEC - Juventude Estudantil Católica). De modo que ao se inserir  
no ambiente universitário, ingressaram na Juventude Universitária Católica (JUC).  
Conforme Becker (2021), no contexto do Serviço Social brasileiro, a JUC continuava  
seu trabalho de militância e formulação teórica (consciência histórica, responsabilidade política  
e transformação social). Discutiam a possibilidade de reformas profundas ou até mesmo uma  
revolução no Brasil, indo além do Governo Federal. O Evangelho era reinterpretado: Cristo,  
além de santo, era um revolucionário, sacrificado por seus ideais de justiça e distribuição de  
riquezas. Devido à necessidade de assumir uma posição política mais livre da Igreja Católica,  
um grupo significativo de militantes, sobretudo no movimento estudantil, criou a Ação  
Popular10 (AP), um movimento independente da Ação Católica. Para Ridenti (1998) a história  
da AP foi marcada pelo seu romantismo revolucionário romantismo entendido como "uma  
crítica da modernidade, isto é, da civilização capitalista moderna, em nome de valores e ideais  
do passado. O romantismo revolucionário se caracterizava por uma busca de instaurar um futuro  
novo, no qual a humanidade estaria guiada por qualidades e valores de comunidade, gratuidade,  
doação, harmonia com a natureza, trabalho como arte, encantamento da vida; apostando numa  
utopia anticapitalista alicerçada no passado. Atrelado a esses aspectos, o romantismo  
834  
8
Para Netto (2015), as bases sociopolíticas que impulsionaram a erosão do Serviço Social tradicional e  
conservador na virada crítica foram: 1) as atividades relacionadas ao Desenvolvimento de Comunidade; 2)  
mudança crítica na Igreja Católica; 3) aproximação com concepções progressistas das ciências sociais; 4)  
Movimento Estudantil articulado as lutas e movimentos sociais da época.  
9 Alves (2022, p. 15) em sua pesquisa sobre as resistências das mulheres do Serviço Social na ditadura aponta que  
foi neste contexto histórico que estudantes, profissionais e/ou docentes de Serviço Social, inseridos na luta política,  
sofreram violações de direitos e violências. Em 1960, houve um amadurecimento da crítica profissional ao  
conservadorismo e seus compromissos de classe, contudo foi reprimida pelo terrorismo do Estado. No período de  
1960-1963 representou, um período de gestação da consciência nacional-popular e de engajamento de amplas  
camadas sociais na luta pelas reformas de estrutura, bem como processos de conscientização e politização de  
operários, camponeses, estudantes e intelectuais (Ammann, 2003).  
10  
A trajetória da Ação Popular (AP), do cristianismo da Ação Católica no final dos anos 50 e início dos 60,  
passando pela influência guevarista, até a adesão ao maoísmo, em 1968, e sua dissolução no início da década de  
80.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 827-847, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Ainda estou aqui”: análise do Ciclo de Memórias do Serviço Social na Ditadura  
revolucionário enfatizava a prática, a ação, a coragem, a disposição, a vontade de  
transformação. A AP no período de 1962-1964 procurou ampliar o seu trabalho de base,  
mantendo sua atuação no segmento estudantil junto com a inserção em trabalhos com operários  
e camponeses, orientação política que favoreceu o contato com experiências educativas  
inspiradas no pensamento de Freire (Closs, et al., 2021)  
Nos anos de 1960 a crítica à universidade e à sua relação com a sociedade era um fator  
determinante para os movimentos estudantis. A agenda política desses movimentos incluía,  
portanto, a necessidade de estabelecer novas relações entre a universidade e a "comunidade".  
Segundo Faleiros (2021), inúmeros estudantes de Serviço Social em diversas cidades brasileiras  
participaram de experiências com círculos de cultura e o método Paulo Freire. Contudo, o golpe  
civil-militar de 1964 resultou na interrupção e criminalização da maioria dessas iniciativas. Um  
exemplo disso é o caso em Ribeirão Preto, onde o proprietário da Faculdade de Serviço Social  
denunciou à Polícia os estudantes envolvidos na organização e mobilização popular, o que  
levou à prisão ou interrogatório deles. A capital carioca se destacou por vivenciar intensos  
movimentos culturais, especialmente através das experiências dos Centros Populares de Cultura  
(CPC) (Berlinck, 1984). O golpe civil-militar de 1964 foi a causa fundamental do fim do CPC  
da UNE, cuja sede foi destruída em 1º de abril. A curta experiência estética e política do CPC  
transformou-o em "mito". Ex-cepecistas tentaram manter a aliança de classes popular-  
revolucionária com o Grupo Opinião, buscando recuperar a dialética forma e conteúdo para  
montar espetáculos engajados, como o "Show Opinião" de 1964. Contudo, essa alternativa foi  
afetada pelo AI-5 (1968) e o endurecimento do regime, além de receber críticas de parte da  
esquerda por manter "representações romantizadas" do "povo engajado" (Chaves, 2021).  
No que concerne ao Serviço Social na cidade do Rio de Janeiro, apesar de sua  
efervescência cultural e estudantil, sua trajetória foi marcada pela intensa atuação do CBCISS,  
o qual, por sua vez, fomentou discussões acerca das vertentes da Modernização Conservadora  
e da Reatualização do Conservadorismo. A seguir, apresenta-se o quadro dos/as depoentes,  
destacando dados referentes ao período de ingresso e conclusão do curso de graduação em  
Serviço Social no Rio de Janeiro:  
835  
Graziela Scheffer; Karla da Silva Apolinario; Sara Beatriz Silva de Oliveira  
Quadro 1 - Apresentação dos sujeitos depoentes no Ciclo de Memórias do Serviço Social na Ditadura.  
Período  
Graduação/Local  
Nome  
Atuação  
Articulação política  
Miriam  
Calvalcanti  
1965-1968  
UERJ  
Estudante/Profissional  
Movimento Estudantil  
1968-1971  
Movimento Estudantil  
PCB/Movimento da  
Reforma Sanitária  
Maria Inês Bravo  
Universidade Gama Assistente Social na saúde  
Filho  
Ana Maria  
Vasconcelos  
1968-1972  
Movimento Estudantil  
Sindicato profissional  
Assistente Social na saúde  
UFF  
1977-1981  
UERJ  
1974-1978  
UNISUAM  
1982-1986  
UERJ  
Estudante/Professor  
UERJ  
Paulo Roberto  
Magali Almeida  
Ney Almeida  
Movimento de bairro  
Movimento  
Negro/CRESS  
Estudante/Profissional  
Estudante/Professor  
Movimento Estudantil  
Fonte: Elaboração própria da equipe de extensão, a partir dos depoimentos coletados em 2025.  
O quadro evidencia que o ingresso no curso de Serviço Social se deu em momentos  
distintos da ditadura, observamos que as três primeiras depoentes (Miriam Cavalcanti, Maria  
Inês Bravo e Ana Maria Vasconcelos) vivenciaram o período dos Atos Institucionais (AI) que  
foram utilizados como ferramenta de controle e centralização do poder. Já em abril de 1964 o  
AI nº 1 suspendeu os direitos políticos e legalizou o que ficou conhecido como “operação  
limpeza”, tendo como alvo possíveis opositores da ditadura nas instituições públicas e  
movimentos sociais, o que se tornou uma constante nos anos seguintes. Esse quadro foi  
agudizado com o AI nº 5, iniciando os “tempos de chumbo”, marcados pela suspensão do  
habeas corpus e pela perseguição violenta sob tutela do Estado. Por meio dos depoimentos,  
podemos verificar a dinâmica de repressão-resistência e a importância do movimento  
estudantil:  
836  
As reuniões eram meio clandestinas (1965), mais ou menos. A gente marcava  
encontro aqui por perto, e íamos subindo as rampas até o local da reunião, e  
às vezes acendendo fósforos. (...) Ajuventude tem uma vantagem, que sempre  
acredita que está imune, mesmo quando tem medo, ela é tão forte. (...) quem  
organizava essas reuniões era o Diretório Central dos Estudantes, a tarefa  
deles era identificar nas faculdades se haviam estudantes de esquerda para  
formar chapas para compor o Diretório (Miriam Cavalcanti, 2024).  
A repressão veio primeiro nas universidades públicas e depois nas  
universidades particulares. (...). Então, naquela época, as universidades  
particulares, Santa Úrsula, PUC-RJ, Gama Filho, tinham certa liberdade. Por  
exemplo, eu cheguei na Gama Filho no início de 68, tinha Centro Acadêmico,  
(...), eles não fecharam nem na PUC e nem na Gama Filho. Os outros Centros  
Acadêmicos estavam fechados nas outras universidades federais. Teve um  
movimento em 1968 muito importante, que contou com uma forte  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 827-847, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Ainda estou aqui”: análise do Ciclo de Memórias do Serviço Social na Ditadura  
mobilização dos estudantes, principalmente os estudantes das federais, que  
tinham fechado seus CEAs e seus DCEs e iam realizar o congresso de Ibiúna  
no segundo semestre de 68 (Maria Inês Bravo, 2024).  
A gente tinha medo de tudo, a gente tinha medo de falar, porque as pessoas  
estavam desaparecendo. A presidente do Centro Acadêmico (UFF),  
desapareceu e a gente não sabe para onde. A gente ia para as passeatas. A  
minha família, não deixava. Aí eu inventava, ia para estágio e ia para as  
passeatas. A gente levava panfleto e era aquela confusão, então a gente  
contestava dentro de sala e fora dela. Todas as pessoas que a gente conhecia  
participavam do movimento estudantil (Ana Maria Vasconcelos, 2024).  
Nas décadas de 1960 e 1970, a juventude assumiu um papel central, tornando-se  
protagonista de movimentos sociais mais impactantes do que os observados nas décadas  
anteriores. Mundialmente, fenômenos como os movimentos de contracultura e as lutas  
estudantis se disseminaram, posicionando a juventude como um agente de contestação radical  
da ordem política, cultural e moral vigente. Nesse cenário, o movimento estudantil ganhou força  
e se politizou intensamente, não apenas no Brasil, mas em escala global, alcançando inclusive  
os regimes socialistas (Menegozzo, 2016).  
Os depoimentos também retratam os efeitos do autoritarismo e violência  
institucionalizada, que, após o golpe civil-militar de abril de 1964, colocaram os estudantes e  
as lideranças estudantis como alvo de grande repressão e na clandestinidade. Por exemplo, a  
UNE, foi posta na ilegalidade e sua sede foi incendiada pelos militares. Também sofreram  
perseguição a União Estadual dos Estudantes (UEE) e os Diretórios Centrais dos Estudantes  
(DCEs) durante todo período ditatorial. Buarque (2008, p. 210) salienta que o golpe de 1964  
surpreendeu estudantes e artistas, desarticulando seus projetos de transformação social por  
confronto de classes. A UNE perdeu apoio e atuou em semiclandestinidade. A agressiva censura  
e outras consequências se impuseram após o Primeiro de Abril (Chaves, 2020).  
837  
As depoentes ressaltam o período de 1968, que foi marcado pela ampla e forte  
mobilização de artistas, intelectuais e estudantes contrários ao regime. Essa mobilização ecoou  
na passeata dos Cem Mil, no Rio de Janeiro, e no Congresso clandestino de Ibiúna, em São  
Paulo, promovido pela UNE, no qual o movimento estudantil do Serviço Social aderiu à tese  
militante da APML (Ação Popular Marxista Leninista). Esse segmento político defendia que o  
foco da formação deveria ser centrado na realidade brasileira e no modo de produção capitalista.  
Igualmente, argumentava na defesa dos direitos dos segmentos atingidos pela repressão militar  
e o compromisso com os trabalhadores (Abramides, 2016).  
Nos relatos destacados acima, com ênfase no de Ana Maria Vasconcelos, identificamos  
a intensa participação dos estudantes na construção das lutas diante de um cenário permeado  
pela contradição entre o medo da repressão e a vontade de enfrentar a bruta realidade posta. Na  
Graziela Scheffer; Karla da Silva Apolinario; Sara Beatriz Silva de Oliveira  
mesma medida em que os estudantes se depararam com o trágico sumiço de companheiros de  
curso e a censura de entidades estudantis, também enxergavam a necessidade de se organizar e  
compor manifestações contra o regime militar. Também podemos observar que a posição crítica  
adotada por muitos estudantes de Serviço Social na época, se expressou em uma composição  
de muitos profissionais alinhados com um enfrentamento massivo ao conservadorismo, que  
tentava e tenta se renovar na categoria. Muitos dos sujeitos que estavam nos centros acadêmicos  
e nas frentes de luta agora são professores, assistentes sociais formados, que compartilham a  
memória viva como ferramenta de luta e resistência.  
Já os três assistentes sociais, Paulo Roberto, Magali Almeida e Ney Almeida,  
concluíram a formação no processo de distensão da ditadura e redemocratização. Para Serra  
(2009), a partir de 1975 houve mudança na profissão no sentido de pôr novas alternativas ao  
trabalho profissional vinculadas à tradição marxista. Também, nesse período, fundou-se os  
cursos de mestrado no Rio de Janeiro e em São Paulo. Tais cursos contribuíram na mudança  
crítica, na ação político-organizativa do Serviço Social. Concomitantemente, este período  
marca o início da crise do regime ditatorial com esgotamento do milagre econômico, que se  
intensificará até 1978. Ou seja, é nesse período que se evidencia na cena pública a retomada  
das lutas democráticas por diferentes movimentos sociais (trabalhadores, negros, mulheres) e  
por pautas que exigem democratização das estruturas institucionais em diversos campos sócio-  
ocupacionais.  
838  
No testemunho do professor Paulo Roberto, tornam-se evidentes indícios dessas  
transformações. Ele narra que, em 1978, a FSS/UERJ foi submetida a uma renovação do seu  
corpo docente e da matriz curricular do curso, o que, em sua análise, sinalizava a perspectiva  
de modernização e também uma convergência com o espectro progressista que se apontava no  
período.  
Além de alguma coisa tradicional, todos eles (os novos professores) já  
utilizavam a literatura da chamada reconceituação, então a gente via muito  
espanhol. O espanhol era uma língua normal da disciplina de todos esses  
professores. Eram produções do CELATS e da editora Humanitas da  
Argentina. [...]. Já se lia alguma coisa de Marx, por meio desses autores. [...]  
o método BH líamos uma edição bem precária, cópia do manuscrito, alguma  
coisa da Leila Lima Santos publicada pelo CELATS (Paulo Roberto, 2023).  
A turma de formandos de 1981, em um gesto de homenagem à cultura e à reflexão  
social, escolheu o nome "Operários em Construção", remetendo ao emblemático poema de  
Vinícius de Moraes. Essa escolha, por si só, carregava um significado de compromisso com a  
transformação e o trabalho contínuo, espelhando talvez a visão que os estudantes tinham de sua  
futura atuação profissional. Para paraninfo a turma elegeu o Professor Vicente Faleiros, uma  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 827-847, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Ainda estou aqui”: análise do Ciclo de Memórias do Serviço Social na Ditadura  
figura certamente influente e respeitada no meio acadêmico, cuja presença endossava o espírito  
e os valores daquela coorte de formandos. Contudo, um dos momentos mais marcantes e  
representativos do clima da época ocorreu durante a cerimônia de formatura. Motivados por  
uma insatisfação com a natureza e o conteúdo do juramento oficial, os estudantes  
empreenderam a elaboração de uma nova versão do texto. Infelizmente, essa manifestação de  
autonomia e pensamento crítico foi abruptamente censurada. O texto alternativo, fruto da  
reflexão coletiva da turma, foi vetado e interrompido pelo vice-diretor quando seria lido  
publicamente. Este episódio não foi um evento isolado, mas sim um reflexo direto e incisivo  
do contexto político e institucional autoritário que permeava a academia naquele período. A  
censura exercida pelo vice-diretor era sintomática de uma estrutura de poder centralizada, na  
qual a autonomia universitária era severamente restringida. O fato de gestores e diretores serem  
nomeados diretamente pelo reitor e não eleitos pela comunidade acadêmica (professores,  
estudantes e técnicos) criava um ambiente onde a lealdade à hierarquia e o controle ideológico  
frequentemente se sobrepunham à liberdade de expressão e ao debate democrático. A  
intervenção na leitura do juramento alternativo serviu como um lembrete vívido das limitações  
impostas à livre manifestação dentro da própria universidade.  
Essa ambiência política de autoritarismo institucional teve um impacto significativo e  
catalisador no movimento estudantil da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). O  
descontentamento acumulado culminou na histórica greve dos estudantes de Serviço Social em  
1982, um marco de resistência dentro da universidade. Essa paralisação não foi um evento  
isolado, mas sim uma resposta direta e contundente às ações de cunho autoritário promovidas  
pela administração da época. A motivação central da greve foi a demissão sumária e  
injustificada de cinco importantes docentes do curso de Serviço Social: Alany Pinto Caldeira,  
Ana Maria de Vasconcelos, Maria Alice Correia, Maria Helena Rauta Ramos e Rose Mary  
Sousa Serra. É crucial destacar o perfil dessas professoras. Todas estavam profundamente  
envolvidas e eram militantes ativas no movimento de renovação crítica que, naquele período,  
se expandia e ganhava força no Serviço Social brasileiro. Essa corrente de pensamento  
propunha uma reorientação da profissão, rompendo com o conservadorismo e adotando uma  
perspectiva mais crítica, engajada e sintonizada com as demandas sociais e a luta por  
redemocratização do país. A demissão delas foi vista, portanto, como uma tentativa de cercear  
o debate e reprimir o pensamento crítico dentro da universidade. A adesão à greve foi ampla,  
demonstrando a solidariedade e o engajamento dos estudantes com a causa da renovação e  
contra o autoritarismo. O professor Ney Luiz de Almeida teve participação ativa e relevante  
nesse movimento grevista estudantil. A greve de 1982 na UERJ se consolidou, assim, como um  
839  
Graziela Scheffer; Karla da Silva Apolinario; Sara Beatriz Silva de Oliveira  
importante episódio de luta pela democratização universitária e pela manutenção da autonomia  
de pensamento no Serviço Social.  
Eu comecei o curso em 1982 com 30 dias de início das aulas, o pessoal do  
centro acadêmico passou nas turmas falando que 5 professoras tinham sido  
demitidas [...] com 30 dias de aula não entendi muito bem, mas aquilo me  
incomodou. [...] E o fato mais marcante, é que um grupo conversou com a  
professora, que era a Ana Jacó, professora de psicologia. Falamos,  
“professora, nós estamos interessados em ir à reunião, aí ela respondeu, “é  
uma questão do curso de vocês, vão pedir autorização?! Vocês precisam  
decidir se vão ou não.” Então nós saímos da aula, em torno de 5 ou 6 alunos,  
a maior parte não saiu. E daí nos envolvemos nesse processo. Mas, 5 dias  
depois da Páscoa, quando a gente volta, a unidade está lacrada, porque o  
diretor já sabendo desse movimento destituiu as professoras e falou que iria  
fazer uma mudança no curso e que precisava de uns dias, contando que iria  
desmobilizar o movimento estudantil. [...]. Tínhamos militantes das frações  
políticas mais atuantes. Com o apoio também muito forte dos centros  
acadêmicos da geologia, da história, da química e alguns estudantes do direito.  
Então, inicialmente deflagramos uma greve por tempo indeterminado,  
tentamos negociar com o diretor, mas não houve acordo, então essa greve se  
estendeu por 35 dias. Foi a primeira greve a parar a UERJ de fato. Essa greve  
acabou tendo condições de retomar o processo de contratação das professoras,  
com exceção de uma, a professora Rose Serra, porque era substituta (Ney L.  
de Almeida, 2023).  
A greve estudantil transbordou os muros institucionais da FSS-UERJ, desencadeando  
mobilizações que levaram a uma greve geral dos estudantes na UERJ em apoio às demandas  
dos discentes do Serviço Social. Além disso, a greve estudantil estreitou seus vínculos com a  
organização sindical da categoria e desencadeou a criação do currículo de 1985, balizado em  
pressupostos teóricos da tradição marxista na formação da FSS-UERJ (Cislaghi; Brandt, 2014).  
Evidencia-se que o contexto político de mobilização pela democratização da universidade e do  
país forjaram o processo de revisão curricular e debate em torno do projeto de formação na  
FSS/UERJ. O depoente afirmou ainda que esse processo político da década de 1980 marcou  
profundamente a forma como as eleições internas são realizadas até o tempo presente na  
unidade, prezando pela paridade e ampla participação, ou seja, transformou-se numa cultura  
política. Essa experiência histórica de mobilização dos estudantes da FSS/UERJ reflete a  
reconstrução institucional do movimento estudantil, que se deu no contexto de uma onda de  
protestos em 1977 e culminou com a refundação da UNE, em 1979. Essa conjuntura permitiu  
ao movimento estudantil alcançar significativa visibilidade e ser reconhecido como uma força  
relevante no processo de abertura política (Menegozzo, 2016).  
840  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 827-847, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Ainda estou aqui”: análise do Ciclo de Memórias do Serviço Social na Ditadura  
O depoimento da Professora Magali Almeida enfatiza o Movimento Negro no Rio de  
Janeiro e a sua participação no Movimento Black Rio, que promoviam bailes dos ritmos  
predominante soul11. Conforme Pedretti (2022, p. 12):  
Não é uma coincidência que os bailes soul tenham surgido na mesma época  
em que nascia o chamado Movimento Negro Contemporâneo, ou dos Anos  
70, que apresentava dois pontos principais em sua agenda: a denúncia, como  
farsa, do mito da “democracia racial” e a construção de uma identidade negra  
positiva, baseada na afirmação da história e da cultura da África e da Diáspora  
Africana, e também na valorização do fenótipo negro. E os bailes soul, com a  
promoção de uma estética afro, deram sua contribuição importante a esse  
processo.  
Conforme o depoimento da professora Magali da Silva Almeida, enquanto mulher negra  
e uma das protagonistas do debate étnico racial, em seus relatos presentes no ciclo podemos  
observar memórias subterrâneas, definidas por Pollak (1989) como as memórias enterradas  
pelos vitoriosos na disputa de narrativas. Ou seja, a partir da dominação capitalista, a memória  
hegemônica promove um apagamento das vivências e lutas das minorias implementando um  
consenso de memória coletiva acerca de momentos históricos, que enterra os grupos sociais  
oprimidos pela coerção no esquecimento. Um exemplo disso é o silêncio disseminado sobre os  
bailes black no Brasil, que surgiram como uma das principais formas de organização negra no  
século XX e despontaram na formação do MNU (Movimento Negro Unificado), ocupando  
papel central como espaço de fortalecimento e reafirmação do que é ser negro, da construção  
da autoestima e carregando o slogan “negro é lindo”.  
841  
Entendemos que a depoente revive sua memória nesses bailes como parte de sua  
formação política, nos é permitido olhar para a história de outra forma, enxergando essa  
manifestação cultural também enquanto manifestação política e teórica do Movimento Negro,  
pois nas palavras dela “a gente lutava, dançava, mas também formulava”.  
Juntamente a esse desenterrar da memória, que nos fornece novos elementos para  
análise da história, o depoimento volta o nosso olhar para o fortalecimento do mito da  
democracia racial durante a ditadura, que como ideologia impregnada na sociedade, também se  
fez presente nos movimentos sociais e no Serviço Social. Ela relata como um momento em que  
os avanços travados no campo teórico no que diz respeito à questão étnico racial, foram  
cessados pela censura, perseguição de pesquisadores e movimentos que levantaram o debate  
nas ciências sociais, trazendo o exemplo de Clóvis Moura e a perseguição policial sofrida pelo  
autor, que tinha o racismo e o escravismo enquanto categorias centrais da sua obra. Além disso,  
11  
O surgimento do soul vincula-se ao milagre econômico e ao avanço da chamada indústria cultural. Os bailes  
ganharam destaque e passaram a chamar atenção das gravadoras, que logo perceberam o potencial comercial  
daquele público de milhares de jovens (Pedretti, 2022).  
Graziela Scheffer; Karla da Silva Apolinario; Sara Beatriz Silva de Oliveira  
no que diz respeito à construção teórica da professora, foi relatado acerca das leituras  
clandestinas que ela teve contato durante a graduação, visto que não se falava abertamente sobre  
reconceituação e movimentos sociais em sua universidade.  
Para Magali Almeida (2024), “a ditadura fez um estrago ao impedir de lembrar quem  
somos nós” enquanto povo negro, o que ao mesmo tempo que dificultou a organização da luta  
coletiva, fez gritar a necessidade de construção de um movimento negro unificado, concretizado  
nos anos 1980. O efervescer dessa organização trouxe mudanças diretas para o Serviço Social,  
que passava pelo seu momento de renovação crítica no Brasil. Das contribuições identificadas  
no ciclo, podemos pontuar a movimentação pela integração da categoria na organização da  
marcha contra a farsa da abolição, em que Magali atuou na posição de coordenadora do CRAS  
(Conselho Regional de Assistentes Sociais), atual CRESS. Além disso, tem-se o início de um  
coletivo negro no Serviço Social, fomentado principalmente no eixo Rio-São Paulo, em que  
Magali e outras assistentes sociais negras fomentaram a publicação de artigos debatendo o  
racismo.  
Ainda é interessante observar a importância da cultura para os depoentes, vejamos  
alguns exemplos ilustrativos:  
[...]. Diante desse processo de ofensiva moral, intelectual que o racismo  
propõe, eu acho que a classe trabalhadora -que o Clóvis Moura vai falar disso-  
, o que resta para nós é a cultura. Acultura é quem vai nos alimentar a memória  
de referências positivas, de beleza. Eu trouxe essa foto dos anos 70, que  
mesmo a ditadura matando, a galera dançava, e dançava muito (Magali  
Almeida, 2024).  
842  
Na faculdade, no primeiro ano que entramos, tínhamos uma fantasia, muito  
inspirada no que eram nos filmes americanos, como no filme “Juventude  
Transviada12”, tinha-se essa ideia, o que podia parecer ser meio estranho  
estando numa Ditadura (Miriam Cavalcante, 2024).  
Olha aqui, quer dizer, em outubro, você tem o Congresso de Ibiúna. Em  
setembro, você tem o Festival da Canção13. Esse festival, o terceiro, foi o mais  
importante na época. Porque os festivais foram importantes, foram todos eles,  
quer dizer, Gil, Caetano, Chico, Edu Lobo, enfim. Então, todos esses foram  
fundamentais e cresceram, e apareceram. Realmente, foi fundamental para os  
festivais (Maria Inês Bravo, 2024).  
12  
O filme aborda a busca por identidade e o confronto com as normas sociais, ele se tornou um símbolo da  
adolescência e da rebeldia, além disso, o protagonista representa a frustração e o questionamento dos jovens em  
relação às figuras de autoridade, como seus pais.  
13 O Festival Internacional da Canção (FIC), promovido pela TV Globo de 1966 a 1972, teve seu evento de 1968  
(III FIC) como crucial para a MPB. Além de lançar artistas e obras, esse festival refletiu a complexa situação  
política e cultural do país, destacando-se o lançamento de "Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores", de Geraldo  
Vandré, hino da juventude contra a ditadura.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 827-847, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Ainda estou aqui”: análise do Ciclo de Memórias do Serviço Social na Ditadura  
música (Ney Almeida, 2023).  
Com base nos relatos dos/as depoentes, observamos a ocorrência de um processo de  
radicalização da cultura ao longo das diferentes conjunturas, conforme a análise de Acosta  
(2008), que considera a "cultura radical" resultante da articulação entre a ascensão da classe  
operária e as posições de outras camadas sociais, como as classes médias e os intelectuais. Estes  
últimos são cruciais como mediadores para a consolidação do "bloco histórico". Paralelamente,  
as transformações técnico-materiais na produção industrial, impulsionadas pela  
financeirização, reconfiguraram as relações entre trabalho manual e intelectual na geração de  
valor, o que, por sua vez, redefiniu as relações entre as esferas econômica e político-cultural.  
Além disso, Acosta (2008) salienta que, no Serviço Social, seus desdobramentos se  
manifestaram na renovação profissional como uma refração na cultura profissional. Este  
processo vincula-se à luta da classe trabalhadora pela direção intelectual e moral do conjunto  
da sociedade, angariando a adesão das camadas médias para seu campo e, com elas, a dos  
intelectuais. Ademais, essa manifestação na renovação profissional assumiu suas formas mais  
radicalizadas na América Latina sob a denominação de Movimento de Reconceituação.  
Segundo Duriguetto et al. (2021), o "Método de BH" (1969-1975) na Escola de Serviço  
Social de Belo Horizonte, ligado à Reconceituação, baseou-se na resistência à ditadura,  
alinhando o Serviço Social aos interesses das classes subalternas. Devido às condições  
ditatoriais e correlação de forças desfavorável, a experiência mineira permaneceu isolada e  
minoritária, sendo resgatada no final dos anos de 1970, com a reinserção do movimento das  
classes trabalhadoras.  
843  
Em suma, os depoimentos analisados, abrangendo diversos períodos e militâncias  
políticas, evidenciaram a dinâmica de repressão e resistência característica do período da  
ditadura. Destaca-se a importância da organização estudantil como elemento articulador com  
as lutas pela democracia e na formação profissional em um sentido mais amplo. Conclui-se que,  
apesar das contradições de realidade imporem limites aos indivíduos, elas também fornecem os  
recursos necessários para o avanço das lutas sociais.  
Tempo rei”: considerações finais  
Não me iludo  
Tudo permanecerá do jeito  
Que tem sido  
Transcorrendo  
Transformando  
Tempo e espaço navegando todos os sentidos  
(Tempo Rei Gilberto Gil, 1983)  
Graziela Scheffer; Karla da Silva Apolinario; Sara Beatriz Silva de Oliveira  
A análise dos depoimentos permitiu constatar a relevância da militância estudantil na  
formação política dos assistentes sociais. O movimento estudantil, ao se configurar como um  
elo entre as lutas democráticas e a comunidade universitária, deflagrou um intenso processo de  
politização na formação profissional com refrações no exercício profissional. Tal politização  
manifestava-se na denúncia da violência e da censura estatal, bem como na atenção às  
demandas das classes trabalhadoras. Os relatos evidenciam uma juventude engajada em  
diversas frentes de lutas, incluindo entidades estudantis, o movimento negro e movimentos  
culturais.  
Nos depoimentos de Miriam Cavalcante (2024) e Ana Maria Vasconcelos (2024),  
observamos o enfrentamento da clandestinidade por jovens que integravam espaços de  
organização e reuniões da juventude de esquerda. Em meio à repressão, estes se sentiam aptos  
a formular proposições e empreender lutas coletivas, reiterando a relevância das entidades  
estudantis na articulação da organização da classe trabalhadora no âmbito universitário, sendo  
a disputa pelo Diretório Central dos Estudantes o principal foco.  
Já na apresentação pública de Maria Inês Bravo (2024), por sua vez, ressalta-se a  
importância da articulação latino-americana no período em que o Serviço Social passava pelo  
Movimento de Reconceituação. Enquanto estudante e, posteriormente, assistente social e  
docente, Bravo dedicou-se à participação em instâncias como conselhos universitários, reuniões  
e congressos da categoria. Outro ponto relevante em suas manifestações é a distinção na forma  
como a ditadura se manifestou nas universidades públicas em comparação com as universidades  
privadas (exemplificando sua faculdade situada na Universidade Gama Filho), indicando que  
dinâmicas distintas de repressão e resistência, consequentemente, repercutindo na organização  
das lutas democráticas, ocorreu primeiramente nas instituições públicas. O depoimento da  
professora Magali Almeida (2024) resgatou memórias de sua juventude enquanto estudante  
negra que sentiu a repressão e resistiu à censura se movendo contra o que era estabelecido como  
lugar do negro a partir do mito da democracia racial. Os bailes blacks foram destacados como  
espaços de formação e resistência, construindo parte do seu arcabouço político para  
posteriormente ocupar espaços deliberativos da profissão, como o (CRESS), levando a  
discussão das relações étnico raciais no momento de redemocratização.  
844  
Finalmente, nos relatos dos ex-alunos da UERJ e, posteriormente, docentes, Paulo  
Roberto (2023) e Ney Almeida (2023), é possível constatar a aproximação do Serviço Social  
da unidade com o arcabouço teórico que fundamentou a renovação crítica da profissão. Tais  
depoimentos permitiram a análise de elementos que compõem o contexto da greve de 1982 e a  
dimensão da luta estudantil na FSS-UERJ, que vivenciou a demissão e perseguição de diversos  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 827-847, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Ainda estou aqui”: análise do Ciclo de Memórias do Serviço Social na Ditadura  
estudantes e professores durante a distensão democrática na década de 1980, evidenciando que  
a resposta discente se baseou na organização coletiva e no diálogo do Serviço Social com outras  
unidades curriculares da universidade.  
Analisando os relatos, observamos que o compartilhamento da memória por parte dos  
entrevistados estabeleceu uma importante relação dialética entre passado e presente, visto que  
ao realizarem a reflexão sobre esse fio temporal de onde vieram, até o momento e espaços que  
compõem agora, permitiram uma visualização dos ouvintes sobre elementos que constituem a  
posição crítica da categoria até os dias atuais. De forma geral, fica elucidado os desafios vividos  
pelo Serviço Social frente a efervescência dos movimentos sociais e lutas coletivas,  
demonstrando que, apesar dos desafios, a escolha desses estudantes por pautarem o  
enfrentamento ao regime nos permitiu, durante a construção deste projeto, ter o contato com  
relatos de profissionais que assumiram um compromisso com o lado crítico da história.  
Entre os resultados alcançados pelo projeto, temos as contribuições no adensamento do  
ensino em Fundamentos Históricos Metodológicos do Serviço Social, utilizando a memória  
profissional enquanto um recurso pedagógico de sensibilização da consciência histórica junto  
à comunidade acadêmica. Nesse processo, os discentes envolvidos com o projeto puderam ter  
um contato direto com relatos que ultrapassam os limites das salas de aula, proporcionando uma  
experiência dialética importante para formação, que despertou o interesse sobre a temática,  
tanto dos fundamentos, quando da memória, se tornando objeto de pesquisa de alunos  
envolvidos.  
845  
Além disso, a experiência com o tratamento da memória também foi uma importante  
capacitação trazida pelo ciclo de debates, que em todos os momentos de coleta de relatos, tornou  
a exposição coletiva e aberta ao público, possibilitando que a extensão fizesse seu papel de  
contato entre a universidade e a sociedade civil, buscando fomentar uma “UERJ sem muros”.  
Por fim, em tempos de ascensão do conservadorismo e tentativas constantes da extrema  
direita de construir uma narrativa favorável aos horrores da ditadura, espaços como o ciclo de  
debates reafirmam o enfrentamento crítico assumido pelo serviço social e pelas universidades  
públicas. A memória é ferramenta fundamental para construção da história e ao valorizar a  
memória oral enquanto instrumento de análise, temos como resultado a materialização do  
legado de luta de assistentes sociais que vivenciaram ativamente esse momento chave para toda  
categoria.  
Graziela Scheffer; Karla da Silva Apolinario; Sara Beatriz Silva de Oliveira  
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Ideología y ciencia en el interior de las  
relaciones de producción capitalistas  
Ideology and science within capitalist relations of production  
Álvaro Laine Menéndez*  
Resumo: En el presente trabajo nos  
proponemos realizar una serie de reflexiones  
que orbitan en torno al concepto de ideología,  
esto es, en torno a sus causas, su papel y función  
en una sociedad (particularmente en nuestra  
sociedad capitalista) y la posibilidad de  
oponerle algo así como un conocimiento libre  
de ideología, si es que esto puede llegar a  
tematizarse de algún modo. Para ello,  
realizaremos un diálogo con algunos de los  
autores brasileiros más relevantes, así como de  
ámbito internacional, que han abordado este  
campo, con el fin extraer algunas conclusiones  
relevantes.  
Abstract: In this paper we propose to carry out  
a series of reflections that orbit around the  
concept of ideology, that is, around its causes,  
its role and function in a society (particularly in  
our capitalist society) and the possibility of  
opposing it to something like ideology-free  
knowledge, if this can be thematised in any way.  
To this end, we will engage in a dialogue with  
some of the most relevant Brazilian and  
international authors who have addressed this  
field, in order to draw some relevant  
conclusions.  
Palavras-chaves: Ideología; ciencia; sentido  
Keywords: Ideology; science; common sense;  
común; método.  
method.  
Introducción  
Sobre el concepto de ideología se han escrito ríos de tinta desde interpretaciones muy  
diversas1. Arriesgándonos a un cierto reduccionismo por nuestra parte, quizás podrían señalarse  
dos posturas límite a la hora de abordar la cuestión, tal como señala Godelier (1989): por un  
lado, aquella que trata la ideología como un conjunto de representaciones en nuestra consciencia  
de relaciones sociales levantadas bajo un modo de producción determinado; por otro, aquella  
que focaliza en el contenido exclusivo de las ideas, partiendo de ellas y moviéndose en ellas, al  
configurar éstas las realidades sociales.  
* Universidade Federal do Espírito Santo. E-mail: alvaro_laine@hotmail.com  
1 Konder (2002), por ejemplo, aborda el tema a través del distinto significado que llega a adoptar el concepto de  
ideología según una buena cantidad de autores.  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.47392  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 10/02/2025  
Aprovado em: 22/09/2025  
Ideología y ciencia en el interior de las relaciones de producción capitalistas  
Insistiendo un poco más en esta caricatura, podríamos identificar la segunda postura con  
una posición idealista2, la cual rechazamos desde el principio, motivo por el cual no será objeto  
de análisis en las siguientes páginas. La primera, sin embargo, que podríamos caracterizar como  
una posición materialista3, pensamos que se mueve en una vía interesante para reflexionar sobre  
el sentido de las palabras siguientes: que lo ideal se constituya como cierto reflejo de lo real.  
¿Qué quiere decir esto? ¿Ocuparía aquí algún papel una especie de ilusión? En caso afirmativo,  
¿por qué habría de producirse tal ilusión y mediante qué mecanismos? ¿Es un problema  
enraizado en una marco histórico-social concreto o también atiende a un componente  
epistemológico/gnoseológico? Por otro lado, ¿qué tipo de representación se refleja en la  
conciencia a partir de una realidad social existente?  
Estas son algunas de las preguntas que queremos tratar de contestar en las siguientes  
páginas a partir de algunos de los autores más relevantes que han tratado esta cuestión, lo cual  
se abordará en el segundo apartado. En el siguiente (tercero), se introducirá un marco de  
carácter gnoseológico para el análisis de la ideología, con el fin de discutir su relevancia a partir  
del modo de conectar consciencia (interior del ser humano) y relaciones sociales (exterior del  
ser humano). Lo que trataremos de hacer, por tanto, será abrir un diálogo con algunas de las  
lecturas más relevantes sobre el tema de la ideología en el campo de las ciencias sociales. Por  
último, se apuntan algunas conclusiones que extraemos de dicho análisis.  
849  
Ideología como representación en la conciencia de relaciones sociales de  
producción  
Para explicar la ideología como representación en la conciencia de relaciones sociales  
que se sitúan a la base de una sociedad determinada y, en particular, referido al marco de la  
sociedad capitalista, en donde las “consecuencias estructurales” de la mercancía “influencian  
decisivamente todas las manifestaciones de la vida” (Lukács, 2003, p. 7), normalmente se hace  
referencia al uso de una metáfora usada por Marx en la que distingue una estructura  
(Grundlage) de una superestructura (Überbau). Con ella, suele plantearse el hecho de que, sobre  
la base económica de una sociedad regida por unas relaciones sociales de producción  
particulares y un desarrollo determinado de las fuerzas productivas, se levanta una  
superestructura que, en última instancia, opera como perpetuador de dichas relaciones sociales.  
2
El asunto es, sin embargo, más complejo. El idealismo no puede reducirse a un supuesto punto de partida que  
comienza en las ideas y en contraste con un materialismo que parte de la realidad concreta. El problema, según  
nuestro punto de vista, está en el método que se sigue a partir de una primera representación inmediata que es la  
misma para todos. Más adelante se ofrecen algunos apuntes sobre esto. Véase, por ejemplo, Liria (2019).  
3
“Las representaciones que constituyen nuestra conciencia son la expresión, en el ámbito de las ideas, de las  
relaciones que establecemos entre nosotros para producir socialmente nuestra existencia” (Iasi, 2017, p. 89).  
Álvaro Laine Menéndez  
Se trataría de saber, por tanto, cómo se produce este juego ideológico por el cual individuos  
explotados (pues se trata siempre de sociedades divididas en clases4) aceptan más o menos  
sumisamente tales condiciones sociales basadas en la violencia. Para ello, el primer concepto  
clave es el de alienación5.  
Dicho de otro modo, si existe ideología en una sociedad particular es porque  
previamente existe alienación. ¿Pero a qué se hace referencia con este concepto? Según Netto,  
tres son las principales líneas de interpretación que lo tematizan:  
La primera supone que la alienación es un fenómeno que se manifiesta  
exclusivamente en las sociedades de clases (...). La segunda posición  
[constata] que no basta con suprimir las causas iniciales del fenómeno para  
extirparlo de la vida social (...) y que, por tanto, es imposible suponer su  
eliminación. (...) Finalmente, la tercera posición [que defiende el autor] parte  
de una rigurosa determinación económico-social del fenómeno (que parte de  
la división social del trabajo y de la propiedad privada) pero concentra su  
atención en las consecuencias de la alienación [configurando] estructuras de  
comportamiento históricamente muy resistentes (Netto, 1981, p. 34-35).  
De las tres, la más interesante, también para nosotros, es la tercera. En este caso, como  
nos dice, la causa de la alienación partiría de una determinación económico-social, la cual se  
deriva del hecho de que exista una división del trabajo con apropiación privada de los medios  
de producción y, con ello, del excedente. Pero, de alguna forma, sus consecuencias van más  
allá de esa determinación apuntada, pues ella misma, la alienación, se desdobla en estructuras  
de comportamiento que, además, son muy resistentes al tiempo. Es decir, que, en definitiva,  
aunque se acabara con la existencia de las clases, no por ello inmediatamente desaparecería el  
problema de la alienación. Por el contrario, aparecería un largo período de transición que  
debería ir eliminándolo progresivamente6. Pero, es cierto, lo importante es que tras ese gran  
esfuerzo revolucionario contra las sociedades de clases (y en particular contra la sociedad  
capitalista) y tras una más o menos prolongada fase de transición socialista hacia una sociedad  
sin clases, parece que podría llegarse a una situación hipotética en la que dejara de operar la  
alienación y, estirando del hilo, libre de ideología.  
850  
Para arrojar más luz sobre este concepto, sin embargo, debemos introducir otro  
elemento. Como bien apunta Iasi (1999), cuando hablamos de alienación en los individuos y,  
4 “El origen remoto de la ideología se encuentra, pues, en la división social del trabajo o, dicho de otro modo, en  
la propiedad privada” (Konder, 2002, p. 41).  
5 “Nuestra hipótesis es que Marx y Engels llegan a la cuestión particular de la ideología dentro de una discusión  
más general, rica y profunda, sobre la alienación” (Iasi, 2017, p. 87).  
6 En un interesantísimo libro del economista ruso Evgueni Preobrazhensky, escrito en 1922, en donde realiza una  
ficción sobre el futuro de una rusa revolucionaria victoriosa tras los episodios de 1917, es interesante notar cómo  
el autor, a parte de la rigurosidad económica, tiene en cuenta justamente este elemento cuando expone la dificultad  
en las sucesivas generaciones para progresar hacia una sociedad más libre de los componentes ideológicos propios  
de sociedades de clases (Preobrazhensky, 1976).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 848-861, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Ideología y ciencia en el interior de las relaciones de producción capitalistas  
con ello, de ideología, de alguna forma todo se juega al nivel de la conciencia. Pero no porque  
se parta de las ideas en sí mismas para explicarlo (pues en este caso nos situaríamos en la línea  
idealista rechazada ya en el comienzo), sino porque como representaciones extraídas de  
determinados fenómenos del mundo, toda la realidad se presenta en la consciencia, como ya  
dijimos7. En este mismo sentido afirmó Gramsci (1970, p. 6) que “todos los hombres son  
filósofos”, refiriéndose a la existencia de una filosofía espontánea que es propia de todo ser  
humano, que se transmite mediante todos los sistemas de creencias (el floklore de la sociedad)  
y por el lenguaje mismo, mediante conceptos y nociones comunes. Este proceso, al que está  
clavado todo ser humano desde que nace en el seno de una sociedad8 es, sobre todo,  
inconsciente (no en el sentido de que no se produzca en la consciencia, más allá o más acá de  
ella, sino de no ser apenas perceptible para el individuo) y su producto es una especie de sentido  
común (Gramsci, 1970), algo así como un agregado caótico de concepciones entremezcladas y  
confusas:  
Predominam no senso comum os elementos realistas, materialistas, isto é, o  
produtoimediato da sensação bruta (...) estes elementos são supersticiosos,  
acríticos. (...) ele confirma estes elementos acríticos, graças aos quais o senso  
comum é ainda ptolemaico, antropomórfico, antropocêntrico, ao invés de  
criticá-los cientificamente (Gramsci, 2015, p.10).  
De forma similar, también Althusser denominó a todo ese conjunto de evidencias,  
representaciones e imágenes con el término de macizo ideológico, el cual, si bien es  
imprescindible para que el ser humano se reconozca en el seno de una sociedad, al mismo  
tiempo esconde su verdadera realidad, denominada por él como estructural (Althusser; Balibar,  
1970). Y ya sea que nos refiramos a tal sentido común en términos gramscianos o a este otro  
término, lo cierto es que ambos hacen referencia, en definitiva, al punto de partida para todo  
conocimiento de cualquier ser humano que llega al mundo; en concreto, que llega-nace siempre  
en una sociedad ya constituida.  
851  
Así, es imposible imaginar a un individuo sin consciencia (Iasi, 1999). De alguna forma,  
ésta parte siempre de ese sentido común que nos describe Gramsci, o, como lo formula Heller  
(2000), de nuestra vida cotidiana, pues una y otra, sentido común (o macizo ideológico) y vida  
cotidiana, como veremos, se corresponden. Aquí, en la vida cotidiana, es precisamente donde  
7
“La conciencia sería el proceso de representación mental (subjetiva) de una realidad concreta (objetiva) (...) a  
través de su vínculo de inserción inmediata (percepción). En otras palabras, una realidad externa que se interioriza.  
(...) La materialidad de este movimiento [debe buscarse] en el hecho de que la conciencia se genera a partir de y  
por medio de las relaciones concretas entre los seres humanos, y entre los seres humanos y la naturaleza” (Iasi,  
1999, p.17).  
8 Eso es tan cierto que, de hecho, para la Antropología este proceso es básicamente la clave a la hora de estudiar  
las diferentes sociedades que han existido y existen en nuestro planeta. Aquí, sin embargo, lo denominan proceso  
de enculturación (Kottak, 2003).  
Álvaro Laine Menéndez  
reina aquel mundo de nociones comunes. Iasi (1999), de hecho, mediante la definición de tres  
formas de consciencia, relaciona la primera a ese primer contacto de los individuos con su  
realidad, esto es, con su vida cotidiana, la cual abre la posibilidad de la alienación y la ideología  
entre los individuos cuando se levanta, como ya hemos visto en la interpretación de los autores  
citados, sobre relaciones de clase9.  
Alcanzamos así un punto paradójico, pues si por un lado es en la vida cotidiana donde  
nos reconocemos como seres humanos, al mismo tiempo aquí se levanta un obstáculo para el  
conocimiento. Porque, de hecho, como se destaca en varias de las lecturas citadas, al  
reconocernos como humanos en esa primera forma de consciencia, en realidad nos estamos  
reconociendo como especie de una determinada sociedad, particular, histórica; jamás sobre algo  
así como la humanidad en general (Heller, 2000; Iasi, 1999).  
Para poder percibir esto último, deberíamos avanzar hacia las siguientes formas de  
consciencia que propone Iasi (1999), lo que por otro lado no resulta nada fácil. Este proceso de  
naturalizar o eternizar lo particular es la base de la alienación. Sobre ella la ideología actúa con  
el fin de preservar la estructura social determinada que está en funcionamiento. Y, como ya  
hemos visto, esto ocurre en sociedades divididas en clases, en las que un grupo domina las  
relaciones sociales de producción y se apropia del excedente, lo que lleva a pensar que, en  
última instancia, la función de la ideología es la de legitimar el orden existente, un orden de  
explotación de una clase sobre otra u otras. Este es el punto de llegada general de las  
interpretaciones que venimos exponiendo.  
852  
Ahora bien, llegados aquí cabe preguntarse lo siguiente: estas representaciones de las  
relaciones sociales de dominación que tienen por fin legitimarlas, ¿son producto de una  
deformación ideal de la realidad, de una ilusión, algo así como una falsa consciencia?  
Respondiendo directamente, podemos afirmar que sólo en cierta medida sí, pues, como señala,  
por ejemplo, Eagleton (1997), si hablamos de un sentido ilusorio no podemos referirnos a éste  
como sinónimo de falso. Antes bien, las apariencias que capta la primera forma de consciencia  
son, en realidad, muy reales, como por otra parte insiste también Lukács (2003). ¿Por qué? ¿En  
qué sentido podemos hablar de ilusorio sin que por ello nos refiramos a falsa consciencia? De  
hecho, porque lo que se produce ante nosotros es algo así como una inversión10, es decir, una  
especie de desfase entre la realidad efectiva y su forma de manifestación, cuyo resultado es un  
9
“En el nivel del sentido común, la alienación se trata como un estadio de la no-conciencia. Tras este análisis  
preliminar, nos damos cuenta de que es la manifestación inicial de la conciencia. Esta forma será la base, el terreno  
fértil, donde se plantará la ideología como forma de dominación” (Iasi, 1999, p. 23).  
10 “El Estado, como la ideología, tiene un aspecto de inversión; sin embargo, la imagen invertida sigue siendo la  
imagen de una objetividad” (Iasi, 2011, p. 52).  
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Ideología y ciencia en el interior de las relaciones de producción capitalistas  
juego de formas de apariencia que se hacen pasar por lo real mismo (San Miguel, 2018). Si esto  
es así, entonces, es claro que cuando nos referimos a una ilusión no podemos hablar de falsa  
consciencia.  
Concretamente, refiriéndonos a la realidad social capitalista, con la forma de  
intercambio regida por la mercancía, entre los seres humanos se produce a cada instante una  
realidad que les es extraña, la cual se muestra como inversión de una realidad efectiva que  
permanece oculta. En concreto, en tanto que la forma mercantil capitalista –vale decir, la forma  
mercantil más exacerbada, en donde hasta la fuerza de trabajo se torna mercancía–, en tanto  
que esta forma societaria produce una inversión y, con ello, un ocultamiento de sus relaciones  
sociales efectivas, el término preciso para tematizarlo sería el de fetichismo, con la  
correspondiente reificación o cosificación de dichas relaciones sociales (Netto, 1981).  
En resumen, llegados a este punto, tendríamos entonces lo siguiente: que en el interior  
de nuestra sociedad moderna, en la que domina el modo de producción capitalista, sobre la base  
general de la alienación se levanta toda una realidad-ficción fetichizada, provocada por la forma  
mercancía, todo ello a través de una inversión que precisamente oculta la realidad efectiva, cuyo  
fin es, en última instancia, en tanto que sociedad dividida en clases, legitimar las relaciones de  
dominación de la clase dominante sobre las dominadas. Ahora bien, con todo lo planteado hasta  
aquí se nos impone preguntarnos por lo siguiente: ¿Bastaría entonces la superación de la  
división de clases, del Estado, del Derecho, etc., para acabar con la ideología? ¿Podría existir  
algo así como un espacio no ideológico? Porque, como plantea Zizek (1996), ¿desde dónde  
podemos estar seguros de no caer bajo las garras de la ideología? ¿Hay alguna forma de escapar  
a ella?  
853  
Ideología y ciencia: El problema del método  
Concordamos, en líneas generales, con todo lo apuntado hasta aquí a partir de los autores  
citados. Sin embargo, consideramos que aún hace falta examinar un componente de carácter  
gnoseológico/epistemológico, referido al método de conocimiento, generalizable en tanto que  
concerniente al ser humano y a su manera de conocer. Esto no significa que enfrentemos esto  
último a los aportes anteriores, sino que, además de la importancia del componente histórico-  
social ya discutido colocado a la base de toda sociedadpensamos que tiene lugar un problema  
añadido de carácter epistemológico que ha de desarrollarse con mayor profundidad. Para tratar  
de explicar esto, la oposición entre ciencia e ideología como métodos de conocimiento nos  
puede abrir un camino fructífero.  
Álvaro Laine Menéndez  
Para ello, consideramos oportuno desarrollar de manera más elaborada una cuestión  
gnoseológica/epistemológica a la hora de tratar con el concepto de ideología, en tanto que ésta  
implica una doble relación: de un lado con el conocimiento, de otro con la sociedad (Althusser,  
1967). Como ambos elementos están interconectados, el resultado es que la relación ideología  
- sociedad no puede ser comprendida sin la relación ideología - conocimiento, lo que nos coloca  
en el punto de un análisis gnoseológico/epistemológico sobre el cual se levanta la problemática  
de la ideología: es decir, con el método de conocimiento.  
Nótese que la interpretación común de la mayor parte de los textos hasta aquí citados  
parece situar el núcleo central de la ideología en torno a la existencia de la división de clases  
(ver, por ejemplo, Zizek (1996), quien a nuestro modo de ver lo expone claramente); para  
nosotros, que no negamos la importancia de este concepto y que concordamos en situarlo sobre  
la base de la problemática de la ideología, nos parece que, además, debe atenderse a dicha  
componente gnoseológica para comprender en su totalidad cómo es posible que, dada una  
sociedad dividida en clases, una de ellas consiga imponer su dominio mediante el revestimiento  
de la legitimidad11.  
De alguna forma queremos afirmar que lo que separa a la ideología de lo no ideológico  
es, desde esta perspectiva, una cuestión de método de conocimiento, si bien sobre esta actúan,  
a su vez y como base, los componentes sociales ya apuntados en el punto anterior: en concreto,  
la hegemonía que una clase impone sobre otra(s), la cual limita toda posible salida sin una  
práctica política que trate de combatirla, como bien se puede deducir de Gramsci. En este  
sentido, evidentemente no es posible una vía de liberación ideológica (o de combate efectivo a  
la misma) exclusivamente sobre el campo de las ideas, como rechazamos desde el inicio.  
A la vez, la lucha política contra la estructura social de clases, y por ende contra la  
ideología que la sustenta, no puede triunfar sin un desarrollo correspondiente al nivel del  
método: es decir, de la práctica científica. Dicho de otro modo, sin esto último, esto es,  
únicamente mediante la lucha política y revolucionaria que consiguiera alzar una futura  
sociedad sin clases, por sí sola sería estéril para acabar con la ideología si en su seno no contiene  
un desarrollo en el campo de la ciencia (del método)12. Rápidamente una nueva dominación de  
una clase sobre otra(s) lograría imponerse sobre la base de la ideología «resistente».  
854  
11  
Netto (1981), como se vio más arriba, separa entre tres posiciones diferentes de alienación y adopta la más  
compleja, aquella en la que la ideología se desdobla en “estructuras de comportamiento muy resistentes” (Netto,  
1981, p. 34-35) que van más allá de las determinaciones económico-sociales. Hace falta, según nuestra  
interpretación, tematizar con mayor profundidad las causas de dicha resistencia.  
12 Así como tampoco resulta fácil pensar cómo una lucha revolucionaria podría tener éxito sin un progreso en el  
campo de la práctica teórica/científica.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 848-861, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Ideología y ciencia en el interior de las relaciones de producción capitalistas  
Lo que queremos decir es que, si bien este proceso, esto es, la lucha política, coloca las  
bases para reducir aquel ocultamiento exacerbado que la mercancía (como relación social)  
provoca hoy, todavía y siempre haría falta la práctica teórica (la práctica científica) para  
cualquier progreso futuro en tal sentido, incluso después del triunfo de una revolución. Si bien  
la suposición de una sociedad sin clases facilitaría mucho la reducción del fetichismo y de la  
alienación y, por lo mismo, de la ideología, a la vez han de revelarse los medios epistemológicos  
concretos por medio de los cuales esa posibilidad abierta en el terreno político y social puede  
materializarse.  
Las representaciones de la ideología se refieren al mundo en el que los seres humanos  
viven, en donde se encuentran frente a todo un conjunto de elementos sociales y naturales  
(Althusser, 1967; Godelier, 1989). Si tales representaciones coincidiesen con esas  
determinaciones de la naturaleza y de la sociedad, entonces, como ya advirtió Marx, no sería  
necesaria la práctica científica13. Sin embargo, si hablamos de ideología es porque entre la  
realidad y la representación, como hemos visto, aparece una especia de ilusión que, si bien es  
el producto de una deformación (inversión) de lo que sería la realidad efectiva, sin embargo, no  
puede tratarse como falsa, no hay una falsa conciencia, sino una objetivación de una realidad  
invertida.  
En tal caso, incluso en las llamadas sociedades primitivas sin clases podríamos constatar  
esa ilusión, mistificación o inversión, germen de la ideología. Pensamos que no es casualidad  
que Marx se refiriera a la religión como primera forma general de ideología (Marx, 2009b), la  
cual no puede ser un simple efecto o epifenómeno de la existencia de división entre clases, pues  
el ser humano siempre ha estado rezando desde que es humano, como podría constatar cualquier  
antropólogo (Godelier, 1989; Graeber, 2014). En este sentido, si aceptamos que han existido o  
existen sociedades sin clases no podemos, sin embargo, afirmar que éstas no se levantaran sobre  
creencias míticas, cuya función es también la de asegurar la cohesión entre los individuos y  
entre éstos y su medio (Althusser, 1967); es decir, cuya función es también ideológica, pues,  
aunque no hablásemos de clases como tal, en tales sociedades primitivas siempre ha habido  
jerarquías que podían ser muy desiguales: por ejemplo, la de los ancestros sobre la propia  
sociedad o simplemente una dominación patriarcal.  
855  
En realidad, sobre la base de aquella distinción metafórica de Marx entre infraestructura  
(Grundlage) y superestructura (Überbau), se esconde una interpretación simplificadora, la cual  
trata los elementos que se corresponderían con la parte superestructural como simples  
13 “(…) toda ciencia sería superflua si la forma de manifestación y la esencia de las cosas coincidiese directamente”  
(Marx, 2009a, p. 1041).  
Álvaro Laine Menéndez  
epifenómenos de la infraestructura. Esto es, aquella postura que considera todo carácter  
ideológico y cultural como producto directo de una infraestructura económica. Siendo así,  
bastaría cambiar ésta para acabar con el carácter ideológico que le corresponde, y en esta  
especie de ley histórica, como afirma Lukács (2003), el protagonismo hoy le cabe a la clase  
proletaria, cuya esencia intrínseca no sería ideológica. Así, cada modo de producción material  
determinaría a su medida un universo superestructural correspondiente, esto es, todo lo  
ideológico, cultural, jurídico, etc., que es producto de una determinada base económica (Liria,  
2015).  
Ahora bien, como ya advirtió Godelier (1989), resulta que tal metáfora usada por Marx  
ni siquiera se tradujo correctamente, pues el término Überbau se refiere a la construcción que  
se levanta sobre los cimientos, denominados estos últimos con el término Grundlage. Y como  
afirmó este autor, “se vive en la casa y no en los cimientos” (Godelier, 1989, p. 24), por lo que  
otra traducción quizás podría haber hecho más hincapié en la importancia de la superestructura,  
así como por otra parte el propio Gramsci hizo, al concederle cierta autonomía a esta última.  
Siguiendo la postura de Liria (2015), no consideramos que pueda hablarse en ningún  
caso de ley o leyes de la historia, en la cual se irían sucediendo los distintos modos de  
producción levantados siempre sobre una base económica que hace brotar su correspondiente  
superestructura; en este sentido, si bien es cierto que podríamos afirmar la existencia de leyes  
en la historia, esto es muy distinto de leyes de la historia. Desde nuestro punto de vista no hay  
ninguna ley de la historia mediante la cual, ni por un juego dialéctico, se asegure el paso del  
capitalismo en su contrario, una sociedad comunista, con todo el correspondiente paso  
superestructural que le sigue. Sin una gigantesca práctica política y teórica-científica es  
sencillamente imposible realizar ese paso.  
856  
Como bien apunta Gramsci, la práctica política, esto es, la lucha política es, ante nada,  
una lucha ideológica, pues la clave está en conquistar lo que él denominó hegemonía, aquello  
que da legitimidad al poder político. Nótese, en definitiva, que el aspecto ideológico aquí es  
esencial, pues esa hegemonía se ejerce, en última instancia, mediante la apropiación del sentido  
común, de aquello que identificábamos con la vida cotidiana (Gramsci 1970; 2015). Aquello  
que, según Althusser, podría calificarse de macizo ideológico.  
Pero este sentido común no puede ser para nosotros el simple epifenómeno de la  
infraestructura económica de una sociedad. Es cierto que en la sociedad capitalista la  
hegemonía, esto es, la apropiación del sentido común de dicha sociedad, la detenta la clase  
dominante: la clase burguesa. Lo que queremos negar, sin embargo, es que el contenido de tal  
hegemonía pueda reducirse a un simple efecto de la existencia de la burguesía, en tanto que  
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Ideología y ciencia en el interior de las relaciones de producción capitalistas  
clase dominante. Y, por lo mismo, que tras la desaparición de la burguesía (y de toda división  
de clases), mediata o inmediatamente tenga por necesidad que desaparecer toda existencia  
ideológica. Ya lo apuntaba Netto (1981) cuando hacía referencia a factores ideológicos muy  
«resistentes».  
Existe, en un intento de tematizar esa resistencia, una problemática  
gnoseológica/epistemológica junto a la base social-histórica. La burguesía, como clase  
dominante, se apropia de un sentido común o macizo ideológico –al mismo tiempo que lo  
transforma para su mayor provecho– previamente existente. Fundamentalmente porque, dando  
la razón a Kant (1984), el ser humano no puede apropiarse de las esencias puras ni de los  
universales puros (mundo de los noúmenom); no hay forma de situarlo en un espacio de  
entendimiento puro, en el que apariencia y esencia se identificasen por el hecho de que ya no  
existan clases. Como insiste en afirmar Heller (2000), el ser humano no puede arrancarse de su  
vida cotidiana, dominada por el sentido común. El método de aproximación y conocimiento de  
la realidad ejercido en la vida cotidiana para nosotros difiere totalmente del método de  
aproximación y conocimiento científico. En este sentido, si hay alguna posibilidad de escapar  
de la vida cotidiana es, precisamente, a través del segundo, de la práctica científica14. En la  
figura 1, basada en Liria (2019) se representa esquemáticamente la diferencia de uno y otro, así  
como el producto de conocimiento en cada caso.  
857  
En la parte de la izquierda aparece lo que se correspondería con la vida cotidiana de  
cada individuo que, como ya hemos dicho, es algo así como la primera aproximación al mundo,  
dominada por la realidad empírica. Es evidente que este es siempre el punto de partida del  
conocimiento, reflejado en la figura con el punto 1. Sin embargo, a partir de aquí se abren dos  
posibilidades. La primera, infinitamente más común, como también apunta Heller (2000), es el  
seguido por la línea roja (alternativa A), cuyo producto es la producción de las representaciones  
que componen el macizo ideológico o sentido común ya referidos (punto 1ˈ). Desde el punto 1  
hasta el punto 1ˈ vemos que se produce una inversión de la realidad y, además, denominamos  
a propósito a sus determinaciones como abstractas, por el hecho de que tales son todo lo  
contrario a cualquier concreción, pues todo aparece junto y mezclado, combinando en ellas  
hasta los prejuicios más profundos de nuestra consciencia.  
14  
“Si, tal como lo ha descubierto el lector muy a pesar suyo, el análisis de las conexiones internas reales del  
proceso capitalista de producción es una cuestión sumamente intrincada y un trabajo muy minucioso; si es una  
tarea de la ciencia reducir el movimiento visible y solamente aparente al movimiento real interno, va de suyo que  
en las mentes de los agentes de la producción y de la circulación capitalistas deben formarse ideas acerca de las  
leyes de la producción que diverjan por completo de esas leyes, y que son sólo una expresión consciente del  
movimiento aparente” (Marx, 2009a, p. 400).  
Álvaro Laine Menéndez  
Figura 1: método ideológico vs método científico.  
Fuente: Elaboración propia en base a Liria (2019).  
Sin embargo, en algún punto del recorrido anterior se abre otra posibilidad, caracterizado  
por la línea azul (alternativa B), la cual correspondería simple y llanamente a la práctica  
científica. Ésta, partiendo del elemento captado primeramente por la experiencia de la vida  
cotidiana, es capaz de, por un largo y arduo trabajo teórico (práctica teórica) producir elementos  
concretos de pensamiento (Althusser, 1967), cuyo resultado último es un «simple» dato, que,  
volcado de nuevo al mundo de la vida cotidiana, nos permite entender mejor los fenómenos  
(obsérvese que el dato, representado con el número 2, siempre aparece después de captar  
cualquier fenómeno en el punto A, es decir, después de analizar toda esa masa de abstracciones  
confusas). Lo que esta vía abre, por lo tanto, es la posibilidad de percibir la realidad sin la  
inversión correspondiente de la vía ideología a través de la producción de datos científicos15.  
La posibilidad que abre esta vía B (línea azul) es que puedan producirse datos y, con  
ello, enunciados cuya formulación limite la participación ideológica16. Evidentemente, jamás  
858  
15 Evidentemente, como puede deducirse de lo planteado anteriormente, esta vía nunca podría ofrecer la completa  
visión de una realidad libre del camino A, sino una limitación progresiva de la visión ideológica. En este sentido,  
ciencia e ideología se oponen, y, por lo mismo, capitalismo y ciencia.  
16 Una prueba de ello es que los enunciados de la vía B son independientes del estatus social de quien lo formula.  
Para explicarnos, lo que decimos es que por medio de tal práctica teórica podemos llegar a formulaciones tales  
como la definición del Teorema de Pitágoras, cuyo enunciado no depende del estatus de ser obrero, ser negro, ser  
rico o ser mujer, entre infinitos otros. Independientemente de quien lo enuncie siempre se hará de la misma forma  
si con ello se está formulando este teorema. Esta es una posición límite que nos sirve para explicar la diferencia  
de la vía B con respecto a la vía A, pero, evidentemente, requeriría una explicación más compleja y con  
mediaciones para el caso de fenómenos de tipo social, puesto que éstos se encuentran clavados en los intereses de  
clase. Utilizamos este caso extremo o puro (representado en la formulación de un teorema matemático) por la  
clareza que ofrece. Tampoco quiere esto decir que se hayan de formular algo así como las esencias del mundo, su  
estructura constituyente (el verbo hecho carne), sino que simple y llanamente puedan descubrirse ciertos elementos  
reales, libre de la inversión producida por medio de la vía A, que permitan avanzar en una progresiva mejor  
concepción de nuestra realidad. En este mismo sentido, el descubrimiento de la explotación bajo condiciones  
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Ideología y ciencia en el interior de las relaciones de producción capitalistas  
con un carácter absoluto, pues, como ya hemos dicho, no tenemos el acceso a la verdad plena,  
sino que, en todo caso, en un sentido aristotélico, la certeza de que, por esta vía, con cada nuevo  
dato, nos separamos infinitesimalmente del error (Aristóteles, 2014). Dicho de otra forma: no  
tenemos acceso al mundo de las esencias que componen la realidad, de lo constituyente real,  
pero sí la capacidad de llegar a ciertos enunciados que desenmascaran la inversión de los  
fenómenos provocada por un componente ideológico (que se mueve a partir de un método  
propio).  
A su vez, la evidencia de que este otro camino, que podemos denominar científico,  
supone un desarrollo para el conjunto de la sociedad se manifiesta en el hecho de que sus  
formulaciones no dependen apenas del estatus social, de la subjetividad, en la medida en que  
somos capaces de colocar un cierto corte de neutralidad (el camino B de la figura 1) entre  
nuestra vida cotidiana y su conocimiento inmediato, es decir, a lo largo del camino A en la  
figura 1. Evidentemente, y conectando este desarrollo epistemológico con la relevancia de las  
lecturas analizadas en el punto anterior, para que esta vía pueda prosperar hace falta una  
condición de posibilidad esencial: la eliminación de las clases por medio de la práctica política-  
revolucionaria, puesto que éstas descansan en la vía A de la figura 1, en un método de  
conocimiento ideológico.  
859  
Consideraciones finales  
En síntesis, lo que se ha propuesto es que lo que hemos denominado como método  
científico, por un lado, y la ideología, por otro, avanzan por vías diferentes, diferenciando dos  
métodos de conocimiento distintos según cada caso. A su vez, y a partir de la lectura de los  
autores citados en la primera parte, se ha resaltado que la condición de clase supone la base que  
sustenta y extiende el avance de la ideología, en contraste con un método de conocimiento  
científico. A día de hoy, donde los elementos negacionistas en el interior de las distintas ciencias  
tratan de acaparar un mayor espacio en la sociedad, se observa, al mismo tiempo, un  
recrudecimiento de la lucha de clases a partir del ascenso de la extrema derecha. Ambas cosas,  
como puede deducirse a partir de lo apuntado en este texto, no están desconectadas, sino todo  
lo contrario. El pleno avance de la ciencia necesita un espacio libre de clases.  
En última instancia, para combatir la ideología se debería conseguir que el sentido  
común no fuera dominado hegemónicamente ni por un tirano, ni por una clase, sino por un  
capitalistas de producción no depende, tampoco, del estatus social, sino que revela el contenido real y efectivo de  
relaciones sociales en el interior del capitalismo. Para una explicación más profunda puede verse, por ejemplo,  
Liria (2019).  
Álvaro Laine Menéndez  
conjunto de individuos libres e independientes (es decir, sin depender de otro para existir), lo  
más posiblemente emancipados, lo que pasa, para empezar, por la abolición de las clases. Sin  
esta última condición de posibilidad es claro que jamás la ideología va a dejar de dominar la  
vida de los individuos. Por otro lado, la tematización efectuada de la problemática  
gnoseológica/epistemológica de la ideología nos lleva a pensar que, aun logrando una sociedad  
sin clases, el fin de la ideología difícilmente pude ser una realidad posible, en tanto que su  
origen se encuentra clavada en la propia forma de conocimiento humano. La conformación  
histórico-social de clases exacerba el camino ideológico de conocimiento, como se ha  
defendido, pero su ausencia plena equivaldría a pensar un Superhombre más metafísico que  
real. Lo que abre la posibilidad de la ausencia de clases es el pleno desarrollo de las instituciones  
que permitan trabajar por la vía B de la figura expuesta más arriba libre de obstáculos, en un  
desarrollo continuo de las capacidades de conocimiento y de construcción social contra los  
peligros ideológicos.  
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861  
Acidentes de trabalho e (des)proteção social no  
Brasil  
Workplace accidents and (lack of) social protection in Brazil  
Reginaldo Ghiraldelli*  
Thais Pereira Carvalho**  
Resumo: Nas últimas décadas são observadas  
múltiplas alterações no mercado de trabalho que  
afetam diretamente a classe trabalhadora, como  
é o caso do tema abordado neste artigo que  
objetiva analisar os acidentes de trabalho no  
contexto de profundas transformações laborais  
e de desmantelamento da proteção social  
brasileira na temporalidade de 2015 a 2024.  
Com a reestruturação capitalista, os processos  
produtivos marcados pela precarização se  
intensificaram, sobretudo com a expansão de  
Abstract: In recent decades, multiple changes  
have been observed in the labor market that  
directly affect the working class, as is the case  
with the topic addressed in this article, which  
aims to analyze workplace accidents in the  
context of profound labor transformations and  
the dismantling of Brazilian social protection  
between 2015 and 2024. With the restructuring  
of capitalism, production processes marked by  
precariousness have intensified, especially with  
the expansion of labor forms characterized by  
formas  
laborais  
caracterizadas  
pela  
flexibilization,  
outsourcing,  
informality,  
flexibilização, terceirização, informalidade,  
subcontratações e outras modalidades em que a  
tônica passa a ser a ausência de proteção social  
para a população que vive e sobrevive do  
trabalho. Alterações sucessivas nas legislações  
que tratam dos direitos trabalhistas também são  
identificadas como forma de desconstrução do  
aparato de proteção social, como é o caso das  
subcontracting, and other modalities in which  
the emphasis becomes the lack of social  
protection for the population that lives and  
survives from labor. Successive changes in  
legislation that deals with labor rights are also  
identified as a way of dismantling the social  
protection apparatus, as is the case with  
neoliberal reforms. This article presents some  
indicators regarding workplace accidents,  
which are intensifying in the face of  
increasingly precarious forms of work. The  
article is the result of research based on  
bibliographic and documentary sources and  
access to secondary data available on the  
subject. It is concluded that there has been an  
increase in workplace accidents in recent years,  
which requires studies and effective actions to  
change this reality.  
reformas neoliberais.  
O
presente artigo  
apresenta alguns indicadores sobre os acidentes  
laborais que se intensificam diante de  
modalidades cada vez mais precarizadas de  
trabalho. O artigo resulta de pesquisa baseada  
em fonte bibliográfica, documental e acesso a  
dados secundários disponibilizados sobre o  
tema. Conclui-se que ocorre um crescimento de  
acidentes de trabalho nos últimos anos, o que  
requer estudos e ações efetivas para alterar essa  
realidade.  
Palavras-chaves: Trabalho; Saúde; Acidentes  
de trabalho; Proteção social.  
Keywords:  
accidents; Social protection.  
Labor;  
Health; Workplace  
* Universidade de Brasília. E-mail: rghiraldelli@unb.br  
** Universidade de Brasília. E-mail: pereiradecarvalho.thais319@gmail.com  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.48992  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 03/06/2025  
Aprovado em: 15/12/2025  
Acidentes de trabalho e (des)proteção social no Brasil  
Introdução  
As múltiplas e incessantes mudanças no mercado de trabalho, sobretudo nos últimos  
anos, com o incremento das tecnologias digitais, informacionais e comunicacionais, em muitos  
casos são abordadas como avanços e progressos para o desenvolvimento da humanidade.  
Porém, nem sempre se considera a outra face das consequências dessas transformações, quando  
se trata das condições de vida e saúde da classe trabalhadora, diante de um cenário que envolve  
o desemprego e modalidades contratuais de trabalho em que se prevalece a precarização como  
modo de ser de um sistema que prioriza o lucro e a acumulação de riqueza em detrimento do  
crescimento da pobreza e amplificação das desigualdades sociais. O que precisa ser  
considerado, com base nesta realidade, não é a negação do desenvolvimento e aperfeiçoamento  
das forças produtivas, mas trata-se de problematizar para que e a quem serve o avanço técnico-  
científico em curso, visto que os indicadores de adoecimento e acidentes laborais se expandem,  
afetando a vida e a saúde da classe trabalhadora.  
Com base nessas considerações e reconhecendo as suas contradições, o respectivo artigo  
objetiva apresentar, em linhas gerais, reflexões sobre as mudanças que vem ocorrendo no  
mercado do trabalho e que provocam consequências danosas para a vida e a saúde da classe  
trabalhadora, quando se trata do crescimento de adoecimentos e acidentes laborais. Por meio  
de fonte bibliográfica, documental e acesso a dados secundários disponibilizados por órgãos  
públicos, como no caso do Ministério do Trabalho e Emprego, da Previdência e da Saúde, são  
evidenciados os crescentes índices de adoecimento e acidentes de trabalho que exigem estudos,  
pesquisas e construção de estratégias e ações que possibilitem o enfrentamento dessa realidade.  
Outras bases de dados foram consultadas como o “Painel de Informações e Estatísticas da  
Inspeção do Trabalho no Brasil” (Radar SIT do Ministério do Trabalho e Emprego),  
“Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho” (SmartLab, 2025), Sistema de Informação  
de Agravos de Notificação (Sinan)1 e as informações obtidas nos “Anuários Estatísticos de  
Acidente de Trabalho2”, com o objetivo de abranger, da forma mais aproximada possível, a  
heterogeneidade e complexidade desta realidade que não cabe apenas nas fontes estatísticas  
oficiais. A temporalidade histórica dos dados secundários obtidos e analisados corresponde ao  
período que abrange os anos de 2015 a 2024. Nesse sentido, é fundamental compreender e situar  
863  
1 Composto por dados advindos da notificação de agravos à saúde que necessitam ser notificados obrigatoriamente,  
como os acidentes de trabalho. Os registros de informações referentes a casos de acidente de trabalho permitem  
um maior detalhamento sobre a ocorrência no ambiente laboral, auxilia o/a trabalhador/a no acesso aos direitos e  
na promoção de medidas preventivas por meio de políticas públicas (Cf. Brasil, 2025).  
2
São dados disponibilizados pelo Ministério da Previdência Social e pelo Instituto Brasileiro de Geografia e  
Estatística (IBGE), com base nos dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e da DATAPREV (Cf.  
Brasil, 2023a).  
Reginaldo Ghiraldelli; Thais Pereira Carvalho  
os acidentes de trabalho em uma perspectiva crítica e de totalidade, considerando os indicadores  
disponíveis e publicizados, as subnotificações diante de um universo laboral caracterizado por  
ocupações formais e informais, mas também a dinâmica socioeconômica e ideopolítica que  
permeia as relações de trabalho no capitalismo.  
Em um contexto de desemprego e desregulamentação do trabalho, tendo em vista o  
quadro de informalidade, terceirizações, subcontratações, trabalho por conta própria, contratos  
por tempo determinado e outras modalidades de vínculos ocupacionais marcadas por  
subempregos que não garantem nenhum tipo de proteção social para a população que vende a  
sua força de trabalho, o presente artigo esboça reflexões aproximativas acerca das mudanças  
em curso no mercado do trabalho nas últimas décadas e que incidem na vida e saúde da classe  
trabalhadora, como é o caso dos acidentes de trabalho. Tendo em vista que o artigo objetiva  
analisar os acidentes de trabalho em um cenário de profundas transformações laborais e de  
desmantelamento da proteção social brasileira, na primeira seção do texto são apresentadas  
considerações acerca do mercado de trabalho na realidade brasileira em um contexto de  
reformas neoliberais que incidem na regressão dos direitos da classe trabalhadora,  
exemplificando alguns desafios atuais da agenda e luta política por melhores condições de vida  
e trabalho da população. Na segunda seção são apresentadas reflexões teórico-conceituais  
acerca da concepção de proteção social e sua construção histórica no Brasil, em que se aborda  
também a perspectiva da saúde do trabalhador e da trabalhadora, com seus avanços e impasses,  
e, de forma contextualizada e com base em indicadores, são problematizados os acidentes de  
trabalho na contemporaneidade. Por fim, são apresentadas as considerações finais como síntese  
do processo investigativo.  
864  
Mercado de trabalho, ofensiva neoliberal e regressão de direitos no Brasil  
A configuração do mercado de trabalho brasileiro na contemporaneidade é expressão  
das transformações em curso que ocorrem nas relações sociais, econômicas, políticas e culturais  
que incidem na vida em sociedade. Nesse processo, também cabe mencionar as alterações nas  
legislações protetivas do trabalho, que trazem uma série de desdobramentos para os direitos da  
classe trabalhadora.  
A construção das legislações protetivas do trabalho não é um mero arcabouço jurídico  
de caráter formal-normativo, mas resultado do embate de classes e da correlação de forças  
contidas entre interesses antagônicos que envolvem a classe trabalhadora e a classe dominante  
no capitalismo. De acordo com Netto (2012), desde a década de 1970, ocorrem transformações  
societárias que estão vinculadas às mudanças no “mundo do trabalho”, envolvendo a totalidade  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 862-885, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Acidentes de trabalho e (des)proteção social no Brasil  
social e a configuração da sociedade “tardo-burguesa” que emerge da reestruturação do capital.  
Nessa conjuntura, com vistas ao atendimento das exigências do capital, observa-se a  
implementação do projeto neoliberal que se pauta na flexibilização, que tem o objetivo de  
aniquilar os direitos sociais; na privatização, que transfere ao capital grandes parcelas de  
riquezas públicas; e na desregulamentação como regra. Para Netto, o mercado de trabalho, “[...]  
vem sendo radicalmente reestruturado - e todas as “inovações” levam à precarização das  
condições de vida da massa de vendedores de força de trabalho: a ordem do capital é hoje,  
reconhecidamente, a ordem do desemprego e da informalidade” (2012, p. 417).  
No caso brasileiro, mesmo com políticas importantes que foram introduzidas na década  
de 1920, como as Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAPs), nos anos 1930 com os Institutos  
de Aposentadoria e Pensão (IAPs) e, na década de 1940, no caso emblemático da Consolidação  
das Leis do Trabalho (CLT) em 1943, pode-se considerar que foi apenas nos anos de 1980 que  
foram dados os passos para a construção de um sistema de proteção social, a partir da  
promulgação da Constituição Federal de 1988, que traz, por exemplo, a concepção de  
seguridade social que envolve o direito à saúde (universal), previdência social (mediante  
contribuição) e assistência social (com base em critérios e necessidades).  
Porém, logo em seguida, nos idos dos anos de 1990, sob a forte ofensiva neoliberal,  
foram aprovadas reformas regressivas de direitos que começam a desmontar aquilo que estava  
previsto como sistema de proteção social e garantia de direitos na recém promulgada  
Constituição Federal. Pode-se exemplificar a Reforma da Previdência Social de 1998 (Brasil,  
1998), durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, que representou ataques aos direitos  
conquistados pela classe trabalhadora naquele momento histórico. Na década de 1990,  
consolidou-se, de forma programática, a agenda neoliberal no Brasil, inserindo a modernização  
trabalhista na agenda do empresariado (Druck; Dutra; Silva, 2019). Segundo Antunes (2018),  
865  
No Brasil, em particular na década de 1990, as transformações geradas pela  
nova divisão internacional do trabalho foram de grande intensidade, já que  
partiram de uma dinâmica interna, característica dos países de industrialização  
dependente, fundada na superexploração da força de trabalho. A imposição de  
baixos salários, associada a ritmos de produção intensificados e jornadas de  
trabalho prolongadas, foi ainda acentuada pela desorganização do movimento  
operário e sindical, imposta pela vigência, entre 1964 e 1985, da ditadura civil-  
militar (p. 156).  
Nos anos 1990, a ofensiva neoliberal, que representa as respostas do capital à sua crise  
de dimensão estrutural, se volta para “[...] a desregulamentação das relações de trabalho, amplos  
programas de privatização e a abertura externa da economia. Todas essas iniciativas têm o  
objetivo de restaurar a rentabilidade do capital (Araújo, 2009, p. 32)”. Ainda segundo Araújo  
Reginaldo Ghiraldelli; Thais Pereira Carvalho  
(2009, p. 33), é fundamental compreender as questões que emergem com as reformas  
previdenciárias, como no caso das taxas de crescimento econômico abaixo da média histórica  
da região; as elevadas taxas de desemprego e subemprego; a precarização das relações de  
trabalho; o aumento da informalidade; a perda do poder aquisitivo dos salários; o desequilíbrio  
fiscal e financeiro do Estado, associado à política de juros altos e à recessão ou semiestagnação  
da economia. Os argumentos ideopolíticos favoráveis às medidas de implementação de  
reformas neoliberais, se pautam na ideia de déficit financeiro que levaria a uma suposta  
inviabilização do sistema previdenciário; das desigualdades entre o Regime Geral de  
Previdência Social e os Regimes Próprios de Previdência Social e o envelhecimento da  
população brasileira, que gera a inversão da pirâmide demográfica (Araújo, 2009). Outras  
reformas da previdência social, marcadas pela regressão de direitos, foram aprovadas nos anos  
2000, como a de 2003 durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, a de 2013 no Governo  
Dilma Rousseff, que cria a Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público da  
União (FUNPRESP), abrindo caminhos para os fundos privados de aposentadoria e, por fim, a  
de 2019 durante o Governo de Jair Messias Bolsonaro. Um fator importante a ser citado, é a  
decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que anula a obrigatoriedade de Regimes Jurídicos  
Únicos (RJU)3 e planos de carreira para servidores e servidoras da administração pública direta,  
das autarquias e das fundações públicas federais, estaduais e municipais. Tal ação ocorreu em  
06 de novembro de 2024, repercutindo diretamente na vida da classe trabalhadora que presta  
serviços atrelados a diversas políticas sociais e  
866  
[...] fragmentam os direitos da classe trabalhadora, contrariando ainda a  
intenção original do constituinte de promover igualdade e estabilidade no  
serviço público. Além disso, o regime estatutário é fundamental para o serviço  
público, pois confere a servidoras e servidores a imparcialidade e a  
independência necessárias para atuarem em prol do interesse público, sem  
serem vulneráveis a pressões políticas ou pessoais de ocupantes transitórios  
do poder. A estabilidade e as proteções desse regime preservam uma atuação  
técnica e legal, evitando ingerências que possam desviar o foco daquela pessoa  
de seu compromisso com o bem comum e os princípios constitucionais que  
regem a administração pública (CFESS, 2024b, online).  
Ainda são identificadas outras mudanças na legislação trabalhista brasileira que versam  
sobre as relações trabalhistas e a proteção social, como a Reforma Trabalhista (Lei nº  
3
Trata-se de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 2.135) que advêm do questionamento sobre a  
alteração no art. 39 da Constituição Federal de 1988, determinada pela Emenda Constitucional 19/1998 (Reforma  
Administrativa) e que apresenta a exclusão da obrigatoriedade de um regime jurídico único para os servidores  
públicos. Os argumentos da ADI estavam pautados em questões que perpassavam a não observância correta dos  
tramites legislativos. Entretanto, o STF compreendeu que o processo legislativo ocorreu devidamente, seguindo a  
votação em dois turnos por 3/5 de votos dos parlamentares da Câmara dos Deputados e do Senado, conforme exige  
a Constituição. Diante disso, resultou-se na revogação da liminar que suspendia a alteração advinda da Emenda  
Constitucional. Logo, houve o retorno da anulação dos regimes jurídicos únicos aos servidores (Brasil, 2024b).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 862-885, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Acidentes de trabalho e (des)proteção social no Brasil  
13.467/2017), além das recentes reformas da previdência que foram aprovadas, conforme  
mencionado. As modificações ocorridas com a Reforma Trabalhista se externalizam em  
modalidades laborais precarizadas como no caso dos contratos intermitentes4, terceirização das  
atividades meio e fim, trabalho por conta própria, informalidade, dentre outros formatos que  
revelam a fragilidade, instabilidade, insegurança e incertezas dos vínculos laborais. Diante  
desses processos em curso, cabe salientar, com base em Alves (2007, p. 126), que “[...] o  
fenômeno da precarização e da precariedade do trabalho implica não apenas a dimensão do  
local de trabalho e das relações salariais, mas das relações sociais de produção e reprodução da  
vida social”.  
Abílio (2021), descreve que a informalidade pode se apresentar de diversas formas,  
como no trabalho autônomo, conhecido como “conta própria”; “PJ”, em que o indivíduo é  
contratado como pessoa jurídica, evidenciando as expressões da terceirização e o caso do  
Microempreendedor Individual (MEI). Com a inserção de novos formatos de contratação  
flexibilizada, diante das modalidades informais praticadas, a autora afirma que isso se reflete  
nas condições de trabalho como um todo, no caso das remunerações, estabilidade, jornadas e  
intensidade laboral. Também merece ser considerado o advento da pandemia de covid-19 a  
partir de 2020 que afetou todo o conjunto da vida social em escala global, com efeitos  
devastadores para a vida de milhares de pessoas e com rebatimentos também no mercado de  
trabalho.  
867  
De acordo com Bernardino e Andrade (2015), a classe trabalhadora inserida na  
informalidade geralmente se submete a baixas remunerações, longas jornadas de trabalho (até  
16 horas por dia) e condições de trabalho insalubres, gerando processos de adoecimento tanto  
físico quanto mental.  
A pesquisa de Cockell e Perticarrari (2011) analisou as redes sociais que ofereceram  
apoio em momentos de necessidade de trabalhadores informais que passaram por processos de  
adoecimentos e/ou acidentes de trabalho. Tendo como base as entrevistas realizadas na  
pesquisa, percebe-se pontos em comum como “a cada dia parado significa um dia a menos de  
renda”, ausência de proteção social e trabalhista, além da presença do medo do desemprego,  
que faz com que muitos retornem ao trabalho antes do restabelecimento completo da saúde.  
4
Art. 443 § 3º: Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com  
subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade,  
determinado sem horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador,  
exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria (Brasil, 2017).  
Reginaldo Ghiraldelli; Thais Pereira Carvalho  
Diante dessas situações, as redes sociais como família, vizinhos e amigos são aquelas que  
resguardam os trabalhadores nos momentos de infortúnio.  
Com a intensificação da precarização, jornadas extenuantes e exaurimento das  
condições físicas e mentais da população que vive e sobrevive do trabalho, emerge no ano de  
2024 o debate da escala 6x1, considerando os trabalhadores que desempenham atividades  
laborais por 6 dias e usufruem de folga apenas em 1 dia da semana. Tal forma de trabalho  
demonstra que,  
O real problema da classe trabalhadora é viver espremida pelo tempo do  
trabalho, é ver sua vida se resumindo a ir e voltar do trabalho, sendo  
consumida pela lógica de exploração-dominação, é ter sua saúde física e  
emocional comprometida por desgastes desse modelo, e é não ter tempo de  
viver, para além do trabalho (CFESS, 2024a, online).  
Por meio da organização do movimento social Vida Além do Trabalho (VAT) e pela  
iniciativa da deputada Érika Hilton (PSOL), a Proposta de Emenda Constitucional (PEC)  
8/2025 tem recebido um amplo apoio popular por meio das redes sociais e manifestações em  
diversas cidades brasileiras (Xavier, 2025). Entretanto, também há resistência por parte de  
setores associados aos interesses do capital, evidenciando a luta de classes na sociedade  
brasileira (CFESS, 2024).  
Sobre a jornada de trabalho, a Constituição Federal de 1988 prevê 8 horas diárias e 44  
horas semanais de trabalho, resultando em 6 dias trabalhados a cada semana. A PEC 8/2025  
propõe que a jornada de trabalho seja de 36 horas semanais, com o resguardo da remuneração  
e abrangência para toda a classe trabalhadora.  
868  
A partir desse esboço, em que se prevalece a precarização nas relações laborais e nas  
formas contratuais, considera-se relevante apresentar, mesmo que brevemente, reflexões sobre  
a instituição de um sistema de proteção social e a construção da saúde do trabalhador e da  
trabalhadora no Brasil, com o objetivo de abordar o adoecimento laboral e os indicadores sobre  
os acidentes de trabalho de forma contextualizada.  
Proteção social, saúde do trabalhador e da trabalhadora e os acidentes de trabalho  
no Brasil: entre avanços e retrocessos  
No Brasil, a instituição de um sistema de proteção social, organizado como um conjunto  
de políticas sociais que se efetivam por meio da intervenção do Estado com a finalidade de  
satisfazer as necessidades humanas da população, ganha materialidade com a promulgação da  
Constituição Federal de 1988, especialmente a partir da concepção de seguridade social5. Com  
5 Apesar de reconhecidos avanços no âmbito da proteção social, “[...] evidenciam-se na estrutura da seguridade  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 862-885, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Acidentes de trabalho e (des)proteção social no Brasil  
isso, os direitos sociais são instituídos para atender um conjunto de demandas advindas da  
sociedade visando proporcionar melhores condições de vida para a classe trabalhadora  
(Mendes; Wünsch; Corrêa, 2009).  
A proteção social, nos dizeres de Mendes, Wünsch e Corrêa (2009), expressa, de forma  
contraditória e dialética, um “[...] conjunto de direitos que foram conquistados pelo movimento  
dos trabalhadores, a partir das relações de conflito das classes na luta por igualdades e das  
desigualdades que são estabelecidas no processo de mediação [...] entre Estado e sociedade” (p.  
56). Em uma perspectiva histórica, o sistema de proteção social foi sempre tensionado pela  
lógica capitalista, diante dos embates, conflitos e interesses antagônicos postos na relação entre  
as classes sociais. Nesse sentido, a construção dos direitos sociais é marcada por avanços e  
retrocessos. Em períodos de crise, medidas de austeridade e ajuste fiscal, se observam  
proposições políticas voltadas para a redução ou extinção de direitos, por meio de reformas  
neoliberais de caráter regressivo, o que exige capacidade de mobilização, organização e luta  
coletiva da classe trabalhadora para a preservação e ampliação de direitos.  
No caso da saúde do trabalhador e da trabalhadora, a Lei Orgânica da Saúde (Lei n.  
8080/1990), determina que suas ações “[...] devam ser executadas pelo SUS nos âmbitos de  
assistência, vigilância, informação, pesquisas e participação dos sindicatos” (Gomez;  
Vasconcellos; Machado, 2018, p. 1965).  
869  
Para Gomez, Vasconcellos e Machado (2018), a saúde do trabalhador e da trabalhadora  
“[...] configura-se como um campo de práticas e de conhecimentos estratégicos  
interdisciplinares técnicos, sociais, políticos, humanos, multiprofissionais e interinstitucionais,  
voltados para analisar e intervir nas relações de trabalho que provocam doenças e agravos” (p.  
1964).  
Na perspectiva de Lacaz (2007), o campo da saúde do trabalhador e da trabalhadora é  
constituído de três vetores: a produção acadêmica, a programação em saúde na rede pública e  
o movimento organizado da classe trabalhadora que ganha destaque na cena política sobretudo  
a partir dos anos 1980. Do ponto de vista histórico e dialético, a relação trabalho-saúde é  
entrecruzada pelos desígnios da sociabilidade do capital, com possibilidades de transformação  
social por meio da luta política.  
[...] para se entender a emergência do campo Saúde do Trabalhador, como  
prática teórica (geração de conhecimentos) e prática político-ideológica  
(superação de relações de poder e conscientização dos trabalhadores), é  
social brasileira contradições presentes no seu interior e a necessidade de pensá-la na ótica das transformações  
sociais em curso [...] o “modelo” de seguridade social brasileiro vem sendo marcado pelo viés contributivo e  
assistencial, que primam por respostas ainda focalizadas, dado as contingências de seu aparato legal e  
meritocrático” (Mendes; Wünsch; Corrêa, 2009, p. 59).  
Reginaldo Ghiraldelli; Thais Pereira Carvalho  
necessário frisar que ele emerge concomitantemente à maturação do processo  
de industrialização e à forma particular que este assume na América Latina,  
nos anos 1970, com o surgimento de uma classe operária industrial urbana  
(Lacaz, 2007, p. 762).  
No ano de 1983, é publicado o Programa de Salud de los Trabajadores pela  
Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), que patrocinou um seminário na cidade de  
Campinas (SP) em 1984, em que se discutiu “[...] a necessidade de se passar do conceito de  
saúde ocupacional para o de saúde dos trabalhadores, com vistas a enfrentar a problemática  
saúde-trabalho como um todo, numa conjugação de fatores econômicos, culturais e individuais”  
(Gomez; Vasconcellos; Machado, 2018, p. 1965).  
Além disso, cabe ressaltar a importância do movimento da Reforma Sanitária para a  
construção do Sistema Único de Saúde (SUS), conforme previsto na VIII Conferência Nacional  
de Saúde de 1986 e a realização da 1ª Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador e da  
Trabalhadora no mesmo ano, que incorpora a perspectiva do direito à saúde em uma lógica  
universalista, de integralidade e controle social.  
Em 1999, a publicação da Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho, representou um  
avanço significativo e, nos primeiros anos de 2000, a área técnica de saúde do trabalhador e da  
trabalhadora do Ministério da Saúde, formulou uma proposta de criação da Rede Nacional de  
Atenção Integral à Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (RENAST). Com base na Portaria  
nº 2.728, de 11 de novembro de 2009, a Renast deve integrar a rede de serviços do SUS por  
meio dos Centros de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST), evidenciando um  
importante avanço para a área (Gomez; Vasconcellos; Machado, 2018, p. 1966).  
A partir de uma atuação integrada e em rede, observa-se, com base em Gomez,  
Vasconcellos e Machado (2018, p. 1968), o aumento no registro de agravos relacionados ao  
trabalho, tendo como exemplo os casos relacionados à exposição ao benzeno em postos de  
combustíveis; as ações de vigilância à saúde de trabalhadores/as canavieiros/as; as ações  
articuladas para o banimento do amianto; ações interinstitucionais para vigilância e prevenção  
aos acidentes de trabalho; ações que envolvem o trabalho análogo à escravidão, o trabalho  
infantil e outros trabalhos em condições extremas de precariedade como no lixo e no carvão.  
Também merecem destaque os agravos e adoecimentos em decorrência de problemas  
cardiopulmonares, o câncer relacionado ao trabalho, as intoxicações por agrotóxicos e a saúde  
mental.  
870  
Para Gomez, Vasconcellos e Machado (2018), o maior avanço no campo da saúde do  
trabalhador e da trabalhadora no Brasil diz respeito ao seu reconhecimento constitucional no  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 862-885, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Acidentes de trabalho e (des)proteção social no Brasil  
âmbito da saúde pública, embora as suas ações sejam ainda insuficientes para dar conta do  
cenário dramático e complexo que permeia o mundo do trabalho.  
Apesar dos significativos avanços, Lacaz (2007) sinaliza para os retrocessos no campo  
da Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora nos últimos anos, especialmente em decorrência da  
fragilização do sindicalismo, o pouco engajamento da academia e o reducionismo das políticas  
públicas.  
Em relação ao adoecimento laboral, há uma tendência de individualização e  
culpabilização do/a trabalhador/a, reforçando uma perspectiva a-histórica de disfunção e  
flagelo, descontextualizada da dinâmica socioeconômica e das condições precarizadas de vida  
e trabalho presentes na sociabilidade capitalista.  
No caso dos adoecimentos, agravos à saúde e acidentes de trabalho, Mendes, Wünsch e  
Corrêa (2009), apontam que a classe trabalhadora é atingida de maneira distinta, a depender do  
lugar que ocupa na estrutura produtiva, considerando os trabalhos formais, com proteção social,  
e os trabalhos informais, desprotegidos socialmente diante da ausência de direitos.  
Por isso, pensar a saúde do trabalhador e da trabalhadora pressupõe o estabelecimento  
de novas formas de garantia do acesso à proteção que contemple a classe trabalhadora  
assalariada nas suas múltiplas e diversas ocupações laborais, ou seja, tanto em postos formais,  
quanto informais. Nessa realidade, marcada pela (des)proteção social, não há espaço para o  
reconhecimento de uma cidadania plena, contudo, é possível, por meio de mobilizações e  
organizações coletivas, transformar as demandas sociais em uma agenda política de luta e  
reivindicações da classe trabalhadora.  
871  
Os acidentes de trabalho são agravos à saúde que acontecem durante o deslocamento ao  
local de trabalho, período de exercício laboral ou que possam estar relacionados com o trabalho,  
como as doenças ocupacionais (Brasil, 2018). Em situações de acidente de trabalho, deve-se  
realizar a comunicação do ocorrido até o seguinte dia útil, ou em casos de morte deve ser  
notificada imediatamente ao Instituto Nacional de Seguro Social (INSS). A partir de  
informações produzidas por Comunicações de Acidente de Trabalho (CAT) e pelo Sistema de  
Informações de Agravos de Notificação (SINAN) é possível visualizar, de forma aproximativa,  
o cenário brasileiro do mundo do trabalho perante esses agravos que incidem na saúde da classe  
trabalhadora. Procurou-se identificar esses dados no período temporal de 2015 a 2024,  
conforme a disponibilidade das fontes consultadas.  
Como ponto de partida, é fundamental compreender que a emissão de um número  
elevado de CAT não explica a totalidade e não esgota a complexidade do tema, o que exige  
Reginaldo Ghiraldelli; Thais Pereira Carvalho  
considerar outros aspectos e dimensões dessa realidade. Por exemplo, a subnotificação possui  
determinantes que estão para além da informação da CAT6.  
Com isso, é necessário contextualizar outras dimensões que envolvem o cenário do  
mercado de trabalho brasileiro, como é o caso das ocupações informais, trabalho por conta  
própria, subempregos, trabalho temporário, trabalho análogo à escravidão, dentre outras  
modalidades que revelam as extremas precariedades e precarizações laborais e sociais.  
Cabe sublinhar que os dados sobre acidentes de trabalho e óbitos são registrados tendo  
como referência a classe trabalhadora que possui vínculo empregatício. Isso significa que os  
segmentos laborais que realizam atividades de forma informal ou autônoma, caso passem por  
alguma situação adversa que envolve agravos à saúde, adoecimento, acidente ou óbito, não  
serão identificados, além do que não terão cobertura e garantias de proteção social.  
Com base nessas reflexões, apresenta-se na Tabela 1 o quantitativo de acidentes de  
trabalho baseados na notificação com a CAT e sem a CAT, tendo como referência a  
temporalidade de 2015 a 2024, que corresponde ao período que antecede a aprovação da  
Reforma Trabalhista e contempla também o período da pandemia de covid-19.  
Tabela 1: Total de acidentes de trabalho no Brasil de 2015 a 2024.  
Acidentes de Trabalho com CAT e sem CAT registrada.  
Ano  
2015  
2016  
2017  
2018  
2019  
2020  
2021  
2022  
2023  
2024  
Com CAT  
507.753  
478.039  
453.839  
481.993  
487.739  
417.492  
504.814  
567.746  
661.007  
744.477  
Sem CAT  
114.626  
107.587  
103.787  
104.024  
99.118  
48.280  
76.019  
87.162  
93.375  
Total  
872  
622.379  
585.626  
557.626  
586.017  
586.857  
465.772  
580.833  
654.908  
754.382  
834.048  
89.571  
Fonte: Ministério da Previdência Social, Anuário Estatístico de Acidentes de Trabalho (2025). Elaboração própria.  
Identifica-se, a partir da série histórica analisada, ou seja, entre os anos de 2015 a 2024  
sendo os últimos dados disponibilizados pelo Ministério da Previdência Social, movimentos de  
6 A subnotificação ocorre quando os acidentes de trabalho não são notificados para a Previdência Social. Isso se  
dá diante de relações de trabalho não formalizadas por meio da Carteira de Trabalho e quando não são realizadas  
as Comunicações de Acidente de Trabalho ou situações de adoecimento laboral. As informações de casos  
subnotificados são consolidadas por meio de dados colhidos da Ficha de Investigação de Acidente de Trabalho,  
preenchidas a partir de atendimentos realizados por profissionais da saúde que atuam em Hospitais, Unidades  
Básicas de Saúde (UBS), Unidades de Pronto Atendimento (UPA), Centros de Referência em Saúde do  
Trabalhador (CEREST) e Serviços de Vigilância em Saúde do Trabalhador. As informações coletadas são  
integradas ao Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 862-885, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Acidentes de trabalho e (des)proteção social no Brasil  
aumento e redução dos acidentes de trabalho. Na coluna sobre acidentes com CAT, percebe-se  
que após o ano de 2015, houve queda nos anos de 2016 e 2017, sendo que no ano de 2018 há o  
crescimento dos indicadores que quase se equipara aos acidentes ocorridos em 2016. Em 2019,  
os indicadores seguem a tendência de aumento. É importante lembrar de dois acontecimentos  
dramáticos que marcaram a história brasileira quando relacionados aos acidentes de trabalho,  
tendo em vista a temporalidade demarcada. O primeiro deles, ocorrido em 2015, é o  
rompimento da barragem de rejeitos de fundão ocorrido no dia 5 de novembro de 2015, na  
cidade de Mariana, Estado de Minas Gerais, mais especificamente no subdistrito de Bento  
Rodrigues. Segundo o relatório de análise de acidentes de trabalho, desenvolvido pela  
Secretaria de Inspeção do Trabalho, todos os trabalhadores falecidos eram terceirizados (Brasil,  
2016).  
O documento: “Antes fosse mais leve a carga: avaliação dos aspectos econômicos,  
políticos e sociais do desastre da Samarco/Vale/BHP em Mariana (MG)” (2015), elaborado  
por pesquisadores do grupo Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade (Poemas)  
da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), apresenta os impactos do desastre perante os  
fatores históricos, financeiros, socioambientais, judiciais e trabalhistas. Diante do exposto no  
relatório da pesquisa, a empresa Samarco possuía como predominância dos vínculos laborais a  
contratação por meio da terceirização, sendo que havia denúncias de precárias condições de  
trabalho e ajuizamento de ações trabalhistas, decorrentes de questões como: terceirização ilícita,  
atrasos de pagamento, descumprimento de aviso prévio, não pagamento de horas in itinere  
(tempo gasto pelo trabalhador/a no deslocamento), dentre outros aspectos. Somado a esse  
cenário, a Samarco estava em um contexto de endividamento e com a queda no preço do  
minério, consolidou-se o objetivo de redução de custos operacionais na tentativa de que haveria  
aumento da lucratividade e produtividade da empresa. Isso gerou uma deterioração das  
condições de trabalho, intensificação do ritmo do trabalho, redução de componentes de  
segurança e saúde de trabalhadores/as, resultando no aumento dos índices de acidentes de  
trabalho.  
873  
O segundo acontecimento que marca a história trágica do trabalho na realidade brasileira  
e que também se relaciona com os acidentes de trabalho e a temporalidade demarcada, é o  
rompimento da barragem da Vale S.A., localizada na cidade de Brumadinho, Estado de Minas  
Gerais, em 25 de janeiro de 2019. Segundo o relatório de análise de acidente de trabalho, cerca  
de 334 trabalhadores foram acidentados e, desses, 270 faleceram. Aproximadamente 55% dos  
trabalhadores que faleceram ou que foram lesionados no território da mina eram terceirizados  
(Brasil, 2019).  
Reginaldo Ghiraldelli; Thais Pereira Carvalho  
Ambas as situações apresentam acidentes de trabalho fatais, em grande maioria para  
aqueles que tinham o vínculo de terceirização, gerando várias repercussões e desdobramentos  
para as famílias dos/as trabalhadores/as, pois além da perda trágica de uma pessoa (que diz  
respeito aos vínculos familiares e afetivos), ainda precisam lidar com a impunidade dos  
responsáveis por tais crimes e com a devastação do meio ambiente que por vezes são a fonte de  
sustento familiar.  
Ainda com base na Tabela 1, nos dados referentes aos registros totais, com CAT e sem  
CAT, em 2020, observa-se a maior redução de acidentes de trabalho da série histórica. Isso  
pode ser explicado, dentre a multiplicidade de fatores e fenômenos, como decorrência da  
pandemia de covid-19, ou seja, a redução nos indicadores relacionados ao ano de 2020 podem  
ser também justificados pelas medidas de distanciamento social que ocasionou na restrição de  
abertura de serviços que não eram considerados essenciais, resultando no aumento do  
desemprego e na contratação de trabalhadores em postos de trabalho sem vínculo formalizado,  
que em caso de adoecimento e/ou acidente de trabalho possuem dificuldades de acessar seus  
direitos, além de ocorrer a subnotificação dessas ocorrências.  
Uma das categorias que ganhou evidência durante o cenário pandêmico foi a de  
entregadores por aplicativo. No período de distanciamento e isolamento social observa-se a  
intensificação da precarização das condições de trabalho dos entregadores. No documentário  
Motoboy, de vilão a herói (2020), de Danilo Alves, pode-se visualizar o relato de diversos  
entregadores que trabalhavam para aplicativos durante o período da pandemia. São expostas as  
inseguranças relacionadas ao adoecimento próprio ou de contaminação de pessoas do convívio  
cotidiano. Alguns relatavam o receio de levar o vírus para mães que já possuíam comorbidades  
ou para as companheiras que estavam grávidas. Além disso, diziam das dificuldades em garantir  
a renda necessária para a subsistência, pois a média de ganho nesse trabalho era reduzida e, por  
isso, precisavam trabalhar mais horas. Segundo alguns entrevistados, a jornada de trabalho  
consistia aproximadamente de 12 a 15 horas diárias de trabalho. Diante da necessidade de mais  
horas trabalhadas, baixa remuneração, exposição a riscos, adoecimento ou acidentes de  
trabalho, os entregadores também fazem referência à ausência de direitos sociais e trabalhistas,  
visto o formato de trabalho que realizam.  
874  
De acordo com Rodrigues (2021), as condições precárias de trabalho presentes na  
realidade de entregadores/as por aplicativo foram ainda mais agravadas pelo contexto da  
pandemia, refletindo também no aumento dos índices de acidentes fatais que envolveram  
motociclistas. Um exemplo são os acidentes que ocorrem com os entregadores por aplicativo,  
tanto com aqueles que usam motos, quanto com aqueles que usam bicicletas, que se configuram  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 862-885, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Acidentes de trabalho e (des)proteção social no Brasil  
na maioria das vezes como acidentes de trânsito e não como acidentes de trabalho, o que impõe  
desafios para as lutas e organizações coletivas da classe trabalhadora para o reconhecimento  
desse tipo de acidente como decorrente do trabalho. Além do mais, o não reconhecimento  
desses/as trabalhadores/as como empregados das empresas proprietárias dos aplicativos  
dificulta a produção de indicadores de acidentes de trabalho desse segmento, pois não há a  
exigência de realização da CAT por lei, expressando uma das faces que gera a subnotificação.  
Diante disso, a ausência de dados repercute em dificuldades na responsabilização das  
plataformas e de elaboração de políticas públicas que atendam as necessidades desse segmento  
da classe trabalhadora.  
Em 2024, o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos  
(DIEESE), apontou fatores que devem ser propostos e realizados quando se relaciona a saúde  
do trabalhador e da trabalhadora com o trabalho uberizado, como a elaboração de Normas  
Regulatórias que complementem a CLT, referentes às atividades de entrega; o dever das  
empresas-plataformas de garantir Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), assim como o  
mapeamento de riscos ocupacionais que dizem respeito ao exercício laboral.  
Ainda na Tabela 1, verifica-se nos anos de 2022 e 2024 um aumento nos indicadores de  
acidentes de trabalho. No ano de 2022 são constatados 654.908 acidentes de trabalho no total,  
englobando os registros com CAT e sem CAT. Em 2023 foram 754.382 casos e, em 2024,  
chegam ao registro de 834.048 trabalhadores acidentados. Dentre os tantos fatores e aspectos,  
pode-se evidenciar esse aumento nos determinados anos devido ao retorno progressivo e  
presencial ao mercado de trabalho após a vacinação da população contra a covid-19.  
Além disso, na Tabela 1, se destacam os dados referentes às notificações sem CAT, com  
quedas nos indicadores entre os anos de 2015 a 2020; aumento entre 2021 e 2023 e redução em  
2024 na comparação com 2023. Já nos indicadores totais, ou seja, que englobam as informações  
com e sem CAT, identificam-se reduções de 2015 a 2017; aumento em 2018 e 2019; redução  
em 2020, seguido de um constante e progressivo aumento no período de 2021 a 2024, atingindo  
o maior índice no ano de 2024.  
875  
A Tabela 2 apresenta os dados sobre os acidentes de trabalho típicos7, de trajeto8 e de  
doenças relacionadas ao trabalho9, considerando os números totais de acidentes que possuem a  
CAT registrada.  
7 Segundo o Anuário Estatístico da Previdência Social (Brasil, 2018), os acidentes de trabalho típicos são aqueles  
decorrentes da característica da atividade profissional desempenhada pelo acidentado.  
8
O Anuário Estatístico da Previdência Social (Brasil, 2018), define os acidentes de trabalho no trajeto como  
aqueles ocorridos no trajeto entre a residência e o local de trabalho do segurado e vice-versa.  
9
De acordo com o Anuário Estatístico da Previdência Social (Brasil, 2018), os acidentes de trabalho devido às  
Reginaldo Ghiraldelli; Thais Pereira Carvalho  
Tabela 2: Quantidade de acidentes de trabalho no Brasil, por situação do registro e motivo, de 2015 a 2024. Total  
de Acidentes de Trabalho com CAT registrada, considerando acidentes típicos, de trajeto e doença do trabalho  
Ano  
2015  
2016  
2017  
2018  
2019  
2020  
2021  
2022  
2023  
2024  
Trajeto  
106.721  
108.552  
101.156  
108.082  
102.405  
61.014  
104.267  
124.829  
153.918  
181.335  
Típico  
385.646  
355.560  
341.700  
363.314  
375.300  
322.903  
379.347  
413.139  
489.536  
544.495  
Doenças do Trabalho  
15.386  
Total  
507.753  
478.039  
453.839  
481.430  
487.739  
417.492  
504.814  
567.746  
661.007  
744.477  
13.927  
10.983  
10.597  
10.034  
33.575  
21.200  
29.778  
17.553  
18.647  
Fonte: Ministério da Previdência Social. Anuário Estatístico de Acidentes de Trabalho (2025). Elaboração própria.  
Na Tabela 2, as informações apresentadas são baseadas no levantamento de CAT, ou  
seja, compreende apenas os vínculos formais da classe trabalhadora, considerando o total de  
acidentes de trabalho a partir daqueles que ocorreram de forma típica, no trajeto ou como  
adoecimento no trabalho. Nos anos de 2016 e 2017, identifica-se uma redução no indicador  
total e um aumento nos anos de 2018 e 2019. No ano de 2020 há uma diminuição dos  
indicadores totais, com aumento nos anos sucessivos, com destaque para o ano de 2024, sendo  
o ano com o maior número de acidentes de trabalho da série histórica.  
De acordo com a Lei n° 8.213, de 1991 (Brasil, 1991), considera-se acidente de trabalho  
o fato que gera lesão corporal, perturbação funcional que gere morte, redução ou perda  
(permanente ou temporária) da capacidade de exercício do trabalho em serviço à empresa ou  
para empregador doméstico. Além disso, sobre as doenças relacionadas ao trabalho, também  
consideradas como acidentes de trabalho, sabe-se que a doença profissional é produzida ou  
desencadeada pelo exercício laboral específico da atividade desempenhada. Já a doença do  
trabalho é aquela que está associada às condições especiais em que a ação laboral é  
desempenhada (Fiocruz, 2020).  
876  
Nos casos de acidentes de trabalho envolvendo trabalhadores/as do serviço público  
federal, ou seja, inseridos/as no Regime Jurídico de Servidores Públicos Civis da União (RJU),  
regido pela Lei n° 8.112/1990 (Brasil, 1990), identifica-se a previsão da proteção social, em  
que a legislação garante licença para tratamento e aposentadoria em caso de necessidade. A  
respectiva legislação define o acidente de trabalho como um dano sofrido ao servidor público,  
no aspecto mental ou físico e que possui relação com o trabalho desempenhado.  
doenças do trabalho são aqueles ocasionados por qualquer tipo de doença profissional peculiar a determinado ramo  
de atividade constante na tabela da Previdência Social.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 862-885, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Acidentes de trabalho e (des)proteção social no Brasil  
Para os trabalhadores/as inseridos/as no Regime Geral de Previdência Social (RGPS),  
caso necessitem de afastamento superior a 15 dias, torna-se necessária a avaliação médico-  
pericial para ter acesso ao auxílio-doença. Esse direito está previsto na política de previdência  
social que integra a seguridade social, sendo um direito da classe trabalhadora que se encontra  
em condição de incapacidade total e/ou temporária.  
Na Tabela 2 também são registrados os motivos que geraram os acidentes de trabalho.  
Identifica-se uma maior incidência em relação aos acidentes típicos, seguidos pelos acidentes  
de trajeto e, por fim, com os menores indicadores, as doenças do trabalho.  
Ao visualizar os acidentes de trabalho típicos e os acidentes de trabalho no trajeto, nota-  
se um menor indicador no ano de 2020 e um índice mais elevado no ano de 2024. Esses  
movimentos podem ser explicados pela dinâmica do mercado de trabalho durante o período da  
pandemia tendo em vista o quadro de distanciamento social, demissões, contratações  
precarizadas e informalidade.  
Sobre as doenças no trabalho, observa-se que diferentemente das outras formas de  
acidente, em 2020 há um aumento nos dados, com o indicador de 33.575 mil casos. Isso pode  
ser explicado pelo fator de adoecimento geral da população com a pandemia de covid-19, em  
especial de segmentos da classe trabalhadora que estavam desempenhando atividades na linha  
de frente contra a doença, inseridos em serviços considerados essenciais. Outro fator pode estar  
relacionado à saúde mental da população e sua relação com o trabalho diante das incertezas e  
inseguranças apresentadas durante a pandemia, em especial, os segmentos que não possuíam  
vínculos laborais estáveis.  
877  
As doenças do trabalho são definidas por meio da Lista de Doenças Relacionadas com  
o Trabalho, elaborada pelo Ministério da Saúde, sendo um instrumento importante para mapear  
o perfil da população trabalhadora, assim como formular políticas públicas que atendam às  
demandas que envolvem a saúde da classe trabalhadora.  
A primeira edição da lista, por meio da Portaria n.1339/GM, de 18 de novembro de 1999  
(Brasil, 1999), mencionava as doenças que envolviam agentes químicos (como arsênio,  
amianto, bromo, chumbo, cloro, mercúrio, sílica), físicos (como ruídos, vibrações, radiação  
ionizantes), biológicos (microrganismos e parasitas), que resultam em doenças infecciosas e  
parasitárias; neoplasias; doenças do sangue e dos órgãos hematopoiéticos; doenças endócrinas,  
nutricionais e metabólicas; doenças do sistema nervoso, respiratório, circulatório, digestivo,  
osteomuscular e gênito/urinário; da pele e tecidos subcutâneos; dos olhos e ouvidos;  
traumatismos; envenenamento; transtornos mentais e do comportamento.  
Reginaldo Ghiraldelli; Thais Pereira Carvalho  
Após 24 anos, a Lista de Doenças Relacionadas com o Trabalho (LDRT) foi atualizada,  
resultando na inserção de 165 novas patologias ligadas ao labor, passando de 182 para 347  
códigos que identificam os adoecimentos (Paola, 2023). Na nova lista, houve a inserção da  
covid-1910 como doença do trabalho e a ampliação da compreensão diante da relação entre  
transtornos mentais e ambiente de trabalho, inserindo aspectos como uso de sedativos, uso  
abusivo de cafeína, além de incluir a compreensão de aspectos psicossociais no cenário laboral.  
A lista, conforme Portaria GM/MS n°1999 de 27 de novembro de 2023 (Brasil, 2023c),  
de acordo com o inciso 3, tem a finalidade de:  
I - orientar o uso clínico-epidemiológico, de forma a permitir a qualificação  
da atenção integral à Saúde do Trabalhador;  
II - facilitar o estudo da relação entre o adoecimento e o trabalho;  
III - adotar procedimentos de diagnóstico;  
IV - elaborar projetos terapêuticos mais acurados;  
V - orientar as ações de vigilância e promoção da saúde em nível individual e  
coletivo (Brasil, 2023c).  
Destaca-se que foram incluídos novos fatores para compreender o adoecimento laboral,  
dentre eles os “Agentes e/ou Fatores de Risco Psicossociais no Trabalho”. Com isso entende-  
se questões presentes no contexto laboral que estão para além dos recursos físicos, mas  
envolvem condições de trabalho relacionadas à gestão organizacional e aos cenários da  
organização do trabalho; características das relações sociais no trabalho; condições presentes  
no ambiente de trabalho; jornada de trabalho; violência física ou psicológica ligadas aos  
aspectos do trabalho, assédio moral, assédio sexual e discriminação (Brasil, 2023c).  
Os fatores psicossociais relacionados à gestão organizacional, segundo a LDRT (2023),  
estão ligados à insuficiência na administração de recursos humanos, associados também a  
estilos de comando, modalidade de contratação e pagamento. Nesse trecho, o documento  
relaciona o adoecimento diretamente a formatos precarizados de contratação, como  
terceirização, trabalho intermitente, Microempreendedor individual (MEI), pejotização e  
uberização. Com base na portaria do Ministério da Saúde, pode-se afirmar que essas formas  
contratuais flexibilizadas reverberam diretamente em transtornos mentais e comportamentais  
relacionados ao uso de álcool (Brasil, 2023c).  
878  
De acordo com a Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho LDRT (Brasil, 2023c),  
o desemprego também é considerado como um fator de risco psicossocial, que pode gerar  
transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de álcool, sedativos, alucinógenos,  
solventes, dentre outras substâncias. Além disso, também pode resultar em adoecimentos  
10 Inclusão na Lista Nacional de Notificação Compulsória de Doenças, Agravos e Eventos de Saúde Pública.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 862-885, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Acidentes de trabalho e (des)proteção social no Brasil  
relacionados a transtornos depressivos, reações ao estresse, infarto agudo do miocárdio, dentre  
outras doenças relacionadas ao trabalho.  
Seligmann-Silva (2015), ao realizar estudos sobre o desemprego de longa duração11  
identifica a relação entre o desemprego, precarização e o adoecimento, visto que,  
Nos cerests, as depressões foram os quadros clínicos mais encontrados. A  
análise dos históricos de trabalho e saúde permitiu constatar que a gênese da  
depressão muitas vezes teve início em íntima conexão com as pressões do  
trabalho precarizado, com consequente agravamento após a demissão em  
muitos dos casos. Históricos de acidentes de trabalho estavam presentes em  
vários dos trabalhadores entrevistados. [...] foi possível analisar,  
retrospectivamente, como as pressões do trabalho precarizado haviam  
contribuído para os acidentes (p. 97).  
O trabalho precarizado, conforme Seligmann-Silva (2015), propicia o desgaste mental  
da classe trabalhadora, pois intensifica sentimentos como medo e insegurança em relação à  
manutenção do emprego e consequentemente sua garantia de reprodução social. Além disso,  
essa conjuntura cria uma permanente ansiedade, podendo gerar diversos outros sintomas,  
repercutindo na “[...] canalização para o organismo (somatização), que, entre outros distúrbios,  
com muita frequência leva ao aumento da pressão arterial” (p. 94). Nesse sentido, observa-se  
que,  
[...] uma escalada de desresponsabilização social por parte das empresas foi  
estimulada pela ideologia neoliberal que também incrementou a precarização  
social e a das relações sociais de trabalho. Essa desresponsabilização repercute  
no aumento dos acidentes de trabalho e dos desgastes e adoecimentos  
relacionados a ele (Seligmann-Silva, 2015, p. 94).  
879  
A Tabela 3 aborda os acidentes de trabalho que estão no campo da subnotificação e que  
se constituem a partir de situações em que não ocorre a realização da CAT. Essas informações  
podem ser obtidas por meio de outras fontes de informação, registradas por profissionais de  
saúde que atuam em Unidades Básicas de Saúde (UBS), Unidades de Pronto Atendimento  
(UPA), hospitais e Centros de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST), com base na  
ficha de investigação de acidente de trabalho e consolidadas no Sistema de Informação de  
Agravos de Notificação (SINAN).  
Ao observar os dados do SINAN apresentados na Tabela 3, nota-se que a maior  
quantidade de acidentes de trabalho ocorreu em 2023, e o menor índice está localizado no ano  
de 2016. De 2019 a 2023 observa-se um aumento progressivo, acentuado e preocupante dos  
registros.  
11 “O conceito de desemprego de longa duração (DLD) por nós adotado para efeito da pesquisa se reportava a um  
período maior que seis meses após o desligamento [...] tinha uma razão: o fato de o seguro-desemprego no Brasil,  
por ocasião da elaboração do projeto, ter vigência máxima de cinco meses, o que implicaria, para os mais pobres,  
em recorrer a estratégias especiais de sobrevivência a partir dessa fase” (Seligmann-Silva, 2015, p. 97).  
Reginaldo Ghiraldelli; Thais Pereira Carvalho  
Em relação aos índices fornecidos pelo Anuário Estatístico de Acidentes de Trabalho  
(AEAT), baseados nos Nexos Técnicos Previdenciários (Profissional, Individual e  
Epidemiológico), observa-se o maior registro no ano de 2015, com reduções nos anos  
subsequentes, com destaque para o menor índice no ano de 2020, marcado pela emergência  
sanitária da pandemia de covid-19.  
Tabela 3: Quantidade de acidentes de trabalho no Brasil, por situação do registro, de 2015 a 2023. Total,  
considerando a quantidade de Acidentes de Trabalho sem CAT registrada.  
Ano  
2015  
2016  
2017  
2018  
2019  
2020  
2021  
2022  
2023  
Dados SINAN  
185.368  
179.676  
196.437  
194.825  
215.115  
253.500  
319.187  
392.575  
542.293  
Dados AEAT  
197.853  
195.076  
184.506  
184.879  
175.957  
91.742  
Total  
386.221  
374.752  
380.943  
379.704  
391.072  
345.242  
463.451  
543.498  
694.027  
144.264  
150.923  
151.734  
Fonte: Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho, com base no Sistema de Informação de Agravos de  
Notificação do Ministério da Saúde (2024) e do Anuário Estatístico de Acidentes de Trabalho, Ministério da  
Previdência Social (Brasil, 2024a). Elaboração própria.  
Perante essa conjuntura, é importante problematizar como ocorrem as notificações de  
informações acerca dos acidentes de trabalho para os segmentos que não possuem vínculo  
formal de trabalho, ou seja, que estão inseridos em modalidades desregulamentadas, informais,  
instáveis, incertas, inseguras e mais precárias em relação aos segmentos formalizados e mais  
“estáveis” da classe trabalhadora. As subnotificações podem ser ainda maiores que aquelas  
apresentadas nos dados oficiais, considerando a complexidade que envolve as relações trabalho,  
as modalidades contratuais, a fragilidade da rede de proteção social e os processos de  
acompanhamento e notificação dos casos relacionados aos adoecimentos, agravos à saúde e  
acidentes laborais. Tais fatores e elementos servem como pistas analíticas para compreender a  
complexidade do tema abordado e os caminhos que levam à desproteção social da classe  
trabalhadora.  
880  
Com base nesses apontamentos sobre as transformações em curso que repercutem  
diretamente nas condições de vida e saúde da classe trabalhadora, conforme evidenciado na  
literatura especializada sobre o tema e nos dados secundários que retratam essa realidade,  
mesmo com certas limitações devido às subnotificações, torna-se fundamental o  
aprofundamento de estudos sobre o tema, a formulação de políticas públicas e a construção de  
alternativas que tenham no horizonte um projeto emancipatório que supere essa sociabilidade.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 862-885, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Acidentes de trabalho e (des)proteção social no Brasil  
Considerações finais  
Em um contexto de (des)proteção social, o presente artigo, abordou, de forma  
aproximativa, algumas consequências das transformações laborais que incidem nos processos  
de adoecimento e acidentes de trabalho que afetam a vida e a saúde da classe trabalhadora,  
considerando o período de 2015 a 2024. A finalidade do artigo foi retratar, em linhas gerais e  
sem a pretensão de esgotá-lo, o tema dos acidentes laborais e os aspectos dessa realidade que  
se relaciona com a proteção social destinada à classe trabalhadora, que cada vez mais se depara  
com uma realidade de duros ataques e perdas de direitos, diante da implementação de reformas  
neoliberais, sobretudo a partir dos anos 1990, quando se trata do contexto brasileiro.  
É importante situar o tema dos acidentes de trabalho e dos processos de adoecimento  
laboral sob a lógica do sistema capitalista, com seus objetivos de extração de lucro,  
centralização e acumulação de capital. O adoecimento e os acidentes de trabalho não são  
novidades no mundo do trabalho sob o regime do capital, porém o que se observa é um aumento  
nos respectivos indicadores diante da intensificação de formas laborais precárias que incidem  
nas condições de vida e saúde da classe trabalhadora.  
As experiências recentes de reformas neoliberais no âmbito do trabalho e da previdência  
social também revelam perdas e desmantelamento de direitos sociais historicamente  
conquistados pela classe trabalhadora, exponenciando as mazelas produzidas e reproduzidas  
nessa sociabilidade. Além disso, a experiência da pandemia de covid-19 resultou em  
consequências nefastas para a vida em sociedade como um todo, ceifando milhares de vidas de  
segmentos da classe trabalhadora, sobretudo aqueles inseridos em formas contratuais mais  
precarizadas.  
881  
Evidencia-se que o tema em torno dos processos de adoecimento da classe trabalhadora  
e dos acidentes de trabalho precisam ser aprofundados, especialmente no que se refere às  
particularidades regionais, de modo a obter informações, dados e abordagens crítico-analíticas  
que contemplem dimensões territoriais, de gênero, raça, etnia e tipologias de inserção laboral.  
Isso poderá contribuir para o planejamento, formulação e implementação de ações e políticas  
públicas voltadas para essa realidade.  
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A importância das políticas públicas para a  
primeira infância enquanto estratégia voltada à  
redução da mortalidade infantil no estado do  
Piauí  
The importance of public policies for early childhood as a strategy to  
reduce infant mortality in the state of Piauí  
Geysa Elane Rodrigues de Carvalho Sá*  
Edna Maria Goulart Joazeiro**  
Resumo: Este artigo aborda a implementação  
de políticas públicas voltadas para a primeira  
infância na área da saúde, com foco na redução  
das taxas de mortalidade infantil. Discute o  
conceito de desenvolvimento sustentável como  
multidimensional, alinhado às Agendas 2021 e  
2030, destacando políticas para crianças de zero  
a seis anos. A análise histórica das políticas de  
saúde infantil no Brasil revela avanços após a  
criação do SUS. Contudo, destaca-se que metas  
como a 3.2 dos ODS – que visam eliminar  
óbitos evitáveis de recém-nascidos e crianças  
menores de cinco anos até 2030 – ainda estão  
longe de ser alcançadas, especialmente no Piauí,  
considerando-se o recorte de mortalidade  
infantil até um ano de vida. O estudo reforça a  
necessidade de identificar ações que contribuam  
Abstract: This article examines the  
implementation of public policies aimed at  
early childhood health, focusing on the  
reduction of infant mortality rates. It discusses  
the concept of sustainable development as  
multidimensional, aligned with the 2021 and  
2030 Agendas, highlighting policies targeting  
children from zero to six years of age. The  
historical analysis of child health policies in  
Brazil reveals progress following the  
establishment of the Unified Health System  
(SUS). However, it is important to note that  
targets such as SDG 3.2 — which aim to  
eliminate preventable deaths of newborns and  
children under the age of five by 2030 —  
remain far from being achieved, particularly in  
the state of Piauí, when considering infant  
mortality under one year of age. The study  
reinforces the need to identify actions that can  
improve these indicators, generating positive  
impacts on the well-being of families and  
society as a whole.  
para  
a
melhoria desses indicadores,  
promovendo impactos positivos na qualidade de  
vida das famílias e na sociedade.  
Palavras-chaves: Primeira infância; Políticas  
públicas de saúde; Mortalidade infantil;  
Objetivos do Desenvolvimento Sustentável  
(ODS).  
Keywords: Early childhood; Public health  
policies;  
Infant  
mortality;  
Sustainable  
Development Goals (SDGs).  
* Universidade Federal do Piauí. E-mail: geysaelane@hotmail.com  
** Universidade Federal do Piauí. E-mail: emjoazeiro@gmail.com  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.46633  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 22/11/2024  
Aprovado em: 09/06/2025  
A importância das políticas públicas para a primeira infância enquanto estratégia voltada à redução  
da mortalidade infantil no estado do Piauí  
Introdução  
Este artigo discorre sobre uma temática que integra a tese de doutorado intitulada  
"Promoção da Saúde e Vacinação: Concepção, Temporalidade, Intersetorialidade e Produção  
do Cuidado na Infância". Dessa maneira, aborda a relação que se estabelece entre a  
implementação de políticas voltadas à primeira infância e os índices de mortalidade, que são  
altos especialmente no contexto piauiense. Nesse cenário, compreende-se que a primeira  
infância, período que contempla a faixa dos 0 aos 6 anos de idade, desempenha um papel crucial  
no desenvolvimento humano, e, portanto, ao se investir nessa fase, corrobora-se com a redução  
de desigualdades socioeconômicas na idade adulta.  
Considerando-se esse panorama, no item 1, introduz-se o conceito multidimensional do  
desenvolvimento, partindo-se de uma abordagem abrangente. Dessa forma, parte-se de uma  
perspectiva que supera a apresentação somente do conceito de crescimento econômico,  
trazendo à tona, portanto, a discussão sobre a ação global da Organização das Nações Unidas  
(ONU), que defende a importância de se promover um mundo sustentável, cujos objetivos a  
serem alcançados, sobretudo no que concerne à redução da mortalidade infantil, foram  
desenvolvidos ao longo do século XX, tornando-se, assim, uma prioridade sanitária dos países  
que assumem uma agenda internacional voltada à redução desses números.  
Posteriormente, no item 2, embora não se queira esgotar o debate sobre as ações  
implementadas, principalmente no que tange à explanação das principais transformações  
históricas relacionadas à saúde da criança, apresentar-se-á uma breve contextualização,  
identificando, nesse percurso, quais são as principais mudanças viabilizadas pelas políticas  
públicas de saúde da criança em âmbito nacional, considerando-se, como recorte, as conquistas  
a partir do século XX, destacando, ao abordar sobre esse processo, a manutenção de índices de  
morbimortalidade infantil, o que a torna um componente basilar assumido pela assistência à  
saúde.  
887  
Na sequência, no item 3, apresentam-se os conceitos e as estatísticas relacionadas à  
mortalidade infantil, enquadrando-a como um grave problema de saúde pública que tem sido  
enfrentado pelo país ao longo dos séculos, destacando quais as taxas de mortalidade do Estado  
do Piauí, bem como identificando quais são os possíveis efeitos atrelados à redução ao longo  
dos anos. Ao realizar essa análise, destaca-se o debate sobre a Meta 3.2, que integra os Objetivos  
de Desenvolvimento Sustentável (ODS), pois ela revela qual é a metodologia adotada pelo  
Brasil com vistas a atender a Agenda 2030 da ONU.  
Mesmo com a progressiva redução desses números, é preciso que se verifique,  
continuamente, quais são as melhores estratégias para se combater as constantes lacunas e  
Geysa Elane Rodrigues de Carvalho Sá; Edna Maria Goulart Joazeiro  
desafios que se apresentam, dentre eles, a própria pandemia da Covid-19 e a necessidade de  
promover ações integradas e intersetoriais que garantam a perenidade do investimento voltado  
à primeira infância, reforçando, ainda, sobre a necessidade de explorar políticas públicas que  
efetivamente almejem o alcance das metas propostas pela agenda mundial, para, assim,  
assegurar o nascimento seguro e saudável para essa população específica que integra a primeira  
infância.  
Diante das delimitações apresentadas, metodologicamente, este trabalho assume uma  
natureza essencialmente teórica, adotando-se uma abordagem qualiquantitativa para a  
elucidação dos dados ao longo das seções. Enquadra-se dessa maneira por mesclar, na  
discussão, aspectos inerentes à pesquisa qualitativa, como a interpretação de fenômenos e a  
atribuição de significados, e à pesquisa quantitativa, que se utiliza de recursos estatísticos para  
análises (Prodanov; Freitas, 2013). Por tais motivos, o estudo contempla aspectos tanto  
bibliográficos quanto documentais.  
Dada a natureza qualitativa da pesquisa, adotou-se, em uma primeira etapa, a análise  
documental e bibliográfica, contemplando legislações, políticas públicas, documentos  
institucionais e literatura acadêmica pertinente. Tal abordagem buscou contextualizar  
historicamente a evolução das políticas de saúde voltadas à infância no Brasil. A análise  
interpretativa teve como objetivo compreender os impactos dessas políticas sobre os índices de  
mortalidade infantil, além de identificar os principais desafios enfrentados na sua  
implementação, com ênfase nas particularidades do estado do Piauí.  
888  
Complementarmente, com base no viés quantitativo da pesquisa, foram utilizados dados  
secundários provenientes de bases públicas oficiais, especialmente do DataSUS, TabNet e  
Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM). Esses dados possibilitam a compreensão dos  
indicadores de saúde, com ênfase nas taxas de mortalidade infantil no estado do Piauí. A partir  
dessas informações, foram elaborados gráficos e figuras ilustrativas que subsidiaram análises  
comparativas, permitindo observar tendências, reduções e oscilações ao longo dos anos, bem  
como confrontar os dados estaduais com as metas estabelecidas pela Agenda 2030 da ONU  
(ODS 3.2), em especial o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 3.2.  
1 - Desenvolvimento sustentável: fundamentos e contexto atual  
O desenvolvimento sustentável é um conceito multidimensional que não está atrelado  
apenas ao crescimento econômico. Esse conceito reconhece a interdependência entre aspectos  
sociais, ambientais e econômicos e, a partir disso, busca promover um equilíbrio entre eles,  
reconhecendo, nesse processo, a necessidade de atender às demandas presentes sem  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 886-905, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A importância das políticas públicas para a primeira infância enquanto estratégia voltada à redução  
da mortalidade infantil no estado do Piauí  
comprometer as capacidades das futuras gerações de suprirem suas próprias necessidades. Por  
tais motivos, a discussão sobre o conceito de desenvolvimento é retomada por inúmeros autores,  
tais como por Koldo Satrústegui (2013).  
Em sua análise, Satrústegui (2013) demonstra a quão necessária se faz a discussão  
teórica sobre os elementos que influenciaram e influenciam os processos de desenvolvimento,  
de crises, assim como no mau-desenvolvimento, fenômenos característicos do capitalismo  
global ao longo dos séculos. A partir disso, defende que é preciso propor alternativas para o  
enfrentamento efetivo de crises econômicas, envolvendo estratégias de análise de  
sustentabilidade, de direitos humanos e equidade, superando a proposta basilar da economia  
que trata especificamente do crescimento econômico como solução teórica para os óbices  
proporcionados pelo mercado global.  
Contudo, essa discussão alternativa não é inaugurada no século XX. Essa temática já é  
posta em tela desde os anos 1960, mediante à publicação, pela autora Rachel Carson, do livro  
chamado Silent Spring1. Na obra, a pesquisadora apresenta os problemas relacionados à  
utilização de praguicidas que podem causar impactos na saúde e no meio ambiente.  
Sob essa ótica, ressalta-se um outro marco, agora da década de 1970, ocasião em que  
corre a primeira Conferência Internacional Ambiental na ONU, a chamada Conferência da Rio-  
92, momento em que diversos acordos foram estabelecidos até referendar o primeiro que seria  
o “plano de ação conjunto das nações com vistas ao desenvolvimento sustentável”. Nasce,  
aqui, a Agenda 21, documento que aborda sobre temas da infância. Também apresenta o  
primeiro dos marcos globais voltado ao impulsionamento de políticas de desenvolvimento, o  
designado Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM).  
889  
Os ODM foi um pacto firmado entre a Organização das Nações Unidas (ONU)  
e mais 189 países, inclusive o Brasil, no ano de 2000. Neles, o ODM 4:  
Reduzir a mortalidade infantil, em específico, buscou reduzir em 2/3 a taxa de  
mortalidade em crianças menores de cinco anos (Pereira et al., 2021).  
Cumpre salientar que, no contexto atual, a preocupação com o desenvolvimento  
sustentável tem ganhado cada vez mais relevância. Tal cenário é impulsionado pelo fato de que  
o mundo enfrenta desafios ligados à mudança climática, perda de biodiversidade, pobreza,  
desigualdades sociais e escassez de recursos naturais. Para lidar com esses desafios, a  
comunidade internacional estabeleceu uma série de instrumentos de combate, dentre eles, a  
Agenda 2030.  
1
Para mais informações, confira Carson (2010).  
Geysa Elane Rodrigues de Carvalho Sá; Edna Maria Goulart Joazeiro  
A Agenda 2030 é um plano de ação global adotado pelas Nações Unidas em setembro  
de 2015, que consiste em um conjunto de objetivos, metas e indicadores chamados de Objetivos  
de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que visam à continuidade dos avanços da ONU e  
estabelecem meios para a promoção de um mundo mais sustentável, equitativo e próspero até  
o fim de 2030. Compreendem metas e indicadores que visam abordar sobre os principais  
desafios globais e orientar ações impulsionadoras do desenvolvimento sustentável.  
Há, portanto, 17 objetivos interligados, que abrangem uma gama de questões sociais,  
econômicas e ambientais, como erradicação da pobreza, igualdade de gênero, saúde, educação,  
energia limpa, trabalho digno, cidades sustentáveis, entre outros. Os Objetivos de  
Desenvolvimento Sustentável (ODS) refletem a necessidade de se adotar uma abordagem  
integrada e holística, na qual o progresso em um dos objetivos está intrinsecamente relacionado  
ao avanço dos demais. Dessa forma, as ações voltadas ao cumprimento das metas são orientadas  
em âmbito global, nacional e local.  
O aspecto integrado, tanto dos problemas como dos objetivos, enfatiza a importância de  
estabelecer parcerias e colaborações entre os diferentes atores, incluindo governos, setor  
privado, sociedade civil e organismos internacionais. É essa ação conjunta que possibilita a  
construção de um futuro mais próspero e equitativo para as gerações presentes e futuras. Dentre  
as áreas, a ODS nº 3 de Saúde e Bem-estar objetiva “assegurar uma vida saudável e promover  
o bem-estar para todas e todos, em todas as idades” (ONU, 2015).  
890  
Sob esse prisma, ressalta-se que, em razão do escopo atrelado às suas metas, adota meios  
que permitem quantificar o desenvolvimento sustentável no campo da saúde com indicadores  
amplamente utilizados, o que permite visualizar como se tem fomentado o desenvolvimento  
socioeconômico. Nesse contexto, verifica-se que essa busca por indicadores é essencial, pois,  
a partir deles, é possível realizar uma análise situacional sobre a saúde pública:  
com os avanços no controle das doenças infecciosas e a melhor compreensão  
do conceito de saúde e de seus determinantes sociais, passou-se a analisar  
outras dimensões do estado de saúde, medidas por dados de morbidade,  
incapacidade, acesso a serviços, qualidade da atenção, condições de vida e  
fatores ambientais, entre outros (REDE, 2008, p. 13, grifo nosso).  
Nesse âmbito, destaca-se a relevância da meta 3.2 das ODS, que propõe, aos países  
adotantes, até 2030, “acabar com as mortes evitáveis de recém-nascidos e crianças menores de  
5 anos” (ONU, 2015). O parâmetro almejado é a redução da taxa de mortalidade neonatal, o  
que culmina na necessidade de se reduzir a taxa de mortalidade das crianças com menos de 28  
dias de nascido para pelo menos 12 por 1000 nascidos vivos, e da taxa de mortalidade de  
crianças menores de 5 anos para pelo menos 25 por 1000 nascidos vivos.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 886-905, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A importância das políticas públicas para a primeira infância enquanto estratégia voltada à redução  
da mortalidade infantil no estado do Piauí  
Dessa maneira, observa-se que os indicadores utilizados e mencionados nas metas  
propostas, com vistas a atingir esse objetivo, servem para regular e nortear as políticas públicas  
a serem implementadas ao longo dos anos. Por tais motivos, adotam-se meios que permitam a  
identificação de problemas estruturais básicos, que são aqueles que representam maior impacto  
na cadeia de desenvolvimento sustentável. Sobre os indicadores da meta 3.2, destaca-se que:  
a taxa de mortalidade infantil é usada internacionalmente como o indicador  
que melhor retrata o estágio de desenvolvimento econômico de um país ou  
região, justamente por possuir relação direta com características  
socioeconômicas e, consequentemente, ser sensível às suas variações  
(Kropiwiec; Franco; Amaral, 2017, p. 392).  
O problema da mortalidade é mais perceptível quando se compara países desenvolvidos  
e em desenvolvimento, sendo os primeiros detentores do maior Índice de Desenvolvimento  
Humano (IDH), aqueles, portanto, que apresentam as menores taxas de mortalidade infantil –  
com três mortes a cada mil nascidos vivos , o que reforça a necessidade de alcançar tais metas  
(Kropiwiec; Franco; Amaral, 2017). O Brasil, por sua vez, apesar da meta voltada à redução da  
mortalidade ter sido alcançada mediante à implementação dos ODM, ainda enfrenta desafios.  
Os novos parâmetros estabelecidos na Agenda 2030 estão aquém dos que foram  
objetivados nacionalmente frente à ODS 3, particularmente quanto à meta 3.2. A conexão entre  
os ODS e a discussão sobre a infância, sobretudo no que diz respeito à diminuição da  
mortalidade infantil, é essencial para promover uma sociedade mais justa e equitativa. Nesse  
contexto, destaca-se o ODS 3, que fomenta a existência saudável, em todas as faixas etárias,  
possuindo como um de seus objetivos basilares (3.2) a liquidação dos falecimentos evitáveis de  
recém-nascidos e crianças com menos de cinco anos (ONU, 2015).  
891  
Contudo, para alcançar esse objetivo da ODS 3.2, é fundamental que se reforcem as  
políticas públicas direcionadas à atenção primária à saúde, como o acesso ao pré-natal, parto  
seguro, imunização e monitoramento nutricional, além da expansão da infraestrutura básica de  
saneamento. Sob essa perspectiva, destaca-se o ODS 1, que tem como intuito a eliminação da  
pobreza, também está diretamente relacionado ao tema, uma vez que crianças em condição de  
vulnerabilidade social apresentam maiores riscos de falecimento por causas evitáveis (ONU,  
2015).  
Nesse âmbito, destaca-se, também, o ODS 2, uma vez que visa erradicar a escassez e  
impulsionar a segurança alimentar, o que implica o desenvolvimento de políticas públicas que  
tenham como foco o enfrentamento da desnutrição infantil e o estímulo à alimentação saudável,  
principalmente durante a primeira infância. Por outro lado, ressalta-se a relevância do ODS 6,  
que aborda sobre o acesso à água potável e ao saneamento, destacando-se que a falta dessas  
Geysa Elane Rodrigues de Carvalho Sá; Edna Maria Goulart Joazeiro  
condições essenciais é um fator agravante da mortalidade infantil, especialmente por provocar  
o aparecimento de doenças diarreicas (ONU, 2015).  
Sob essa ótica, Guasch (2022) compreende as crianças como o público prioritário das  
iniciativas da ONU, especialmente após o advento da Agenda 2030 e dos ODS. Desse modo,  
estabelece-se uma relação direta entre os elevados índices de mortalidade infantil, as condições  
de pobreza e a ineficácia das políticas públicas no passado da saúde pública. Nesse sentido,  
Guasch (2022) enfatiza que intervenções como o Programa Primeira Infância Melhor (PIM)  
representam não somente respostas locais a essa questão, mas também a materialização dos  
compromissos internacionais assumidos pelo Brasil.  
Complementarmente, Guasch (2022) reconhece que os ODS, particularmente aqueles  
direcionados à eliminação da pobreza (ODS 1) e à diminuição das disparidades (ODS 10),  
somente serão eficazes se integrarem a primeira infância como um eixo fundamental das  
políticas públicas. Contudo, quando o contexto estadual é posto em análise, conforme será  
observado no item 4, percebe-se, ainda, uma mais elevada taxa de mortalidade infantil, que  
denota o desafio no atingimento das metas da Agenda 2030 e abre espaço para provocar os  
implementadores de políticas, que devem desenvolver estratégias para promover mudanças  
paradigmáticas regionais e locais.  
892  
2 - Breve histórico das políticas de saúde da criança no brasil  
O contexto histórico relacionado à origem do conceito de criança remonta à transição  
do século XIX para o XX (Albernaz; Couto, 2022). Sem dúvida, o Século XX foi marcado por  
inúmeras transformações políticas, econômicas e sociais impulsionadas, especialmente, pela  
Revolução Industrial que o mundo vivenciou nesse período. Até o início desse século, as ações  
do campo de cuidado às crianças possuíam caráter filantrópico, sendo o momento em que,  
efetivamente, criaram-se e reconheceram-se as primeiras instituições de proteção à infância.  
As mais importantes e representativas foram, em 1899, o Instituto de Proteção  
e Assistência à Infância (Ipai), criado por Moncorvo Filho, e a Policlínica  
Botafogo, instituída por Luiz Torres Barbosa, ambas filantrópicas. Em 1909,  
foi criada a Policlínica das Crianças; e, em 1914, o Hospital São Zaccharias,  
ambos da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro. Em 1924, vinculado  
ao Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP), foi fundado o Hospital  
Abrigo Arthur Bernardes, dirigido pelo pediatra Antônio Fernandes Figueira.  
Em 1946, transformou-se no Instituto Fernandes Figueira e, em 2010, no  
Instituto Nacional de Saúde da Mulher, Criança e Adolescente Fernandes  
Figueira - IFF/ Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz (Sanglard; Ferreira, 2014).  
Especificamente no governo Vargas, no ano de 1940, é criado o Departamento de Saúde  
da Criança, cuja perspectiva assistencial era voltada à prestação de auxílio à classe trabalhadora,  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 886-905, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A importância das políticas públicas para a primeira infância enquanto estratégia voltada à redução  
da mortalidade infantil no estado do Piauí  
oferecendo-se acesso a serviços como creches junto às fábricas. Em 1973, foi lançado o  
Programa Nacional de Imunizações (PNI), no intuito de coordenar o processo de imunização,  
cuja cobertura, até então, era reduzida (Tyrrel, 1997). Já em 1976 surge o Programa de Atenção  
à Criança, entretanto, fomentava um atendimento muito burocrático, o que impedia a população  
geral de usufruí-lo (Zanolli; Merhy, 2001).  
Posteriormente, em 1984, foi implantado o Programa de Assistência Integral à Saúde da  
Criança (PAISC), que executava ações voltadas diretamente à área da saúde, correspondendo,  
assim, a uma tentativa de promoção da atenção integral à saúde na infância (Brasil, 1995). Já  
com o advento da Carta Magna de 1988 e mediante à implementação do Sistema Único de  
Saúde (SUS), a saúde passa a ser um direito garantido a todos os brasileiros, sendo que o  
Programa Saúde da Família assume uma notória importância, dado o seu objetivo.  
Impulsionado por esse cenário, em 1995, o Ministério da Saúde (MS) lança o Projeto  
de Redução da Mortalidade Infantil (Brasil, 1995). Contudo, verifica-se que, no Brasil, a  
garantia dos direitos para crianças e adolescentes somente é regulamentada, de fato e de direito,  
a partir do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990. Nesse contexto, ressalta-se  
a importância histórica do pediatra Antônio Filgueira para o próprio ECA, pois, mesmo que  
tenha atuado início do século XX, ao reconhecer a importância de se manter as mães junto às  
crianças internadas, promoveu mudanças importantes:  
893  
Destaca-se, entre 1900 e 1910, a sua atuação como chefe da enfermaria  
pediátrica do Hospital São Sebastião (...) indicado por Oswaldo Cruz, então  
na Diretoria-Geral de Saúde Pública (DGSP). Figueira foi vanguardista ao  
permitir o acompanhamento das mães durante as internações, o que somente  
foi regulamentado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em 1991  
(Albernaz; Couto, 2022, p. 239).  
Entretanto, mesmo diante dos avanços observados, cumpre destacar que foi apenas nos  
anos 2000 que o Ministério da Saúde lançou um programa com o intuito de manter o maior  
contato das mães com os bebês, o chamado ‘método Canguru’, cuja proposta era fomentar a  
atenção e cuidado, com vistas ao aprimoramento da participação da família de forma acolhedora  
e contínua (Araújo, 2014). Já no século XXI, em 2001, é implantada a Atenção Integrada às  
Doenças Prevalentes na Infância (AIDIPI), que teve como objetivo a redução da mortalidade  
em crianças até 05 anos de idade (Brasil, 2002).  
No governo Lula, em 2006, a mortalidade infantil foi considerada como uma política de  
governo e inserida no Pacto pela Vida (Brasil, 2006), dentre outras ações promovidas até  
novembro de 2014, quando se aprovou a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da  
Criança (PNAISC), que tinha direcionamento às crianças, especialmente as da primeira  
infância. Em junho de 2011, o governo brasileiro implementou a Rede Cegonha, fomentando  
Geysa Elane Rodrigues de Carvalho Sá; Edna Maria Goulart Joazeiro  
“uma rede de cuidados com vistas a garantir segurança e qualidade assistencial à mulher em  
todo seu ciclo reprodutivo, bem como garantir à criança segurança e o cuidado integral ao  
nascimento, crescimento e desenvolvimento” (Araújo, 2014, p. 1004).  
Por fim, dentre as ações executadas pela própria sociedade civil, é importante destacar  
a criação Rede Nacional Primeira Infância, que é responsável pelo desenvolvimento do Plano  
Nacional pela Primeira Infância, estratégia que prioriza a execução de ações direcionadas e  
específicas para este público. A partir disso, conclui-se que a assistência à saúde da criança  
deve permanecer em constante avanço, pois a história revela que houve uma evolução na  
qualidade dos cuidados direcionados à essa população, refletida no angariamento de índices de  
redução de mortalidade infantil mais promissores. No entanto, algumas taxas se mantêm  
elevadas, em especial na mortalidade neonatal, como será discutido no próximo item.  
3 - A mortalidade infantil e na infância no Piauí  
Inicialmente, destaca-se que “a mortalidade infantil (MI) é considerada um grave  
problema de saúde pública e possui relação direta com as condições de vida, acesso e qualidade  
da atenção à saúde materno-infantil, sendo na maioria das vezes evitável” (Silva, et al., p. 2,  
2023). Esse índice corresponde a um aspecto social tão socialmente significativo que compôs  
o conjunto de Metas do Desenvolvimento do Milênio (ODM) e também foi inserido como meta  
dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) na Agenda 2030.  
894  
A mortalidade infantil, embora seja tradicionalmente considerada um parâmetro técnico  
de saúde pública, reflete de maneira significativa as desigualdades estruturais que atravessam  
o desenvolvimento social e econômico do país. Nesse sentido, fatores sociais como saúde,  
renda, educação, moradia, saneamento, entre outros, são fundamentais para entender a  
persistência da mortalidade infantil em regiões como o estado do Piauí, marcado historicamente  
por condições de elevada vulnerabilidade social. Trata-se, portanto, não apenas de um desafio  
técnico no campo da medicina preventiva, mas uma expressão concreta de injustiça social  
acumulada, que incide de forma mais intensa sobre territórios e populações historicamente  
marginalizados.  
Sob essa ótica, observa-se que a evitabilidade da mortalidade infantil está diretamente  
relacionada à distribuição equitativa de bens públicos essenciais. Quando essa distribuição não  
ocorre de forma justa, as causas da mortalidade infantil tornam-se múltiplas, impulsionadas por  
fatores socioeconômicos, como o acesso precário a serviços de saúde de qualidade, ausência de  
saneamento básico, desnutrição, entre outros.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 886-905, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A importância das políticas públicas para a primeira infância enquanto estratégia voltada à redução  
da mortalidade infantil no estado do Piauí  
Nesse sentido, Alves e Coelho (2021) destacam que as principais causas da mortalidade  
infantil no Brasil decorrem da interação entre fatores biológicos, sociais e econômicos. Entre  
as causas diretas mais importantes estão a prematuridade, doenças diarreicas, anomalias  
congênitas, asfixia no parto e desnutrição todas associadas a situações passíveis de prevenção  
por meio da oferta de cuidados qualificados no pré-natal, no parto e no período neonatal.  
Entretanto, os autores também chamam atenção para as fragilidades das políticas públicas, que,  
em geral, negligenciam as particularidades de gênero relacionadas à mortalidade infantil.  
Embora o Brasil tenha apresentado uma redução significativa das taxas de mortalidade  
infantil nas últimas décadas, os índices permanecem elevados quando comparados aos países  
desenvolvidos, sobretudo em razão das persistentes desigualdades regionais. Nesse contexto, a  
renda exerce um papel determinante na redução da mortalidade infantil, com impacto ainda  
mais acentuado sobre a população masculina, o que reforça a necessidade de estratégias  
públicas centradas no enfrentamento da pobreza.  
Assim, compreende-se que as origens da mortalidade infantil, embora multifatoriais,  
não devem ser interpretadas unicamente como falhas técnicas ou sanitárias. A continuidade  
desse fenômeno está associada à ausência de condições mínimas para uma vida digna, que priva  
muitas famílias dos recursos e oportunidades necessários para exercerem autonomia e  
alcançarem padrões básicos de bem-estar. Nesse cenário, programas como a Estratégia Saúde  
da Família revelam-se fundamentais ao promovem o acesso a cuidados básicos, incentivarem a  
autonomia e fortalecerem competências essenciais relacionadas ao cuidado e à promoção da  
saúde.  
895  
Diante desse cenário, as políticas públicas desempenham um papel crucial na redução  
da mortalidade infantil e na promoção da saúde das crianças. Especificamente no caso do  
Estado do Piauí, a mortalidade infantil tem sido uma preocupação recorrente devido às taxas  
elevadas que persistem ao longo dos anos; assim, estudar este indicador permite avaliar a  
qualidade da saúde e as políticas públicas atreladas a esta região. Contudo, antes de se  
apresentar tais dados, é preciso esclarecer que a mortalidade infantil possui dois componentes:  
[...] a mortalidade neonatal e a mortalidade pós-neonatal, referente aos óbitos  
ocorridos em menores de um ano de vida, entre 0 e 27 dias de vida e entre 28  
a 364 dias de vida, respectivamente. Na mortalidade neonatal as causas de  
morte estão associadas à qualidade da atenção à saúde, enquanto na  
mortalidade pós-neonatal existe uma relação com o ambiente em que a criança  
cresce e interage (Silva et al., 2023, p. 2).  
O Estado do Piauí tem adotado medidas e políticas voltadas ao enfrentamento desse  
problema. Estratégias como o Programa de Humanização do Pré-Natal e Nascimento (PHPN),  
o Programa de Saúde da Família (PSF) e o Programa Bolsa Família, por exemplo, têm sido  
Geysa Elane Rodrigues de Carvalho Sá; Edna Maria Goulart Joazeiro  
executadas, cujo objetivo é oferecer atendimento adequado às gestantes, garantir o  
acompanhamento médico durante a gravidez e promover a saúde das crianças. O resultado do  
conjunto dessas medidas, aliado a outros fatores, como o avanço da medicina, é visualizado no  
Gráfico 1:  
Gráfico 1: Taxa de Mortalidade Infantil Piauí (2003-2021).  
Fonte: Elaboração própria a partir do Sistema de Informações sobre Mortalidade SIM (Brasil, 2023).  
Sob essa perspectiva, a taxa de mortalidade na infância é compreendida como um  
indicador social representado pelo número de crianças que foram a óbito antes de completar 5  
anos de vida para cada 1.000 nascidas vivas no período de um ano. Essa taxa é influenciada  
pela composição da mortalidade do primeiro ano de vida (mortalidade infantil), amplificando  
o impacto das causas pós-neonatais, a que estão expostas também as crianças entre 1 e 4 anos  
de idade (Brasil, 2002). Assim, no Gráfico 2, é possível observar a evolução da taxa de  
mortalidade na infância do estado do Piauí:  
896  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 886-905, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A importância das políticas públicas para a primeira infância enquanto estratégia voltada à redução  
da mortalidade infantil no estado do Piauí  
Gráfico 2: Taxa de Mortalidade na Infância Piauí (2003-2021).  
Fonte: Elaboração própria a partir do Sistema de Informações sobre Mortalidade SIM (Brasil, 2023).  
Apesar de alguns retrocessos pontuais, observa-se uma tendência geral de redução na  
taxa de mortalidade, o que sinaliza avanços nesse indicador ao longo do tempo. A análise dos  
dados apresentados revela uma queda progressiva nos índices de mortalidade infantil e pueril  
entre os anos de 2003 e 2021. No entanto, os retrocessos identificados nos anos de 2015 e 2016  
coincidem com um intervalo de contração fiscal e redução de investimentos no Sistema Único  
de Saúde (SUS), conforme analisado por José Mendes Ribeiro Funcia (2022). Esse cenário  
evidencia a vulnerabilidade das políticas públicas frente à instabilidade macroeconômica,  
especialmente nos estados fortemente dependentes de transferências federais, como o Piauí.  
Dessa forma, os dados não devem ser interpretados de maneira linear, mas sim como  
indicadores sensíveis às mudanças no pacto federativo, às prioridades fiscais e à capacidade do  
Estado de sustentar políticas redistributivas em cenários de crise. Ressalta-se, contudo, que a  
estratégia macroeconômica adotada no Brasil tem contribuído para o agravamento das  
dificuldades econômicas e sociais preexistentes, tornando o contexto de austeridade fiscal  
particularmente crítico, na medida em que impacta diretamente a continuidade e efetividade  
dos serviços públicos de saúde.  
897  
Diante desse cenário, observa-se que a redução da mortalidade infantil decorre de  
múltiplos fatores, o que demanda a implementação articulada de ações voltadas à educação em  
saúde, à promoção do aleitamento materno exclusivo, ao incentivo à vacinação, à prevenção de  
doenças, à capacitação de profissionais de saúde, à melhoria na infraestrutura dos serviços, de  
fortalecimento da vigilância epidemiológica, entre outras estratégias. Tais medidas são  
Geysa Elane Rodrigues de Carvalho Sá; Edna Maria Goulart Joazeiro  
fundamentais para o enfrentamento do problema e para redução dos índices de mortalidade  
infantil. Nesse sentido, ao se sobreporem os dois indicadores analisados, identifica-se uma  
tendência regular de queda para ambos, conforme demonstrado no Gráfico 3.  
Gráfico 3: Taxa de Mortalidade Infantil e Taxa de Mortalidade na Infância Piauí (2003-2021).  
898  
Fonte: Elaboração própria a partir do Sistema de Informações sobre Mortalidade SIM (Brasil, 2023).  
No entanto, apesar dos esforços empreendidos, é necessário que haja o monitoramento  
constante dessas ações. Por outro lado, também é fundamental que seja feita uma avaliação  
periódica das políticas públicas para garantir que se mantenham efetivas. A identificação de  
lacunas e desafios é fundamental para se aprimorar as estratégias e direcionar os recursos de  
forma adequada, visando à redução da mortalidade infantil e ao bem-estar das crianças no  
Estado do Piauí.  
Como forma de controle e acompanhamento, tanto a sociedade quanto o Estado têm  
buscado aprimorar sua capacidade de mensuração, adotando metodologias mais adequadas às  
realidades enfrentadas. A seguir, são apresentadas as primeiras formas pelas quais a Agenda  
2030 estabelece a mensuração dos índices de mortalidade, no âmbito dos Objetivos de  
Desenvolvimento Sustentável (ODS), a serem alcançados pelos países signatários das Nações  
Unidas.  
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A importância das políticas públicas para a primeira infância enquanto estratégia voltada à redução  
da mortalidade infantil no estado do Piauí  
3.1 - Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS): A Meta 3.2  
Os índices de mortalidade são mensurados tendo como base diferentes fatores, tais como  
faixa etária, a abrangência, a geografia, a quantidade de óbitos por ocorrência ou residência,  
dentre outros. Entende-se que a delimitação de cada fator leva ao estabelecimento de uma taxa  
de mortalidade adaptada à necessidade de mensuração.  
O Ministério da Saúde, como forma de retratar essa realidade, faz uso do Sistema de  
Informações sobre Mortalidade (SIM) para registrar as declarações de óbito e mensurar os  
óbitos infantis e fetais. Adicionalmente, utiliza-se do sistema para identificar taxas de  
mortalidade distintas, sendo várias as taxas neonatais; precoce, tardia, neonatal e pós-neonatal,  
além da infantil (Brasil, 2001).  
Contudo, há que se reiterar que a Agenda 2030, ao estabelecer os parâmetros da ODS,  
registra somente duas metodologias, sendo que a primeira delas corresponde ao número de  
óbitos de menores de 1 ano de idade, a cada 1000 nascidos vivos. Por outro lado, a segunda  
considera o número de óbitos de menores de 5 anos de idade, a cada 1000 nascidos vivos. Este  
trabalho considera ambas em sua análise.  
A seguir descreve-se a metodologia estabelecida para esses dois indicadores.  
3.1.1 - Número de óbitos de menores de 1 ano de idade, a cada 1000 nascidos vivos  
Esse indicador compreende a soma dos óbitos ocorridos nos períodos neonatal precoce  
(0 a 6 dias de vida), neonatal tardio (7 a 27 dias de vida) e pós-neonatal (28 dias a 364 dias),  
cujo objetivo é mensurar o risco de um nascido vivo morrer durante o seu primeiro ano de vida.  
Aqui, compreende-se o índice como mortalidade infantil, ou mortalidade para os menores de  
um ano de idade.  
899  
Portanto, nomeia-se a mortalidade infantil como mortalidade de menores de um ano de  
idade, e, pelo Brasil ser um dos países integrantes às Nações Unidas, visa reduzir a  
mortalidade neonatal para pelo menos 12 a cada 1000 nascidos vivos.  
Método de Cálculo:  
푁푂푅1  
푇푥. 푀표푟푡푎푙푖푑푎푑푒 퐼푛푓푎푛푡푖푙 = (  
) ∗ 1000  
푁푉푀푅  
NOR1: Número de óbitos de residentes com menos de um ano de idade;  
NVMR: Número total de nascidos vivos de mãe residentes.  
Geysa Elane Rodrigues de Carvalho Sá; Edna Maria Goulart Joazeiro  
A taxa de mortalidade infantil é utilizada internacionalmente, compreendida como o  
indicador que melhor retrata o estágio de desenvolvimento econômico e social de um país ou  
região, justamente por possuir relação direta com características socioeconômicas e,  
consequentemente, por ser sensível às suas variações.  
3.1.2 - Número de óbitos de menores de 5 anos de idade, por 1000 nascidos vivos  
Esse indicador social tem por objetivo mensurar os dados relacionados às crianças que  
chegam a óbito antes de completar 5 anos de vida a cada 1000 nascidos vivos. Para as Nações  
Unidas o objetivo, até 2030, é acabar com a mortalidade de crianças menores de 5 anos,  
reduzindo o número para, pelo menos, 25 a cada 1000 nascidos vivos.  
Método de Cálculo:  
푁푂푅5  
푇푥. 푀표푟푡푎푙푖푑푎푑푒 푛푎 퐼푛푓â푛푐푖푎 = (  
) ∗ 1000  
푁푉푀푅  
NOR5: Número de óbitos residentes com menos de 5 anos de idade;  
NVMR: Número total de nascidos vivos de mãe residentes.  
Considerando-se as contribuições de ambas as metodologias, conclui-se que os dois  
indicadores de mortalidade são reflexos de diferentes condições às quais as crianças estão  
submetidas. Dessa maneira, verifica-se que cada um deles corresponde ao estágio do  
desenvolvimento infantil. Portanto, a sua representatividade implica na necessidade de se  
investir nas estratégias de controle e monitoramento das métricas.  
900  
Diante desse cenário, a seguir, apresenta-se uma representação visual dos indicadores  
para o estado do Piauí, desagregando os índices nas metas estabelecidas nacionalmente, de  
acordo com a ODS, com o intuito de verificar, de acordo com os dados de 2019 a 2022, se o  
Estado do Piauí se encaminha para acabar com as mortes evitáveis até os 5 anos de idade, de  
modo a garantir que as gerações seguintes tenham acesso a essas ações sustentáveis.  
3.1.3 - A Meta 3.2 nacionalmente Acabar com as mortes evitáveis até 5 anos  
As taxas altas refletem, de maneira geral, em baixos níveis de saúde, de  
desenvolvimento socioeconômico e de condições de vida. Sob essa lógica, ressalta-se que o  
Brasil possui como meta 3.2 dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS Saúde e  
Bem-Estar) “reduzir a mortalidade neonatal para no máximo 5 por 1000 nascidos vivos” (IPEA,  
2019, grifo nosso).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 886-905, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A importância das políticas públicas para a primeira infância enquanto estratégia voltada à redução  
da mortalidade infantil no estado do Piauí  
Observa-se que o compromisso assumido pelo Brasil é mais ousado, pois a meta está  
além do que é exigido pela própria ODS para os países de maneira geral. Contudo, ao observar  
as taxas apresentadas anteriormente no Gráfico 3, pode-se observar que o Piauí tende a não  
cumprir essa meta. Esses índices tendem a piorar nas diversas regiões do estado (vide figura 1).  
Figura 1: Evolução Mortalidade Infantil (até 1 ano) Piauí (2019-2021).  
2019  
2020  
2021  
901  
20+  
10<20  
0<10  
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados DataSUS e TabNet 2019-2022.  
Com base no cenário evidenciado pela figura 1, observa-se que a desigualdade espacial  
retratada nos mapas confirma a existência de zonas de exclusão sanitária, conforme conceituado  
por Milton Santos (2000). Nessas áreas, a presença do Estado é inexistente ou insuficiente,  
refletindo-se em indicadores de saúde significativamente fragilizados.  
A análise espacial das taxas de mortalidade revela, portanto, que a vulnerabilidade não  
se restringe à dimensão econômica, mas se manifesta também de forma territorial, o que exige  
a formulação de estratégias diferenciadas por microrregiões e a ampliação das ações de  
vigilância em saúde. No que tange à meta brasileira 3.2 dos Objetivos do Desenvolvimento  
Geysa Elane Rodrigues de Carvalho Sá; Edna Maria Goulart Joazeiro  
Sustentável (ODS Saúde e Bem-Estar) acerca da mortalidade na infância (<5 anos), o foco é  
reduzir para, no máximo, 8 a cada 1000 nascidos vivos (IPEA, 2019).  
Figura 2: Evolução Mortalidade na Infância (<5 anos) Piauí (2019-2021).  
2019  
2020  
2021  
902  
20+  
10<20  
0<10  
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados DataSUS e TabNet 2019-2022.  
Mesmo com a tendência contínua de queda desde o ano de 2016 (conforme observado  
no Gráfico 3) o Brasil, e em especial, o Piauí, não conseguirá atingir os valores estabelecidos  
como meta até 2030.  
Considerações finais  
Após verificar os índices de mortalidade infantil presentes no Brasil a partir dos anos  
2000, conclui-se que o país, em especial o estado do Piauí, não irá atingir um dos objetivos da  
Agenda 2030, compromisso assumido a partir dos anos 2015, no que tange à redução da taxa  
de mortalidade neonatal e de infância. Esse cenário implica reconhecer que a efetivação de  
políticas de intervenção na primeira infância depende da identificação e análise dos pontos em  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 886-905, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A importância das políticas públicas para a primeira infância enquanto estratégia voltada à redução  
da mortalidade infantil no estado do Piauí  
que a política de equidade do Sistema Único de Saúde (SUS) apresenta fragilidades ou falhas  
de implementação.  
Sob essa perspectiva, torna-se fundamental identificar as ações voltadas à promoção de  
melhorias nas condições de vida no presente, de modo a avaliar, com base nesse diagnóstico, o  
país que se deseja construir para o futuro. Assim, defender o desenvolvimento sustentável  
implica priorizar intervenções que promovam o bem-estar na primeira infância, considerando  
que as experiências vivenciadas nessa fase têm repercussões ao longo de todo o curso de vida.  
Nesse sentido, as políticas públicas voltadas à primeira infância devem ocupar posição central  
na agenda de desenvolvimento.  
Nesse estudo, verificou-se, mesmo que brevemente, uma constante evolução histórica  
das políticas públicas de saúde da criança acompanhada pari passu ao desenvolvimento dos  
países e melhorias de condições de vida das pessoas que nele fazem parte. Dessa maneira,  
implica-se registrar que, não por acaso, essas mudanças positivas refletem, de forma  
inversamente proporcional, nas taxas de mortalidade infantil. Muito se fez, porém, muito ainda  
há que se fazer.  
Entretanto, a consolidação dos direitos de proteção às crianças ainda precisa sair do  
papel e do âmbito apenas das normas legais. Deve-se fomentar, portanto, não somente o  
desenvolvimento da integridade física e mental, mas, também, do bem-estar social desses que  
são a representação do próprio conceito de esperança. Assim, ao se buscar compreender a  
importância do alinhamento das políticas públicas na primeira infância com os princípios do  
desenvolvimento sustentável, depara-se com um desafio.  
903  
É preciso fortalecer a interconexão entre as dimensões social, ambiental e econômica,  
pois é esse intercâmbio entre ambas que impulsiona o desenvolvimento de soluções abrangentes  
e sustentáveis para promover um futuro melhor para as crianças do Estado do Piauí. Nesse  
contexto, como ressalta a literatura, a melhoria desse indicador culmina, diretamente, na  
melhora dos índices gerais de todo país. A partir disso, entende-se a importância de priorizar as  
políticas públicas direcionadas à primeira infância.  
Conclui-se, por fim, que, embora se reconheça uma tendência de queda nas taxas de  
mortalidade infantil, conforme demonstrado ao longo deste estudo, há uma limitação  
metodológica relevante, relacionada ao uso de dados oficiais disponíveis apenas até o ano de  
2021. Nesse sentido, destaca-se a importância de incorporar, em análises futuras, os dados  
referentes aos anos de 2022 e 2023, a fim de avaliar se a aparente melhora observada representa,  
de fato, uma tendência consistente ou se está vinculada a efeitos pontuais decorrentes da  
pandemia de Covid-19.  
Geysa Elane Rodrigues de Carvalho Sá; Edna Maria Goulart Joazeiro  
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Somos o futuro do Brasil? O Programa  
Pé-de-Meia e a Agenda 2030 da ONU  
Are we the future of Brazil? The Pé-de-Meia Program  
and the UN 2030 agenda  
Eduardo Cechin da Silva*  
Rosilaine Coradini Guilherme**  
Resumo: Este estudo parte da realidade  
brasileira sem, contudo, eximir-se de pontuar as  
determinações impostas sob a influência do  
capital e de organismos internacionais. Tal  
lógica atribui as causas da pobreza e da miséria  
a razões que culpabilizam o sujeito, como o  
déficit educacional ou profissional. Com isto, o  
presente texto objetiva caracterizar o Programa  
Federal Pé-de-Meia enquanto incentivo  
financeiro-educacional, a fim de relacioná-lo à  
Agenda 2030 da ONU. Para tanto, respalda-se  
no método materialista histórico-dialético,  
mediante pesquisa exploratória sustentada em  
fontes documentais, além de articulação de  
fundamentação teórica pertinente e indicadores  
sociais. Em resposta ao objetivo e ao título do  
Abstract: This study departs from the Brazilian  
reality without exempting itself from pointing  
out the imposed determinations under the  
influence of capital and international  
organizations. This logic attributes the causes of  
poverty and misery to reasons that blame the  
subject, such as educational or professional  
deficits. Therefore, this text aims to characterize  
the Federal Pé-de-Meia Program as a financial-  
educational incentive, in order to relate it to the  
UN's 2030 Agenda. To this end, it is based on  
dialectical and historical materialism, through  
exploratory research supported by documentary  
sources, as well as articulating theoretical  
foundations and social indicators. In response to  
the article's objective and title, it became  
apparent that the neoliberal prescription,  
contained in social programs such as Pé-de-  
Meia and in the UN's proposals, clashes with a  
future based on human emancipation. Thus, the  
idea that young people are the future of the  
country perpetuates itself, without considering  
the destination of this oneiric future.  
artigo, evidenciou-se que  
o
receituário  
neoliberal, contido em programas sociais, como  
o Pé-de-Meia e nas propostas da ONU, colide  
com um futuro baseado na emancipação  
humana. Logo, perpetua-se a ideia de que a  
juventude é o futuro do país, sem considerar  
qual é a destinação para esse futuro onírico.  
Palavras-chaves: Pobreza; Educação; Proteção  
Keywords: Poverty; Education; Social  
social; Programa Pé-de-Meia; Agenda 2030.  
protection; Pé-de-Meia Program; Agenda 2030.  
* Universidade Federal do Pampa. E-mail: eduardocechin424@gmail.com  
** Universidade Federal do Pampa. E-mail: rosilaineguilherme@yahoo.com.br  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.47254  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 29/01/2025  
Aprovado em: 03/11/2025  
Somos o futuro do Brasil? O Programa Pé-de-Meia e a Agenda 2030 da ONU  
Introdução  
O Brasil, maior país da América Latina, tem sido palco de constantes retrocessos no  
campo das políticas sociais, resultante das medidas protagonizadas por governos conservadores  
que se encontram alinhados às demandas do grande capital. Na área educacional, isso se  
manifestou com a contrarreforma do ensino médio, mediante Lei Federal n° 13.415/2017,  
sancionada no governo de Michel Temer (2016-2019), a fim de atender o interesse empresarial  
na criação de força de trabalho com baixo custo, camuflada pela falácia do empreendedorismo  
e da autonomia estudantil. Dessa forma, houve a ampliação das desigualdades no país, refletida  
nas situações desencadeadas pela concepção de educação que passa a privilegiar a formação de  
recursos humanos com foco na educação técnica e profissional, em detrimento do acesso a  
conhecimentos críticos contribuidores à formação humana.  
Especificamente em 2024, no terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva,  
é lançada uma nova política vinculada ao ensino médio: o Programa Pé-de-Meia. Frente a esse  
contexto, o presente estudo objetiva caracterizar o programa federal Pé-de-Meia enquanto  
incentivo financeiro-educacional, a fim de relacioná-lo com a Agenda 2030 da Organização das  
Nações Unidas (ONU) documento do qual o Brasil é signatário. Por consequência, vislumbra-  
se um tema cientificamente incipiente, considerando o marco inaugural do Programa Pé-de-  
Meia, instituído recentemente pela Lei n° 14.818/2024, além de considerar a articulação com a  
Agenda, ainda em vigor, prescrita pela ONU.  
907  
Em termos metodológicos, sob o suporte do método materialista histórico-dialético, este  
estudo exploratório ocorreu por meio de pesquisa documental, mediante um enfoque  
qualitativo, envolvendo legislações, bem como publicações disponíveis em sites  
governamentais. O método de análise da realidade, aqui adotado, é denominado como  
materialista histórico-dialético, o qual pressupõe a articulação de “três categorias nucleares –  
totalidade, contradição e mediação” (Netto, 2009, p. 691), além da categoria da historicidade.  
Assim, o fio condutor da análise parte da perspectiva da totalidade, ou seja, parte da noção de  
que as determinações da realidade concreta estão mediatizadas entre si. Logo, essas  
determinações não são isoladas, mas construídas socialmente através da história, que revela  
sua historicidade, seu caráter provisório e dialético por meio das contradições que as negam,  
mas as positivam ao mesmo tempo. Isso não se reduz a um mero conjunto de procedimentos  
técnicos para explicitar através de generalizações a realidade; mas apreendê-la e sintetizá-  
la em sua organicidade, a diversidade na unidade (Lukács, 2003).  
Disposto isso, em relação à natureza documental, a partir da definição de uma amostra  
não probabilística e intencional, foram selecionados os seguintes documentos: a) Lei n°  
Eduardo Cechin da Silva; Rosilaine Coradini Guilherme  
14.818/2024 que institui incentivo financeiro-educacional na modalidade de poupança, às/aos  
estudantes matriculados no ensino médio público; b) Documento de 2015 da ONU, intitulado  
Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável.  
Este estudo ainda contou com bibliografias, no formato de livros e artigos vinculados à  
teoria social crítica de Marx, no intuito de constituir uma fundamentação teórica acerca de  
algumas categorias, como: modo de produção capitalista, pobreza, educação, ensino médio,  
programa pé-de-meia, agenda 2030. Para contribuir com a fundamentação do estudo, buscou-  
se articular alguns indicadores sociais disponibilizados em 2023 pelo Instituto Brasileiro de  
Geografia e Estatísticas (IBGE), acerca das condições de vida da população brasileira; e pelo  
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) sobre o Censo Escolar 2021.  
Buscou-se aporte complementar nesses dados, haja vista que atuam como fontes documentais  
para fundamentar a análise da conjuntura em torno do tema estudado.  
No sentido de constituir uma linha de raciocínio, o presente texto está organizado da  
seguinte maneira, a partir da presente introdução: a) inicialmente, serão abordadas as disputas  
teórico-ideológicas acerca da pobreza no Brasil, apontando as finalidades da mistificação do  
pauperismo no modo de produção capitalista, em vista de ocultar os condicionantes estruturais  
do sistema de dominação-exploração-opressão vigente, com especial atenção aos efeitos da  
globalização sobre a classe trabalhadora; b) na sequência pretende-se apreender o contexto  
educacional brasileiro de 2016 a 2024 no âmbito do ensino médio, considerando aspectos como  
a pobreza multidimensional, com enfoque na articulação entre o Programa Pé-de-Meia e a  
Agenda 2030 da ONU.  
908  
Com isso, revisitar criticamente a conjuntura que molda o referido período histórico  
consiste em expor o contexto do ano do golpe político-jurídico e midiático de Estado, bem  
como o ano de criação da contrarreforma do ensino médio situações que fazem parte da crise  
estrutural do capital repercutida no amplo sucateamento da educação brasileira (em todos os  
seus níveis). Sendo o ano de 2024 correspondente ao tempo de aprovação da segunda versão  
do Novo Ensino Médio, tal qual do Programa Pé-de-Meia e sua relação com a Agenda 2030 da  
ONU, por meio dos objetivos quatro (4) e oito (8), junto de algumas das suas metas, haja vista  
a necessidade de uma política financeira educacional para inclusão no ensino médio, em prol  
de atender os interesses do capital e ascender a economia brasileira, resumidamente. Em síntese,  
o objetivo 4 trata da busca por uma “educação de qualidade”, mediante a garantia ao acesso à  
“educação inclusiva” e “equitativa”, no sentido de garantir oportunidades de aprendizado a  
todas/os; e o objetivo 8 almeja pelo “trabalho decente” e o crescimento econômico através da  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 906-930, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Somos o futuro do Brasil? O Programa Pé-de-Meia e a Agenda 2030 da ONU  
inclusão e da sustentabilidade na economia, a favor de empregos “plenos”, produtivos e  
“dignos” a todas as pessoas (ONU, 2015).  
Logo, o presente texto propõe uma incursão crítica a respeito da realidade  
contemporânea brasileira, considerando a conformação das políticas sociais materializadas  
por meio de programas, a exemplo do Pé-de-Meia, bem como benefícios e serviços que  
constantemente são cooptadas para atender os interesses do grande capital pela via da  
reprodução da força de trabalho.  
Disputas teóricas e ideológicas acerca da pobreza  
O conceito de pobreza, ao longo dos séculos, é concebido de acordo com o contexto  
histórico-social e territorial, assim como perante à conjuntura política de diferentes países. Isso  
é observado desde sua concepção unidimensional conferida apenas no aspecto da renda  
monetária , até a perspectiva multidimensional que considera vários aspectos da riqueza  
socialmente produzida. Logo, presume-se a existência de diversos métodos e conceitos para  
definir pobres e não pobres, com base em distintos critérios e métricas metodológicas.  
Nesta linha de raciocínio, Yazbek (2012) informa que existem diferentes abordagens  
sobre a pobreza, concebidas desta maneira: 1) baseadas em fundamentos teórico-  
metodológicos, a exemplo do positivismo e do marxismo; 2) formuladas pelo Estado liberal,  
pelo Estado democrático-social, no que concerne ao desenvolvimento histórico, político e  
cultural; 3) definidas por indicadores, que se distinguem ao passo que a mensuração da pobreza  
pode ser exclusivamente pela renda monetária, ou recorre a indicadores multidimensionais ao  
incluir atributos não monetários, que revelam a inacessibilidade a um mínimo de bens e  
recursos.  
909  
Frente às distintas abordagens, e em decorrência do alinhamento do presente estudo ao  
campo da teoria social crítica, é indispensável abordar a pobreza (pauperismo) sob a análise  
marxista. Com isto, a pobreza se configura como manifestação da “questão social”1, resultante  
da exploração do capital sobre o trabalho no sentido do seu assalariamento, e pelas relações  
sociais constituídas pela luta de classes, permeadas por contradições (Siqueira, 2015). Sendo  
pontos orgânicos ao modo de produção capitalista que, por um lado, gera riqueza em  
abundância e, em outro, expressivos níveis de pobreza.  
1
A “questão social” surge da relação conflituosa entre dominadores/exploradores e dominados/explorados,  
expressa na desigualdade e na resistência cotidiana. Entre aspas porque alguns teóricos falam equivocadamente  
sobre uma nova “questão social”, todavia, sua gênese e seu fundamento existencial continuam sendo os mesmos,  
sob outras roupagens.  
Eduardo Cechin da Silva; Rosilaine Coradini Guilherme  
É importante expor o distanciamento da categoria pobreza, ou sua materialização  
capitalista o pauperismo em sua forma absoluta ou relativa, das noções neoliberais de  
mensuração da pobreza as quais serão abordadas mais adiante. A pauperização absoluta é  
vivenciada pelos trabalhadores desempregados, sem emprego ou salário fixo, com uma  
inconsistente fonte de renda (Siqueira, 2015). Isso deveria advir, essencialmente, do trabalho  
remunerado, em vista que o trabalhador tem ao seu dispor apenas vender a sua força de trabalho.  
Entretanto, o atual estágio societário restringe inclusive essa lógica própria do capital o  
trabalho como mercadoria mediante trabalho livre e assalariado, em decorrência das funções  
econômico-políticas do desemprego para sustentação de sua base.  
Já a pauperização relativa remete à progressiva distância entre valor produzido e valor  
apropriado pelo trabalhador, remetente ao salário (Siqueira, 2015). Assim, conforme disposto  
por Marx (2004, p. 82), “quanto mais o trabalhador produz, tanto menos tem para consumir;  
que quanto mais valores cria, mais sem-valor e indigno ele se torna”. Isso concerne a um  
resultado intrínseco ao desenvolvimento capitalista que, ao inferiorizar o salário do trabalhador  
e superiorizar o mais-valor apropriado, acaba por impulsionar a pauperização relativa  
decorrente da própria relação salarial, pois essa se limita a satisfazer as necessidades mínimas  
necessárias para a reprodução da força de trabalho.  
Sobre a história da interpretação moralizante da pobreza, desde a economia mercantil  
escravista, têm-se hegemonicamente a percepção de que o pobre é aquele sujeito necessitado,  
passivo em relação à sua condição, sendo um não cidadão, negativamente construído pelo social  
(Yazbek, 2012). Observada por Santos (2000), a marginalização do sujeito pobre ocorre a partir  
do momento em que o consumo se torna fundamental para o processo econômico, a qual é vista  
como “doença civilizatória”, o que abrange os ditos marginais como indesejáveis à ordem.  
Nessa lógica, são diferenciados do trabalhador, do integrado, devido a suas características de  
desintegrado e ocioso (Siqueira, 2015).  
910  
Ao longo do tempo histórico, no que tange às formas de proteção aos pobres,  
constituíam-se desde ações individuais, no sentido de o trabalhador ser o responsável por sua  
sobrevivência, até ações de ordem religiosa e filantrópica, com práticas sociais de fiscalização  
e higienização, direcionados aos mais pobres e mais excluídos, os sem bens e sem poder  
(Yazbek, 2012). Num esforço de classificação ou de estratificação da pobreza, existe o  
estabelecimento de indicadores, sendo o fenômeno tomado como pobreza absoluta, mediante a  
renda, e relativa, perante a capacidade de consumir sem confundir com a postulação teórica  
marxista. Assim, o poder público brasileiro se vê forçado a desenvolver fórmulas para combater  
a pobreza (Santos, 2000).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 906-930, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Somos o futuro do Brasil? O Programa Pé-de-Meia e a Agenda 2030 da ONU  
Em contraste, no início do século XX, com a economia exportadora, a concepção de  
pobreza é definida pela incapacidade pessoal, vista por objeto de benemerência e da filantropia,  
especialmente, os trabalhadores informais (Yazbek, 2012). Essa concepção predominou até o  
final do século passado. As atitudes e comportamentos estatais iniciados na década de 1950,  
diante de tal expressão da “questão social”, coadunam com a ideia de que o pobre passa a ter  
as mesmas chances na economia, o que se deve à iniciativa desenvolvimentista que objetiva a  
participação no desenvolvimento nacional (Yazbek, 2012).  
De acordo com Siqueira (2015), o pensamento desenvolvimentista de enfrentamento à  
pobreza, defende a ideia de que ela advém do insuficiente desenvolvimento capitalista, de uma  
crise sazonal. Atribui-se, assim, a causa da pobreza e da miséria, a razões distintas: déficit  
educacional; incapacidade de planejar o orçamento familiar e doméstico; e problemas  
psicológicos inerentes à moralidade e ao comportamento individual. Tal ideologia acerca das  
causas da pobreza aderem a uma noção individualista, moralista e culpabilizadora, aliada a  
noções liberais. Como se a crise capitalista fosse temporária, relacionada a uma determinada  
insuficiência econômica, decorrente de “problemas” individuais e familiares; como se o  
pauperismo não fosse inerente à lógica (auto)destrutiva do capitalismo e suas razões decorrentes  
das mediações e contradições entre interesses antagônicos, que dominam, exploram e oprimem  
a classe que-vive-do-trabalho.  
911  
Já sob análise da totalidade, a pobreza decorre das implicações da reprodução do capital,  
posto que “a exploração se expressa tanto nas condições de saúde, de habitação, como na  
degradação moral e intelectual do trabalhador” (Iamamoto; Carvalho, 2011, p. 73). Moralizar  
a classe trabalhadora é uma das formas utilizadas pela burguesia para perpetuar sua dominação,  
não apenas dentro do processo produtivo, mas também no processo ideológico da classe  
subalterna.  
Dessa forma, ao consagrar mais trabalhadores mediante abertura de novos postos de  
trabalho no contexto citado anteriormente com o surgimento do viés desenvolvimentista no  
país (anos 1950-1960) até a contemporaneidade da política neodesenvolvimentista2 do século  
XXI – com suas políticas e programas de “inclusão” produtiva, haveria a diminuição da  
pobreza, como muitos defendem, mas o que na realidade objetiva acontece é o inverso: a sua  
contínua intensificação. Assim, quanto maior o quantitativo de trabalhadores empregados e  
2
O “novo desenvolvimentismo [...] supõe crescimento econômico, ampliação e formalização do emprego,  
intervenção do Estado, dentre outros aspectos que, pelo menos em tese, rechaçam medidas neoliberais. Duas ideias  
centrais estariam embasando esta ideologia: a) a de que o enfrentamento ao neoliberalismo se faz com crescimento  
mediado pela intervenção do Estado; b) a de que o crescimento econômico leva inexoravelmente ao  
desenvolvimento social” (Mota, 2012, p. 34).  
Eduardo Cechin da Silva; Rosilaine Coradini Guilherme  
desempregados, maior a pobreza, sujeitando os trabalhadores ao desempenho laboral de  
qualquer atividade, participando do desenvolvimento interno (Siqueira, 2015). Esse suposto  
desenvolvimento corresponde às leis fundamentais do sistema vigente que impossibilita  
dissipar o status econômico de dependência do Brasil. Esse desenvolvimento, para Iamamoto  
(2015), na fase monopolista do capitalismo global e a hegemonia das finanças agrava tal tipo  
de economia e ideologia dependente do país, ao ser colocado como um “produtor” de  
commodities, de exportação de produtos ao mercado internacional. Resultante da histórica  
exploração do Brasil por parte do grande capital, que capturando o país ideológica e  
economicamente desta forma, torna a dominação da classe trabalhadora no país, uma  
superexploração, sob contínua precarização do labor a partir do desmonte das políticas de  
proteção social ao trabalho e a flexibilização das relações no mercado de trabalho.  
Em análise de Santos (2000), no ápice da mundialização do capitalismo, via  
globalização da economia, igualmente a pobreza se torna globalizada, não mais  
regional/nacional, aderindo à constituição da mínima participação estatal na proteção social. De  
maneira convergente, a partir da década de 1980, a pobreza passa a ser tema central da agenda  
social, reconhecida sob base neoliberal, propondo aliviá-la através da criação de programas  
assistenciais com condicionalidades (Yazbek, 2012).  
As contradições aparecem à medida que empresas e instituições e organismos  
multilaterais interagem com interesses antagônicos, desde que convenha manter esta ordem de  
acumulação de riquezas. Isso acontece, ao passo que tal tríade propõe medidas “segmentadas,  
como é o caso do Banco Mundial, que, em diferentes partes do mundo, financia programas de  
atenção aos pobres, querendo passar a impressão de se interessar pelos desvalidos, quando,  
estruturalmente, é o grande produtor da pobreza”3 (Santos, 2000, p. 36).  
912  
Nesse sentido, a partir do início deste século se amplia o debate sobre a abordagem  
multidimensional das vulnerabilidades e dos riscos sociais que contribuem para uma  
interpretação da pobreza para além da renda monetária. Sobre essa abordagem, Yazbek (2012,  
p. 292) pontua: “embora a renda se configure como elemento essencial para a identificação da  
pobreza, o acesso a bens, recursos e serviços sociais, ao lado de outros meios complementares  
de sobrevivência, precisa ser considerado para definir situações de pobreza”.  
3 Vale mencionar que, de maneira distinta, a vertente analítica adotada no presente estudo – a marxista –, o Banco  
Mundial e o IBGE conceituam a pobreza e a extrema pobreza apenas em sua face monetária, referente a renda per  
capita; enquanto o primeiro utiliza a moeda do dólar ($) para mensuração e estratificação, o IBGE o faz através  
da moeda denominada como real (R$).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 906-930, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
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Diferentemente dessa noção de totalidade, atentando apenas ao aspecto unidimensional,  
em publicação do IBGE (2023), os parâmetros do Banco Mundial para aferir pobreza e extrema  
pobreza se detém na renda monetária. Logo, são considerados pobres sujeitos que dispõem de  
renda igual ou inferior a US$ 6,85 por dia, e de pessoas extremamente pobres, igual ou inferior  
a US$ 2,15 por dia.  
Nesses parâmetros baseados apenas na renda monetária, observou-se uma queda da  
pobreza, de 36,7% em 2021, para 31,6% em 2022 da população brasileira, bem como da  
extrema pobreza, a porcentagem de 9,0% em 2021, passa a ser de 5,9% em 2022 (IBGE, 2023).  
O que pode ser analisado de maneira mais densa quando da realização de novos estudos,  
cabendo articular contextos como o da pandemia de Covid-19 na sua relação com a renda  
advinda de benefícios de programas sociais, por exemplo.  
Outros fatores importantes para discussão das linhas de pobreza, no que tange à renda  
per capita da população no país, é o das fontes do rendimento domiciliar, qualificados em  
Benefícios de Programas Sociais (BPS); trabalho, aposentadoria e pensão, entre outros.  
Referente aos extremamente pobres, os BPS compõem 67% do total de renda alocada, ao  
mesmo tempo, o trabalho consiste em 27,5% do total para esses. Já para os pobres isto muda,  
os BPS totalizam 20,5% para elas/es, enquanto o trabalho persiste em 63,1% da renda (IBGE,  
2023).  
913  
Tais dados permitem analisar a funcionalidade da renda advinda dos benefícios de  
programas sociais. Os específicos tipos de rendimentos diferenciados entre pobres e  
extremamente pobres se colocam como funcionais para a reprodução do capital e da economia  
de mercados. Considerando a redistribuição de renda, ainda que parcial, para parcela da  
população desprovida da renda do trabalho e do acesso às políticas de proteção social  
estruturantes, como exemplo a educação e o trabalho.  
Dessa forma, ao aparecer em âmbito global com intermédio da globalização, a pobreza  
não é um aspecto residual, transitório, e nem deve ser tratado isoladamente. Tal expressão da  
“questão social” é estrutural, porque o aumento da riqueza socialmente produzida, sequer reduz  
a pauperização, ao contrário, a aumenta cada vez mais, ou seja, o processo de empobrecimento  
é ineliminável no modo de produção capitalista, por ser a contradição essencial para sua  
manutenção. Destarte, a crise cíclica do capital, camuflada pela falácia do subdesenvolvimento  
dos países, é conferida pela lei geral de acumulação, a qual gera demasiada riqueza  
monopolizada e crescente empobrecimento.  
Entende-se que a atenção direcionada ao delineamento histórico da concepção de  
pobreza é fundamental para desmistificar o discurso em torno do fenômeno. Desse modo, saber  
Eduardo Cechin da Silva; Rosilaine Coradini Guilherme  
como essa concepção de pobreza é utilizada pelo discurso burguês-estatal e mercadológico para  
construção de políticas sociais públicas, como as do campo da “educação formal”,  
especificamente do ensino médio elemento central da reflexão do subsequente capítulo. Cabe  
a partir disso, articular reflexões acerca de como o capital na educação atua para a perpetuação  
de seus valores e atendimento dos seus interesses, partindo-se da ideia de que a educação –  
quando incorporada de forma acrítica e conduzida sob uma lógica economicista através de  
políticas focalizadoras à pobreza é funcional à economia de mercados, logo contribui para a  
reprodução do pauperismo em suas múltiplas dimensões, sendo que a temática da educação  
brasileira será tratada na próxima seção.  
Contexto educacional brasileiro no século XXI  
A noção ideológica de contribuição laboral formal ou informal ao desenvolvimento  
econômico, por meio de uma educação profissionalizante e tecnicista, nasce com as  
workhouses. É nesse contexto que centros de correção forneciam uma educação informal contra  
a ociosidade a única disponível às crianças e adolescentes da classe proletária (Mészáros,  
2008). Cabe destacar que tal contexto envolve o período pré-capitalista e remete às  
denominadas Leis inglesas ou Lei dos Pobres, tendo por intuito a punição da dita  
vagabundagem, por meio da obrigatoriedade do trabalho. Além de distinguir pobres  
merecedores e pobres não merecedores da ajuda e da caridade, sendo os últimos assim  
caracterizados em razão de estarem aptos para o trabalho forçado nas workhouses.  
914  
No contexto brasileiro, de acordo com Frigotto (2025), o século XX corresponde ao  
período em que se modificou o cenário educacional, passando a abranger outras parcelas da  
população para além das elites. Entretanto, isso foi erigido de uma maneira a dispor à classe  
trabalhadora uma educação técnica e instrucional, ou seja, a educação humanista se restringia  
às/aos filhas/os dos detentores de poder. A implementação de educação tecnicista destinada à  
determinada parcela da população é datada aos anos de 1930 à época da ditadura civil-militar  
(1964-1985), em que havia uma diferenciação escrachada entre a formação de  
técnicos/trabalhadores e formação para uma futura entrada no ensino superior. Expressada  
também durante os anos de 1970, com a Educação Técnica para as/os trabalhadoras/es, no  
sentido de sua “qualificação”4 e entrada no mercado de trabalho (Ramos; Frigotto, 2017); ainda  
4
Anterior a isso, no governo civil-ditatorial de Getúlio Vargas, houve iniciativas do tipo como o Serviço de  
Aprendizagem Industrial (Senai), em 1944, e o Serviço de Aprendizagem Comercial (Senac), em 1946 –  
propulsoras de políticas educacionais de décadas subsequentes, principalmente como o ensino médio está  
emoldurado na contemporaneidade (Frigotto, 2025).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 906-930, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Somos o futuro do Brasil? O Programa Pé-de-Meia e a Agenda 2030 da ONU  
que incipientes, em comparação ao que será discorrido ao longo deste estudo mediante a  
abordagem das contrarreformas do ensino médio empreendidas a partir de 2016.  
Posteriormente, durante o período de redemocratização do país, a população em situação  
de pobreza, sobretudo a parcela de negras/os, começa a ter maior visibilidade. Nesse cenário, a  
educação passa a ser pensada formalmente numa lógica universalista e enquanto direito social  
de todas/os, sob os marcos da Constituição Federal de 1988 porém, ainda o Estado mantém o  
projeto desenvolvimentista atrelado a uma educação técnica, de décadas anteriores. Apesar da  
conquista inscrita na Constituição Federal de 1988, concretamente, o campo educacional  
traduziu-se numa divisão não anunciada, quer dizer, uma diferenciação histórico-social entre  
sujeitos estimulados aos estudos, privilegiados de terem a oportunidade de estudar sem  
trabalhar remuneradamente e sujeitos marginalizados, desestimulados a terem uma carreira  
acadêmica, seja pela inexistente representatividade, tal como a ideologia de superiorização  
entre brancos e não brancos, homens e mulheres.  
Diferente do capitalismo industrial, no capitalismo monopolista, não apenas são  
divergentes no mercado de trabalho os “com-diploma” e os “sem-diploma”, mas  
circunstancialmente, os “com-diploma” de uma instituição educacional de qualidade, e os  
“com-diploma” de uma instituição educacional de segunda linha (Lessa, 2013). A educação  
confere e distingue a classe social dos sujeitos, da mesma forma que a escola é um aparato de  
reprodução e padronização de práticas e comportamentos, relevantes à burguesia masculina  
branca. Portanto, o racismo e o patriarcado, por terem sua existência moderna na base da  
acumulação de mercadorias logo são intrínsecos ao capitalismo , incidem na política de  
educação e nas relações escolares, desde o investimento, o modelo de currículo, até na violação  
de direitos.  
915  
Destaca-se a ocorrência da reprodução da lógica burguesa no ambiente educacional a  
partir de dois vetores principais: 1) conformação ideológica das relações capitalistas; 2)  
preparação técnico-científica para incorporação nas relações de produção enquanto empregados  
ou desempregados (Baptista, 2024). Considerando tal análise, na relação com o contexto do  
ensino médio, esta etapa do sistema educacional recebeu demasiada atenção durante década de  
1990 por motivos majoritariamente resultantes da relação entre empresariado e educação  
brasileira , com a massificação e popularização da educação pública, direcionada às discussões  
do ensino médio e do ensino técnico especificamente aos pobres. Em outras palavras, mesmo  
deflagrado pela demanda popular e parecendo democratizar o acesso a este direito social, a  
educação brasileira, nos moldes burgueses, colabora com a hegemonia do sistema classista,  
racista e sexista, erigindo um apartheid social não declarado.  
Eduardo Cechin da Silva; Rosilaine Coradini Guilherme  
No início do século XXI, com os governos de Lula e Dilma, o ensino médio em  
consonância com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), passou a compor o plano  
anual de financiamento de políticas públicas, tal como instituiu a possibilidade de integrá-lo à  
educação profissional e tecnológica. Porém, sempre sob os limites do capital, a exemplo da  
associação do empresariado educacional com a criação de programas do terceiro setor com o  
Estado (Corti, 2019). A educação técnica é direcionada aos brasileiros pobres, além de utilizar  
a periferização da vida das/os trabalhadoras/es como estratégia para estimular o engajamento  
de corpo e alma na concorrência de mercado (Catini, 2020).  
No período de 2013 a 2016, surge uma nova proposta para contrarreforma do ensino  
médio, a partir do Projeto de Lei n° 6840/20135; demonstrando o poder do monopólio no  
legislativo, pois estava vinculado a um projeto de um deputado petista. Tal projeto, a partir de  
críticas contrárias à ideia de educação profissional, enquanto área de ênfase e da redução  
curricular da formação básica, foi engavetado após o golpe de 20166 (Corti, 2019). Entretanto,  
voltou ao debate a escolarização técnico-científica, inicialmente, com a Medida Provisória n°  
746/2016, postulada pela presidência golpista de Michel Temer, que alterou o modelo do  
Ensino Médio na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).  
Nota-se que os motivos dados pelo discurso oficial da contrarreforma do ensino médio  
entrar em decurso foram, primordialmente, a inexistente atratividade do currículo aos jovens e  
o seu descompasso com as demandas do setor produtivo do século XXI, no quesito dos  
conteúdos superficiais e fragmentados. O que, na opinião conservadora, não contribuiria para a  
aprendizagem e o desenvolvimento de competências e habilidades. É crucial notar que essa  
visão do atraso do modelo único de ensino médio, como define a LDB logo a defesa da sua  
suposta modernização , alinha-se com as tendências políticas, econômicas e culturais da  
contemporaneidade sob a ideologia neoliberal. A política brasileira mediatiza esta suposta  
reforma neoliberal para não ficar na contratendência do capital financeiro, ou seja, do grande  
capital.  
916  
5 Atenta-se para a discussão desta época de contrarreforma, mas a mesma é resultante de um processo amplo de  
sucateamento da educação brasileira, especialmente do ensino médio, tendo por protoformas épocas da ditadura  
militar, mas intensificando-se a ascensão do neoliberalismo. Por exemplo, a Lei n° 5.692/1971 (Ramos; Frigotto,  
2017), e após esta, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996 e as diversas reformas de  
currículo apresentadas nos anos 2000.  
6
O golpe de Estado de 2016, ocorrido por meio do impeachment de Dilma Rousseff, teve caráter parlamentar,  
midiático e jurídico, devido às ações progressistas do governo à época, contrariando os valores em mutação da  
globalização e do neoliberalismo, por exemplo, o percentual de trabalhadores informais durante a presidência do  
Partido Trabalhista (PT) era significativamente menor que durante a presidência de Temer e Bolsonaro, espelhando  
a preocupação com o investimento social na época de Lula e Dilma (Marques; Nakatani, 2019).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 906-930, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Somos o futuro do Brasil? O Programa Pé-de-Meia e a Agenda 2030 da ONU  
Os capitalistas-empresários-políticos neoliberais se apropriam do teor positivo que as  
reformas decorrentes das demandas populares tiveram ao longo da história, relacionado às  
concedidas pelos democrata-sociais e socialistas (Coutinho, 2011). “O que antes da onda  
neoliberal queria dizer ampliação de direitos, proteção social, controle e limitação do mercado,  
etc., significa agora cortes, restrições e supressão dos direitos e dos limites do mercado”  
(Coutinho, 2011, p. 35).  
Em consonância, um dos pontos presentes nessa contrarreforma do ensino médio o  
qual tem sua definição na LDB , foi a defesa de um currículo flexível, objetivando o  
protagonismo juvenil com seu projeto de vida, intermediado pelas suas próprias decisões  
(Catini, 2020). O referido projeto de vida concebido como um elemento-chave nessa  
remodelação curricular do ensino médio fortalece o modo de o capital capturar, desde cedo na  
adolescência, a subjetividade de que o desenvolvimento de técnicas socioemocionais e de  
resiliência são para o seu próprio bem-estar no futuro. Entretanto, em realidade, correspondem  
a elementos que fetichizam a realidade, individualizando as responsabilidades e moralizando a  
“questão social” frente à construção de um projeto de vida alimentado pelos valores neoliberais  
da competitividade e do individualismo.  
Dessa forma, estudantes são direcionados a optarem por determinada área de  
conhecimento em razão de haver uma narrativa de que essa viabilizará um futuro vínculo  
empregatício. Assim, ao terem como matérias obrigatórias, apenas o ensino de inglês,  
matemática e português, outros conteúdos capazes de conscientizar radicalmente estes sujeitos  
sobre si e o seu entorno são descartados, tais como conteúdos sobre a formação social,  
econômica e política do Brasil.  
917  
Para tanto, a contrarreforma do ensino médio, sob a conjuntura supracitada, é  
formalizada com a Lei n° 13.415/2017 e implementada pelo plano de educação do ex-governo  
ultraconservador de Jair Messias Bolsonaro, incidindo num campo de demasiada ideologização  
por parte do empresariado sobre tal política pública. Em suma, essa contrarreforma objetiva  
criar respostas às demandas do século atual, dentre elas estão: a escola em tempo integral e a  
parceria entre instituições de ensino médio e terceiro setor, com a disposição de autenticar a  
formação por meio da prática e/ou da simulação do ambiente de trabalho.  
Em vista do desenvolvimento da capacidade laboral na educação, o empreendedorismo  
faz parte das habilidades a serem compelidas ao longo dessa denominada formação inovadora.  
Além disso, as competências socioemocionais, com especial atenção à resiliência, também são  
um dos pontos-chaves sendo que todas compõem o dito protagonismo juvenil , agora  
Eduardo Cechin da Silva; Rosilaine Coradini Guilherme  
ensinadas pelo empresariado, ao invés dos próprios professores que assumem um papel de  
coaching, ao invés de docente (Catini, 2020).  
Cabe referir que a educação não foi afetada apenas pela defesa de um currículo  
tecnicista, mas também pela tática disposta à sua financeirização, em alusão à Emenda  
Constitucional n° 95, a qual dispunha sobre o congelamento, por vinte (20) anos, dos gastos  
públicos, com base nos que foram feitos em 2016. Essa Emenda esteve em vigência durante  
seis (6) anos e meio, sendo questionada pela campanha eleitoral de Lula para a presidência de  
2022, em que uma das promessas era a sua extinção.  
Concretamente, foi criado o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) n° 126, de 2022  
mediante acordo político antes mesmo da posse petista (Vazquez; Schlegel, 2023); e efetivada  
em 2023, com a Lei Complementar n° 200, instituindo o Regime Fiscal Sustentável. Importante  
ressaltar, apesar desse (re)avanço, mesmo extinguindo o antigo Teto de Gastos, a nova criação  
fiscal, ainda assim, limita grandemente os gastos do governo lulista, pois apenas se houver o  
crescimento econômico esperado é que poderá se alcançar o limite máximo dos “gastos  
sociais”, em outras palavras, os investimentos sociais estão condicionados ao crescimento  
econômico do país7.  
Nesse intermédio é que o Programa Pé-de-Meia entra no debate da relação entre política  
social e política econômica, no intuito de propiciar um desenvolvimento econômico sustentável,  
sendo um possível equalizador das oportunidades no mercado laboral. Decorre de “quanto mais  
se desenvolverem as competências ou habilidades nos indivíduos de um país, necessárias às  
demandas das relações de trabalho, mais produtivo e competitivo esse país será” (Baptista,  
2024, p. 138).  
918  
Tais pressupostos se alinham à tese de Lessa (2013), o qual discerne que tal lógica  
consiste num discurso de superação dos obstáculos para com a educação moderna pelo sujeito-  
estudante, e se não consegue ultrapassá-los, não passa de incompetência pessoal. Isso, por sua  
vez, implica numa relação entre selecionados/protagonistas e não selecionados/sem-salvação,  
o que compactua com a ideologia do empreendedorismo educacional, pois a contrarreforma do  
ensino médio não visa a empregabilidade da maioria, mas uma preparação ao “trabalho de  
sísifo” (Catini, 2020); camuflado pela aparência da autonomia laboral, todavia não passa de  
uma relação não contratual com seu explorador.  
7 “Deve-se ter em conta que o limite máximo definido pela nova regra fiscal só será alcançado se o crescimento  
econômico alcançar 3,57%, considerando que a carga tributária seja mantida. Sob estas condições, o PIB do setor  
privado precisará acelerar acima de 4,1% ao ano, dado o limite máximo de 2,5% de crescimento anual da despesa  
pública” (Vazquez; Schlegel, 2023, p. 4).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 906-930, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Somos o futuro do Brasil? O Programa Pé-de-Meia e a Agenda 2030 da ONU  
Pode-se observar o real objetivo da contrarreforma do ensino médio: a aceitação e  
adaptabilidade social, por meio da intensa ideologização neoliberal da educação (Baptista,  
2024), que cega grande porção dos proletários e suas famílias; em contraste às tensões entre as  
classes, harmonizando-as misticamente para conter, por enquanto, a indubitável transformação  
social no horizonte. Ao reportar para a atual conjuntura, apesar de em 2022, a sociedade  
brasileira ter eleito um presidente alinhado ao viés político progressista, a governança do país  
é liderada majoritariamente por deputados e senadores da direita e da extrema-direita,  
comprometendo as decisões econômicas, sociais e governamentais do país.  
Um desses marcos foi a nova versão do Novo Ensino Médio proposta pelo Projeto de  
Lei n° 5.230/2023, de autoria de uma deputada do Partido Liberal, também professora, Dorinha  
Seabra. O referido Projeto se formalizou pela assinatura do atual presidente da república por  
meio da Lei n° 14.945/2024, revogando apenas uma parte do Projeto, no tocante à inclusão dos  
conteúdos flexíveis/itinerários formativos no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). De  
resto, toda a regressividade, agora atualizada, ao novo modelo empresarial do ensino médio foi  
aprovada. Presencia-se então, o que Coutinho (2011, p. 37) chama de “hegemonia da pequena  
política”, no sentido de no contexto da contrarreforma brasileira não se tratar mais de conquistar  
direitos e estar vinculado a um projeto societário contrário ao capitalismo, mas da defesa e da  
luta em prol dos que já foram conquistados.  
919  
Com a exposição em mente, no item seguinte será tratado a respeito do Programa Pé-  
de-Meia e sua conexão com a última Agenda da ONU; apresentando o primeiro não como uma  
reforma por parte do Estado para com as demandas da classe trabalhadora, na área da educação,  
mas como uma resposta do próprio ideário neodesenvolvimentista com as consequências das  
suas políticas neoliberais.  
Relação do programa pé-de-meia com a agenda 2030 da ONU  
No intermédio recém apresentado a respeito da contrarreforma do ensino médio no  
Brasil , contemporaneamente, a Organização das Nações Unidades (ONU) aprovou os  
objetivos e metas da Agenda 2030 do Desenvolvimento Sustentável. Essa agenda é resultado  
do encontro realizado entre 25 a 27 de setembro de 2015, coligado há mais de dois (2) anos de  
discussões com Estados e a sociedade civil de várias nações, com ênfase às populações e países  
mais pobres dos territórios mundiais.  
Com base no referido documento, foram estabelecidos dezessete objetivos com metas a  
serem alcançadas até 2030, alocando atenção maior à erradicação da pobreza, ao combate às  
desigualdades, à construção de sociedades pacíficas e justas, à busca pelo horizonte da defesa  
Eduardo Cechin da Silva; Rosilaine Coradini Guilherme  
permanente dos direitos humanos e ao reconhecimento das particularidades nacionais para  
promulgá-las. Para isso ocorrer, foram prescritas atividades-chaves, por meio de parceria com  
diferentes organismos e instituições da sociedade civil, com abrangência nacional e regional,  
favorecendo alguns objetivos e metas em face de outros (ONU, 2015).  
Na abrangência do presente estudo, serão analisados dois objetivos da citada Agenda  
2030, como forma de relacioná-los à criação do Programa Pé-de-Meia. São eles: o objetivo 4,  
“sobre educação de qualidade”; e o objetivo 8, tratando “do trabalho decente e do crescimento  
econômico” . Antes de situá-los, convém relatar sobre a criação e a formalização legislativa do  
citado Programa, visto que isso é indispensável para contextualizar e apreender esse novo  
direito.  
O Programa Pé-de-Meia foi lançado pelo atual governo Lula, por meio da Lei n°  
14.818/2024, sendo caracterizado como um incentivo financeiro-educacional, em formato de  
poupança, para estudantes em tempo integral da rede pública de ensino médio. Tendo por  
princípios, a permanência e a conclusão escolar das/os incentivadas/os, cujo objetivo é  
democratizar o acesso à educação, amenizar as desigualdades sociais, reduzir a evasão escolar  
e contribuir para a promoção da inclusão (Brasil, 2024a).  
Em relação ao perfil das/os estudantes que podem requerer o incentivo financeiro:  
devem ser de baixa renda, com família inscrita no Cadastro Único (CadÚnico), priorizando  
aqueles de renda familiar per capita mensal igual ou inferior a R$ 218,00; sendo essa linha  
consonante com o disposto na Lei n° 14,601/2023, que reedita o Programa “Bolsa Família”.  
Além disso, os critérios para a elegibilidade abrangem a vulnerabilidade social, a efetivação da  
matrícula em escolas de tempo integral e a idade da/o jovem.  
920  
Assim, se deferida a poupança, o incentivo financeiro será disponibilizado mediante o  
cumprimento das seguintes condições para o acesso e a permanência enquanto beneficiária/a  
do programa: 1) quando houver a matrícula no início de cada ano letivo, através do denominado  
“incentivo-matrícula” no valor de R$ 200,00; 2) se tiver frequência mínima de pelo menos 80%,  
correspondendo ao intitulado “incentivo-frequência” com valor igual ao anterior, porém  
deferido a cada mês dos trimestres letivos; 3) ter participado do Sistema de Avaliação da  
Educação Básica (SAEB) o qual não concebe quantia monetária para a conta corrente do  
beneficiário, mas é um critério para continuidade do último incentivo mencionado; 4) presença  
nos dias do Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM); 5) e na conclusão de cada ano letivo,  
com aprovação (Brasil, 2024b).  
Para realizar o saque de uma parte do valor concedido no transcorrer do ensino médio,  
as/os beneficiárias/os devem ter cumprido duas condicionalidades primárias: a) matrícula no  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 906-930, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Somos o futuro do Brasil? O Programa Pé-de-Meia e a Agenda 2030 da ONU  
início de cada ano letivo; b) frequência mínima de pelo menos 80% durante os trimestres. Em  
relação aos repasses dos valores monetários, se cumpridas as mencionadas condições,  
correspondem a R$ 200,00, após os períodos de comprovação da matrícula no ano letivo e no  
final de cada trimestre escolar no último caso, este ocorre três vezes à época de permanência.  
O Programa Pé-de-Meia também prevê dois incentivos cumulativos, nomeados  
respectivamente, como “incentivo-ENEM” e “incentivo-conclusão”, os quais poderão ser  
retirados da poupança por parte da/o estudante apenas depois do término do ensino médio,  
podendo atingir um montante de até R$ 3.200,00. Esse total abrangerá R$ 1.000,00 depositados  
no final de cada ano da tríade do ensino médio e aos R$ 200,00 reais de presença nos dois dias  
do ENEM, durante o último ano de estudos (Brasil, 2024b).  
Pode-se referir que o consumo da classe trabalhadora que vive em condições de pobreza  
e de extrema pobreza, em parte, passa a ser viabilizado com essas transações em dinheiro. Isso,  
consequentemente, propulsiona o funcionamento do sistema mercantil contemporâneo ou  
ainda, contribui para manter o mercado aquecido por meio do consumo. Assim, percebe-se a  
finalidade dessas transferências monetárias: auxiliar no término dos estudos secundários, em  
que agora repercute uma concepção de educação que preza pela futura inserção das/os  
estudantes contempladas/os no mercado de trabalho, tendo em vista, novas relações formais ou  
informais. Daí, advém a necessidade do desenvolvimento de habilidades técnicas em prol do  
denominado desenvolvimento sustentável e inclusivo durante o período escolar, indo ao  
encontro das demandas apontadas por organismos internacionais em prol da economia de  
mercados.  
921  
Em análise, as transferências monetárias do Pé-de-Meia, ou seja, o alicerce dessa  
política defensora da inclusão, fazem parte do quadro de tentativas de superar as políticas  
ultraneoliberais deixadas pelo ex-governo bolsonarista (2019-2022), que não tentou  
materializar a recomendação de “até 2020, reduzir substancialmente a proporção de jovens sem  
emprego, educação ou formação”, como disposto na meta 8.6 do oitavo objetivo da Agenda  
2030 (ONU, 2015, p. 27). Tal contexto é comprovado pelos dados do Censo Escolar de 2021  
do INEP, o qual divulgou que houve um acréscimo na taxa de abandono de 1,6% a 3,2% em  
2020, para 5,0% no ano seguinte. De acordo com a Síntese de Indicadores Sociais do IBGE de  
2023, a qual realizou por parte, um apanhado temporal de jovens desempregados e sem estudar  
entre 2016 e 2020, tempo em que aumentou tal percentual de 24,6% para 28,0; diminuindo para  
22,3% com a volta de Lula à presidência do Brasil em 2022.  
Eduardo Cechin da Silva; Rosilaine Coradini Guilherme  
A partir dessa contextualização do Programa Pé-de-Meia, estão sistematizados, no  
Quadro 1, a seguir, os objetivos 4 e 8, assim como suas respectivas metas. O intuito é relacionar,  
na sequência, a concepção do Pé-de-Meia com as proposições da Agenda 2030.  
Quadro 1: Objetivos 4 e 8 e algumas de suas metas na agenda 2030 da ONU (2015)  
Objetivo do desenvolvimento sustentável  
Algumas das metas do respectivo objetivo  
4.3 - Assegurar a igualdade de acesso para todos os  
homens e mulheres à educação técnica, profissional e  
superior de qualidade, a preços acessíveis, incluindo  
universidade.  
4.4 - Aumentar substancialmente o número de jovens  
e adultos que tenham habilidades relevantes, inclusive  
Objetivo 4 - Educação de qualidade: Garantir o competências técnicas e profissionais, para emprego,  
acesso à educação inclusiva, de qualidade e equitativa, trabalho decente e empreendedorismo.  
e promover oportunidades de aprendizagem ao longo  
da vida para todos.  
4.5 - Eliminar as disparidades de gênero na educação  
e garantir a igualdade de acesso a todos os níveis de  
educação e formação profissional para os mais  
vulneráveis, incluindo as pessoas com deficiência,  
povos indígenas e as crianças em situação de  
vulnerabilidade.  
4.6 - Garantir que todos os jovens e uma substancial  
proporção dos adultos, homens e mulheres estejam  
alfabetizados e tenham adquirido o conhecimento  
básico de matemática.  
8.2 - Atingir níveis mais elevados de produtividade das  
economias por meio da diversificação, modernização  
tecnológica e inovação, inclusive por meio de um foco  
em setores de alto valor agregado e dos setores  
intensivos em mão de obra.  
Objetivo 8 - Trabalho decente e crescimento  
econômico: Promover o crescimento econômico  
inclusivo e sustentável, o emprego pleno e produtivo e  
o trabalho digno para todos.  
922  
8.3  
-
Promover políticas orientadas para  
o
desenvolvimento que apoiem as atividades produtivas,  
geração de emprego decente, empreendedorismo,  
criatividade e inovação, e incentivar a formalização e  
o crescimento das micro, pequenas e médias empresas,  
inclusive por meio do acesso a serviços financeiros.  
8.4 - Alcançar o emprego pleno e produtivo e trabalho  
decente para todas as mulheres e homens, inclusive  
para os jovens e as pessoas com deficiência, e  
remuneração igual para trabalho de igual valor.  
8.5  
-
Fortalecer a capacidade das instituições  
financeiras nacionais para incentivar a expansão do  
acesso aos serviços bancários, de seguros e financeiros  
para todos.  
Fonte: Sistematização das/os autoras/es, baseado em ONU (2015).  
Um dos aspectos que chamam atenção referente ao Programa Pé-de-Meia é a possível  
contribuição deste para a “promoção da inclusão social pela educação” (Brasil, 2024a, art. 2,  
inciso 4). Para tal disposição, a inclusão social seria mediante uma escolarização tecnicista –  
considerando a atual perspectiva após a contrarreforma do ensino médio , visando incluir a  
pessoa “desvantajada” monetariamente no mercado de trabalho. Ao analisar tal aspecto, fica  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 906-930, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Somos o futuro do Brasil? O Programa Pé-de-Meia e a Agenda 2030 da ONU  
evidente o problema em pauta, pois a perspectiva de inclusão social referida se baseia em  
fundamentos positivistas e conservadores que visam a adaptação da pessoa dita como excluída  
na sociedade. Logo, essa “inclusão” pressupõe a reprodução do modo de produção capitalista,  
não havendo coerência incluir em um sistema fundamentado pela exclusão para sua contínua  
manutenção.  
Com a mudança curricular do ensino médio8, a inclusão pretendida possui obstáculos,  
pois a/o estudante passa a ser conduzida/o para uma formação tecnicista, por uma estratégia  
empresarial de futura superexploração da força de trabalho da maioria desse/as jovens  
educandas/os, seja através da terceirização, do trabalho informal, da inconsistente  
empregabilidade, bem como de outras modalidades arcaicas do labor. Porém, essa mudança  
estratégica é condizente com a meta 4.4 do expresso objetivo da Agenda 2030, a qual pode ser  
verificada no Quadro 1: “aumentar substancialmente o número de jovens e adultos que tenham  
habilidades relevantes, inclusive competências técnicas e profissionais, para emprego, trabalho  
decente e empreendedorismo” (ONU, 2015, p. 23).  
Em relação às determinações sociais desses jovens, o Programa leva em conta uma renda  
per capita específica, concernente, na maioria das vezes, à extrema pobreza. Dessa forma, não  
cogita outros marcadores sociais, o que vem ao encontro com a homogeneização das  
desigualdades e necessidades sociais. Como se hipoteticamente, em razão da correspondência  
do fator monetário e da vulnerabilidade, todos fossem iguais e pudessem ser incluídos da  
mesma maneira, desconsiderando as suas singularidades, em outras palavras, dissociando etnia,  
“raça”, gênero, deficiência, geração, posição na classe dos sujeitos contemplados, bem como  
dos sujeitos não contemplados.  
923  
A respeito disso, dois (2) projetos de leis, respectivamente os PL 154/2024 e 483/2024,  
ainda em trâmite, denunciam a necessidade de incluir nas/os possíveis usuárias/os do Pé-de-  
Meia, estudantes de escolas comunitárias do campo, da educação indígena e quilombola  
(Castro, 2024; Siqueira; Hoffmann; Cunha, 2024). Isso que permitirá, supostamente, caminhar  
na direção do atendimento à meta 4.5 da Agenda de 2030 (ONU, 2015, p. 23), tangente à  
necessidade de “eliminar as disparidades de gênero na educação e garantir a igualdade de acesso  
a todos os níveis de educação e formação profissional para os mais vulneráveis, incluindo as  
pessoas com deficiência, povos indígenas e as crianças em situação de vulnerabilidade”.  
Todavia, isso se apresenta como uma utopia dentro do modelo econômico vigente brasileiro,  
apesar da possível contribuição dos citados PLs e sua posterior materialização para diminuição  
8 Ocorrida primeiramente com a Lei n° 13.415/2017 e, atualmente, atualizada pela Lei nº 14.945/2024.  
Eduardo Cechin da Silva; Rosilaine Coradini Guilherme  
das disparidades de gênero e de outros marcadores sociais na educação, mas não a sua  
erradicação, posto que o capital se reproduz através da dominação de determinadas “minorias”.  
Sendo a política educacional e suas instituições os meios onde a (re)produção do capital se  
realize, mediante a elaboração e gestão da política educacional. Assim, mesmo a partir de certas  
conquistas da classe trabalhadora na educação, limites são instaurados mediante a relação entre  
Estado, Mercado e Sociedade Civil.  
Por outro lado, é incoerente tentar promover um desenvolvimento sustentável por  
intermédio da ação sobre os determinantes estruturais da pobreza extrema e sua reprodução  
intergeracional, ao passo de que o defendido processo é o próprio desenvolvimento do capital  
via aumentativo de trabalhadores no mercado de trabalho, via de regra, informal. Este que  
conforme os pontos problematizados ao longo do presente estudo é, por certo, o  
desenvolvimento do capitalismo via acumulação de riquezas e de pauperismo, seja ele absoluto  
ou relativo. Sob este ponto de vista, consoante a outra proposição dessa política acionada pelo  
Pé-de-Meia, está a diminuição dos efeitos das desigualdades sociais ao acesso, permanência e  
conclusão do ensino médio. Para serem realizados eficazmente, antes de tudo, é preciso  
ponderar e avaliar as limitações impostas pela sociabilidade burguesa para concretização desses  
objetivos.  
Nesse sentido, cabe destacar a estratégia de desenvolvimento que guia diversos  
organismos internacionais, propondo excluir a pobreza e a fome do cenário mundial, a partir da  
concepção de que o Estado deve ser o condutor do desenvolvimento sustentável, em vista de  
ampliar as oportunidades e capacidades dos sujeitos. Tais organismos internacionais, como a  
ONU e o Banco Mundial, “incorporam discurso de combate à pobreza pela via do crescimento  
sustentado. O que implicitamente traduz [...] o receio de que a queda de um mercado emergente  
possa atingir as demais economias dos países capitalistas avançados” (Guilherme, 2018, p.  
114).  
924  
Os objetivos de metas para 2030 da ONU não são intencionados ao questionamento, ou  
muito menos, em vista da erradicação do modo de produção capitalista. Ao contrário, tentam  
humanizá-lo, e se contradizem ao tentar, pois diz objetivar que mais pessoas possam lucrar por  
meio de um trabalho capaz de diminuir as desigualdades sociais (Costa; Gentil, 2018), sejam  
elas étnico-raciais, de gênero, classe, renda e deficiência (ONU, 2015).  
O discurso de que a classe trabalhadora pode dispor de um trabalho assalariado lucrativo  
é totalmente incoerente com a realidade objetiva, na qual lucrar é privilégio da classe burguesa,  
dos donos dos meios de produção e dos aparatos de hegemonia propulsores da reestruturação  
produtiva, abarcando a uberização, a terceirização, a crescente informalidade, precarização e  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 906-930, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Somos o futuro do Brasil? O Programa Pé-de-Meia e a Agenda 2030 da ONU  
automatização do trabalho , contrariando tal visão verbalizada de diminuir as desigualdades  
sociais. Em consequência, alia-se a ideologização empreendedora e empresarial, constatada na  
meta 8.3: de “promover políticas [...] que apoiem as atividades produtivas, [possíveis pela]  
geração de emprego decente, empreendedorismo, criatividade e inovação, e incentivar a  
formalização e o crescimento das [...] empresas, inclusive por meio do acesso a serviços  
financeiros” (ONU, 2015, p. 26-27).  
Para tanto, tal meta tem por ideia propulsionar políticas orientadas ao viés  
desenvolvimentista, traduzido numa aliança neoliberal de filantropização, de obtenção de lucro,  
que no real, requer um desenvolvimento não tão sustentável ao advogado em papel. Assim, com  
a educação visionada pelo referenciado documento do qual o Brasil é signatário, “a execução  
das metas fica sob responsabilidade de governos, empresas, universidades, Organizações Não  
Governamentais [ONGs], entre outros, em regime de parceria, financiada com recursos  
oriundos de doações de grandes corporações” (Costa; Gentil, 2018, p. 669).  
Estimula-se por meio disso, a refilantropização da política pública, da educação  
brasileira, via privatização das competências, não devendo especificamente o Estado  
proporcionar uma educação inclusiva, equitativa e de qualidade, mas o todo social. Tal  
tendência se fomenta numa cuidadosa relação de manipulação dos poderes, para perpetuação  
da hegemonia burguesa através da mistificação dos reais propósitos burgueses exploratórios  
transvestidos de democracia.  
925  
Independentemente de o presidente Lula e seus aliados eleitos serem alinhados ao viés  
político progressista, esses estão submetidos à lógica burguesa. Isso reflete na dependência  
brasileira às economias capitalistas centrais, não apenas no quesito econômico, mas também  
ideopolítico, cultural e remetente a tantas outras instâncias da vida subordinadas, hora ou outra,  
às relações de (re)produção hegemônica.  
O Programa Pé-de-Meia, apesar de ser uma iniciativa de busca pela inclusão social, pela  
democratização ao acesso, pela permanência à educação e pela diminuição das desigualdades  
sociais, reforça a política neoliberal, respaldada por valores de uma organização internacional  
como a ONU. Nesse caminho, embora os repasses financeiros sejam importantes diante das  
condições de vida, muitas vezes extremamente precárias, eles não pressupõem a crítica ao  
intitulado Novo Ensino Médio, à tecnificação do currículo escolar. Com isso, amplia  
manifestações da “questão social” de parte da população brasileira, ao incentivar  
financeiramente as/os estudantes mais vulneráveis e pobres a permanecerem numa educação  
que visa formar recursos humanos. Tal como obscurece as contradições mantenedoras da  
necessidade do Programa ao considerar tais sujeitos como “vulneráveis”, numa leitura  
Eduardo Cechin da Silva; Rosilaine Coradini Guilherme  
imediatista das causas de sua condição social: evasão escolar, baixa renda per capita, falta de  
políticas econômicas para a educação e afins.  
Em outras palavras, “negligencia-se o entendimento das causas estruturais que, na  
sociedade capitalista, fundam a dialética pobreza/acumulação” (Siqueira, 2015, p. 249). Como  
se o incentivo pecuniário do Pé-de-Meia fosse um meio para lutar contra a pobreza, a qual é  
substituída pela noção de vulnerabilidade defendida pelo discurso político-econômico  
neoliberal. Tal narrativa propaga a ideia de que a partir da “inclusão” do Programa Pé-de-Meia  
– construído em torno da defesa da “democratização” educacional – irá impulsionar a/o  
estudante, a partir da sua inserção no Novo Ensino Médio, a investir e empreender de acordo  
com suas “escolhas” nessa educação tecnicista. Em suma, no intuito de formá-las/os ao mercado  
de trabalho, sem a pretensão de formá-las/os criticamente nos moldes da pedagogia  
emancipatória.  
Considerações finais  
A disputa ideológica a respeito das concepções de pobreza se faz presente no Brasil  
desde a economia mercantil escravista. Todavia, é com a edificação do sistema de produção  
capitalista e seu Estado burguês que o pauperismo torna-se categoria central às relações sociais,  
sendo parte fundamental da contradição sustentadora do capital. Surtindo disso, a disseminação  
de razões que conotam uma moralização e psicologização dessa expressão da “questão social”,  
ao popularizar uma interpretação de ordem individual e conjuntural, sem fazer qualquer relação  
com os condicionantes de ordem estrutural.  
926  
Com a globalização, a pobreza decorre da relação entre ciência e suas tecnologias,  
empresas e Estados, produzindo-a intencionalmente e dificultando sua diminuição e  
enfrentamento com a participação mínima na proteção social. Ainda que isso seja mistificado,  
muitas vezes, pelo discurso de desenvolvimento lento do país, cuja ênfase remete a iniciativas  
modernizadoras que visam o progresso e o crescimento econômico e a necessidade mercantil  
da profissionalização e tecnificação da educação brasileira, promovendo um ensino  
supostamente possibilitador de futuras oportunidades no mercado de trabalho. Essa lógica, após  
o impeachment de Dilma em 2016, ganha fôlego com a aprovação do Novo Ensino Médio –  
manifestando uma contrarreforma para a educação brasileira.  
A atual política pública da educação, na conjuntura contemporânea, especificamente o  
ensino médio, é amparada pela falsa defesa da autonomia das/os estudantes e a preparação  
técnico-científica frente às inovações do processo produtivo no século XXI, de maneira que  
estas/es poderão alcançar alguma ascensão econômico-social. Isso oculta as razões estruturais  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 906-930, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Somos o futuro do Brasil? O Programa Pé-de-Meia e a Agenda 2030 da ONU  
para a reelaboração do conteúdo educacional, cooptadas através do forte apelo empresarial e  
das sugestões contraditórias de organismos internacionais como a ONU, mediante a Agenda  
2030 do Desenvolvimento Sustentável.  
Em virtude dos expressivos dados de evasão e os baixos índices de permanência no  
ensino médio durante o mandato bolsonarista, o presidente Lula outorga a Lei nº 14.818, de 16  
de janeiro de 2024, instituindo o Programa Pé-de-Meia enquanto incentivo financeiro na área  
da educação para determinadas/os estudantes, deferindo transferências monetárias conforme o  
atendimento aos requisitos trimestrais e/ou anuais das/os beneficiadas/os. A finalidade primária  
dessa política na forma de programa é a democratização do acesso para jovens ao ensino médio,  
estimulando a permanência escolar. A criação deste Programa, de certa maneira, entra em  
contradição com um dos motivos da implementação do novo modelo de educação do ensino  
médio no Brasil, em que seria melhor e mais estimulante em comparação ao antigo modelo,  
haja vista sua instituição em prol de formação técnica voltada para o mercado laboral, a qual, a  
partir disso, instigaria as/os estudantes a permanecerem no ensino médio com permitida  
autonomia.  
Evidencia-se, com isso, que os critérios para o acesso ao Pé-de-Meia estão sob os limites  
da economia dependente brasileira, erigidas por um governo neodesenvolvimentista que busca  
conjugar crescimento econômico com desenvolvimento social, tendo como uma das estratégias  
implementar programas de transferência de renda. De caráter focalizado, esse Programa se  
destina aos sujeitos mais vulneráveis, mediante cumprimento de requisitos e condições, tanto  
para a concessão como para a permanência.  
927  
Diante disso, em resposta ao título do artigo, observa-se que o receituário neoliberal,  
contido em programas sociais, como o Pé-de-Meia e nas propostas da ONU, colide com a  
construção de um futuro sob bases da emancipação humana. Nesse caso, perpetua-se a ideia de  
que a juventude é o futuro do país, restando refletir sobre qual é a destinação projetada para  
esse futuro onírico. Entende-se que o Programa estudado, configura uma iniciativa importante  
dada as condições precárias de vida de parcela das/os estudantes, por outro lado se faz  
necessário refletir sobre as bases do Programa, onde ele se estrutura e as suas limitações, quando  
considerada a lógica da educação tecnicista e acrítica.  
Por fim, é fundamental atentar às contradições dos objetivos a serem seguidos com base  
na Agenda 2030 da ONU, que vão no sentido de, ao mesmo tempo defender a inclusão social  
na educação e a diminuição do desemprego, apoiar ações que visam privatizá-la para tornar  
essa política um campo de maximização de lucros a ser mediado pela parceria com empresas.  
O lançamento do programa federal Pé-de-Meia, apesar de ser uma iniciativa que, no discurso  
Eduardo Cechin da Silva; Rosilaine Coradini Guilherme  
visa o “combate” à pobreza por meio da “inclusão” e “democratização” educacional, vai na  
tendência neoliberal que permite a existência de políticas sociais públicas desde que  
estruturadas na focalização e na seletividade, em detrimento às políticas de caráter universalista.  
Assim, significando que as/os estudantes contemplados pelo programa estarão inseridos no  
contexto do sucateamento da educação pública e das demais políticas sociais. Logo, se torna  
uma falácia pensar que ao desenvolverem habilidades e técnicas, as/os filhas/os da classe  
trabalhadora, tornam-se responsáveis pelo futuro do Brasil lugar no qual as intenções do  
grande capital correspondem, exclusivamente, aos interesses da classe dominante/exploradora.  
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930  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 906-930, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A educação em saúde na atenção primária e o  
papel do assistente social  
Health education in primary health care and the role of the social worker  
Iza Maria Pereira*  
Francisca Felícia Campos Paiva de Lima**  
Jean Carlos Dantas de Oliveira ***  
Resumo: Este trabalho tem como objetivo  
discutir o papel do assistente social na educação  
em saúde na atenção primária. A relevância  
desse tema reside na necessidade de ampliar a  
Abstract: This study aims to examine the role  
of the social worker in health education within  
primary healthcare. The significance of this  
topic lies in the need to broaden the  
understanding of the professional's contribution  
to fostering collective and democratic practices,  
which are essential to ensure user access to  
healthcare services, particularly within the  
Unified Health System (SUS). The research  
adopts a qualitative, exploratory approach,  
based on a bibliographical survey. Data analysis  
followed the principles of thematic analysis  
(Minayo, 2010) and was complemented by a  
similarity analysis conducted with the  
IRaMuTeQ software, using a corpus derived  
from the theoretical section regarding the social  
worker’s role in primary healthcare. This  
analysis allowed for the identification of key  
thematic units and semantic relationships  
between terms, further deepening the  
understanding of health education strategies.  
The findings highlight the importance of social  
workers in health education processes, through  
the development of strategic actions in primary  
healthcare, linked to public policy management,  
social control, citizenship, and the enhancement  
of SUS.  
compreensão sobre  
a
contribuição desse  
profissional para a promoção de práticas  
coletivas e democráticas, fundamentais para  
assegurar o acesso dos usuários aos serviços de  
saúde, especialmente no SUS. A pesquisa é de  
natureza qualitativa, com caráter exploratório,  
fundamentada em levantamento bibliográfico. A  
análise dos dados seguiu os princípios da análise  
temática (Minayo, 2010) e foi complementada  
por uma análise de similitude, realizada com o  
uso do software IRaMuTeQ, a partir de um  
corpus extraído da seção teórica referente à  
atuação do assistente social na atenção primária.  
Essa etapa permitiu identificar núcleos de  
sentido e relações semânticas entre os termos,  
contribuindo para aprofundar a compreensão  
sobre as estratégias de educação em saúde. Os  
resultados evidenciam a relevância do assistente  
social nos processos educativos em saúde,  
mediante  
o
desenvolvimento de ações  
estratégicas articuladas na atenção primária,  
vinculadas à gestão de políticas públicas, ao  
controle social, ao exercício da cidadania e à  
qualificação do SUS.  
Palavras-chaves: Educação em saúde;  
Assistente social; Promoção em saúde; Atenção  
primária à saúde.  
Keywords: Health education; Social worker;  
Health promotion; Primary attention care.  
* Universidade Estadual do Ceará. E-mail: iza.pereira@aluno.uece.br  
** Centro Universitário de Patos. E-mail: feliciapaiva21@gmail.com  
***  
Fundação de Amparo e Promoção da Ciência, Tecnologia e Inovação do Rio Grande do Norte. E-mail:  
jeanceac2020@gmail.com  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.48434  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 25/04/2025  
Aprovado em: 28/07/2025  
Iza Maria Pereira; Francisca Felícia Campos Paiva de Lima; Jean Carlos Dantas de Oliveira  
Introdução  
O assistente social, inserido no processo de trabalho na área da saúde, ainda enfrenta  
desafios no reconhecimento de seu papel como profissional da saúde, apesar de seu  
enquadramento legal por meio da Resolução nº 218, de outubro de 1998, do Conselho Nacional  
de Saúde (CNS), e da Resolução nº 383/99, de 29 de março de 1999, do Conselho Federal de  
Serviço Social (CFESS). Essas normativas evidenciam a atuação interdisciplinar do assistente  
social na área da saúde e destacam sua importância para a garantia da qualidade dos serviços  
prestados aos usuários do sistema de saúde.  
Apesar disso, a atuação do assistente social na saúde ainda é, por vezes, invisibilizada  
ou compreendida de forma reduzida, tanto por parte de outros profissionais da saúde quanto  
pelas próprias gestões institucionais. Essa desvalorização se expressa na restrição de suas  
funções a atividades meramente burocráticas ou administrativas, o que acaba por obscurecer a  
amplitude e a complexidade de sua intervenção profissional. No entanto, o serviço social  
contribui de maneira significativa para a efetivação do direito à saúde, por meio de diferentes  
frentes de atuação que articulam dimensões técnico-operativas, ético-políticas e teórico-  
metodológicas (CFESS, 2011; Iamamoto, 2007).  
Dentre essas frentes, destaca-se a educação em saúde, entendida como um campo  
estratégico de intervenção que possibilita a promoção do cuidado, da autonomia dos sujeitos e  
da consolidação da cidadania, especialmente no âmbito da Atenção Primária em Saúde (APS).  
Trata-se, portanto, de uma das muitas contribuições do assistente social para a integralidade da  
atenção à saúde e para o fortalecimento das políticas públicas.  
932  
Nessa perspectiva, a educação em saúde exercida pelo serviço social está fortemente  
vinculada à viabilização da participação popular nos espaços institucionais. Como afirmam  
Bentes e Honorato (2022), “uma ação que considera-se importante para os assistentes sociais é  
a viabilização da participação popular nas instituições e programas de saúde”. A atuação do  
assistente social, assim, é tem sido orientada por práticas interventivas e socioeducativas que  
promovem a democratização das informações e a socialização de direitos, muitas vezes  
desconhecidos pelos usuários.  
De acordo com esta perspectiva, este trabalho propõe discutir a relevância do assistente  
social nas ações de educação em saúde na atenção primária, compreendendo essas ações como  
instrumentos fundamentais para o fortalecimento de espaços coletivos democráticos e para a  
efetivação dos direitos dos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS). Trata-se, portanto, de  
refletir sobre como o trabalho desse profissional contribui para a autonomia dos sujeitos e a  
participação social na construção de políticas públicas.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 931-946, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A educação em saúde na atenção primária e o papel do assistente social  
A partir desse contexto, emergem as seguintes questões norteadoras: O que é, de fato, a  
promoção da saúde? Qual o papel do assistente social na efetivação dessa promoção em seu  
espaço de atuação? Como possibilitar a participação dos usuários nos serviços de saúde por  
meio de ações educativas?  
Este estudo adota uma abordagem qualitativa de natureza exploratória, com base em  
pesquisa bibliográfica. A escolha por esse delineamento metodológico se justifica pela  
necessidade de construir uma compreensão inicial e sistematizada sobre o papel do assistente  
social na educação em saúde no âmbito da atenção primária, a partir da análise crítica da  
produção acadêmica e técnica já consolidada sobre o tema. Conforme destaca Minayo (2001),  
a pesquisa qualitativa é particularmente apropriada para o estudo de fenômenos sociais em sua  
complexidade, possibilitando a exploração de sentidos, práticas e mediações construídas  
historicamente.  
Segundo Gil (2008), a pesquisa bibliográfica é desenvolvida a partir de material já  
publicado, constituído principalmente por livros, artigos de periódicos científicos, documentos  
oficiais e outras fontes disponíveis em meios físicos e digitais. Trata-se, portanto, de uma  
estratégia que permite ao pesquisador conhecer e problematizar o estado da arte do objeto de  
estudo, identificando lacunas, avanços e desafios teóricos e práticos.  
A seleção do material foi orientada por critérios de relevância temática, atualidade e  
contribuição para a análise crítica da atuação profissional do assistente social na atenção  
primária à saúde. Para tanto, foi realizada uma pesquisa exploratória nas bases de dados  
SciELO, LILACS e Google Acadêmico, utilizando os seguintes descritores: “educação em  
saúde”, “atenção primária à saúde”, “políticas públicas de saúde” e “serviço social na saúde”.  
Foram incluídas produções como livros, artigos científicos publicados em periódicos da área,  
além de documentos institucionais e normativos, como diretrizes do SUS e resoluções do  
Conselho Nacional de Saúde. Dentre os temas priorizados, destacam-se a educação em saúde,  
as políticas públicas de saúde no Brasil, a atenção primária como estratégia central do SUS,  
bem como a inserção e atuação do serviço social no campo da saúde.  
933  
A análise do conteúdo das obras selecionadas seguiu os princípios da análise temática,  
que, conforme Minayo (2010), permite a identificação de categorias significativas e recorrentes  
a partir da leitura atenta e sistemática dos textos. A partir disso, foi possível sistematizar os  
principais elementos que sustentam a importância do trabalho do assistente social na promoção  
da educação em saúde, bem como sua contribuição para a efetivação dos princípios do SUS,  
em especial a universalidade, a integralidade e a participação social.  
Iza Maria Pereira; Francisca Felícia Campos Paiva de Lima; Jean Carlos Dantas de Oliveira  
Complementarmente, foi realizada uma análise de similitude com base em um corpus  
textual construído exclusivamente a partir da seção “O assistente social e a prática em educação  
em saúde na atenção primária”, que integra o referencial teórico deste artigo. Para essa etapa,  
utilizou-se o software IRaMuTeQ1, com o objetivo de identificar os principais núcleos de  
sentido e as relações semânticas entre os termos mais recorrentes. O corpus foi composto pelo  
texto completo da seção mencionada, sem categorização prévia, a fim de possibilitar uma  
análise exploratória da organização léxica. Tal recurso metodológico contribuiu para ampliar a  
compreensão das regularidades discursivas presentes no texto, permitindo visualizar as  
conexões entre os conceitos centrais da atuação do assistente social na atenção primária e as  
estratégias de educação em saúde.  
A relevância social deste estudo reside na necessidade de reconhecer e valorizar o  
trabalho do assistente social na atenção primária à saúde, especialmente na promoção da  
educação em saúde como mecanismo de efetivação dos direitos sociais decorrentes da Reforma  
Sanitária e da Constituição de 1988. Justifica-se também em âmbito profissional, pela  
experiência da autora e pela compreensão da importância desse campo sócio-ocupacional.  
Embora, historicamente, a atuação profissional tenha sido mais concentrada nos níveis  
secundário e terciário do SUS, a APS, particularmente por meio das equipes da Estratégia Saúde  
da Família (ESF) e do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF), vem se configurando como  
um dos principais espaços de inserção do assistente social no Brasil, com cerca de 60% dos  
profissionais atuando no setor público (CFESS, 2022)  
934  
Dessa forma, ao evidenciar a crescente inserção do assistente social na atenção primária  
à saúde, o presente estudo reafirma a centralidade desse campo de atuação na efetivação dos  
direitos sociais e na consolidação das políticas públicas de saúde. A presença qualificada desse  
profissional nas equipes multiprofissionais, como as da ESF e do NASF, contribui  
significativamente para a promoção da saúde, a democratização do acesso à informação e o  
fortalecimento do SUS enquanto política pública universal e inclusiva.  
1
O IRaMuTeQ (Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires) é um  
software livre, ancorado na linguagem estatística R, que permite realizar diferentes análises textuais e estatísticas.  
No presente estudo, foi utilizado para a construção de uma análise de similitude, visando evidenciar as  
coocorrências entre os termos e os núcleos de sentido predominantes no corpus. O IRaMuTeQ tem sido  
incorporado em pesquisas qualitativas na área da saúde no Brasil, como evidenciado por uma revisão sistemática  
(scoping review) que identificou 54 estudos utilizando o software, destacando a técnica de análise de similitude  
como uma das mais recorrentes (Salvador et al., 2018). Quanto à área de Serviço Social, há registros da aplicação  
dessa ferramenta de análise textual em dissertação de mestrado de Menezes (2021), da Universidade Federal de  
Uberlândia (UFU), que analisou questões relacionadas à saúde de assistentes sociais atuantes na assistência a  
pessoas em situação de rua.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 931-946, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A educação em saúde na atenção primária e o papel do assistente social  
Promoção da saúde na atenção primária: o papel da educação em saúde e a  
participação social  
A Carta de Ottawa (1986), documento de referência para os estudos em promoção da  
saúde, conceitua essa prática como “a capacitação das pessoas e comunidades para modificarem  
os determinantes da saúde em benefício da própria qualidade de vida”.  
Percebe-se que esse documento traz um conceito amplo e que não se restringe às ações  
diretamente vinculadas ao setor da saúde. Parte-se da compreensão de que o processo saúde-  
doença resulta de múltiplos determinantes sociais, como educação, habitação, meio ambiente,  
cultura, trabalho, transporte e lazer, entre outros. Assim, saúde não se resume à ausência de  
enfermidades, mas está relacionada à qualidade de vida, entendida como o acesso a condições  
dignas de existência e aos serviços essenciais. Como define a Organização Mundial da Saúde  
(OMS), “saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a  
ausência de doenças ou enfermidades” (OMS, 2006, p. 1), destacando que os determinantes  
sociais desempenham papel central na formulação de políticas públicas na área da saúde.  
Seguindo esses pressupostos, o SUS foi criado e regulamentado através da Lei nº 8.080,  
de 19 de setembro de 1990. Conforme o artigo 5º da referida lei (Brasil, 1990), são objetivos  
do SUS: (I) identificar e divulgar os fatores condicionantes e determinantes da saúde; (II)  
formular políticas de saúde que promovam ações nos campos econômico e social; e (III) prestar  
assistência integral à população por meio de promoção, proteção e recuperação da saúde.  
Assim, as ações e serviços de saúde passaram a ser de relevância pública à medida que  
o Estado assumiu o compromisso com a saúde da população, buscando promovê-la por meio  
da formulação de políticas sociais e econômicas voltadas à redução dos riscos de doenças e  
agravos. Essa diretriz se alinha, em parte, ao projeto da Reforma Sanitária, especialmente no  
que diz respeito ao reconhecimento dos determinantes sociais da saúde, “fatores sociais,  
econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e comportamentais que influenciam a  
ocorrência de problemas de saúde e seus fatores de risco na população” (Buss, 2000, p. 79).  
Diante dessa conjuntura, torna-se imprescindível contar com profissionais capacitados  
para intervir nas políticas sociais de saúde, entre os quais se destaca o assistente social, cuja  
inserção na área da saúde está historicamente consolidada. Conforme aponta Silva (2010), a  
atuação do serviço social nesse campo remonta às primeiras décadas do século XX e está  
fortemente associada à defesa dos direitos sociais e à consolidação das políticas públicas. Essa  
discussão será aprofundada nas seções seguintes, com ênfase nas contribuições do assistente  
social na atenção primária e na educação em saúde.  
935  
Iza Maria Pereira; Francisca Felícia Campos Paiva de Lima; Jean Carlos Dantas de Oliveira  
Mediante essa conjuntura, torna-se necessário contar com profissionais capacitados para  
intervir nas políticas sociais de saúde, entre os quais se destaca o assistente social, cuja inserção  
histórica na área da saúde remonta à década de 1930, quando a profissão passou a compor  
equipes de serviços de assistência à saúde, participando ativamente da construção das políticas  
sociais no Brasil, especialmente com a Reforma Sanitária e a criação do SUS (CFESS, 2013).  
Essa discussão será aprofundada nas seções seguintes, considerando os fundamentos históricos  
e ético-políticos da profissão no campo da saúde.  
Pensar em promoção da saúde envolve ações coletivas e individuais de caráter educativo  
e de ampliação de conhecimento, partindo dos determinantes sociais e do conceito ampliado de  
saúde, com o desenvolvimento de ações estratégicas articuladas da atenção primária entre os  
diversos setores. Nesse contexto, a atenção primária à saúde (APS) se configura como um eixo  
central, sendo definida pela Organização Mundial de Saúde (OMS), na Conferência  
Internacional sobre Atenção Primária à Saúde, em 1978, em Alma Ata, como:  
cuidados essenciais de saúde baseados em métodos e tecnologias práticas,  
cientificamente bem fundamentadas e socialmente aceitáveis, colocados ao  
alcance universal de indivíduos e famílias [...]. Representam o primeiro nível  
de contato dos indivíduos, da família e da comunidade com o sistema nacional  
de saúde pelo qual os cuidados são levados o mais proximamente possível aos  
lugares onde as pessoas vivem e trabalham, e constituem o primeiro elemento  
de um continuado processo de assistência à saúde (Brasil, 2020, p. 5).  
936  
Nesta perspectiva, a atenção primária caracteriza-se por sua proximidade com a  
população, suas necessidades, contextos locais, equipamentos de saúde e recursos humanos  
disponíveis e possui quatros características norteadoras essenciais: acesso de primeiro contato  
(acessibilidade e utilização dos serviços de saúde), longitudinalidade de serviços (continuidade  
de atenção; relações interpessoais intensas que expressem a identificação mútua entre as  
pessoas atendidas e os profissionais de saúde), integralidade da atenção (acesso a todos os  
serviços de saúde necessários, assim como serviços preventivos ou que possibilitem o  
diagnóstico e o tratamento das doenças; resolução de problemas - orgânicos, funcionais ou  
sociais) e coordenação do sistema de saúde (integralização dos diferentes níveis do sistema de  
saúde) (Brasil, 2020).  
Partindo dessas premissas, a atenção primária assume papel de estruturação dos serviços  
básicos de saúde de maneira que a atenção básica atue nos territórios de forma forte e resolutiva,  
demonstrando a evolução histórica nas políticas sociais de saúde através das legislações  
específicas e a própria constituição do SUS, culminando, posteriormente, na Política Nacional  
de Atenção Básica PNAB.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 931-946, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A educação em saúde na atenção primária e o papel do assistente social  
No âmbito da atenção básica, são desenvolvidas ações e estratégias de educação em  
saúde pelos profissionais da saúde, especialmente pelos assistentes sociais. É importante  
destacar que, embora a educação em saúde seja uma atribuição recorrente desse profissional,  
ela não é uma área exclusiva do assistente social.  
Para entender melhor o conceito de educação em saúde, é necessário compreender sua  
definição. Segundo Santos e Senna (2017), a educação em saúde, embora não seja uma prática  
exclusiva do assistente social, tem sido uma das mais constantes e frequentemente requisitadas  
a esse profissional, especialmente no contexto da Atenção Primária à Saúde (APS).  
Conforme Rezende (1989, p. 112 apud Lopes, 2002),  
a educação para a saúde é, sem dúvida, o processo mais eficiente das ações  
profiláticas, um instrumento básico para a veiculação de informações e  
experiências sobre saúde. Educar para a saúde é uma atividade das mais  
relevantes para um país em desenvolvimento.  
Assim, ao refletirmos sobre a educação em saúde, é essencial considerar os sujeitos  
envolvidos no processo, o desenvolvimento de ações articuladas e interdisciplinares, além de  
sua contribuição para a consolidação da cidadania. A educação em saúde, portanto, é uma  
ferramenta indispensável para o fortalecimento da saúde coletiva e da cidadania.  
Valia e Stotz (1994 apud Lopes, 2002, p. 21) afirmam que a educação em saúde:  
é um campo de conhecimentos que pode facultar à sociedade uma melhor  
compreensão sobre as relações entre as condições de vida e trabalho e a saúde  
e a doença, e do ponto de vista da ação social, apontar os meios para pressionar  
os governos a aplicar os recursos públicos mais de acordo com as necessidades  
da população trabalhadora.  
937  
Essa perspectiva corrobora com o que defende o CFESS (2020), ao afirmar que as ações  
educação em saúde e/ou socioeducativas não devem pautar-se somente pelo fornecimento de  
informações ou esclarecimentos que levem à simples adesão do usuário, pois isso denotaria, tão  
somente, controle e subalternação. A educação em saúde deve ter como propósito a construção  
de uma nova cultura, enfatizando a participação dos usuários no conhecimento crítico da sua  
realidade, bem como sua potencialização para a construção de estratégias coletivas, e não  
somente individuais.  
Nesse âmbito, depreende-se que a educação em saúde aponta o diálogo como  
mecanismo de gestão participativa e de construção de uma saúde, ou acesso à saúde, mais  
adequada à vida da população. É nesse espaço, também, que há o reconhecimento dos sujeitos,  
suas histórias e a construção dos seus processos educativos em saúde, conferindo-lhe autonomia  
e exercício da cidadania.  
Iza Maria Pereira; Francisca Felícia Campos Paiva de Lima; Jean Carlos Dantas de Oliveira  
Nesse contexto, o trabalho profissional do assistente social no que se refere à educação  
em saúde é relevante, pois esse profissional atua diretamente nas relações sociais e no cotidiano  
dos sujeitos, contribuindo com práticas socioeducativas voltadas à promoção da saúde e à  
ampliação do acesso à informação.  
O assistente social e a prática em educação em saúde na atenção primária  
O serviço social tem ocupado espaços no campo da saúde. Entretanto, foi somente no  
final dos anos 1980 e início dos anos de 1990, com a implantação do SUS e com a ampliação  
horizontal das subunidades de serviços, que ocorreu um processo crescente de inserção dos  
assistentes sociais nesta área (Costa, 2000).  
Nessa conjuntura, observou-se um momento de plena efervescência na saúde, aliado a  
uma reflexão no interior do serviço social que, repensando suas bases teóricas, metodológicas  
e éticas, vem construindo desde décadas anteriores, o projeto ético-político que é definido a  
partir de algumas inquietações referentes à indefinição da profissão (o que é, o que faz?), visto  
que tais questões, quando são postas em evidência, afetam direta ou indiretamente o  
profissional, que tem de explicitar constantemente o porquê da sua necessidade e importância  
na instituição (Lima, 2007).  
Assim, a partir da implantação do SUS, consolidada por meio de mobilizações,  
encontros, conferências, criação de conselhos e comissões, o serviço social passou a promover  
discussões sobre sua atuação na área da saúde, com a necessidade de redefinir suas funções em  
relação às demais profissões, buscando afirmar sua identidade e especificidade profissional  
nesse campo.  
938  
À vista disso, o Conselho Federal de Serviço Social CFESS (2010, p. 39-65)  
sistematizou, por meio de documento orientador, os parâmetros de atuação dos assistentes  
sociais na política de saúde, delimitando quatro eixos fundamentais de intervenção profissional.  
No quadro abaixo, apresentamos uma síntese desses eixos:  
Quadro 1: Eixos de intervenção profissional do assistente social.  
Atendimento direto ao Atendimento aos usuários dos serviços de saúde nos diversos  
1.  
2.  
usuário  
espaços desde a atenção básica até os serviços de média e alta  
complexidade seja através de ações socioassistenciais, ações de  
articulação com a equipe de saúde e ações socioeducativas.  
Mobilização, participação Envolve um conjunto de ações voltadas para a mobilização e  
e controle social  
participação social de usuários, familiares, trabalhadores de  
saúde e movimentos sociais em espaços democráticos de  
controle social (conselhos, conferências, fóruns de saúde e de  
outras políticas públicas) e nas lutas em defesa da garantia do  
direito à saúde.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 931-946, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A educação em saúde na atenção primária e o papel do assistente social  
Investigação,  
planejamento e gestão  
Conjunto de ações que tem como perspectiva o fortalecimento  
da gestão democrática e participativa capaz de produzir, em  
equipe e intersetorialmente, propostas que viabilizem e  
potencializem a gestão em favor dos usuários e trabalhadores de  
saúde, na garantia dos direitos sociais.  
3.  
4.  
Assessoria, qualificação e Envolve a educação permanente dos trabalhadores de saúde, da  
formação profissional  
gestão, dos conselheiros de saúde e representantes comunitários,  
bem como a formação de estudantes da área da saúde e  
residentes e, as ações voltadas para a assessoria.  
Fonte: Elaborado pelos autores, adaptado de CFESS (2010, p. 39-65).  
Por isso, ao estabelecer as atribuições do assistente social na saúde, o CFESS reconhece  
a profissão na área saúde, tendo suas funções e legitimidade definidas pela representação da  
categoria, ao passo que se torna essencial a atuação do profissional nesse espaço, seja no  
assessoramento, elaboração de programas e/ou projetos em que são subsidiados pelo  
conhecimento da realidade social através da intervenção.  
É no escopo da área da saúde que iremos pensar o fazer profissional dos assistentes  
sociais e as contribuições da educação em saúde como mecanismo de materialização do projeto  
ético-político do serviço social. Para isso, segundo as autoras Santos e Senna (2017), ponderar  
a educação em saúde como instrumento de atuação do assistente social encontra-se imbricado  
com as dimensões ético-político, teórico-metodológicas e técnico-operativo da profissão.  
Nesse sentido, Santos e Senna (2017, p. 445) registram que:  
939  
uma proposta socioeducativa do profissional de Serviço Social na saúde  
politiza as demandas, enfatiza a participação social dos usuários, produz o  
conhecimento crítico da realidade e aposta na constante busca da autonomia  
dos sujeitos sociais. Por isso, reforça-se a ideia que a Educação em Saúde deve  
ser pensada como instrumento teórico-metodológico e ético-político do  
exercício profissional, que pode fomentar sua transformação qualitativa em  
direção aos interesses dos usuários e à satisfação das necessidades dos  
segmentos menos favorecidos.  
Destarte, é nesse lócus de atuação que o assistente social, especificamente nos serviços  
de saúde de atenção primária, encontra subsídios para aliar os princípios estruturantes do SUS  
como: universalidade, participação social, promoção da saúde e a educação permanente ao  
realizar ações de educação em saúde no cotidiano junto aos usuários, suscitando a reflexão  
crítica da realidade, quer seja em atividades grupais, individuais ou nos territórios dos serviços  
de saúde.  
Essa perspectiva corrobora com o posicionamento do CFESS (2010), nos Parâmetros de  
Atuação de Assistentes Sociais na Política de Saúde, ao realizar uma reflexão acerca do objetivo  
das ações socioeducativas e/ou em educação em saúde em que diz:  
As ações socioeducativas e/ou educação em saúde não devem pautar-se pelo  
fornecimento de informações e/ou esclarecimentos que levem a simples  
Iza Maria Pereira; Francisca Felícia Campos Paiva de Lima; Jean Carlos Dantas de Oliveira  
adesão do usuário, reforçando a perspectiva de subalternização e controle dos  
mesmos. Devem ter como intencionalidade a dimensão da libertação na  
construção de uma nova cultura e enfatizar a participação dos usuários no  
conhecimento crítico da sua realidade e potencializar os sujeitos para a  
construção de estratégias coletivas (CFESS, 2010, p. 55).  
Desse modo, no tocante às atividades socioeducativas e/ou educação em saúde  
desenvolvidas por assistente social nos serviços de saúde de atenção primária pode-se destacar  
as principais atividades, conforme o CFESS (2010, p. 56):  
• sensibilizar os usuários acerca dos direitos sociais, princípios e diretrizes do  
SUS, rotinas institucionais, promoção da saúde e prevenção de doenças por  
meio de grupos socioeducativos;  
• democratizar as informações da rede de atendimento e direitos sociais por  
meio de ações de mobilização na comunidade;  
• realizar debates e oficinas na área geográfica de abrangência da instituição;  
• realizar atividades socioeducativas nas campanhas preventivas;  
• democratizar as rotinas e o funcionamento da unidade por meio de ações  
coletivas de orientação;  
• socializar informações e potencializar as ações socioeducativas  
desenvolvendo atividades nas salas de espera;  
• elaborar e/ou divulgar materiais socioeducativos como folhetos, cartilhas,  
vídeos, cartazes e outros que facilitem o conhecimento e o acesso dos usuários  
aos serviços oferecidos pelas unidades de saúde e aos direitos sociais em geral;  
• mobilizar e incentivar os usuários e suas famílias para participar no controle  
democrático dos serviços prestados;  
• realizar atividades em grupos com os usuários e suas famílias, abordando  
temas de seu interesse.  
940  
Assim, o assistente social atuante na atenção primária deve articular as estratégias de  
intervenções com o projeto ético-político da profissão na perspectiva de transformação social,  
bem como, também, analisar a realidade por meio do viés da totalidade social (Souza;  
Hauradou, 2020). De modo que é imprescindível o conhecimento da realidade e das demandas  
dos usuários dos serviços e, ao realizar as mediações pertinentes, utilizar-se dos recursos da  
educação em saúde como instrumento potencializador da emancipação social dos sujeitos  
(Santos; Senna, 2017). Essas medidas estimulam a participação no processo de elaboração e  
construção das políticas sociais que atendam à realidade e à materialização do SUS, quer seja  
através dos órgãos de controle social, por exemplo, conselhos municipais, conferências,  
ouvidorias ou através de outros meios de participação popular (Gomes; Orfão, 2021).  
A atuação do assistente social na atenção primária à saúde vai além da simples execução  
de atividades previstas em protocolos institucionais, mas sua prática se fundamenta em uma  
perspectiva crítica e propositiva, que busca reconhecer e valorizar os sujeitos enquanto  
protagonistas na construção de sua própria saúde (Moura, 2018). Nesse contexto, as atividades  
socioeducativas se tornam espaços privilegiados de escuta, reflexão e mobilização coletiva,  
onde se estimula a apropriação dos direitos e o fortalecimento da autonomia dos usuários.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 931-946, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A educação em saúde na atenção primária e o papel do assistente social  
Através dessas ações, o profissional contribui para a formação de uma consciência crítica acerca  
das desigualdades sociais que atravessam os territórios e interferem diretamente nas condições  
de vida e saúde da população (Lopes; Simões, 2020).  
Ao promover o diálogo entre os saberes populares e os conhecimentos técnico-  
científicos, o assistente social favorece a construção de práticas educativas que respeitam as  
especificidades culturais e sociais dos grupos atendidos (Salvador; Salvador, 2019). Essa  
mediação qualificada permite não apenas o acesso à informação, mas também a ressignificação  
de experiências, fortalecendo os vínculos comunitários e a corresponsabilidade na produção do  
cuidado. Assim, a educação em saúde se configura como uma ferramenta estratégica na  
promoção da equidade, consolidando o compromisso ético-político da profissão com a justiça  
social e a defesa intransigente dos direitos humanos (Fittipaldi et al., 2021).  
A análise de similitude (Figura 1), realizada com o auxílio do software IRaMuTeQ a  
partir do corpus extraído da seção “O assistente social e a prática em educação em saúde na  
atenção primária”, evidenciou que o termo “social” ocupa posição central na rede léxica. A  
centralidade dessa palavra confirma sua relevância na organização do discurso profissional,  
conforme defendido pelo Projeto Ético-Político do Serviço Social (CFESS, 2009, p. 20).  
Ao redor desse núcleo, identificou-se um agrupamento denso de termos como  
“assistente”, “profissional”, “mobilização”, “usuário”, “dever” e “serviço”, cuja coocorrência  
revela a recorrência de sentidos associados ao compromisso profissional com os direitos sociais.  
Essa inferência é sustentada tanto pela frequência e proximidade lexical desses termos quanto  
pelo alinhamento com os princípios que orientam a profissão, especialmente no que se refere à  
ética, à responsabilidade social e à defesa intransigente dos direitos dos usuários (CFESS, 2009;  
CFESS, 2011).  
941  
Outro agrupamento relevante articula os termos “saúde”, “SUS”, “educação” e  
“participação”, o que remete à inserção do Serviço Social no campo da saúde coletiva, em  
especial na atenção primária. A presença conjunta desses vocábulos sugere a valorização de  
estratégias como a intersetorialidade e a educação em saúde, entendidas como práticas  
fundamentais para o fortalecimento da cidadania e da participação social. Tais práticas  
dialogam diretamente com as diretrizes do Projeto Ético-Político do Serviço Social, que  
defende a atuação crítica e comprometida com os direitos sociais. Segundo Bravo e Cunha  
(2013), a atuação do assistente social na saúde deve compreender “as determinações sociais do  
processo saúde-doença e a necessária articulação com os diferentes setores sociais, o que requer  
uma intervenção profissional crítica, propositiva e intersetorial” (p. 109). Assim, a  
intersetorialidade não é apenas uma diretriz técnica, mas um princípio político e ético que  
Iza Maria Pereira; Francisca Felícia Campos Paiva de Lima; Jean Carlos Dantas de Oliveira  
orienta a prática profissional voltada à superação das desigualdades e à ampliação do acesso à  
cidadania.  
A presença dos termos “político”, “projeto” e “ético” (Figura 1) reforça a ancoragem da  
prática profissional no projeto ético-político do serviço social, que orienta o enfrentamento das  
desigualdades sociais com posicionamento crítico. Por fim, o cluster formado por “ação” e  
“coletivo” destaca a valorização das práticas emancipatórias e da mobilização social como  
instrumentos de transformação. Assim, a rede semântica construída a partir do corpus aponta  
para um discurso comprometido com os direitos humanos, a justiça social e a promoção da  
autonomia dos sujeitos, reafirmando o papel do assistente social como agente político e  
educador social.  
Figura 1: Análise de Similitude do corpus “O assistente social e a prática em educação em saúde na atenção  
primária”.  
942  
Fonte: Elaborada pelos autores a partir do software IRaMuTeQ (2025).  
Os resultados da análise de similitude refletem o conteúdo e os sentidos mais recorrentes  
do corpus analisado, o que está diretamente relacionado à temática abordada, ao campo  
profissional envolvido e ao contexto discursivo dos textos. A centralidade do termo “social”  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 931-946, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
A educação em saúde na atenção primária e o papel do assistente social  
pode ser explicada pelo fato de que o corpus trata, majoritariamente, da atuação do assistente  
social, uma profissão historicamente vinculada à defesa de direitos, à mediação de demandas  
sociais e à intervenção em contextos de vulnerabilidade.  
A forte associação entre “social” e termos como “usuário”, “dever”, “profissional” e  
“serviço” indica a ênfase na dimensão ética e técnica do exercício profissional, destacando o  
compromisso com o atendimento qualificado e com os princípios do projeto ético-político do  
serviço social, que orienta a prática rumo à emancipação dos sujeitos.  
A ligação entre “social” e “saúde”, por sua vez, demonstra a inserção crescente do  
assistente social nas políticas públicas de saúde, sobretudo no Sistema Único de Saúde (SUS).  
Esse vínculo é reforçado pela presença dos termos “educação” e “participação”, que evidenciam  
estratégias de atuação voltadas à educação em saúde, ao empoderamento dos usuários e ao  
fortalecimento da intersetorialidade, sobretudo por meio de programas como o Saúde na  
Escola2. O agrupamento de palavras como “projeto”, “político” e “ético” reafirma o caráter  
crítico-reflexivo da profissão, que se posiciona diante das desigualdades sociais e defende  
transformações estruturais, em consonância com o projeto societário democrático e  
emancipatório defendido pela categoria.  
Por fim, o cluster formado por “ação” e “coletivo” evidencia uma prática profissional  
comprometida com a mobilização social, a atuação junto a grupos e comunidades e a  
valorização do trabalho coletivo como caminho para fortalecer os sujeitos sociais. Assim, a  
análise de similitude, embora baseada em critérios estatísticos, é aqui interpretada sob uma  
abordagem qualitativa, permitindo compreender como determinados núcleos de sentido  
estruturam o discurso profissional do serviço social, expressando uma intencionalidade política,  
crítica e transformadora no contexto das políticas públicas.  
943  
Considerações finais  
A partir das discussões feitas, foi possível constatar a importância do assistente social  
na área da saúde, uma vez que é o profissional habilitado para desenvolver ações educativas  
junto aos usuários do sistema de saúde, viabilizando o acesso a informações necessárias para  
garantir e/ou ampliar seus direitos, contribuindo, dessa forma, para a melhoria na qualidade de  
vida.  
2 O Programa Saúde na Escola (PSE), criado em 2007, é uma iniciativa do Ministério da Saúde em parceria com  
o Ministério da Educação. O programa visa promover a saúde dos estudantes da educação básica por meio de  
ações como prevenção de doenças, vacinação, orientação sobre saúde bucal, nutrição e incentivo a hábitos  
saudáveis. Ele integra ações de saúde e educação no ambiente escolar, desenvolvendo políticas intersetoriais e  
incentivando a participação da comunidade escolar (Programa Saúde na Escola, 2025).  
Iza Maria Pereira; Francisca Felícia Campos Paiva de Lima; Jean Carlos Dantas de Oliveira  
Considerando o perfil intervencionista do assistente social, ele é capaz de efetivar ações  
socioeducativas no processo de educação em saúde, por meio da socialização e democratização  
de informações/direitos, muitas vezes desconhecidas pelos usuários do sistema de saúde, o que  
favorece a prevenção do adoecimento da população.  
Como discutimos, a saúde é resultado da articulação com outros fatores sociais como  
educação, habitação, saneamento básico, meio ambiente, cultura, trabalho, transporte, lazer,  
entre outros, não se reduzindo, portanto, somente à ausência de doenças, mas relacionado ao  
bem-estar, à qualidade de vida de forma geral e isso perpassa por acesso aos serviços essenciais,  
sendo, pois, possibilitado pela educação em saúde e com o desenvolvimento de ações  
estratégicas articuladas da atenção primária.  
A educação em saúde é a forma mais eficaz de agilizar ações preventivas, através da  
veiculação de informações e, na medida do possível, educa a população sobre seus direitos,  
podendo proporcionar mudança de hábitos com vistas à transformação social. Para isso, são  
necessários profissionais que participem da gestão das políticas e possam lutar por políticas  
públicas e de qualidade.  
Discutir sobre a presença do assistente social no campo da saúde torna-se fundamental  
como forma de diferenciar a especificidade de suas funções nessa área, bem como de dar  
visibilidade à sua presença e a importância do seu trabalho perante os preceitos da Reforma  
Sanitária e às diretrizes do SUS, para a qualificação dos serviços oferecidos aos usuários desse  
sistema de saúde.  
944  
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Serviço social e gestão de unidades acadêmicas  
na perspectiva da gestão democrática  
Social work and the management of academic units from the  
perspective of democratic management  
Francine Helfreich Coutinho dos Santos*  
Resumo: O texto versa sobre os desafios  
colocados na gestão de unidades acadêmicas,  
subjacente à experiência na direção da Escola de  
Serviço Social de uma Universidade Publica,  
onde se problematiza os dilemas e estratégias  
construídos para a realização da gestão  
Abstract: The text deals with the challenges  
posed by the management of academic units,  
based on the experience of running the School  
of Social Work which problematises the  
dilemmas and strategies built to achieve  
democratic management that reiterates the  
defence of the public university, anchored in the  
ethical and political project of Social Work. In  
authoritarian times where productivism  
permeates the logic of the university, there are  
still ways of managing from other perspectives,  
as the article concludes. From a methodological  
point of view, the production comes from  
participant research that is articulated with a  
bibliographical review and is based on a critical  
perspective that dialogues with authors from the  
Marxist field.  
democrática que reitera  
a
defesa da  
universidade pública ancorada, ainda, no  
projeto ético político do Serviço Social. Em  
tempos autoritários, onde o produtivismo  
atravessa a lógica da universidade, ainda assim  
encontram-se formas de gerir sobre outros  
prismas, conforme se conclui no artigo. Do  
ponto de vista metodológico, a produção é  
oriunda de uma experiência concreta no período  
de 2017 a 2021 que se articula com a revisão  
bibliográfica e se fundamenta na perspectiva  
crítica, dialogando com autores do campo  
marxista.  
Palavras-chaves: Serviço social; Universidade  
Keywords: Social work; Public university;  
pública; Gestão democrática.  
Democratic management.  
Introdução  
Os elementos apresentados neste artigo foram sedimentados ao longo do processo em  
que ocupava a função de diretora de unidade acadêmica. Portanto, esse texto versa sobre  
reflexões e desafios postos na gestão subjacente à experiência recente, mais precisamente no  
período entre 2017-2021, na direção de uma Unidade Formativa Acadêmica (UFA).  
* Universidade Federal Fluminense. E-mail: francinesantos@yahoo.com.br  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.48076  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 28/03/2025  
Aprovado em: 12/12/2025  
Francine Helfreich Coutinho dos Santos  
Embora a administração universitária, em sua elaboração teórica e prática, venha sendo  
construída ao longo dos anos a partir da contribuição de diferentes gestores e pesquisadores; de  
forma genérica, as formulações frequentemente estão fundamentadas em lógicas gerenciais que  
passam ao largo do debate da democracia e da efetiva participação reivindicadas por  
movimentos e entidades da Educação.1 Os gestores e estudiosos da área de distintas instituições  
e de diferentes países, que abordam a temática sobre as organizações de educação superior,  
apoiam-se substantivamente em questões que vinculam a “missão” das Instituições Federais de  
Ensino (IFE), que nem sempre se coadunam com a perspectiva de construção de uma educação  
omnilateral2, nos termos apontados por Gramsci (2006).  
Nas distintas experiências de administração/gestão3 de forma democrática, é  
consensual o quão essa tarefa é complexa, sejam experiências de gestão ou “autogestão”. Em  
se tratando de gestão no serviço público, nos deparamos ainda com a questão do  
“desfinanciamento” das políticas sociais, da burocratização dos serviços, da dificuldade de  
“gerir” pessoas, da precariedade das condições de trabalho e, ainda, da falta de reajustes  
salariais, o que torna ainda mais difícil administrar esses espaços.  
Compreendendo que as atividades docentes sofreram uma multiplicidade de mudanças  
nos últimos anos, as quais se expressam no produtivismo científico, na mercantilização da  
educação e na intensificação do trabalho docente, pretende-se, através de uma revisão de  
literatura e da experiência concreta , vide a vivência como diretora em uma Unidade Acadêmica  
Formativa (UFA), problematizar os desafios, dilemas e estratégias construídas para a realização  
da gestão numa perspectiva que dialoga com a defesa da universidade pública. Portanto, a  
experiência em tela se dispôs a balizar suas ações na cultura crítica do Serviço Social brasileiro,  
o qual vem construindo a resistência da ação política e propondo a reflexão do agir ético-  
político, ancorado nos princípios e valores do Projeto ético-político que a profissão concebeu,  
bem como nos valores do movimento docente de ensino superior, tal como o Sindicato  
Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN) forja suas ações.  
Para tanto, partimos do entendimento de que os desafios começam na formação, já que  
a baixa inserção profissional nos espaços de gestão se reflete tanto nas disciplinas quanto nos  
948  
1 Para um exemplo de concepção distinta da qual esse texto se remete ver: Melo, Pedro Antônio de Melo; Meyer,  
Bernardo. Administração Universitária em Tempos de Mudança: Novos Rumos e Desafios. Curitiba: Apris, 2021.  
Ou ver os anais do CIGU – Colóquio internacional de gestão universitária organizado pelo INPEAU/ UFSC.  
2 Aeducação omnilateral se refere a concepção de uma formação humana integral, que abarque todas as dimensões  
do desenvolvimento do indivíduo, que se contrapõe a superar a visão limitada e fragmentada do trabalho e da  
educação sob o capitalismo, onde os indivíduos sociais sejam capazes de atuar de forma crítica e criativa em todas  
as esferas da vida social.  
3 Usaremos Gestão como sinônimo de Administração.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 947-967, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço social e gestão de unidades acadêmicas na perspectiva da gestão democrática  
estágios supervisionados, de modo que os estudantes se formam com pouquíssimo contato com  
este universo. Além do mais, toda a lógica mercantil que reverbera na universidade afasta  
gradativamente os docentes do anseio do universo da gestão, já que este espaço dificulta o  
cotidiano do exercício das atividades docentes.  
Dentro deste liame, o texto se divide em dois momentos que estão relacionados entre  
si, a saber: o primeiro, em que trataremos do debate do trabalho de gestão realizado por  
assistentes sociais, considerando as concepções distintas que moldam as práticas com ênfase  
naquelas que dialogam com o projeto ético-político da profissão; e o segundo, em que  
situaremos o trabalho docente na experiência à frente da Direção de uma unidade formativa,  
problematizando os desafios e pontuando a dimensão política da experiência.  
Do ponto de vista metodológico, o artigo parte de estudos bibliográficos, utilizando  
autores que se vinculam ao debate do ensino superior brasileiro, ao trabalho profissional e que  
dialogam com o campo da gestão democrática. Além disso, a observação participante constitui-  
se como elemento metodológico já que, mediante a experiência vivenciada, desenvolvemos  
alguns processos analíticos necessários e subjacentes ao debate da questão política e  
administrativa que atravessa o trabalho profissional no espaço da gestão.  
O trabalho de gestão realizado por assistentes sociais, sua concepção e o projeto  
ético-politico.  
949  
O trabalho de assistentes sociais na gestão de unidades formativas está previsto nas  
atribuições privativas desses profissionais, conforme consta no inciso VII do artigo 5º da Lei  
n.º 8.662, de 7 de junho de 1993, o qual dispõe: “VII – dirigir e coordenar Unidades de Ensino  
e Cursos de Serviço Social, de graduação e pós-graduação; (CRESS 7ª Região, 2000, p. 33-4)”.  
Trata-se de uma atividade de caráter predominantemente político, que, no caso das  
universidades públicas, pressupõe ainda o diálogo com um conjunto de legislações de ordem  
administrativa, o que exige do profissional não apenas conhecimentos teóricos, mas também  
habilidade política, capacidade de liderança e de administração.  
Sabe-se que o debate sobre as instituições e o Serviço Social tem se configurado como  
um recurso didático-pedagógico fundamental na formação profissional de assistentes sociais,  
conforme Dahmer (2022) nos aponta. Contudo, a particularidade da gestão é atribuição pouco  
discutida no âmbito da categoria profissional. O lugar da gestão ainda é um espaço sócio-  
ocupacional pouco debatido e pouco explorado nos meandros da profissão, mas que se adequa  
à dinâmica da profissão, à medida que esta se modifica e se renova no tempo, bem como ao  
passo em que a mesma se posiciona criticamente no cenário acadêmico e político.  
Francine Helfreich Coutinho dos Santos  
Embora o conjunto Conselho Federal de Serviço Social/Conselho Regional de Serviço  
Social (CFESS/CRESS) venha gradativamente lançando luz sobre esta temática, ainda  
precisamos avançar no amadurecimento das questões que atravessam o exercício profissional  
no âmbito da gestão. O CRESS/RJ, em 2023, lançou um número da revista Práxis (107) que  
versa sobre o tema4, e o conjunto CFESS/CRESS lançou, há alguns anos, alguns documentos,  
embora tenha enfatizado apenas o âmbito da saúde, a saber: O Serviço Social em hospitais:  
orientações básicas (CRESS, 2003) e Parâmetros para atuação de Assistentes Sociais na Saúde  
(CFESS, 2010), em que se problematizou o significado social das experiências das chefias.  
Em geral, as experiências em gestão de unidades formativas nas universidades públicas  
decorrem de processos eleitorais, em que, através de consulta pública que envolve toda a  
comunidade acadêmica (professores, funcionários e estudantes), se elegem chapas, geralmente  
compostas por diretor e vice-diretor. Ocorre que, mesmo que a formação profissional ofereça  
os conteúdos para o desenvolvimento dessa função, são inúmeros os desafios que o cotidiano  
revela, a começar pelo excesso de demandas administrativas até a necessária habilidade política  
no trato com as reitorias e com os servidores públicos e, principalmente, a indispensável atenção  
às determinações oriundas da conjuntura nacional, que incidem, enfaticamente, na política  
educacional de ensino superior e moldam o cotidiano acadêmico.  
De acordo com o texto das Diretrizes Curriculares da Associação Brasileira de Ensino  
e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS) de 1996, é no Núcleo de Fundamentos da Formação  
Sócio-Histórica da Sociedade Brasileira que se encontra o debate sobre os modelos de gestão,  
assim como são nas disciplinas de Políticas Sociais e na disciplina de Administração e  
Planejamento em Serviço Social que aparecem os principais conteúdos para o exercício  
profissional, a saber: (1) Política Social: As teorias explicativas da constituição e  
desenvolvimento das políticas sociais. A questão social e desenvolvimento do sistema brasileiro  
de proteção social. Formulação e gestão das políticas sociais. (...) (ABESS, 1996, p. 18); (2)  
Administração e Planejamento em Serviço Social: As teorias organizacionais e os modelos  
gerenciais na organização do trabalho e nas políticas sociais; (3) Planejamento e gestão de  
serviços nas diversas áreas sociais. (4) Elaboração, coordenação e execução de programas e  
projetos na área de Serviço Social (ABESS, 1996, p. 18).  
950  
Embora não tenhamos uma precisão numérica quanto aos profissionais que ocupam  
cargos de gestão, ou melhor, cargos de direção de unidades, compartilhamos as reflexões de  
Almeida (2009) ao problematizar a importância das funções desempenhadas pelas assistentes  
4 Para mais informações ver Revista PRAXIS, n. 107, ano 2023 - CRESS/RJ, com uma interessante entrevista da  
assistente social e gestora, Dra. Gleyce Figueiredo.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 947-967, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço social e gestão de unidades acadêmicas na perspectiva da gestão democrática  
sociais vinculadas ao magistério, à direção de unidades formadoras e à supervisão de estágio.  
Sobre o assunto, o autor nos diz que:  
Ocupam um lugar de destaque tanto no âmbito da produção de conhecimentos  
e da proposição dos perfis e projetos profissionais que orientam a formação  
de novos assistentes sociais como na reprodução de determinadas práticas,  
valores e modos de relacionamento com as expressões da questão social e suas  
formas de enfrentamento. Constituem desse modo, funções importantes na  
dinâmica de produção do Serviço Social como uma instituição que se  
modifica, se renova e se posiciona no cenário acadêmico e político, como  
também na objetivação das próprias condições e processos institucionais  
necessários à continuidade da profissão (Almeida, 2009, p. 629).  
Contudo, mesmo que consensual a sua importância, temos aqui um espaço repleto de  
contradições, desafios e intempéries. Embora exista todo um discurso acerca da importância da  
gestão na educação, esse debate não foi consolidado no âmbito da profissão: nem sobre “gestão”  
propriamente dita e nem mesmo em aportes teóricos que subsidiam as práticas nesses espaços.  
Uma recente pesquisa utilizando diferentes Projetos Políticos Pedagógicos (PPP) de cursos de  
Serviço Social no país revelou a resistência em se reconhecer a atribuição da gestão no âmbito  
do trabalho de assistentes sociais.5  
Nas análises da pesquisa de Benevides (2017), tal questão se justificaria por dois  
motivos: o primeiro diz respeito ao desconhecimento dos conteúdos sobre gestão, conforme  
apresentado nas Diretrizes Curriculares; o segundo consiste na questão de caráter ideológico  
que permeia a compreensão das finalidades da gestão no Serviço Social, como se a gestão  
reproduzisse de forma automática a lógica capitalista, fato que interfere diretamente no  
reconhecimento da gestão como atividade inerente ao trabalho de assistentes sociais, incluída  
no rol das competências desses profissionais, e como instrumento de trabalho no cotidiano.  
Para Benevides (2017), a resistência em reconhecer a gestão no Serviço Social está  
ligada a questões ideológicas, sob as quais se resume a gestão apenas a estratégia e instrumento  
de reprodução das relações sociais capitalistas, a partir da perspectiva da dominação de classes.  
Tal posicionamento, sob a ótica da pesquisa realizada, tende a contribuir para a negação da  
gestão no Serviço Social. De fato, em uma sociedade cindida em classes sociais, a  
determinação principal da administração capitalista é mediar a produção da mais-valia e  
viabilizar a dominação fundante do capitalismo, seja na esfera da produção ou no âmbito da  
reprodução social” (Benevides, 2017, p. 70). Conforme Vitor Paro (2012, p. 60),  
951  
No processo de produção capitalista, o comando está nas mãos dos  
proprietários dos meios de produção. Esse comando se reflete na  
superestrutura política, jurídica, e ideológica, que se organiza com vistas ao  
domínio da classe capitalista, detentora do poder econômico, sobre o restante  
5 Para mais informações ver Benevides e Lima (2023).  
Francine Helfreich Coutinho dos Santos  
da população. A administração, ou a utilização racional de recursos para  
realização de fins, adquire, na sociedade capitalista, como não podia deixar de  
ter, características próprias, advindas dessa situação de domínio.  
Entretanto, o caráter contraditório das relações sociais também possibilita que relações  
“contra-hegemônicas” possam ser forjadas mediante a construção de processos democráticos,  
já que a sociedade não é estática e está sendo construída por sujeitos que possuem finalidades  
em suas ações, e podem realizá-las com objetivos emancipatórios e progressistas. Nesse  
sentido, ainda de acordo com o mesmo autor, a atividade administrativa é “[...] compatível tanto  
com um projeto revolucionário, de superação da estrutura social vigente, quanto com forças  
conservadoras interessadas em manter a estrutura [...]” (Paro 2012, p. 43).  
De fato, o estudo da temática ainda é incipiente, ao passo que é necessário. Na  
atualidade, as experiências de gestão democráticas vêm sendo apropriadas por uma  
racionalidade que enfatiza os modelos de gestão com finalidade de alavancar o processo de  
produção de valor, se aproximado de uma linha de atuação que pouco tem de democrática em  
suas práticas. Tal apropriação “semântica” possibilita que tanto gestões centrais de  
universidades quanto movimentos sociais da educação levantem a mesma bandeira, num  
primeiro momento, mas a oposição de suas respectivas ações, interesses e perspectivas acaba  
por serem revelada.6  
Dito isto, compreendendo a administração como uma ciência, e sistematizando o  
conhecimento obtido por meio de uma racionalidade instrumental, é sabido que historicamente  
o tipo de racionalidade hegemônica nas formas de administrar e fazer gestão coincide com o  
desenvolvimento das forças produtivas, o que nos demanda tratar aqui, mesmo que de forma  
breve, as diferenças na maneira de se fazer gestão, para que possamos chegar à forma que  
reivindicamos e alinhamos nossa experiência empírica.  
952  
Embora neste estudo não pretendamos nos debruçar sobre a Teoria Geral da  
Administração, e muito menos sobre os modelos gerenciais que orientam a gestão do trabalho  
nas políticas sociais e nos espaços sócio-ocupacionais do assistente social no âmbito da  
Administração Pública, cabe-nos recorrer a algumas características sobre as formas de gestão  
mais comumente estudadas. As reflexões realizadas sobre a administração construídas por Paro  
(2012) concebem a gestão como atividade exclusivamente humana. O autor atenta que nos  
diferentes modos de organização social a atividade administrativa esteve presente por ser  
determinante na vida em sociedade.  
6
Para citar aqui as distinções de compreensão sobre o conceito, vale destaque às produções dos intelectuais  
Liberais como Alexis Tocqueville, Jean-Jean Jacques Rousseau e adeptos ao socialismo democrático como Rosa  
Luxemburgo, Antônio Gramsci, Poulantzas, entre outros.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 947-967, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço social e gestão de unidades acadêmicas na perspectiva da gestão democrática  
Paro (2012, p. 25) aponta que é possível captar os elementos que em sua existência  
concreta são determinações históricas e características de um dado modo de produção.  
Compreende atividade administrativa em seu sentido amplo, independentemente de qualquer  
tipo de sociedade, afirmando que a administração “[...] é a utilização racional de recursos para  
a realização de fins determinados” (Paro, 2012, p. 25). Ou seja, ele quer dizer que somente o  
homem é capaz de exercer o trabalho, em seu sentido mais geral e abstrato, como “atividade  
orientada a um fim” (Marx, 1983, p. 150).  
Dentro dessa compreensão, é possível afirmar que tanto a modalidade de gestão  
administrativa, quanto a modalidade de gestão capitalista e a modalidade burocrática situam-se  
no mesmo lado, isto é, no mesmo campo teórico, visto que a administração apresenta uma  
perspectiva funcional da gestão, compreendendo-a como atividade científica a partir da ciência  
moderna e, portanto, entorpecida pela racionalidade instrumental que, por sua vez, é  
conveniente ao desenvolvimento e avanço do capitalismo.  
Nessa esteira argumentativa, a administração é reconhecida como prática científica a  
partir do advento da Revolução Industrial e seus consectários. Contudo, a perspectiva  
administrativa capitalista, que representa a racionalização do pensamento administrativo  
burguês, “manifesta-se na passagem do capitalismo comercial para sua fase industrial”  
(Braverman, 1977, p. 61). Ela nasce do processo de criação da gerência capitalista enquanto  
estratégia de ampliação de lucros e, concomitantemente, do desenvolvimento do controle do  
processo produtivo e de trabalho do controle sobre os trabalhadores, contribuindo,  
sobremaneira, para a conformação das relações sociais, que reproduzem a lógica de exploração  
da classe trabalhadora.  
953  
No que tange à perspectiva burocrática de gestão, esta se sustenta nos fundamentos da  
burocracia estudados por Max Weber (1864-1920). O alemão entende que a burocracia seria  
um tipo de poder situado na mesma categoria do patriarcalismo, patrimonialismo e feudalismo,  
e que versa sobre uma configuração de relação social da sociedade moderna, inevitável no  
âmbito do Estado, e condição sem a qual o mesmo não pode existir.  
A administração burocrática “estrutura-se na racionalidade formal-legal” que se  
expressa na legalidade das normas, dos regulamentos e da divisão do trabalho, formalismo,  
previsibilidade, impessoalidade, hierarquia, padronização, competência técnica,  
profissionalização e especialização da administração para buscar meios racionais e legais, em  
alinhamento aos objetivos e características institucionais, visando promover o pleno  
funcionamento da organização/instituição.  
Francine Helfreich Coutinho dos Santos  
Em síntese, esta concepção consiste no processo de gerenciamento dos objetivos  
organizacionais a partir da racionalidade técnica e instrumental. Em tal condição, o foco está  
direcionado para o afiançamento da adequação dos meios aos fins determinados, sempre com  
a finalidade de garantir a máxima eficiência na realização dos objetivos das instituições, seja  
no campo da produção ou da reprodução social. Desse modo, na sociedade capitalista, tende-se  
a promover processos administrativos que viabilizem as finalidades do capital, a produção,  
acumulação e apropriação privada da riqueza produzida.  
Ressalta-se, ainda, que as formulações elaboradas por Frederick Taylor, Henry Ford e  
Taiichi Ohno nem sempre foram implementadas de igual modo. Elas apresentaram variações  
relacionadas aos distintos territórios e à forma das mobilizações de resistência dos trabalhadores  
organizados. Assim sendo, podemos depreender que as perspectivas de gestão administrativa,  
capitalista e burocrática encontram- se em um mesmo “campo” ideológico e político, em que  
prevalece o interesse do grande Capital.  
No lado oposto, a perspectiva de gestão democrática e emancipadora vêm sendo  
estudada por autores, especialmente, por Vitor Paro (2012), que é uma referência para os  
estudiosos da área da educação, sobretudo para aqueles que estudam a gestão da educação  
básica. O autor tem como eixo o ser humano. Em sua visão ontológica, na gestão democrática  
e emancipadora, o ser humano não é concebido como recurso, mas como fim da atividade  
administrativa, isto porque “considerar o homem como fim, implica em tê-lo como sujeito e  
não como objeto no processo em que se busca a realização de objetivos” (Paro, 2012, p. 32).  
E para ampliar o debate - já que vivemos em uma sociedade complexa e dinâmica -,  
temos ainda a gestão social e suas variações, quais sejam: gerência social, gerência de  
programas sociais, gestão de políticas sociais, que vem se constituindo como espaço de trabalho  
profissional. Segundo Filho (2009, s/p) “o termo gestão social, portanto, ganha relevância numa  
conjuntura hegemonizada pelo pensamento neoliberal. Dessa forma, incorpora critérios  
economicistas de mercado para redefinir o formato de gestão pública para a área social”. Ou  
seja, trata-se de uma modalidade de gestão que, em certa medida, encontra algum espaço para  
ações contra hegemônicas, mas cujo termo e sentidos estão em disputa.  
954  
Em consonância com Iamamoto (2019), nós, assistentes sociais brasileiras(os), vimos  
construindo, coletivamente, há quarenta anos um projeto ético-político profissional, o qual é,  
fundado nos valores maiores da liberdade, da igualdade, da democracia, dos  
direitos humanos e sociais com opção privilegiada pelos interesses do  
conjunto dos trabalhadores. Tais princípios éticos, indissociáveis da “grande  
política” em termos gramscianos, imprimem nortes ao trabalho de assistentes  
sociais brasileiros e reverberam nos requisitos acadêmicos, técnicos e  
políticos à sua condução, envolvendo o zelo pela qualidade dos serviços  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 947-967, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço social e gestão de unidades acadêmicas na perspectiva da gestão democrática  
prestados e a identificação com os interesses das classes subalternas.  
(Iamamoto, 2019, p. 3)  
Pode-se dizer, dessa forma, que na elaboração expressa do projeto profissional, há o  
reconhecimento do conceito e das práticas de gestão que tenham como horizonte a construção  
de uma nova ordem societária. Isto porque não é possível pensar em uma sociedade isenta de  
formas de dominação, desconsiderando uma perspectiva de gestão que parta dos interesses  
coletivos das classes subalternas.  
Paro (2012, p. 24-25) afirma que  
situar a administração em uma perspectiva democrática e emancipatória, com  
fins para a transformação da sociedade, implica uma dimensão ético-  
finalística, que tenha por objetivo atender aos interesses coletivos da classe  
trabalhadora.” Suas reflexões nos permitem fazer um paralelo de um dos  
princípios do nosso código de ética, qual seja, “a defesa do aprofundamento  
da democracia” [...] com o horizonte da “socialização da participação política  
e da riqueza socialmente produzida.  
Considerando os tempos recentes, nunca foi tão importante reivindicar a democracia  
dentro e fora da Universidade.7 A isto se deve o fato de que, recentemente, o Brasil e vários  
países passaram por experiências marcadas pelo ultraneoliberalismo, onde governos de direita  
com características autoritárias e fascistas reiteram o corte de direitos e de garantias e a  
lateralizarão da educação pública.  
955  
Neste sentido, a concepção de gestão democrática e emancipadora se propõe a  
“efetivar e ampliar o acesso da classe trabalhadora aos direitos historicamente conquistados”  
(Souza Filho; Gurgel, 2016, p. 72), sendo, pois, especialmente necessária nos tempos em que  
vivemos.  
O ataque à autonomia universitária - direito conquistado através da Constituição  
Federal de 1988 - tornou-se fato comum no governo Bolsonaro (2019-2022). Durante o seu  
mandato, 55 universidades fizeram consultas às suas comunidades acadêmicas e formaram  
listas tríplices para viabilizar seus respectivos processos eleitorais. Contudo, foram percebidos  
28 episódios de intervenção do governo nesses processos, o que significa dizer que ferir a  
democracia foi fato comum naquele governo, contrariando frontalmente as diretrizes  
construídas pelo ANDES-SN. No que se refere ao debate sobre democracia interna, o referido  
Sindicato assimilou ao longo dos anos que:  
a democracia é indispensável para a universidade cumprir sua função social,  
mas que isso não será suficiente se o trabalho acadêmico não se referenciar na  
própria sociedade e em políticas públicas efetivamente populares para a  
7
Democracia aqui entendida como “presença efetiva das condições sociais e institucionais que possibilitam ao  
conjunto dos cidadãos a participação ativa na formação do governo e, em consequência, no controle da vida social”  
(Coutinho, 1997, p. 145).  
Francine Helfreich Coutinho dos Santos  
educação (ANDES, 1981, p. 26).  
Neste contexto, a gestão democrática se caracteriza não só por uma dimensão ideo-  
política, mas também pela sua dimensão ético-política, pois prioriza escolhas e decisões na  
condução do processo de trabalho que visam alcançar os fins ou interesses dos sujeitos numa  
direção que se coadunem aos coletivos. No caso, o viés democrático e emancipador da gestão  
busca “sempre aproximar estas finalidades a um processo que amplie e universalize as  
condições de vida das classes subalternas atingidas pelas ações da organização” (Souza Filho;  
Gurgel, 2016, p. 74).  
Tratando-se da especificidade da área de conhecimento, conforme é sabido, o Serviço  
Social é uma das poucas profissões que, em suas organizações e posicionamentos ético-  
políticos, se coaduna com valores e princípios humanizadores, que apontam para a superação  
dessa estrutura social posta e, por conseguinte, para a contraposição de toda forma de  
exploração e opressão, bem como que reitera democracia e liberdade como valores centrais.  
Daí a necessidade de dialogar com concepções de gestão que partilhem dos mesmos princípios,  
mesmo que saibamos que a democracia propriamente dita é inviável no capitalismo, já que a  
“concepção conservadora, mais identificada com o senso comum educacional, advoga métodos  
e princípios idênticos aos aplicados na administração empresarial” (Paro, 2010, p. 763)  
cooptando sutilmente corações e mentes.  
956  
Nos últimos anos, a conjuntura brasileira nos exigiu, diante da correlação de forças, a  
intensificação da pauta social e da defesa da democracia. Perseguir a democracia tornou-se  
tarefa central daqueles que acreditam que outro mundo é possível. E, em alinhamento com uma  
das obras mais polêmicas e importantes de Coutinho (1980), a “renovação democrática do  
conjunto da vida nacional” não pode ser vista como um elemento tático, mas sim como  
“conteúdo estratégico” da revolução.  
O trabalho docente e os desafios da atuação de assistentes sociais na gestão  
acadêmica – a experiência em tela  
Conforme já mencionado, a experiência em questão teve início em 2017 com uma  
proposta explícita de concepção de universidade norteada por princípios democráticos, que foi  
apresentada no programa da chapa intitulada “Seguindo na Luta: por uma gestão democrática  
em defesa da universidade pública para a direção da Escola de Serviço Social de Niterói –  
Gestão 2017-2021”.  
Esta proposta significou, no âmbito da escola de Serviço Social, não apenas um passo  
importante na abertura de diálogo com diferentes grupos que compõem o quadro docente, como  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 947-967, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço social e gestão de unidades acadêmicas na perspectiva da gestão democrática  
também uma nova configuração na relação com os gestores da administração central da reitoria,  
a qual, também à época, sofreu mudanças, favorecendo, assim, a construção de relações de  
cooperação, em meio a um cotidiano marcado pela permanente interlocução com a comunidade  
interna.8  
Todavia, o cenário que se abriu no período, com o governo de Jair Messias Bolsonaro  
(2017-2022) e a crise sanitária decorrente da Pandemia de Covid-19, repercutiu de forma  
singular na gestão da Universidade. Trata-se de um período atravessado por todas as  
intempéries da Covid-19 e por uma democracia frágil e ameaçada. Agregado a isto, o governo  
expressou um descaso total com as mais de 700 mil vidas perdidas no país. De forma similar,  
manifestou seu desprezo pela vida de crianças, adultos e profissionais da educação, ao tentar,  
reiteradas vezes, aprovar medidas de retorno às aulas presenciais sem as mínimas condições  
sanitárias devidas ao contexto pandêmico (Helfreich et al., 2021).  
O período da experiência significou uma profunda regressão de conquistas  
civilizatórias. No que tange às políticas educacionais, o governo federal impôs uma série de  
cortes para a educação pública, embora alguns já houvessem iniciado a supressão de verbas  
antes mesmo da sua gestão, principalmente, após a aprovação da Emenda Constitucional n.º  
95/2016, que versa sobre teto de gastos do orçamento federal, o qual veda novos investimentos  
para as áreas que asseguram direitos sociais, como educação, assistência social e saúde.  
Imperioso destacar que, durante o governo Bolsonaro, a produção do conhecimento e  
a universidade pública foram caracterizados da pior forma possível nos diversos  
pronunciamentos do presidente e de outras figuras importantes do governo. Estes trouxeram  
sérias implicações para a universidade, desencadeando um dos piores momentos da quadra  
histórica.9  
957  
Sua proposta para a educação superior pública, expressa no fracassado projeto “Future-  
se”10, veio acompanhada de uma intensa perseguição a professores e estudantes comprometidos  
com a pesquisa científica e com a construção do pensamento crítico, mediante a ameaça aos  
mesmos e às organizações estudantis e sindicais. Significativos foram os prejuízos às  
8
No início da gestão tínhamos na reitoria o professor Sidney Mello (2014-2018), muito conhecido pela sua  
ausência e esvaziamento dos Conselhos Universitários e, também, pela indiferença com o movimento docente e  
as pautas dos setores progressistas da universidade. No período de sua gestão, ocorreu uma greve de  
aproximadamente 3 meses de duração, e o mesmo não recebeu o Comando de Greve, o que reforçou as marcas  
negativas deixadas na sua relação com a comunidade acadêmica.  
9
Cabe salientar que, contraditoriamente, o reitor embora tenha apresentado as contas da universidade, expondo  
dúvidas e dificuldades de mantê-las, em 2019, ao fim da Pandemia, numa entrevista, pronunciou a liquidação das  
dívidas e a redução das despesas, além de captação de novas receitas. Para mais informações cf. Nóbrega (2021).  
10  
Metaforicamente, o projeto “Future-se” é explicado por estudiosos como o “Fature-se” das Instituições de  
Ensino Superior Pública do país, com base na venda direta e irrestrita da educação superior pública. Para mais  
informações ver Projeto de Lei n.º 3.076/2020 (Câmara dos Deputados, 2020).  
Francine Helfreich Coutinho dos Santos  
universidades públicas, à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior  
(CAPES), ao Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) e ao Instituto Nacional de Estudos e  
Pesquisas Educacionais (INEP), dificultando as pesquisas e as produções científicas.  
Desde que assumiu a presidência da República, Bolsonaro atribuiu uma verdadeira  
depreciação à educação. Em se tratando de números, em 2019, o governo federal cortou cerca  
de R$ 5,8 bilhões na educação. O decreto federal n.º 9.741, de 29 de março de 2019,  
contingenciou R$ 29,582 bilhões do Orçamento Federal de 2019.  
Em meio a uma conjuntura que se modificava a cada dia, a Educação Pública,  
especialmente entre os anos da gestão, teve os seus investimentos globais diminuídos; como  
exemplo a que reduziu drasticamente os recursos para as universidades11. Só no período da  
experiência, o reitor anunciou por duas vezes em 2019 e em 2021 a dificuldade em manter  
a universidade em pleno funcionamento. A Universidade em questão junto com a Universidade  
de Brasília (UNB) e a Universidade Federal da Bahia (UFBA) receberam cortes por motivos  
ideológicos, sob o frágil fundamento utilizado pelo Ministro da Educação da época de que  
teriam obtido “fraco desempenho”. No entanto, além de não ter tornado público os critérios  
para tal conclusão, o referido argumento foi derrubado, posteriormente, já que as pesquisas  
evidenciaram justamente o contrário.  
Esse foi, portanto, o cenário na qual a experiência ocorreu: em meio à maior crise  
sanitária da história recente com impactos econômicos, políticos e sociais, que afetou toda a  
humanidade - a COVID-19, e que, por consequência lógica, impactou diretamente a  
Universidade e a Escola de Serviço. As aulas on-line, caracterizadas como “ensino remoto”,  
tornaram-se rotina, a partir do uso intensificado de tecnologias, tendo gerado um excesso de  
atividades virtuais, dentre elas, reuniões, palestras, atividades de ensino e de pesquisas, cursos  
de extensão, reuniões dos Conselhos de Ensino e Pesquisa, Assembleias docentes e, até mesmo,  
formaturas.  
958  
A universidade em questão e as demais universidades brasileiras sofreram a  
implantação “forçada” do Ensino Remoto Emergencial (ERE), e experimentaram os dissabores  
do trabalho remoto e suas nefastas consequências.12  
Conforme as análises de Costa, Farage e Silva (2021, p. 228),  
essa modalidade de educação, a partir da mediação tecnológica, provocou um  
rebaixamento da qualidade de ensino, é considerada pelo capital como uma  
forma de reduzir custos, certificar em larga escala e esvaziar o sentido pleno  
do processo de ensino-aprendizagem, fortalecendo uma perspectiva  
11 Para mais informações ver Mourão (2021).  
12 Para informações mais aprofundadas sobre o assunto ver Costa et al. (2020).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 947-967, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço social e gestão de unidades acadêmicas na perspectiva da gestão democrática  
educacional de adaptação à ordem e ao estabelecido que se encontra e  
fortalece a perspectiva anti-ciência da extrema direita em ascensão.  
Esse fenômeno também colocou em evidência um quadro de desigualdades sociais que  
se intensificou na realidade brasileira e que, no espectro aqui abordado, refere-se à ausência de  
condições de acesso igualitário a essas tecnologias pela totalidade da comunidade acadêmica.  
Isto acabou produzindo um distanciamento expressivo daqueles que não conseguiram, por  
diversos fatores, acessar a internet. Essa nova realidade impactou significativamente as relações  
de trabalho em todo país, trazendo alterações relevantes nas rotinas dos núcleos familiares e no  
cotidiano laborativo das Universidades.  
Pode-se dizer, assim, que uma série de mudanças ocorreu na educação a partir dessa  
nova conjuntura, o que ensejou uma verdadeira alteração da forma ser-essência da educação,  
conforme os autores acima analisaram. E, obviamente, o cotidiano daqueles que ocuparam  
cargos de gestão no período piorou muito, tendo lhes sido atribuídas atividades que foram desde  
o estabelecimento de regras para distribuição de equipamentos para o trabalho remoto, até a  
construção coletiva de documentos e protocolos para o retorno seguro às aulas.  
Agregado às questões relativas à pandemia, é consenso que ocupar espaços de gestão  
não é algo simples, como falamos nas linhas iniciais. Caso, caso listássemos as ações  
profissionais no âmbito da gestão de unidades acadêmicas poderíamos encontrar o  
planejamento e a avaliação das ações, a criação de estruturas organizativas dos serviços, a  
gestão dos parcos recursos destinados as unidades (no caso da Escola de Serviço Social); a  
busca pela melhoria das condições de trabalho considerando a subordinação à administração  
central da Universidade, a elaboração de projetos para captação de recursos; a mediação de  
questões conflituosas e divergentes diante dos setores, a presidência e ou composição de  
inúmeros colegiados e comissões assim como a reafirmação dos valores e princípios que  
fundamentam a profissão no âmbito da Unidade. Mas, afinal, quais são os desafios impostos  
para a gestão no trabalho docente? Por que é tão raro, no âmbito das universidades, que os  
docentes optem por estar nesses espaços? São inúmeras as questões que poderíamos levantar  
aqui, contudo, a experiência nos mostrou algumas pistas para responder a essas questões  
aparentemente retóricas.  
959  
Talvez, primeiramente, porque exista um produtivismo acadêmico13 e uma importante  
intensificação do trabalho docente, que gera um gradativo distanciamento dos docentes dos  
13  
O produtivismo acadêmico pode ser compreendido como uma forma de se fazer pesquisa onde os docentes e  
pesquisadores são impelidos a produzir artigos em tempo e quantidade desproporcional para que possam se manter  
em seus respectivos programas de pós-graduação. Trata-se de uma prática nociva, mas muito comum no meio  
acadêmico.  
Francine Helfreich Coutinho dos Santos  
espaços coletivos de debates, seja no âmbito dos colegiados, que determinam o funcionamento  
da universidade, seja nos espaços de construção e organização coletiva, como o sindicato. Esse  
fato é nítido. São poucos os docentes que participam dos espaços coletivos de deliberação, que  
se colocam à disposição para construir chapas para os colegiados de curso e unidade, e que se  
oferecem espontaneamente para compor comissões.  
Tais posturas dificultam e muito a ampliação dos processos de participação. Note-se  
que o que queremos aqui não é uma busca por “culpados”, mas destacar o quanto a cultura  
política da universidade vem se modificando. Muito embora a democracia esteja aposta nas  
letras da lei, a participação democrática deve se dar espontaneamente, sendo antes um processo  
histórico, uma construção coletiva onde “coloca-se a necessidade de se preverem mecanismos  
institucionais que não apenas viabilizem, mas também incentivem práticas participativas dentro  
da escola pública” (Paro, 1986, p. 46). Mas, como garantir democracia sem participação? Essa  
é uma pergunta que ressoa, pois não se trata de uma questão individual, mas de uma  
característica da sociabilidade contemporânea, em que,  
a sociedade capitalista caracteriza‑se pela fragmentação de todas as esferas da  
vida social, desde a produção, com a dispersão espacial e temporal do  
trabalho, até a destruição dos referenciais que balizavam a identidade de classe  
e as formas de luta de classes (Chaui, 2006, p. 324).  
Outro elemento que gera esse afastamento está ligado à lógica empreendedora que  
permeia a universidade pública, onde cada qual busca seu edital, via recursos internos e externos  
à Universidade para o fomento de suas próprias pesquisas.  
960  
A redução de recursos públicos também vem contribuindo para esse movimento,  
intensificando a competitividade entre colegas, sobretudo, nas pós-graduações. Guardadas as  
suas particularidades, as unidades acadêmicas que não possuem cursos tanto lato quanto stricto  
sensu com cobrança de mensalidades recebem um baixo valor de Livre Ordenação14 , o que  
pressupõe que os docentes dessas unidades busquem individualmente seus próprios meios para  
adquirir insumos para suas pesquisas.  
Além disso, é perceptível o irrisório desejo ou mesmo a ausência de estímulo subjetivo  
do docente de ocupar espaços administrativos, já que a gestão é vista como uma dimensão do  
trabalho enfadonha, que consome tempo, reduzindo possibilidades para seus estudos que, em  
tese, é o que realmente é levado em consideração para os processos de progressão na carreira e  
de aquisição de bolsas e editais externos. Em alguma medida, essas questões vão capturando o  
14 A Livre Ordenação é o recurso de periodicidade anual para que, através das verbas de custeio (material de  
consumo e contratação de serviços) e das verbas de capital (materiais permanentes, computadores e mobiliários),  
se possa garantir o funcionamento das unidades acadêmicas. Sua forma de utilização é aprovada nos Colegiados  
de Unidade, assim como sua prestação de contas.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 947-967, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço social e gestão de unidades acadêmicas na perspectiva da gestão democrática  
interesse do professor de preencher esses cargos e, gradativamente, minando o projeto de  
universidade pública, o que gera, naturalmente, uma forma de mercantilização, que já está em  
curso. Ou seja, a universidade vai sendo absorvida pela lógica empreendedora mercantil,  
compondo o que os estudiosos chamam de um “novo ethos acadêmico”.  
Em síntese, ao passo que não se tem uma adesão ao projeto das universidades tal como  
o que ocorreu na Europa com as universidades que aderiram ao Tratado de Bolonha15, a  
universidade brasileira vai sendo gradativamente deteriorada e a privatização se desenvolve sob  
outros moldes: diferente, mas dialeticamente igual.  
São muitas as atividades administrativas que compõem o conjunto de atribuições na  
gestão. Elas vão do controle da frequência dos técnicos administrativos à manipulação de  
dezenas de sistemas informatizados que organizam e gerenciam os serviços da universidade,  
tais como: sistema de bolsas de estudos (SISBOL), de controle de ponto de servidores, de  
manutenção e reparos, de patrimônio, Sistema de Bens Ociosos (SIGEBOC), de solicitação de  
transporte (SISAUTO), e de administração de compras (SIA Compras), os quais, ao mesmo  
tempo em que facilitam o ordenamento dos processos, demandam mais tempo na frente das  
telas, o que acaba por gerar um distanciamento da construção da política interna da Unidade.  
Em tese, nenhum docente faz concurso para ser um “gestor”, mas sim para ser  
“professor”. As atividades intrínsecas à gestão pressupõem o conhecimento da totalidade da  
universidade do ponto de vista político, administrativo e acadêmico, sem o qual é  
substantivamente difícil realizar uma gestão de qualidade.16 Aqui, destacamos a importância do  
servidor técnico-administrativo lotado na secretaria das unidades, que assume, na maioria das  
vezes, um protagonismo à frente das questões ligadas à manipulação dos sistemas,  
equipamentos e recursos humanos quase sempre sem gratificação, como foi o caso da nossa  
experiência, em que pese ter havido muitas movimentações em prol de que o servidor fizesse  
jus à mesma.  
961  
Vale esclarecer que esse excesso de atividades administrativas e burocráticas não é  
exclusivo do cotidiano de gestores, mas também está presente na rotina dos demais docentes da  
universidade. Na verdade, esse conjunto de elementos só demonstra o que vem se tornando o  
15  
O Tratado de Bolonha é um acordo entre os Ministros da educação de 29 países europeus com o objetivo de  
fortalecer e fomentar a educação superior na Europa. Significou uma mudança importante na forma de gerir as  
universidades, na construção dos currículos (em 3 graus) e nas alterações da carreira docente. Para uma análise  
mais aprofundada e crítica ver: Santos e Melo (2019) e Duarte (2009).  
16  
Destaco que a universidade através da escola de Governança em Gestão Pública, elaborou dois cursos  
importantes á época para os/as diretores(as) de Unidade Acadêmica, quais sejam: "Apresentação UFF: atribuições  
do(a) Gestor(a) e Gerenciamento da Unidade Acadêmica" e "Gerenciando a Unidade: gestão interna, institucional  
e externa". Para mais informações ver: https://eggp-ava.vr.uff.br/login/index.php.  
Francine Helfreich Coutinho dos Santos  
cotidiano da educação nos países da América Latina, em que os ataques à universidade pública  
a desestruturam e fazem com que os docentes não tenham mais interesse em assumir cargos de  
gestão e/ou construírem em coletividade o seu cotidiano, esvaziando-a.  
Outrossim, para além dos elementos administrativos, há uma dimensão política que é  
central para que a gestão das unidades avance. Trata-se do necessário envolvimento com a  
política universitária para a construção de mediações capazes de criar um denominador comum  
entre as partes diante de tantas disputas no âmbito interno e externo da universidade. Isto porque  
as diferenças e interesses antagônicos revelam-se a partir da premissa de que esse trabalho é  
desenvolvido num meio social que o determina, e diante do qual se tem que fazer opções e  
tomar decisões no cotidiano universitário, levando em consideração, todavia, o local em que a  
unidade está fisicamente situada e politicamente inserida.  
No caso, ser político, como afirma Heller (1982, p. 55), “é tomar partido, não ficando  
indiferente diante das opções” quase sempre antagônicas: de um lado temos a universidade, que  
é gerida por práticas e princípios próximos com a “racionalidade empresarial”, mas que ergue  
a bandeira da gestão democrática para fazer jus à sua base legal (Constituição Federal e LDB);  
e de outro lado, a gestão de unidade (de serviço social), que prima por uma por uma  
administração efetivamente democrática a serviço de uma concepção de universidade que seja  
realmente pública e gratuita, cujos serviços precisam ser prestados com qualidade, o que colide  
com o tipo de gestão hegemônica presente na maioria das reitorias.  
962  
Dessa maneira, pode-se afirmar junto com Yazbek (2014) que o curso de Serviço  
Social é tensionado pela necessidade de formular mediações políticas e ideológicas,  
evidenciadas, sobretudo, por ações de resistência e pela constituição de alianças estratégicas no  
extenso campo da política, justamente por se tratar de uma profissão que demarca no seu próprio  
código de ética e no conjunto das resoluções das instituições representativas da categoria  
profissional o seu lugar político no mundo.17  
Pensando nas particularidades da Escola de Serviço Social da referida universidade,  
esta unidade registra inúmeras ocorrências da política de resistência. A história da referida  
Escola, nos seus 76 anos, sempre foi balizada pelas movimentações políticas e pelo  
enfrentamento a projetos de autoritarismo, a exemplo das lutas contra reitorias autoritárias,  
contra governos fascistas e prefeituras oportunistas, além das disputas dentro dos espaços  
institucionais, especialmente na resistência contra os cursos pagos, contra o ensino à distância  
e a favor da autonomia universitária. Para exemplificar, a Escola de Serviço Social realizou  
17  
O Código de Ética da profissão deixa explícita a opção por um projeto profissional vinculado ao processo de  
construção de uma nova ordem societária no seu oitavo princípio fundamental.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 947-967, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço social e gestão de unidades acadêmicas na perspectiva da gestão democrática  
centenas de questionamentos às formas de avaliação da administração central e às práticas  
internas. Contudo, os questionamentos produzidos não se restringiram a produção de críticas,  
mas dezenas de docentes que passaram pela unidade, compuseram o quadro de gestores do  
sindicato de docentes da universidade e engrossaram as fileiras dos movimentos sociais,  
atuantes em projetos de extensão críticos, e ativistas da profissão que se posicionam contra as  
crises do sistema e suas formas distintas de expropriação do fundo público.  
Em síntese, a (ESS) sempre se posicionou criticamente diante das questões e disputas  
colocadas em torno do Estado e de sua política para o ensino superior. Valendo-nos das  
reflexões de Souza (2019, p. 6), “historicamente ao consolidarmos posicionamentos ético-  
políticos e efetivarmos a nossa opção teórico-metodológica em consonância com um projeto  
societário, passamos a legitimar valores que possuem uma direção social” e, nesse sentido, a  
demarcar a nossa concepção de mundo, de sociedade e de universidade mesmo com todos os  
percalços e as intercorrências que a conjuntura nos impõe.  
Assim, desafiada por todas as questões supramencionadas, a experiência da gestão  
deixou alguns feitos importantes, que vai desde a compra de um novo elevador para a escola,  
fruto de recurso de emenda parlamentar18, até o estabelecimento de uma cultura de encontros  
sistemáticos com funcionários para dirimir os problemas cotidianos, assim como com os grupos  
de professores que estão à frente das coordenações (curso, departamento, pós-graduação).  
963  
Considerações finais  
Ainda que de forma inconclusiva, deixamos aqui brevíssimas considerações, que  
devem ser debatidas e ampliadas, na busca de fortalecer uma das atribuições do Serviço Social,  
que é a gestão. Para tanto, destacamos a importância de que os (as) assistentes sociais que atuam  
na direção de unidades acadêmicas das Escolas de Serviço Social balizem suas ações tomando  
por princípio a concepção de gestão democrática e participativa contida na Constituição Federal  
de 1988. No caso em tela, ao aderirmos e coadunarmos com, bem como uma concepção de  
universidade pública gratuita, de qualidade e socialmente referenciada e, sobretudo, que tem  
como horizonte os valores expressos no projeto ético-político da profissão e nos  
posicionamentos políticos construídos coletivamente pelo ANDES-SN e pelo Conjunto  
CFESS-CRESS, compreendemos que, desta forma é possível avançar rumo a uma perspectiva  
de gestão realmente democrática.  
18 A Escola de Serviço Social da UFF recebeu via emenda Parlamentar, da ex-aluna e Deputada Federal, Talíria  
Petrone, o recurso destinado à compra de um novo elevador para a ESS.  
Francine Helfreich Coutinho dos Santos  
Encerro essas linhas de reflexão dialogando com Miguel Arroyo (2008), importante  
intelectual brasileiro, que, ao pensar os processos democráticos no âmbito da educação,  
enxergou a existência de um grande avanço na democracia com a participação efetiva dos  
sujeitos nos processos educacionais, mas também identificou uma acomodação da referida  
participação, quando da institucionalização das práticas democráticas. Assim como Arroyo  
(2008), acreditamos que é preciso resgatar a radicalidade política da gestão democrática no  
âmbito no ensino superior para que seja possível resistir às incidências do rentismo e às formas  
de privatizar a Universidade Pública.  
Em relação aos debates acima referidos, embora a assertiva possa parecer um “devir”,  
dentro das universidades, guardadas as devidas proporções, ainda se tem mais autonomia no  
fazer profissional nos espaços de direção de unidades acadêmicas do que em outros espaços  
sócio-ocupacionais de gestão. A conquista e a manutenção da autonomia docente e da  
autonomia universitária foram construídas a duras penas pelos professores coletivamente, em  
seus aparelhos privados de hegemonia19 - no caso do ANDES-SN e suas seções sindicais. O  
papel do referido sindicato em sua luta pela autonomia universitária significa:  
autonomia para contrapor-se à dominação da universidade pelos poderes  
político e econômico; autonomia para contrapor-se à dominação da  
universidade pelos interesses de grupos econômicos e políticos hegemônicos;  
autonomia para contrapor-se à lógica produtivista que concebe a escola, o  
ensino e o saber como mercadorias (ANDES, 1981, p. 26).  
964  
Em consonância às referências do Serviço Social, embora o(a) assistente social  
disponha de uma relativa autonomia na condução de seu trabalho (Iamamoto, 2008), as  
instituições empregadoras, em geral, interferem no estabelecimento de metas a cumprir e, por  
vezes, direcionam as decisões dos trabalhadores profissionais de acordo com os seus interesses  
(Vidal; Freitas, 2014).  
Decerto, o Estado, em sua dimensão de gestor de políticas sociais, não se configura  
como o centro das mobilizações para a transformação da sociedade. No entanto, é um espaço  
importante para acumulação de conquistas dos trabalhadores, através da ampliação e  
aprofundamento de direitos (Filho, 2009, s/p), que precisa estar a serviço do interesse dos  
mesmos e não, exclusivamente, das classes dominantes. Isso nos impele - não a qualquer preço  
- a ocupar certos espaços, como os de direção e de gestão das instituições, com o objetivo de  
resistir às formas de gestão fundadas na racionalidade empresarial, burocrática e capitalista.  
19 Gramsci (2007a) aponta que o poder dos grupos dominantes não é exercido apenas pela repressão, mas também  
através do consenso. Para isso, a classe dominante busca difundir sua ideologia entre as classes subalternizadas,  
como via de construção de sua hegemonia, entendida como direção política e cultural de uma classe sobre a outra.  
Há que se destacar o papel da sociedade civil nessa construção, através dos aparelhos privados de hegemonia.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 947-967, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Serviço social e gestão de unidades acadêmicas na perspectiva da gestão democrática  
Portanto, tendo em vista que nossa proposta é a de formar profissionais para o mercado  
e, simultaneamente, sujeitos críticos, uma das questões que nos é colocada é compreender que  
o exercício destes cargos de direção de unidades acadêmicas tanto em sua condição técnica  
quanto política deve estar relacionado à condição de utilização racional de meios e recursos,  
bem como precisa ser coerente com o caráter educativo da nossa atividade-fim.  
Nas palavras de Gramsci, devemos formar sujeitos, tornando-os capazes de “pensar,  
de estudar, de dirigir ou de controlar quem dirige” (Gramsci, 2006, Q12, §2º, p. 1457) e, para  
tanto, na condição de assistente sociais, a manutenção do fazer profissional ancorados na defesa  
da democracia e da autonomia das instituições de ensino superior torna-se um imperativo tendo  
em vista a necessidade de estarmos atentos contra todo e qualquer processo autoritário.  
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Planejamento reprodutivo na Atenção Primária  
à Saúde: um relato de experiência  
Reproductive planning in Primary Health Care: an experience report  
Waleska Matheus Rosa*  
Resumo: Trata-se de um relato de experiência a  
partir da atuação enquanto assistente social  
residente em uma Unidade Básica de Saúde. As  
questões norteadoras surgiram tanto mediante  
participação na realização de atividades  
educativas - Grupo de Direitos Sexuais e  
Reprodutivos -, quanto dos atendimentos  
individuais realizados aos usuários do território  
de abrangência. Busca-se compreender como as  
Abstract: This is an experience report based on  
my work as a resident social worker in a Basic  
Health Unit. The guiding questions arose both  
from participation in educational activities - the  
Sexual and Reproductive Rights Group - and  
from individual consultations with users in the  
area. The aim is to understand how the  
reproductive rights/reproductive planning  
guidelines are incorporated and implemented in  
practice by Primary Health Care, as well as to  
identify what contributions multiprofessional  
residency can make to reproductive planning  
actions in the practice setting. A review of the  
emergence of reproductive rights is given,  
followed by a brief literature review on  
reproductive rights in Primary Health Care, and  
finally, the experience report.  
diretrizes  
dos  
direitos  
reprodutivos/  
planejamento reprodutivo são incorporadas e  
executadas na prática pela Atenção Primária à  
Saúde, bem como identificar quais as  
contribuições que a residência multiprofissional  
pode oferecer nas ações de planejamento  
reprodutivo no cenário de prática. É feito um  
resgate do surgimento dos direitos reprodutivos,  
seguido de breve revisão de literatura acerca dos  
direitos reprodutivos na Atenção Primária, e por  
fim, o relato de experiência.  
Palavras-chaves: Planejamento reprodutivo;  
Keywords: Reproductive planning; Primary  
Atenção  
Primária;  
Residência  
care; Multiprofessional residency.  
multiprofissional.  
Introdução  
A aproximação com a temática do planejamento reprodutivo ocorreu mediante a inserção  
no campo de prática da Residência Multiprofissional em Saúde da Família do Hospital  
Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora (HU-UFJF). Durante o primeiro ano de  
residência, dentre as demandas atendidas pelo Serviço Social na Unidade Básica de Saúde  
* Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: wmatheusrosa@gmail.com  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.47715  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 08/03/2025  
Aprovado em: 18/09/2025  
Planejamento reprodutivo na Atenção Primária à Saúde: um relato de experiência  
(UBS), destacou-se a alta procura por parte das usuárias por orientações quanto ao fluxo de  
atendimento na rede pública municipal para acesso aos métodos contraceptivos -  
especificamente laqueadura e dispositivo intrauterino (DIU). Saliento que embora alguns  
homens procurassem o serviço com essa finalidade, estes representam a minoria do público,  
dessa forma, justifica-se o uso acima do termo “usuárias” (no feminino e plural) - uma breve  
revisão de literatura auxilia na compreensão desse fenômeno, e revela que historicamente a  
responsabilidade na regulação da fecundidade tem sido imputada às mulheres.  
A luta pelos direitos sexuais e reprodutivos é intrínseca à luta do movimento feminista, o  
qual se sustenta em pilares como defesa da liberdade e autonomia sobre o próprio corpo. Logo,  
abrange a crítica à moral conservadora que impunha às mulheres o exercício da sexualidade  
restrita à reprodução. A luta pelos direitos sexuais (igualdade e liberdade no exercício da  
sexualidade, sem discriminação e violência), tem autoria compartilhada com o movimento  
LGBTQIAPN+1 (Ávila, 2003). Quanto aos direitos reprodutivos, o surgimento destes está  
alinhado com as reivindicações pelo direito à reprodução (ou não), ao aborto, à contracepção,  
e sob a ótica do campo normativo podem ser considerados como uma ampliação do escopo dos  
direitos humanos (Scavone, 2007).  
Essa disputa ideológica impulsionada principalmente durante a 2° onda do movimento  
feminista2 europeu e norte americano (décadas de 1960-70) foi fundamental para introduzir a  
pauta dos direitos sexuais e reprodutivos no debate internacional sobre Direitos Humanos na  
década de 1990 através das Conferências da ONU, e estabelecer tratados - que  
consequentemente impactou a formulação das legislações e normativas dos países signatários,  
inclusive o Brasil (Telo, 2019). Além disso, ao levar as pautas reivindicatórias para o campo do  
Direito, estas passam a ser conceituadas juridicamente como “direitos reprodutivos”, que apesar  
de na formulação ter adotado uma perspectiva liberal, ainda assim representa um marco. Direito  
reprodutivo passou a ser entendido como direito humano fundamental que reconhece o direito  
de decisão livre e responsável dos indivíduos acerca da reprodução (concepção e contracepção),  
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Lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, queer, intersexuais, assexuais, pansexuais e não binários. O símbolo “+”  
representa a possibilidade de inclusão de novas formas de expressão da sexualidade.  
2 O movimento feminista costuma ser analisado sob a perspectiva de construção de algumas “ondas”. Trata-se de  
uma forma da literatura internacional categorizar didaticamente os contextos sócio-históricos do movimento nos  
cenários europeu e norte americano, e condensar os principais avanços e recuos das pautas em cada época (Ribeiro;  
Nogueira; Magalhães, 2021). Segundo Hobsbawm (apud Mesquita, 2010), a inserção das mulheres no mercado de  
trabalho e no ensino superior no pós 2ª Guerra influenciou a segunda onda feminista. Novas pautas foram  
incorporadas ao movimento, como a dos direitos sexuais e reprodutivos, que inclui o direito à liberdade sexual,  
acesso aos métodos contraceptivos - vale ressaltar que as pílulas anticoncepcionais foram criadas em 1960 -, e a  
descriminalização do aborto (Souza, 2023).  
Waleska Matheus Rosa  
e, portanto, abrange o direito à informação para que através dela se alcance o mais alto nível de  
saúde sexual e reprodutiva (UNFPA Brasil, 1995).  
No Brasil, a Carta Constitucional trouxe a perspectiva dos direitos sexuais e reprodutivos  
enquanto direitos fundamentais, bem como preconizou o direito ao livre planejamento familiar  
(reprodutivo), sendo este último posteriormente regido por lei específica - Lei nº 9.263/1996,  
conhecida como Lei do Planejamento Familiar (Brasil, 1988). No entanto, não tratou sobre o  
aborto, mantendo sua regulamentação através do Código Penal (Damião, 2022).  
Foi estabelecido que o planejamento reprodutivo é o conjunto de ações de regulação de  
fecundidade, que deve ser orientado por ações (preventivas e educativas) e pela garantia de  
acesso a informações, meios, métodos e técnicas disponíveis para o controle de fecundidade.  
Preconizou também assistência à concepção, pré-natal, parto, puerpério, controle de infecções  
sexualmente transmissíveis (IST), bem como controle e prevenção de cânceres (colo do útero,  
de mama, próstata, pênis) (Brasil, 1996). Quanto aos métodos contraceptivos, abordou apenas  
sobre os critérios de elegibilidade para esterilização voluntária (vasectomia, laqueadura ou  
algum outro método cientificamente aceito). A saber:  
Idade mínima de 25 anos (critério alterado em 2022, que passou a ser 21 anos), ou no  
mínimo 2 filhos vivos - nesta hipótese, o usuário deve ter adquirido a capacidade civil  
plena (18 anos completos);  
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Transcorrer no mínimo 60 dias após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e  
Esclarecido (TCLE) para realização do procedimento;  
Risco à vida da gestante ou do feto, desde que testemunhado em relatório escrito e  
assinado por 2 médicos.  
Por ser a porta de entrada preferencial do SUS e ordenadora das Redes de Atenção à saúde  
(RAS), o planejamento reprodutivo encontra na Atenção Primária à Saúde (APS) o espaço  
propício para o desenvolvimento de suas ações. A aproximação com essa política se deu a  
princípio pela realização dos Grupos de Direitos Sexuais e Reprodutivos na UBS - que como  
será explicitado, a comprovação junto à atenção secundária do recebimento de orientação  
individual ou de participação em atividade educativa é uma das condicionalidades para acesso  
a alguns métodos contraceptivos -, e posteriormente, pelo contato com as usuárias nos  
acolhimentos individuais. Em vista disso, os eixos norteadores deste trabalho são: como as  
diretrizes dos direitos reprodutivos e planejamento reprodutivo são incorporados e executados  
pela Atenção Primária à Saúde? quais contribuições a residência multiprofissional pode  
oferecer nas ações de planejamento reprodutivo no cenário de prática?  
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Planejamento reprodutivo na Atenção Primária à Saúde: um relato de experiência  
Direitos reprodutivos na Atenção Primária  
A Política Nacional de Atenção Básica caracteriza esse nível de atenção à saúde como  
um conjunto de ações (coletivas e individuais) com foco na promoção do cuidado integral dos  
sujeitos, de modo a gerar impacto tanto na sua condição de saúde individual quanto nos  
determinantes e condicionantes de saúde coletiva, além de propiciar educação em saúde, com  
vistas à autonomia decisória do usuário no processo de cuidado. Portanto, baseia-se na  
promoção, proteção, prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação, redução de  
danos e a manutenção da saúde (Brasil, 2011). A partir desses pilares, entende-se que a atenção  
à saúde reprodutiva e o planejamento familiar são áreas de atuação da atenção primária.  
É necessário fazer um adendo e distinguir 2 termos: planejamento familiar x planejamento  
reprodutivo. Se analisado sob perspectiva ampliada dos direitos sexuais e reprodutivos  
(incluindo a população heterossexual e LGBTQIAPN+), o planejamento familiar vai além do  
objetivo de constituir família, pois a autonomia decisória dos indivíduos acerca da concepção  
ou anticoncepção independe da existência de um vínculo conjugal/familiar, podendo, portanto,  
ser tomada tanto individualmente quanto em conjunto com o/a parceiro/a, se houver. Sendo  
assim, o termo “planejamento familiar” foi substituído por “planejamento reprodutivo” (Brasil,  
2013). No entanto, apenas a troca da terminologia não significa que no atendimento direto aos  
usuários práticas conservadoras, heteronormativas e familistas não se perpetuem.  
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No que se refere ao planejamento reprodutivo, o Ministério da Saúde3 estabelece que a  
atuação dos profissionais engloba principalmente aconselhamento, atividades clínicas e  
educativas, podendo esta última ser individual ou coletiva. Propõe integração desses 3 eixos -  
já que o serviço de saúde se constitui um espaço para a prática de ações educativas -, e  
recomenda interação dos membros da equipe de saúde, fomentando uma atuação multi e  
interdisciplinar, propiciando ao usuário conhecimento tanto sobre a anticoncepção quanto  
aspectos da sexualidade (Brasil, 2013). Uma estratégia viável para a realização das atividades  
de educação em saúde é através de grupos, os quais nas UBSs do município de Juiz de Fora são  
comumente conhecidos como “Grupo de Direitos Sexuais e Reprodutivos”, “Grupo de Direitos  
Reprodutivos”, ou apenas pela sigla GDR. É interessante observar que o termo “sexuais” têm  
sido omitido do nome, o que já é um reflexo da forma como, na maioria das vezes, os grupos  
são conduzidos e o enfoque que é dado: a contracepção. “(...) o controle da natalidade e o  
número de filhos são apontados como principal intento do planejamento, desconsiderando os  
3 Os Cadernos de Atenção Básica são publicações elaboradas pelo Ministério da Saúde, a fim de prestar orientações  
técnicas, protocolos e diretrizes para a atuação dos profissionais da atenção primária. Quanto à saúde sexual e  
reprodutiva, o material de referência é o Caderno de Atenção Básica n° 26.  
Waleska Matheus Rosa  
aspectos socioculturais e as características individuais de cada família” (Dias et al., 2017, p.  
350).  
Os estudos mostram que há uma discrepância entre o que é preconizado na legislação e  
a forma que a assistência reprodutiva se efetiva na prática, indicando, portanto, diversas falhas  
e entraves. Paiva et al. (2019) pontuam algumas barreiras na assistência ao planejamento  
reprodutivo, tais como: abordagem exclusivamente voltada para contracepção e ISTs;  
dificuldade de acesso aos métodos contraceptivos; baixa oferta de métodos contraceptivos nas  
UBS; dificuldade de adesão do público masculino; falta de assistência à infertilidade; ausência  
de acompanhamento do usuário após ter acesso ao método contraceptivo escolhido (o que  
compromete a integralidade do cuidado).  
Historicamente as ações de planejamento reprodutivo são direcionadas às mulheres, e há  
responsabilização destas tanto em relação à concepção quanto à contracepção. Isso ainda se  
perpetua, e um dos indicativos é a baixa adesão do público masculino nas ações de planejamento  
reprodutivo. No estudo realizado por Dias et al. (2017) acerca da participação dos homens nas  
ações de planejamento familiar na atenção primária foram identificados dois aspectos que  
auxiliam na compreensão do fenômeno: distanciamento do serviço de saúde e desconhecimento  
sobre a existência do serviço de planejamento reprodutivo.  
A desigualdade atravessa a construção social de gênero, determinando os padrões e  
comportamentos socialmente aceitos do que é ser homem e mulher na sociedade capitalista. No  
âmbito da saúde é possível identificá-la tanto no que tange à produção do autocuidado e  
prevenção (que são entendidos como “coisa de mulher”), quanto na procura pelos serviços de  
saúde - que para o público masculino ocorre majoritariamente nos casos em que a condição de  
saúde se agrava de modo a gerar incapacidade para realização de atividades diárias, como o  
exercício de atividade laborativa, segundo Solano et al. (2017). Além disso, as ações  
desenvolvidas na Atenção Primária são predominantemente focadas na saúde da mulher  
(realização de coleta de citopatológico, rastreio de cânceres, pré-natal, consulta de puerpério) e  
da criança (puericultura, atualização do cartão vacinal, acompanhamento das condicionalidades  
do Programa Bolsa Família), o que corrobora para que de certo modo os homens se afastem dos  
serviços de saúde.  
972  
Esse distanciamento somado à falta de conhecimento sobre a assistência ao planejamento  
reprodutivo são dificultadores para adesão dos homens e promoção da integralidade do cuidado.  
O desconhecimento das ações realizadas no serviço de saúde - principalmente na Atenção  
Primária, que tem atuação direta nos territórios de abrangência -, revela uma falha na  
comunicação (equipes - usuários) e na forma de prestação da assistência. Rios et al. (2023)  
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Planejamento reprodutivo na Atenção Primária à Saúde: um relato de experiência  
corroboram com esse entendimento e sinalizam que a maioria dos usuários desconhece o  
programa e passam a ter acesso somente após a primeira gestação.  
Além da dificuldade de aproximação com o público masculino, também há barreiras  
quanto à população jovem (pessoas na faixa etária de 10 a 24 anos, se considerada a definição  
preconizada pelo Ministério da Saúde4). Silva e Engstrom (2020) ao fazerem uma revisão  
integrativa acerca da atenção à saúde dos adolescentes na atenção primária identificaram a  
necessidade de uma postura diferenciada no acolhimento dos adolescentes, a fim de construir  
vínculos e melhorar a prestação da assistência. Atitudes autoritárias, práticas baseadas na  
perspectiva disciplinar e normativa, ausência de diálogo, não permitindo assim que os  
adolescentes se expressem, são alguns entraves apresentados.  
Por último, porém não menos importante, outro aspecto de análise referente à assistência  
no planejamento familiar na atenção primária é quanto ao viés heteronormativo e binomial que  
é adotado pelos profissionais de saúde. Historicamente a família (aqui entendida como espaço  
de reprodução de valores sociais e formação dos indivíduos) exerce o papel da procriação, e  
por conseguinte os modelos nucleares (composta por pai, mãe, filhos), matrimonial,  
monogâmica e heterossexual são as que possuem legitimidade no ideário social, gerando assim  
a estigmatização das novas configurações. A compreensão que os profissionais têm acerca do  
que é ou não caracterizado como “família” pode rebater nas práticas em saúde (Albuquerque et  
al., 2018).  
973  
Por exemplo, numa pesquisa elaborada com enfermeiros da ESF no município de Juazeiro  
do Norte (CE) acerca do planejamento reprodutivo para casais homossexuais no ano de 2014,  
dois elementos chamam atenção: foi identificado que para alguns profissionais, a população  
LGBTQIAPN+ não deve ser público-alvo das ações do programa, visto que a ênfase é na  
reprodução, logo, a assistência prestada a essa parcela da população deveria se restringir à  
dispensação de preservativos para prevenção de ISTs. Além disso, identificou-se uma falta de  
preparo dos profissionais frente à demanda por uso de anticoncepcionais para indução de  
mudanças corporais (feminização) (Albuquerque et al., 2018).  
4 Adefinição de adolescência e juventude adota critérios diferenciados. De acordo com o ECA(Estatuto da Criança  
e do Adolescente), compreende a faixa etária de 12 a 18 anos. Já de acordo com a OMS (Organização Mundial da  
Saúde), de 10-19, sendo que a juventude perpassa a adolescência, havendo uma intersecção entre as etapas, e  
compreende a faixa de 15-24 anos. Dessa forma, a definição de juventude adotada pelo Ministério da Saúde mescla  
os critérios de adolescência e juventude da OMS (Brasil, 2025).  
Waleska Matheus Rosa  
Relato de experiência  
A Residência Multiprofissional em Saúde da Família é uma modalidade de pós-graduação  
lato sensu caracterizada pela educação em serviço. Neste programa as áreas profissionais  
presentes são: Enfermagem, Farmácia, Odontologia e Serviço Social. Os profissionais  
residentes são divididos em equipes e distribuídos entre as Unidades de Saúde da Família  
escolhidas pela gestão municipal em conjunto com a Coordenação do Programa de Residência  
Multiprofissional do Hospital Universitário da UFJF, nas quais permanecem durante os 2 anos  
da especialização.  
Em março de 2023, a equipe multiprofissional chegou à UBS designada como campo de  
prática do Programa, e é importante ressaltar 3 pontos: os profissionais desta localidade não  
tinham experiência prévia com preceptoria de residência multiprofissional, apenas de Medicina;  
fomos a primeira turma de residentes do local, e até então não havia profissional de Serviço  
Social na equipe.  
Até a chegada da residência na UBS, os grupos de direitos sexuais e reprodutivos (GDR)  
eram realizados apenas pelos profissionais de enfermagem. Com a necessidade de desenvolver  
atividades multiprofissionais, a realização do GDR foi a primeira atividade que a equipe de  
residentes identificou potencialidade de alguma forma agregar todas as categorias profissionais.  
Dessa forma, as profissionais residentes reestruturaram a condução/organização dos grupos e  
passaram a assumi-lo enquanto uma atividade multiprofissional da residência. Apesar do  
empenho do grupo para o desenvolvimento desta atividade na perspectiva interdisciplinar,  
ressalto de partida que a inexperiência profissional e as lacunas na formação dos profissionais  
de saúde para o desenvolvimento de trabalho multiprofissional foram dificultadores para que  
pudéssemos romper com a lógica de fragmentação dos saberes e agregarmos à esta atividade  
uma abordagem que fosse além do viés biomédico. Como consequência, havia uma  
centralidade das questões do corpo biológico, com foco na anticoncepção e prevenção de IST,  
desconsiderando a dimensão dos direitos sexuais.  
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Os temas abordados foram divididos por categoria profissional, e a configuração  
elaborada no início do programa permaneceu durante os 2 anos da seguinte forma:  
Enfermagem: anatomia dos sistemas reprodutivos e métodos contraceptivos;  
Odontologia: infecções sexualmente transmissíveis (IST), com ênfase nas  
manifestações orais;  
Serviço Social: critérios de elegibilidade para acesso ao DIU, laqueadura e vasectomia  
através do SUS; fluxos de atendimento na rede, e a elaboração dos encaminhamentos.  
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Planejamento reprodutivo na Atenção Primária à Saúde: um relato de experiência  
No ano de 2024, a farmacêutica passou a integrar a equipe de residentes desta UBS e  
coube à profissional abordar acerca dos métodos contraceptivos juntamente com a enfermagem.  
Geralmente, os encontros eram realizados em um único dia, com duração média de 1h. A UBS  
não tinha recursos de mídia e áudio disponíveis para realização das atividades, como  
computador, retroprojetor e caixa de som, então o grupo era conduzido no formato de palestra,  
utilizando-se de recursos didáticos como imagens impressas, mostra dos modelos de métodos  
contraceptivos e dos sistemas reprodutivos.  
Segundo Paiva et al. (2019), apesar das práticas educativas serem uma dimensão inerente  
ao trabalho em saúde - principalmente na Atenção Primária, o que se observa é que esta tem  
sido relegada ao segundo plano tanto no planejamento e organização da assistência, quanto pela  
gestão e nas ações de cuidado. Além disso, a pandemia da Covid-19 demandou que os serviços  
de saúde reorganizassem os processos de trabalho, focando no atendimento das demandas  
emergenciais (Xavier et al., 2024). Logo, houve uma redução na realização de atividades de  
educação em saúde, e por conseguinte, o distanciamento dos profissionais do serviço da prática  
de atividades coletivas - esses impactos puderam ser observados durante a estadia nesta UBS.  
Uma vez que o processo de educação em saúde é responsabilidade de toda a equipe assistencial,  
e não uma atividade exclusiva da residência, por solicitação da nova supervisão da unidade  
houve uma reestruturação na composição dos grupos. Dessa forma, a partir de 2024 os grupos  
deixaram de ser executados exclusivamente pelas residentes, e passou a ser feito um  
revezamento entre as profissionais (vinculadas ao serviço e residentes). Dentre as profissionais  
do serviço, apenas as enfermeiras e a assistente social participavam do GDR - devido à carga  
horária de 12h30min semanais, não havia participação das cirurgiãs dentistas (Juiz de Fora,  
2016).  
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O acolhimento é um processo constitutivo das práticas de produção e promoção de saúde  
que perpassa todos os níveis de atenção à saúde. Tem como foco compreender e buscar  
resolutividade para atendimento das demandas dos usuários através de escuta qualificada,  
sendo, portanto, atribuição de toda a equipe multidisciplinar (Brasil, 2021). Adotamos o  
acolhimento em direitos reprodutivos nesta UBS como forma de ampliar a escuta das demandas  
trazidas pelas/pelos usuários, sendo o mesmo realizado pelas assistentes sociais. O atendimento  
era registrado em ficha própria (também elaborada pelas profissionais) e mantida em arquivo  
privativo. A partir dele era feito agendamento para o grupo ou para orientação individual. É  
necessário salientar que a necessidade de comprovação de participação no grupo ou de  
recebimento de orientação ocorre no momento que o usuário inicia os trâmites junto à atenção  
secundária, e se aplica quando o método escolhido é DIU, laqueadura ou vasectomia. Quanto  
Waleska Matheus Rosa  
aos anticoncepcionais orais e injetáveis, a tratativa é na própria UBS através de agendamento  
de consulta médica.  
Até a organização do acolhimento, o fluxo nesta UBS funcionava da seguinte forma:  
quando o/a usuário/a demandava pelo DIU, laqueadura ou vasectomia (seja nas consultas  
médicas, de enfermagem, ou por demanda espontânea), era direcionado para a recepção da  
UBS, onde era disponibilizada uma lista de espera para o GDR, e à medida que os encontros  
eram programados, os usuários eram comunicados através dos agentes comunitários de saúde.  
Em trabalho conjunto com a preceptora, em agosto/2023 apresentamos para a profissional  
que estava na gerência uma proposta de fluxo de atendimento para essa demanda. Desde então,  
o Serviço Social passou a fazer o que nomeamos de “acolhimento para direitos reprodutivos”.  
Ao buscar a UBS o/a usuário/a era direcionado ao Serviço Social e neste momento eram  
realizadas as seguintes etapas: orientações iniciais acerca do fluxo na rede e critérios legais nos  
casos de esterilização voluntária; verificação da DPP (data provável do parto) - caso a gestante  
optasse pela laqueadura; agendamento de orientação individual ou participação no GDR (Grupo  
de Direitos Reprodutivos) com a equipe multidisciplinar. Após a participação no grupo (ou  
atendimento individual), o/a usuário/a recebia a declaração de participação, encaminhamento,  
e demais orientações individuais que fossem necessárias acerca da documentação -  
principalmente quanto ao preenchimento do TCLE -, e dos prazos estabelecidos para entrada  
no processo junto à atenção secundária, a depender do método escolhido. Atualmente no  
município os serviços de referência são: Departamento de Saúde da Mulher, Gestante, Criança  
e do Adolescente (DSMGCA), se mulher, e Departamento de Saúde do Adulto (localizado no  
PAM Marechal), se homem.  
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Sobre as orientações individuais, geralmente era agendado para as gestantes que optavam  
pela realização da laqueadura no momento do parto, mas que procuravam a UBS no final da  
gestação5 (por volta da 28ª semana), ou para os/as usuários/as que por conta da jornada de  
trabalho não conseguiam participar dos grupos. Apesar da extensão do horário de  
funcionamento das UBS´s6 desde fevereiro/2024, ainda há dificuldade da classe trabalhadora  
acessar os serviços de saúde para as ações preventivas e de promoção da saúde, deixando o  
5 É necessário observar a data provável do parto (DPP) e agilizar as orientações e os devidos encaminhamentos,  
de modo a garantir que entre a assinatura do TCLE e a realização do procedimento transcorra pelo menos 60 dias,  
conforme o que preconiza a legislação, e a usuária não perca o direito à realização do procedimento no momento  
do parto. Dessa forma, quando não havia previsão de realização de grupo, era feita a orientação individual.  
6 A Portaria Conjunta nº 95 SRH/ PJF estabeleceu o funcionamento das UBS no período de 7h - 19h ininterruptas  
de segunda a sexta - exceto às quintas feiras que é reservado 2 horas para reunião de equipe -, e sábado de 7h -  
12h (Juiz de Fora, 2024).  
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Planejamento reprodutivo na Atenção Primária à Saúde: um relato de experiência  
acesso apenas para queixas agudas e pontuais, o que é um aspecto de questionamento acerca da  
real ampliação do acesso aos serviços.  
Apesar do grupo abranger as 4 categorias profissionais, a orientação individual era feita  
apenas com assistente social e enfermeira (vinculadas ao serviço ou residentes). As orientações  
eram direcionadas para o método escolhido, e na oportunidade também era feita breve educação  
em saúde para prevenção de ISTs. Destaco que por vezes a demanda por métodos  
contraceptivos era captada durante as consultas de pré-natal ou puericultura, e as profissionais  
(enfermeiras e médicas) encaminhavam ao Serviço Social para acolhimento. A depender da  
profissional - pois nem todas demonstravam flexibilidade para realização de trabalho multi -,  
ao captarem a demanda, acionavam a assistente social disponível no momento. Quando  
possível, era feito um atendimento compartilhado de imediato. No entanto, é necessário cautela  
para identificar se a demanda parte de fato da usuária ou do profissional de saúde, já que por  
vezes, por trás desse encaminhamento pode haver um viés de controle por parte do profissional  
que faz a escuta inicial da demanda.  
A reprodução é um tema a partir do qual percebemos com facilidade a  
estigmatização destinada, particularmente, à população pobre. Ações de saúde  
neste âmbito focalizam a contracepção como mecanismo de controle e as  
orientações, em sua maioria, adotam um caráter crítico e culpabilizante frente  
àquelas que assumem a irresponsabilidade de terem muitos filhos  
(Nascimento; Melo, 2014, p. 279).  
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O atendimento em direitos reprodutivos foi uma frente de trabalho que o Serviço Social  
adquiriu reconhecimento e legitimidade diante dos demais membros da equipe. Barra e Oliveira  
(2012) pontuam que na atenção primária o acolhimento exerce papel central na organização do  
trabalho na unidade de saúde, alternando entre ser um dispositivo humanizador da assistência  
(e gerador de mudanças no processo de trabalho), e mecanismo de organização da demanda e  
otimização do serviço. Quanto ao aspecto da reorganização do processo de trabalho, ponderam  
ainda que a construção de um modelo de atenção à saúde pautado na integralidade,  
interdisciplinaridade e centralidade nas necessidades do usuário, ainda é um desafio que  
perpassa a micro e macropolítica da saúde7. Apesar dessa forma de acolhimento estar longe de  
ser algo extremamente inovador/revolucionário - até porque, a reestruturação dos processos de  
trabalho pode ser proposta por qualquer profissional de saúde -, pôde-se visualizar certa  
efetividade no cenário de prática, principalmente no sentido de orientar os usuários quanto ao  
7 São dimensões complementares, sendo que a macropolítica diz respeito à formulação e normatização das políticas  
públicas, sendo que nem sempre atendem às reais necessidades da população. Já a micro é a prática cotidiana dos  
serviços, onde os profissionais escolhem algumas estratégias e táticas para prestação do cuidado, o que envolve  
decidir como a assistência será prestada na prática. Um exemplo mencionado neste artigo é a escolha de 2 grupos  
específicos para orientação individual (gestantes e trabalhadores).  
Waleska Matheus Rosa  
itinerário a ser percorrido na RAS. Por exemplo, se o método almejado é o DIU, um dos  
requisitos é que em até 1 ano tenha sido realizada coleta de exame citopatológico (preventivo).  
Dessa forma, no momento do acolhimento era feita essa orientação, e caso a usuária não tivesse  
um exame recente, orientávamos a realização antes de participar do grupo, para que no dia ela  
já saísse com toda a documentação pronta e pudesse seguir o itinerário na rede. Outro cenário  
recorrente era de usuárias que já haviam participado de algum grupo anteriormente -  
independentemente do local que foi realizado, podendo ter sido feito em outra UBS, inclusive  
-, e optavam por outro método contraceptivo. Dessa forma, com vistas a desburocratizar o  
acesso, era feita atualização da documentação e encaminhamento para a atenção especializada,  
não sendo necessário, portanto, que ela precisasse participar novamente de um grupo ou  
recebesse nova orientação individual.  
Outro elemento que demonstra a importância do acolhimento é que mediante olhar crítico  
e escuta qualificada era possível captar outras demandas, além daquela trazida inicialmente  
pelas/os usuários - que não necessariamente se esgotavam na política de saúde, e demandava  
variados encaminhamentos para as políticas setoriais, principalmente as de assistência social e  
de transferência de renda.  
No período de 1 ano (setembro de 2023 a setembro de 2024) foram contabilizados 90  
acolhimentos, e o método contraceptivo mais procurado foi laqueadura (42), seguido de DIU  
(36) e vasectomia (12). Uma falha observada foi a falta de contrarreferência, que de certo modo  
impacta na integralidade da assistência e impossibilita inclusive, mensurar quantos usuários de  
fato acessaram ou não os serviços. Geralmente esse feedback acontecia apenas com as  
puérperas, devido à realização de visita domiciliar puerperal, que também é uma atividade que,  
quando possível, as assistentes sociais realizavam em conjunto com a enfermagem.  
Os dados acima refletem que ainda na atualidade o público-alvo das políticas de direitos  
reprodutivos são as mulheres, recaindo sobre elas a responsabilidade pela regulação da  
fecundidade. No caso da opção pela laqueadura, muitas relatavam que a dificuldade financeira  
era um fator determinante na escolha do método contraceptivo “definitivo”, o que de certo  
modo ajuda a desmistificar o discurso conservador que a população pobre tem muitos filhos  
para usufruírem dos benefícios assistenciais, como o Bolsa Família, por exemplo. Os estudos  
de Corrêa e Petchesky (1996) auxiliam na compreensão desse fenômeno, ao explicar que  
identidades grupais e intergrupais complexas (que perpassam os marcadores gênero, classe,  
raça, religião, idade, nacionalidade) influenciam a tomada de decisão das mulheres em  
múltiplas direções. Além disso, explicam que:  
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Para que as decisões sejam realmente “livres”, e não compelidas pelas  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 968-986, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Planejamento reprodutivo na Atenção Primária à Saúde: um relato de experiência  
circunstâncias ou por desespero, é necessário que existam certas condições  
que constituam a base dos direitos sexuais e reprodutivos, o que as feministas  
denominam “autonomia feminina”. Elas incluem fatores materiais e de  
infraestrutura, tais como transporte, creches, subsídios financeiros, bem como  
serviços de saúde acessíveis, humanizados e bem equipados (Corrêa;  
Petchesky, 1996, p. 159).  
Essa análise auxilia inclusive a tecer uma crítica ao próprio conceito de “direito  
reprodutivo”, que já em sua concepção - sob a ótica liberal -, situa esse direito no campo da  
liberdade privada e das escolhas individuais. Porém, sob a perspectiva crítica, entende-se que a  
liberdade enquanto valor ético central depende de condições objetivas para seu exercício,  
mediante atendimento das necessidades sociais que são mais amplas do que apenas a regulação  
da fecundidade, e perpassam tanto por aspectos gerais da saúde da mulher (morbimortalidade  
materno-infantil, violência sexual, IST), quanto pelas condições estruturais que balizam as  
decisões sexuais e reprodutivas, tais como pobreza, analfabetismo, não acesso à renda, falta de  
estrutura sanitária, dentre outros. Dessa forma, direitos reprodutivos extrapolam o campo das  
liberdades individuais, e envolvem também a esfera dos direitos sociais e coletivos e a  
responsabilidade do poder público (Corrêa; Petchesky, 1996).  
Fernandes et al. (2022) explicam que ações intersetoriais no âmbito do SUS são  
estratégias para superar a fragmentação gerada pela setorização administrativa e disciplinar das  
políticas sociais, o que propicia enfrentamento de algumas questões de saúde de forma efetiva  
e integral, ancorada num pensamento sistêmico e interdependente. Nessa lógica, em 2007 foi  
instituído pelo governo federal o Programa Saúde na Escola (PSE), com o objetivo de contribuir  
para a formação integral dos alunos da educação básica da rede pública por meio de ações de  
prevenção, promoção e atenção à saúde. A articulação entre escola e atenção primária é o pilar  
da política, e dentre as ações previstas estão as de promoção da saúde sexual e da saúde  
reprodutiva (Brasil, 2025).  
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Apesar do início da vida sexual ser predominantemente na adolescência, Bezerra et al.  
(2018) explica que a procura pelos serviços de saúde (tanto para orientações quanto para uso  
de métodos contraceptivos) ocorre em média 1 ano após o início das relações sexuais. Esses  
dados mostram a importância da quebra de tabus e da educação sexual para a juventude.  
O último recenseamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística  
(IBGE), em 2022, mostra que houve uma queda na taxa de natalidade no grupo de mulheres  
abaixo de 20 anos (12,1%) se comparado com o ano de 2000 (21,6%) (Agência IBGE, 2024).  
Porém, de acordo com Sousa et al. (2024), ainda que os dados epidemiológicos evidenciem  
redução das taxas de gravidez na adolescência, ainda assim é uma questão de saúde pública a  
ser enfrentada. Aliás, no que se refere ao exercício da sexualidade na adolescência, não é apenas  
Waleska Matheus Rosa  
a dimensão da gravidez e uso dos métodos contraceptivos que deve ser alvo de intervenção por  
parte dos profissionais de saúde, devendo perpassar também pela dimensão das questões de  
gênero, diversidade sexual, consentimento, tipos de violência, prevenção de IST, a fim de que  
os adolescentes desenvolvam “(...) habilidades relacionais e afetivas no processo de construção  
da autonomia juvenil, dimensões fundamentais que permitem ao jovem reconhecer e articular  
desejos e limites sexuais, e a aprender a se antecipar e se preparar para os atos sexuais” (Cabral;  
Brandão, 2020, p. 2).  
Por iniciativa da residência, no último trimestre de 2024 foi feita uma articulação com a  
escola municipal do território de abrangência da UBS e proposto à coordenadora pedagógica a  
realização de um grupo de direitos reprodutivos com os alunos da EJA8 (Educação de Jovens e  
Adultos). Na ocasião a profissional solicitou que a atividade fosse estendida aos alunos do 9º  
ano (cerca de 14 anos), justificando que a maioria dos adolescentes era sexualmente ativa, e,  
portanto, as temáticas deveriam ser gravidez na adolescência e métodos contraceptivos. Essa  
solicitação revela uma tentativa de transportar para o ambiente escolar a lógica biologizante  
que já é reproduzida nos serviços de saúde e na sociedade. Contraditoriamente, pediu que não  
fosse abordado sobre prevenção de ISTs nem mesmo através de imagens ilustrativas.  
Devido às restrições impostas pela profissional, seria necessário mais tempo para estudo  
e elaboração de estratégias diferenciadas para que o plano de trabalho fosse aceito. Por isso, a  
princípio, colocamos a proposta para o 9° ano em standby e priorizamos o plano de trabalho da  
EJA. Nesta proposta além dos aspectos biológicos e fluxos de atendimento para acesso aos  
métodos contraceptivos, contemplava informações sobre os serviços disponíveis na rede  
pública municipal, como o Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) - que oferece  
testagem gratuita, aconselhamento e intervenções biomédicas (PrEP e PEP) nos casos de ISTs  
-, breve elucidação sobre a possibilidade de entrega voluntária para adoção, além de uma  
dinâmica para reflexão sobre os tipos de violência contra a mulher. Após revisão do plano de  
trabalho pela supervisão da UBS a proposta foi encaminhada, mas devido ao calendário escolar,  
a atividade não foi realizada.  
980  
Considerações finais  
Dentre as pautas reivindicatórias do movimento feminista acerca dos direitos sexuais e  
reprodutivos, nota-se que apenas o aspecto da regulação da fecundidade parece ter sido  
absorvido pelas equipes responsáveis pela atenção primária consideradas aqui. Além da ênfase  
8 A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade de ensino destinada às pessoas que não tiveram acesso  
ao ensino básico na idade preconizada, ou interromperam os estudos (Brasil, 1996).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 968-986, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Planejamento reprodutivo na Atenção Primária à Saúde: um relato de experiência  
na contracepção e prevenção de ISTs, baixa adesão do público masculino e da população jovem,  
conforme apontado na breve revisão de literatura acima, aponto como falhas e entraves no  
manejo das vivências sexuais e reprodutivas no cenário de prática aspectos como a ausência de  
abordagem das questões de gênero e sexualidade, tais como o direito à autonomia e integridade  
do corpo (e as possíveis violações - violência física, psicológica, sexual, patrimonial, moral e  
obstétrica), aborto legal, identidade de gênero e diversidade sexual.  
Ao analisar o acolhimento em si, avalio necessidade de revisão do instrumento (ficha).  
São feitas algumas perguntas gerais para conhecer o perfil do usuário e 2 dimensões  
fundamentais da vida dos sujeitos não são abordadas: identidade de gênero e religião -  
elementos importantes também para conhecer o público atendido e traçar as melhores  
estratégias de abordagem.  
Embora o trabalho grupal seja uma estratégia com potencial contributivo para  
universalização do direito à saúde mediante ações de promoção e educação em saúde, o GDR  
especificamente apresenta duas faces: a da educação em saúde em si e da burocratização, uma  
vez que independentemente do método contraceptivo almejado (DIU, laqueadura ou  
vasectomia) ao fazer o requerimento junto à atenção especializada é exigido do usuário a  
declaração de participação do grupo (ou da orientação individual), bem como o  
encaminhamento. Consequentemente, um aspecto observado é que os próprios usuários  
encaravam a participação apenas pelo viés da obrigatoriedade, e não como um processo de  
educação em saúde. Um cenário recorrente era o usuário participar do encontro, mas não usar  
daquele espaço coletivo para sanar as dúvidas (principalmente as relacionadas sobre a  
realização dos procedimentos), e posteriormente levarem para o Serviço Social os  
questionamentos de vários assuntos que foram abordados.  
981  
Um dos desafios colocados é conseguir transformar esse espaço - que estruturalmente  
adota uma forma engessada (com temas pré-determinados), centrada na perspectiva biológica,  
em algo que desperte o interesse da população em ter uma participação ativa, alinhada com a  
perspectiva de educação popular em saúde. Uma alternativa é a busca por construção de uma  
nova abordagem pedagógica que agregue pautas da contemporaneidade, pois, uma vez que a  
realidade é dinâmica, as formas de abordagem sobre ela devem acompanhar esse processo e  
propiciar reflexões para além do imediato. Quanto a isso, Bergamasquini et al. (2021) sinalizam  
a importância da APS enquanto espaço privilegiado da assistência pela sua inserção no  
território, o que permite tanto o conhecimento sobre a realidade social dos sujeitos, quanto dos  
determinantes e condicionantes de saúde, e identificação das necessidades específicas da  
Waleska Matheus Rosa  
população. Portanto, observar essas interações pode propiciar a construção de uma nova forma  
de abordagem.  
Embora haja um grupo específico para tratar sobre direitos sexuais e reprodutivos, a  
temática não precisa se restringir a esse espaço. Uma vez que há baixa adesão dos homens para  
essa demanda, é possível pensar em estratégias como por exemplo, estabelecer parcerias com  
as empresas no entorno da UBS e inserir as temáticas nas salas de espera, uma vez que na UBS  
em questão eram realizadas todos os dias nos turnos da manhã e tarde, porém, com temas pré-  
estabelecidos pela supervisão.  
Apesar da residência multiprofissional em saúde ter potencial para contribuir na  
articulação entre as profissões, reafirmar a integralidade das ações em saúde e promover novas  
reflexões e concepções sobre os fazeres profissionais e multiprofissionais - suscitando algumas  
mudanças tanto para os serviços de saúde quanto para as práticas de ensino -, muitas vezes  
esbarramos em desafios estruturais e conjunturais que dificultam estas articulações e  
aprendizagens.  
O processo de construção do trabalho em equipe interprofissional é  
atravessado pelos desafios da comunicação e dificuldades de diálogo, a  
disputa de interesses profissionais, as múltiplas experiências — tanto  
profissionais quanto pessoais, que interferem na conformação do trabalho —,  
dificuldades de compartilhar saberes, relações de poder, conflitos, projetos  
políticos distintos, entre outros (Bergamasquini et al., 2021, p. 6).  
982  
Se tratando especificamente do GDR na Atenção Primária, um dos entraves observados  
foi a dificuldade de permeabilidade na proposição de algumas temáticas junto à equipe, que na  
concepção de alguns profissionais são vistas como “polêmicas” ou “desnecessárias”, como por  
exemplo, aborto legal, orientação sexual e diversidade de gênero. Um dos princípios do Código  
de Ética Profissional do Assistente Social é a defesa intransigente dos direitos humanos (Brasil,  
1993), logo, é parte do trabalho pelo menos tentar tensionar o debate sobre essas questões - o  
que é uma forma de reafirmar o compromisso com o projeto ético político. Ao atuar com  
políticas públicas, o foco deve ser a garantia de direitos do usuário, portanto, independente da  
categoria profissional, dogmas e crenças individuais não devem nortear a atuação.  
Vale ressaltar que esse conservadorismo/ resistência não se restringe ao âmbito da saúde,  
e faz parte de uma tendência neoconservadora que se espalhou a nível mundial com o  
crescimento da extrema direita9, e no Brasil houve um boom principalmente no Governo  
Bolsonaro (2019- 2022), mas que ainda na atualidade deixa resquícios. Por isso é primordial  
9
Essas mudanças estão inscritas no processo de crise estrutural do capital e se desenvolvem com características  
próprias em cada país e conjuntura. Essa rearticulação política cria novas ideologias resgatando ideários fascistas  
e conservadores, como neofascismo e neoconservadorismo (Barroco, 2022).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 968-986, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Planejamento reprodutivo na Atenção Primária à Saúde: um relato de experiência  
que a formação não se restrinja à dimensão assistencial do trabalho do assistente social no SUS,  
e haja a integração ensino/serviço, promovendo a articulação entre os atores envolvidos na  
residência (tutores, residentes e preceptores), visando superar a dicotomia entre o processo de  
ensino e a prática do cuidado em saúde (Closs et al., 2012 apud Castro; Dornelas; Zschaber,  
2019).  
Apesar dos aspectos pontuados ao longo deste trabalho, a residência multiprofissional é  
um espaço com potencialidades, e talvez uma das maiores seja o caráter propositivo para  
algumas temáticas e a forma de se fazer e pensar a saúde pública. Neste sentido, considerando  
a precocidade da experiência da residência neste território, esperamos que este relato possa  
ajudar a pensar os desafios para superá-los numa perspectiva a longo prazo.  
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986  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 968-986, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Mas é preciso ter força, é preciso ter raça, é  
preciso ter gana sempre”: entrevista com a  
Assistente Social Luiza Erundina de Sousa  
Maria Lúcia Duriguetto*  
Maria Beatriz Costa Abramides**  
Maria Rosângela Batistoni***  
...os textos de Luiza Erundina estão “molhados” e não apenas salpicados de  
esperança. É que não há esperança fora da luta, da busca, do empenho de  
mudar, de refazer, de recriar, de reinventar. Não há esperança na pura espera,  
na inação de quem cruza os braços e, perdendo o desejo do sonho, submerge  
no fatalismo imobilista” (Paulo Freire – Prefácio do livro Exercício da Paixão  
Política).  
Luiza Erundina nasceu em Uiraúna, no sertão da Paraíba, no dia 30 de novembro de  
1934. De uma família numerosa de dez irmãos, cursou metade do curso de Serviço Social na  
Faculdade de Campina Grande e a outra metade na Faculdade de Serviço Social de João Pessoa,  
onde concluiu o curso em 1966. Nessa entrevista1, nosso foco foi que nos falasse de seu trabalho  
como Assistente Social desenvolvido na Paraíba e na Prefeitura Municipal de São Paulo (entre  
1967-1981), da sua militância e trabalho sindical como presidenta da Associação Profissional  
dos Assistentes Sociais de São Paulo (APASSP) entre 1978-1981, e do trabalho acadêmico  
como docente de Serviço Social em Faculdades da cidade e do Estado de São Paulo (1977-  
1981)2.  
* Universidade Federal de Juiz de Fora. E-mail: maluduriguetto@gmail.com  
** Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. E-mail: biabramides@gmail.com  
*** Universidade Federal de São Paulo. E-mail: rosangelabatistoni@gmail.com  
1
Entrevista realizada no contexto da pesquisa de pós-doutorado intitulada “A relação do Serviço Social com as  
lutas sociais no Brasil nas décadas de 1970-1990: reflexões sobre a questão da natureza da dimensão ético-política  
profissional. Premissas analíticas”, de Maria Lúcia Duriguetto (Bolsista produtividade (PQ) CNPq), realizada no  
Programa de Pós-Graduação da PUC-SP (2023-24) sob a orientação da Professora Maria Beatriz C. Abramides  
(Bolsista produtividade (PQ) CNPq). A entrevista com Luiza Erundina de Sousa foi realizada no dia 14/11/2023,  
na cidade de São Paulo, com duração de 2h13min. Foram entrevistadoras as Professoras Maria Lúcia Duriguetto,  
Maria Beatriz C. Abramides e Maria Rosângela Batistoni.  
2
Essas inserções foram desenvolvidas, portanto, antes de Erundina se tornar vereadora pelo Partido dos  
Trabalhadores (PT) pelo município de São Paulo, em 1982. Chamamos a atenção que alguns relatos dos trabalhos  
profissionais, sindicais e de docência feitos na nossa entrevista são reforçados e ampliados por outros depoimentos  
dados por Erundina e pelo conteúdo do seu livro autobiográfico (Sousa, 1991). Também, explicitamos informações  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.51146  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 28/11/2025  
Aprovado em: 15/12/2025  
Maria Lúcia Duriguetto; Maria Beatriz Costa Abramides; Maria Rosângela Batistoni  
Entrevistadoras: Erundina, essa entrevista visa contribuir para desocultar a  
contribuição que segmentos da categoria de assistentes sociais tiveram no sentido de apoiar as  
lutas populares, de apoiar suas demandas, suas reivindicações, em um momento conjuntural  
quente aqui em São Paulo, que foi a segunda metade da década de 1970 e toda a década de  
1980. Então, estamos fazendo uma entrevista com as profissionais que estabeleceram relação  
com os movimentos sociais, defendendo suas reivindicações nos espaços institucionais em que  
atuavam.  
Luiza Erundina: Eu tinha um vínculo com a defesa da terra, com a população  
camponesa como assistente social... Eu vim para São Paulo para fazer o mestrado em Ciências  
Sociais, na Sociologia Política de São Paulo (19681969)... sobre uma experiência que eu vivi  
como Assistente Social na periferia de João Pessoa... com foco muito forte nas comunidades  
locais, numa visão muito inspirada na Teologia da Libertação... No meu caso, não tinha um  
vínculo muito pessoal com a Igreja não; eu sou católica, mas, naquele momento, era mais uma  
militância política, não partidária, trabalhando como assistente social junto aos camponeses  
primeiro, depois à população pobre da periferia e com a dimensão política da profissão.  
E havia um questionamento, na época, em que nós, Assistentes Sociais o Serviço  
Social éramos uma profissão descolada, desligada da luta concreta e das condições políticas  
que existiam na época, que era a ditadura militar, fortemente prendendo trabalhador, cassando  
mandatos de dirigentes sindicais. Então, naquele momento, algumas de nós descobrimos que a  
profissão carecia de uma dimensão política. O que se pregava nas Faculdades chamadas  
ascéticas era que a profissão tinha que ser neutra, tinha que ser ascética para poder garantir o  
caráter científico da profissão. Isso não tinha nada a ver com o que a gente tentava fazer como  
Assistente Social junto aos camponeses e junto à população pobre dos centros urbanos. E aí se  
conseguiu articular um grupo de profissionais (Erundina aqui já trata do período em que chega  
em São Paulo) que estava saindo da Faculdade, particularmente da PUC. Aí estavam a Bia3, a  
Celinha4, a Chana5... Esses novos profissionais que já vinham com um engajamento político —  
não em partido, porque os partidos estavam proibidos de existir mas havia as tendências,  
sobretudo daqueles que estavam voltando do exílio. E, então, algumas de nós, Assistentes  
Sociais, não aceitávamos essa pecha de que o Assistente Social era neutro, que não tinha que  
ter posicionamento político nenhum, que isso comprometeria o caráter racional e científico da  
988  
que achamos necessárias serem dadas em relação à alguns fatos mencionados por nossa entrevistada. Todas as  
informações acrescentadas se encontram em notas de rodapé.  
3 Maria Beatriz C. Abramides, assistente social do Inocoop à época.  
4 Célia Fernandes Vilarinho Peres, assistente social à época do Hospital do Servidor Público Estadual.  
5 Chana Viner, assistente social à época da Prefeitura Municipal de Osasco.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 987-1005, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Mas é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre”:  
entrevista com a Assistente Social Luiza Erundina de Sousa  
profissão, e nós recusamos aceitar essa avaliação e esse critério. Mas isso, cada uma de nós  
sofrendo essa crítica, e foi a necessidade de nos organizarmos para enfrentarmos esse  
preconceito contra nós: que o Assistente Social era para resolver os problemas dos pobres que  
o governo criava o governo da época, o sistema econômico da época criava e nós,  
Assistentes Sociais, devíamos ir lá para pormos panos mornos entre os conflitos e as  
contradições. E alguns de nós nos recusamos a incorporar essa avaliação e deixar barato, e aí  
nós tivemos um momento de reflexão entre nós.  
Não dava para pensar em fazer isso com os profissionais no seu todo, muito menos a  
partir de uma Faculdade ou de alguma entidade ligada ao Serviço Social, porque não havia —  
e as que havia não eram no sentido de evoluir, no sentido de assumir a dimensão política da  
profissão. A gente entendia que a neutralidade político-ideológica favorecia os que não queriam  
mudança nenhuma; pra eles estava tudo bem, estava tudo bom. Para resolver os problemas da  
fome, da pobreza, do desemprego, o trabalhador estava despreparado para enfrentar a  
conjuntura, e a profissão teria que estar junto, ajudando o trabalhador individualmente a superar  
as dificuldades, e não focada nas causas estruturais do regime político, do sistema político e do  
regime de governo, que era a ditadura militar.  
E nós, trabalhando em órgãos públicos... então nós vimos que tínhamos que nos  
organizar e nos assumir politicamente e coletivamente, para poder a gente preservar os espaços  
que a gente estava conquistando e ampliar esses espaços. E aí a gente viu que tinha que assumir  
a tarefa de contribuir com a organização política da profissão.  
989  
Depois do mestrado, eu voltei para lecionar para Assistentes Sociais na Universidade  
Federal da Paraíba, em 1971... frequentei as reuniões do Departamento de Ciências Sociais; iria  
assumir a cadeira de Ciências Sociais numa segunda-feira e, na sexta-feira, recebi o recado da  
Chefe do Departamento de que minha entrada na Universidade tinha sido vetada pelo regime  
militar, da divisão do regime militar lá da região, que havia determinado ao Reitor6...  
Entrevistadoras: Nesse momento você vai trabalhar com os camponeses, quando você  
não é contratada. Você já tinha um trabalho anterior, e você continua o trabalho com a derrota  
das Ligas Camponesas. Fale um pouco para nós deste trabalho.  
6 Erundina, depois que se formou em Serviço Social, teve experiência como professora na área de Serviço Social  
“como monitora, como auxiliar. Mesmo como estudante, eu já trabalhava junto a algumas cadeiras no curso de  
serviço social lá em João Pessoa”. Explica que “a Faculdade de Serviço Social ainda não era da Universidade,  
ainda era uma escola de uma congregação religiosa...Portanto, eu, como auxiliar de ensino, como monitora, ajudei  
em algumas cadeiras lá, ainda como estudante. Quando fiz Ciências Sociais, era para lecionar nos cursos da  
Universidade. E aí fui impedida pelos órgãos de segurança” (Sousa, 2002, p. 14).  
Maria Lúcia Duriguetto; Maria Beatriz Costa Abramides; Maria Rosângela Batistoni  
Luiza Erundina: As Ligas Camponesas foram destroçadas, numa violência enorme  
que ainda não se contou a sua verdadeira história, que teve um foco importante na Paraíba…  
Nós não éramos ligadas às Ligas Camponesas, nós entramos na relação com os que ficaram dos  
destroços do massacre... do Sapé7, e com o respaldo da Teologia da Libertação e da Pastoral da  
Terra da Arquidiocese da Paraíba, que era Dom José Maria Pires e Dom Helder Câmara, no  
Recife8. Era a igreja progressista... Toda aquela conjuntura do final do governo Goulart e o  
início da ditadura militar... teve uma presença muito forte da Igreja progressista, influenciando  
a política de educação e influenciando a política da terra... Era uma ação do nordeste, da igreja  
progressista, com os militantes políticos de esquerda que entraram na luta assumindo  
diretamente, concretamente, a dimensão política da militância. Fé e Política nasceu ali9.  
A fé sem política se ressente de sua eficácia, de sua importância, da sua oportunidade e  
da coerência... A fé sem política não é uma fé consequente, ou seja, uma fé transformadora.  
Portanto, tinha um vínculo cristão, católico, mas ao mesmo tempo tinha um braço político forte  
que associava a opção de fé com a ação política com vistas às reformas estruturais, as reformas  
de base que o Governo Goulart, o Celso Furtado e outros que estavam juntos estavam  
promovendo. Eles promoviam as reformas de base no sentido exatamente de enfrentar as  
injustiças, enfrentar as desigualdades, enfrentar, sabe, as consequências do capitalismo na sua  
forma mais atrasada, que tinha por base a propriedade da terra, apropriada individualmente,  
improdutivamente e excluindo os trabalhadores da terra e reforçando a migração campo-cidade.  
990  
7 As Ligas Camponesas do Sapé se referem ao núcleo das Ligas Camponesas que atuou na região do Engenho  
Sapé, localizado no município de Sapé, na Paraíba, sendo um dos núcleos mais importantes do movimento  
camponês entre o final dos anos 1950 e início dos anos 1960. Formadas por trabalhadores rurais (trabalhadores  
sem-terra, moradores de engenho, arrendatários e pequenos agricultores), as Ligas foram organizações de  
resistência às duras condições de vida e trabalho impostas pelos proprietários de terra na região do nordeste. No  
Sapé, as Ligas se organizaram para reivindicar direitos trabalhistas no campo, acesso à terra, fim de expulsões  
arbitrárias e reforma agrária. Com o golpe de 1964, as Ligas foram duramente reprimidas, e suas organizações –  
incluindo o núcleo do Sapé – foram desmanteladas. Consultar, por exemplo, Julião (1962), Medeiros (1987) e o  
Memorial das Ligas Camponesas (2025).  
8
Dom José Maria Pires, o “Dom Zumbi”, foi arcebispo da Paraíba (1965-1995) e Dom Hélder Câmara foi  
arcebispo de Olinda e Recife (1964-1985). Foram umas das principais vozes da Igreja Católica na defesa dos  
Direitos Humanos durante a ditadura e por justiça social no campo. Quando ambos assumiram seus arcebispados,  
as Ligas já haviam sido duramente desmanteladas e passaram a denunciar e condenar a violência sofrida pelos  
trabalhadores rurais (que eram assassinados, que enfrentavam expulsões, prisões e ameaças). Dom Hélder e Dom  
José ajudaram a preservar e transformar o legado das Ligas, impulsionando e apoiando novas formas de  
organização popular, como as Comunidades Eclesiais de Base, sindicatos, centros de formação e movimentos  
rurais que deram continuidade, de outro modo, à luta iniciada pelas Ligas.  
9 Fé e Política é uma corrente de reflexão e atuação dentro da Igreja Católica e de movimentos cristãos que surgiu  
na América Latina a partir dos anos 1960–1970, influenciada pela Teologia da Libertação. É um movimento que  
busca articular a vivência da fé com o compromisso social e político com as lutas contra as injustiças sociais, a  
conscientização política e o apoio a movimentos populares. Dom Hélder e Dom José foram grandes referências  
desse movimento.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 987-1005, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Mas é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre”:  
entrevista com a Assistente Social Luiza Erundina de Sousa  
Foi nesse momento, eu estava com essa atuação, que eu vim fazer o curso de mestrado (1968-  
69).  
Voltei em 1970 (para João Pessoa), e não fui lecionar porque fui vetada pelo regime  
militar, eu tenho inclusive ofício do Reitor... informando isso... e fiquei o ano de 1970  
trabalhando esse trabalho de igreja10, indo pro campo, indo com o bispo, porque se fosse sozinha  
era capaz de ser presa. Então, nós íamos no final de semana pra aquelas áreas cobertas que eles  
faziam no campo para conversar com os camponeses e pra tentar resgatar os trabalhadores que  
estavam dispersados com os destroços das Ligas Camponesas…  
O medo e a repressão foram tão fortes sobre eles que eles não se reconheciam mais  
como camponeses, como trabalhadores rurais e foi com esse núcleo que restou das Ligas  
completamente destroçadas, muito medo, muito trauma, a morte do Teixeira (faz menção ao  
documentário “Cabra Marcado para Morrer”) e a sua parceira Elizabete11. Com o apoio do  
bispo progressista Dom José e Dom Helder a gente tinha um certo respaldo pra tá trabalhando  
com os camponeses, não estávamos tão frágeis, tão expostas como Assistentes Sociais  
trabalhando com a igreja até um certo ponto...era um trabalho interdisciplinar, com  
profissionais de várias áreas…  
Eu voltei para ir lecionar na Universidade Federal da Paraíba e aí houve o  
impedimento... Então eu fiquei trabalhando como funcionária administrativa… no INPS... e  
sendo muito visada. Onde eu ia tinha um olheiro destes querendo ouvir o que eu estava fazendo  
e gravando minhas falas em algum lugar pra ir me detonar. Eu me lembro uma vez, eu estava  
fazendo uma palestra com trabalhadoras domésticas porque elas estavam querendo formar uma  
associação, nós estávamos juntas para que elas formassem aquela associação e no final da  
palestra, no final da sala, eu encontrei um jovem que morava vizinho a minha família lá no  
bairro e eu conhecia esse rapaz, a irmã dele estudou comigo no Colégio estadual… e como o  
Colégio era afastado, muitas vezes era o pai da Edna e desse rapaz que ia nos levar... porque  
era muito deserto… Então eu o conhecia como vizinho, ele estava lá no fundo da sala, ele me  
abordou, se aproximou de mim, se apresentou, eu sou o fulano de tal, irmão da Edna, moro  
991  
10 Um ano antes de cursar o mestrado e trabalhando no SANDU, Erundina vai passar férias em São Paulo na casa  
de parentes e faz um concurso para assistente social no INPS, sendo aprovada. Ficou o ano de 1970 trabalhando  
no INPS, em João Pessoa, em uma atividade administrativa e “militando como assistente social. Militava nos  
movimentos de mulheres, no trabalho com o trabalhador rural” (Sousa, 2002, p. 14).  
11  
Erundina se refere a Francisco Teixeira, que foi uma liderança das Ligas. Foi assassinado, em 1962, por  
latifundiários e grupos armados. Sua esposa, Elizabete Teixeira, também era militante e foi duramente perseguida,  
o que a obrigou a viver escondida durante todo o período da ditadura. O filme Cabra Marcado para Morrer, de  
Eduardo Coutinho, foi iniciado em 1964 e pretendia relatar a vida de Teixeira com a participação de Elizabete. As  
filmagens foram interrompidas no dia do golpe e parte do material foi apreendida. Coutinho retomou o filme entre  
1981–1984, agora como documentário sobre as lutas camponesas pré-64, o assassinato de Teixeira e a perseguição  
a Elizabete, seu sofrimento e o reencontro com os filhos. Link do documentário: https://youtu.be/yaOQ2Pyo15w  
Maria Lúcia Duriguetto; Maria Beatriz Costa Abramides; Maria Rosângela Batistoni  
vizinho a sua casa e eu trabalho para o regime militar e eu estou aqui pra gravar o que você tá  
falando pra levar... então ele declarou, assim meio sem jeito.  
Eu disse, olha você sabe as consequências disso pra mim e pra outras pessoas que  
eventualmente você segue levando informações...eu não faria esse trabalho… Então chegou um  
ponto que eu não tinha mais liberdade nenhuma, segurança em canto nenhum. Aí tinha uma  
amiga minha, irmã de caridade, que tinha um irmão que era membro do poder do 4º Exército lá  
em Recife e ela indagou dele qual era minha situação política diante das forças armadas...então  
ele falou pra ela que eu corria risco, que não era bom permanecer lá, que era melhor eu sair de  
lá, porque tinha problemas sérios, era mais seguro eu sair de lá...foi quando resolvi vir para São  
Paulo. Me lembro que eu não queria vir, queria continuar fazendo a luta lá pela Reforma Agrária  
e fui tomar o ônibus no Recife... até São Paulo. Já tinha estado lá fazendo o curso, e voltei como  
Assistente Social, como funcionária do INPS12... Então eu fui de ônibus para São Paulo...essa  
religiosa que era minha amiga foi me levar na rodoviária, eu muito magoada, chorando, eu senti  
como se eu tivesse deixado a luta para trás…  
Cheguei em São Paulo (em 28 de janeiro de 1971), eu odiava essa cidade… São Paulo  
era muito frio e eu não tinha roupa adequada para o inverno... me lembro do frio que eu sofria.  
Eu trabalhava durante o dia...6hs fazendo cálculos... para benefícios para o trabalhador,  
trabalho... burocrático…  
992  
Aí comecei a dar aula na Faculdade Paulista de Serviço Social, na Faculdade de Serviço  
Social das Faculdades Metropolitanas Unidas e na Pontifícia Universidade Católica (todas em  
São Paulo); no interior do estado, em que voltava na mesma noite, de ônibus: Universidade de  
Taubaté (UNITAU); Faculdade Paulista de Serviço Social de São Caetano do Sul, e na  
Universidade Católica de Santos, em Santos. Então eu fiquei dez anos lecionando em diferentes  
Faculdades.  
Aí eu entrei na luta política através dos estudantes, que já estavam resistindo aos  
currículos tradicionais...os alunos fizeram greve e nós, professores, fizemos greve juntos, aí  
eles nos demitiram...13  
12  
Erundina pediu transferência como administrativa do INPS para trabalhar em São Paulo. Ela já “tinha feito o  
concurso de assistente social, estava bem classificada, então era certo o meu aproveitamento como assistente social  
do INPS. Só que eles me colocaram num órgão de contabilidade, para fazer cálculos custo-benefício... Deve ter  
sido por limitações políticas, o fato de eles não terem me aproveitado como Assistente Social. E me lembro que  
me obrigavam a fazer cálculos, a fazer horas extras fazendo cálculos de serviços. Era uma agonia!” (Sousa, 2002,  
p. 16).  
13 Erundina foi demitida da Faculdade Paulista de Serviço Social depois de nove anos de trabalho “... porque nós  
nos aliamos aos estudantes numa greve interna para repensar o currículo, para repensar a formação profissional”  
(Sousa, 2002, p. 22).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 987-1005, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Mas é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre”:  
entrevista com a Assistente Social Luiza Erundina de Sousa  
Entrevistadoras: E você também, neste período, já estava na luta no trabalho  
profissional. Você passa no concurso público em 1971 na Secretaria de Bem-Estar Social da  
Prefeitura de São Paulo (Sebes) e vai trabalhar nas favelas14.  
Luiza Erundina: Eu fiz um outro concurso e a prefeitura me chamou logo em  
seguida...e me puseram para trabalhar nas favelas e nos cortiços e aí que foi que eu me descobri  
em São Paulo. Porque quem eu fui encontrar nas favelas? Os trabalhadores rurais que não  
tinham mais condições de trabalho e viam para a cidade grande, não exatamente os mesmos,  
mas havia gente do nordeste, do interior de São Paulo. O fluxo migratório campo-cidade  
intensificou-se naquele período pela mudança da política agrária do governo, enfim, então eu  
fui para as favelas.  
Aí eu percebi, havia poucas favelas na época porque a repressão sobre as ocupações era  
muito grande, e as ocupações se faziam de madrugada, uma a uma, família por família. Elas  
estavam chegando, não tinham onde morar, não iam para debaixo de viaduto ainda...então  
encontravam um vazio na cidade, um espaço e de madrugada montavam um barraco e entravam  
para dentro... A partir do dia seguinte ia crescendo, e ia se criando os núcleos de favela, foi  
onde a gente atuou como Assistente Social.  
E eu, tendo uma identidade muito direta com a situação deles e com eles, porque  
estavam vindo expulsos pelo latifúndio, estavam vindo do campo para a cidade e chegavam  
aqui não tinham onde morar, muito menos trabalho, não tinham a formação para o trabalho  
urbano, na indústria. Não tinham, porque estavam vindo do campo, portanto numa precariedade  
muito grande.  
993  
O primeiro problema que enfrentavam, além do emprego, era o de não terem onde  
morar... eu, desde o início com outras colegas, acompanhamos essa construção, esse  
crescimento do fenômeno de favelas na cidade, favelas e cortiços, e foi rápido porque foi um  
14  
A Sebes foi transformada em Coordenadoria do Bem-Estar Social (Cobes) em maio de 1977, criando a  
descentralização do órgão e a criação de Supervisões Regionais de Serviço Social (Surss). Erundina integrou a  
Surss da zona norte, a partir de 1978, na área de habitação. As diretrizes de trabalho de ação da Surss eram  
compreensão da realidade regional, criação de uma metodologia comum de trabalho social junto à população da  
área regional que tinha como estratégia a mobilização e participação popular. Em 1979, como representante da  
Surss, Erundina foi convidada pela direção da Cobes para a elaboração de uma proposta de trabalho junto a  
representantes de outros órgãos da prefeitura. A proposta não foi oficializada devido ao esquema montado para  
apoiar a candidatura do então prefeito biônico Reynaldo de Barros ao governo do Estado de São Paulo,  
transformando a Cobes em seu cabo eleitoral. Técnicos capacitados foram afastados, Assistentes Sociais perderam  
emprego e lideranças de movimentos populares cooptadas. “Ainda passei por outras experiências na Cobes. Tive  
oportunidade de compreender as limitações impostas pela instituição com o fim de impedir a realização de um  
trabalho comprometido com os interesses dos trabalhadores. Compreendi ainda que o profissional competente e  
realmente comprometido com os interesses dos trabalhadores, se está sozinho, não é capaz de reorientar uma  
prática institucional. Para superar as limitações, temos que ampliar e criar novos espaços de atuação, assumindo,  
ao mesmo tempo, clara posição política diante da realidade social” (Sousa, 1991, p. 69).  
Maria Lúcia Duriguetto; Maria Beatriz Costa Abramides; Maria Rosângela Batistoni  
período que se intensificou o fluxo migratório campo-cidade... e aí os núcleos de favelas  
começaram a crescer e a se formar. A repressão policial e de governo se dava com muita força  
e aí nós fomos de novo visadas por estarmos juntas com eles nos momentos de despejos.  
Ficávamos ao lado deles enfrentando a repressão policial e como funcionárias da prefeitura.  
E eles queriam que nós, Assistentes Sociais da prefeitura, ao invés de estarmos lá  
apoiando, defendendo os trabalhadores - sem terem onde morar - da repressão policial, nós  
tínhamos que convencê-los a sair e tendo uma ajuda financeira para dar a eles, uma passagem  
de volta de onde eram e alguma coisa para comer durante o caminho. Houve um decreto do  
Paulo Setúbal, que era prefeito da cidade, criando essa função para nós15. Aí foi a primeira vez  
que nós nos rebelamos, nós que estávamos sobrevivendo na cidade sob os olhos da ditadura, da  
repressão a nós, mas como funcionárias públicas.  
A condição de funcionárias públicas nos dava acesso aos problemas, à população, às  
comunidades e as condições de sobrevivência nossa. Mas o compromisso da luta pela questão  
da terra, o direito a trabalhar e viver da terra e a terra pra morar... Eu descobri na luta que tinha  
que estar aqui mesmo… Eu tinha uma identidade muito forte porque eu trouxe de lá a razão de  
ser, o meu compromisso com a democratização da terra no campo, a mesma coisa a  
democratização da terra na cidade.  
E aí foi o vínculo mais forte, político, que se criou entre, no meu caso e outras pessoas  
que trabalhamos juntas, com as favelas, os cortiços, com a população das periferias, que crescia  
assustadoramente...as ocupações já não se davam só individualmente, se davam por grandes  
grupos de pessoas e a resistência era mais forte, consequentemente, a repressão era mais forte…  
A gente lá tentando evitar a repressão policial. O Adão morreu num despejo de favela  
na zona leste... Era um ocupante de terra que resistiu à expulsão, ao despejo, e nós tentando  
negociar com a polícia. Tinha alguns advogados que estavam na nossa equipe que  
também ajudavam a encaminhar junto à justiça, protelando a hora de despejar para poder juntar  
gente, organizar melhor a luta.  
994  
Aí nasceu o grande movimento de favelas e de cortiços pelo direito à terra na cidade pra  
morar e esse movimento foi tão forte que ensejou a organização política dos Assistentes Sociais,  
que trabalhavam com esse fenômeno.  
15  
Erundina se refere ao Decreto Municipal n.15.086 de junho de 1978 do prefeito biônico Olavo Setúbal. “O  
decreto determinava o uso da força policial e a intervenção de assistentes sociais através da Unidade de Supervisão  
Regional de Serviço Social (Surss)...para impedir a ocupação das áreas vazias na cidade para deter o crescimento  
das favelas”. Erundina, em outra entrevista, elucida: “Então, ia o assistente social, junto com o policial, levando  
uma ajuda para o aluguel de três meses, ou para a construção de um barraco, ou a compra de um terreno... Alguém  
que tivesse um terreno, um parente que tivesse um terreno para ajudar a construir uma casa, ou então, dar passagem  
de volta para as pessoas que estavam chegando...” (Sousa, 2002, p. 18).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 987-1005, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Mas é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre”:  
entrevista com a Assistente Social Luiza Erundina de Sousa  
A gente viu que não dava mais só como funcionária da prefeitura, Assistente Social que  
trabalhava na prefeitura, dar condições e ação política nossa sem que isso implicasse na nossa  
eliminação, na demissão. Não só eu, outras companheiras. Aí veio a ideia da gente reativar a  
Associação Profissional dos Assistentes Sociais, que estava desativada há sete anos.16  
Aí foi o nosso trabalho, veio a Celinha, a Chana, a Bia, me convencer pra que eu  
assumisse a presidência da Associação, que seria reativada17... Eu não estava interessada em  
fazer militância sindical naquele momento, estava interessada em continuar a luta na cidade...  
usando a profissão, mas percebendo os limites e as determinações que faziam com que a  
profissão não iria muito a frente… que não iríamos resistir por muito tempo só como  
profissionais.  
Aí veio a ideia da Associação Profissional, era um outro espaço que a gente criava pra  
onde a gente levava a discussão da luta pelo direito de morar, terras ociosas na cidade, a  
repressão nos despejos 18. E o governo, também, começou a nos vigiar, a nos perseguir, enfim,  
era de novo a resistência ao regime militar a partir da ação profissional, mas ação profissional  
com uma dimensão político-sindical...onde vieram outros profissionais, outras associações,  
vieram e se juntaram a nós nesses momentos de stresse e de conflito e de confronto com o  
governo, com o regime.  
Era um espaço mais independente e, ao mesmo tempo, apoiado por mais entidades,  
profissionais de outras áreas… E os próprios favelados também começando a discutir, perceber  
as causas dos seus problemas, começaram, também, a se organizar e a exigir que os  
profissionais também se organizassem.  
995  
16  
Isso foi em 1977. Mas já no ano de 1968, houve tentativas de reorganizar a Associação por parte de alguns  
profissionais com o apoio do movimento estudantil por meio da realização de assembleias. Entretanto, com a  
promulgação do AI-5 em dezembro deste ano, esse processo de reativação foi impedido, assim como associações  
e entidades sindicais profissionais em todo o país. Esse processo ainda necessita ser investigado.  
17  
“Lembro-me que era um pessoal que tinha saído da PUC, recém-formado. Eu já tinha bastante idade, já era  
formada há muito tempo, mas eles me procuraram para dar condições de representatividade junto à categoria na  
reativação da APASSP. Então, eram jovens. Era a Chana, a Socorro - que trabalhava no INAMPS -, tinha um grupo  
grande de pessoas… a Celinha… Enfim, eram jovens que estavam saindo do curso de Serviço Social da PUC e  
que tinham vínculos com, por exemplo, a Convergência Socialista, com grupos clandestinos e que, no Serviço  
Social, viam como instrumento reativar a Associação. E eu estava junto com eles na APASSP” (Sousa, 2002, p.  
17).  
18 “E aí nós nos rebelamos – nós da APASSP – contra esse decreto e dissemos que não íamos cumpri-lo. Isso em  
plena ditadura...Aí, chamamos a população favelada para dizer: olha, esse decreto é para tirar vocês das áreas em  
que vocês estão, além de impedir que ocupem outras. Portanto nós estamos sendo ameaçados de demissão, de  
enquadramento na Lei de Segurança Nacional etc. Então vamos juntos tentar resistir a essa ordem, a esse decreto”.  
Sousa (2002, p.18). Um debate sobre essa questão foi promovido pela APASSP com moradores de favelas,  
representantes de movimentos sociais e de outras categoriais profissionais, dando “início ao processo de  
organização dos moradores das favelas...depois surgiam as Associações de Moradores de Favelas, que passaram a  
dirigir o movimento de forma autônoma ...” (Sousa, 1991, p. 77-78).  
Maria Lúcia Duriguetto; Maria Beatriz Costa Abramides; Maria Rosângela Batistoni  
Eles não entendiam, depois de um certo tempo que a gente os convencia a se formarem  
com suas comunidades para resistir, a luta, eles não entendiam que nós não tivéssemos também  
a nossa organização. Isso nos formava também, nos levava também, nós, também, tínhamos  
questões profissionais nossas que requeriam uma ação política em defesa de nós, porque somos  
trabalhadores. Nunca a profissão se colocava para si mesmo a condição de trabalhador  
assalariado, os profissionais se achavam profissionais liberais. Coisa nenhuma, eram  
assalariados, explorados tanto quanto e que precisavam se organizarem, conscientizarem da sua  
posição de opressão, de injustiça, de desigualdade.  
Também isso contribuiu para que os profissionais começassem a se interessar pela  
militância sindical através da Associação Profissional… Então a profissão começou a se  
politizar, a profissão era tida mesmo como profissão a pretexto de ser técnica, científica, não  
pode ter opção ideológica, falar em política19... então a gente rompeu com tudo isso… e essa  
ruptura se deu definitivamente no Congresso (de 1979).  
Entrevistadoras: Neste contexto mesmo como é que era esse trabalho (na SEBES)  
junto com a docência?  
Luiza Erundina: Eu continuei lecionando nas escolas no horário que não era o do  
trabalho na prefeitura20.  
Entrevistadoras: Luiza, duas perguntas ligadas. Você era Assistente Social, docente e  
militante sindical. Como é que esse conteúdo, essa prática, essa relação com os movimentos  
sociais vieram para os conteúdos (se veio, como veio), para o ensino nos espaços em que você  
estava? E, situe para nós, elementos da pressão interna que esse movimento da categoria  
produziu no âmbito da Secretaria de Bem-Estar Social. Teve o Congresso que é emblemático,  
mas também tem muito mais coisa aí.  
996  
19  
Segundo Erundina, “a diretoria da APASSP estava decidida a contribuir no processo de mobilização e  
organização da categoria” por meio de realização de atividades e lutas que envolveram profissionais do estado de  
São Paulo e de todo o país. Lembra que um “número significativo de profissionais e estudantes de Serviço Social  
compareceu ao painel intitulado “O papel do assistente social frente à realidade brasileira” em 1978, em  
comemoração ao dia da profissão no teatro TUCA da PUC-SP. Sousa (1991, p. 76). Explicita: “Reativamos a  
APASSP, e fiquei três anos como presidente (1978-1981), participando de todas as lutas de resistência”. Na greve  
geral dos servidores públicos do estado e do município, em abril de 1979, Erundina era do comando de greve como  
Assistente Social da prefeitura e como presidenta da APASSP, e em alguns momentos, assumiu a liderança da  
greve, que durou mais de um mês. AAPASSP, também, esteve presente na Comissão Permanente de Mobilização  
no apoio aos trabalhadores metalúrgicos em greve no ABCD (em 1979), no Comitê de Solidariedade aos  
Metalúrgicos em greve no ABC e, desde 1978, compôs a coordenação geral do Comitê Brasileiro de Anistia.  
20  
Nesse tempo, Erundina lecionava nas Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU), uma instituição privada:  
“Lembro-me que, a cada ano, os estudantes me convidavam para ser paraninfa, e meus discursos eram gravados.  
Em seguida, eu era chamada na diretoria para explicar meus discursos. E os estudantes… faziam um abaixo  
assinado exigindo a minha volta no ano seguinte, porque eles sabiam que se eles não fizessem isso, se não me  
sustentassem, eles me demitiriam” (Sousa, 2002, p. 23).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 987-1005, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Mas é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre”:  
entrevista com a Assistente Social Luiza Erundina de Sousa  
Luiza Erundina: Antes de trabalhar nas favelas, eles me puseram para coordenar o  
MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização), que era de responsabilidade da  
prefeitura... e tinha uma equipe muito boa... gente tocada pela luta também… Eu coordenando  
a equipe… algumas delas politizadas…  
Quando estudava, a gente adotava o método Paulo Freire no campo, alfabetizando  
trabalhadores… esses profissionais conheciam e trabalhavam com o método Paulo Freire. Aí  
veio a obrigatoriedade do livro do MOBRAL, que era o livro da Abril21, com método de  
alfabetização de adultos mais antigo do mundo e generalizado para todo o país… Dissemos:  
vamos elaborar apostilas com o método Paulo Freire, nós não vamos usar os textos da Abril,  
mas isso tínhamos que fazer clandestinamente porque se a gente fosse pego era grave. Nós  
passamos a alfabetizar com o método Paulo Freire através de apostilas elaboradas pela equipe.  
Portanto, a gente ia fazendo subversão na medida que desse aqui e acolá no interior da  
instituição. Aí veio forte foi esse trabalho nas favelas que era um fenômeno que explodia... e  
isso tinha um fator de subversão forte. Por isso, eles escolhiam a nós, Assistentes Sociais, para  
convencer os que estavam ocupando a terra para voltar para seu lugar de origem…  
Entrevistadoras: O que vocês faziam quando foi colocada essa demanda, esse decreto?  
Luiza Erundina: Ao mesmo tempo que levava os serviços, a assistência social... cesta  
de alimentos, ajuda para aluguel, etc. nós levávamos, juntas, a preocupação em conversar com  
as pessoas que a gente levava esses serviços, a razão do porque eles estavam precisando desses  
benefícios. Não é porque você está desempregado que você está recebendo esses benefícios,  
você é desempregado porque tem uma situação maior que te coloca nessa situação. Não é culpa  
sua, nem é favor nenhum do governo...Você tem direito a muito mais, você tem direito ao  
trabalho, a emprego, a salário, a morar. Então você levava junto a conscientização, a força da  
conscientização, mas tudo isso sob um risco muito grande, porque havia pessoas encomendadas  
para ver o que a gente estava fazendo… Éramos profissionais… que conseguiam permanecer  
junto ao povo e, se realmente estava tocado pelo processo de emancipação do pobre e de  
oposição ao regime, esse contato com o povo era fundamental. Com todos os riscos que isso  
implicava. Se não você ia reproduzindo a situação gerada pela própria política do governo…  
Não dá para levar os benefícios só sem levar junto a consciência ao beneficiário do  
porque ele tá recebendo isso, porque isso significa pra ele não achar que tá recebendo um favor.  
Não é favor. Então era um processo de conscientização na linha freiriana mesmo.  
997  
21  
O MOBRAL foi um programa criado no período da ditadura (1967-1985), que impôs a utilização do material  
didático produzido pela editora Abril no processo de alfabetização funcional de jovens e adultos. O material  
promovia um ensino homogeneizador em profunda sintonia com a ideologia do regime.  
Maria Lúcia Duriguetto; Maria Beatriz Costa Abramides; Maria Rosângela Batistoni  
A gente lia os livros de Paulo Freire que a gente importava clandestinamente22. Alguém  
que viajava para o exterior e não tinha vínculo com a política, era lançado um livro do Paulo  
Freire em algum país, a gente sabia. Então falávamos: quando você vier compre o livro tal e  
esconde na sua mala, chegando aqui eu pago. A gente importava dessa forma, clandestinamente,  
os livros e, nos finais de semana, a gente se escondia em algum buraco...e estudava, lia os livros,  
era assim. Era resistência mesmo. Acho que isso nos formou muito. Não foi fácil. Era aquilo  
que a gente fazia no nordeste…  
Então o serviço público dava essa margem de possibilidade se você tivesse uma  
consciência, se tivesse um projeto, se tivesse decidida a correr o risco… Ou você corria o risco  
ou você ficava aguardando o dia em que acontecesse alguma coisa, mas alguma coisa estava  
acontecendo… Foi uma luta muito dura, mas que nos formou…  
Entrevistadoras: Você avalia o fato dessas assistentes sociais... já terem resistido  
como estudantes, já terem resistido no campo, isso auxiliou a própria formação de consciência  
delas? Eram profissionais que vinham com um grau de consciência muito grande.  
Luiza Erundina: É o meu caso. Havia antes o envolvimento dos profissionais na  
política, até que assumissem uma luta política no plano institucional23.  
Neste momento da entrevista, Maria Beatriz C. Abramides e Luiza Erundina  
evidenciam, juntas, o fato de os movimentos sociais reconhecerem a importância da APASSP  
para suas organizações e suas lutas. Também afirmam a importância da APASSP se constituir  
como um espaço da luta sindical e de articulação política das profissionais que estavam atuando  
nas várias políticas sociais públicas setoriais. E, nelas, ajudando os movimentos a organizarem-  
se na defesa dos seus direitos (como as lutas pela tarifa social de água e luz, pelas creches  
998  
22 Importante lembrar que Luiza Erundina, quando cursava a graduação em Serviço Social já fazia um trabalho de  
alfabetização de adultos no ciclo de cultura do Paulo Freire. Com a instauração da ditadura, lembra que “...nossos  
livros tiveram que ser escondidos, os retroprojetores que usávamos nas aulas de alfabetização de adultos tiveram  
que ser enterrados…” (Sousa, 2002, p. 7).  
23  
Em outra entrevista, Erundina é indagada sobre qual a relevância que teve a militância de alguns Assistentes  
Sociais vinculados a organizações de esquerda - para além dos espaços da categoria profissional- naquele momento  
histórico. Ela evidencia: “Antes de tudo, contribuiu para criar uma outra imagem do profissional de Serviço Social  
junto aos trabalhadores e a sociedade em geral. A militância política desses assistentes sociais e seu engajamento  
concreto nas lutas reivindicativas dos trabalhadores e dos segmentos excluídos da sociedade, contribuiu para  
afirmar a dimensão político-ideológica da profissão. Também ajudou na articulação dos Assistentes Sociais com  
profissionais de outras áreas (pedagogos, sociólogos, economistas, advogados), ampliando e fortalecendo, assim,  
sua própria atuação e a daqueles com os quais militavam e participavam das mesmas lutas. Ajudou no processo de  
politização dos assistentes sociais menos politizados e contribuiu na organização política da categoria, participando  
da criação de associações profissionais e sindicatos como instrumentos de luta por direitos e de conquista de espaço  
de ação política na sociedade. Em síntese, a militância dos Assistentes Sociais vinculados a organizações de  
esquerda, nas décadas de 1960 e 1970, foi muito importante como presença da categoria nas lutas que marcaram  
aquele momento histórico da vida do país e que criaram as condições para as mudanças e avanços, cujos efeitos  
até hoje se fazem sentir” (Sousa, 2009, n.p.).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 987-1005, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Mas é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre”:  
entrevista com a Assistente Social Luiza Erundina de Sousa  
diretas, contra as mães crecheiras, entre outras). Eram profissionais que estavam enraizadas na  
discussão dessas lutas.24  
Entrevistadoras: Como que isso pressiona a instituição para mudanças internas? E  
também dos movimentos que resultam das ações que pressionam essas mudanças?  
Luiza Erundina: Você percebe que o movimento é uma luta mais de prestação de  
serviços e aproveitar essa relação de prestação de serviço para dar um componente  
conscientizador e politizador. Isso vai crescendo ao ponto de que uma comunidade que lutava  
para a canalização de um córrego... ou uma creche… ou um posto de saúde, essa luta ela ia se  
qualificando, ia se coletivizando. Quanto maior era o número de pessoas que demandavam  
aquele serviço e que lutavam por eles juntos, mais rapidamente esse coletivo se transformava  
numa força política. Aí, junto com profissionais que tinham uma opção política que trabalhava  
junto com eles, tinha uma mão dupla de politização e de força política que se criava a partir  
deles e a partir de nós. Nós nos formamos politicamente, nós nos organizamos politicamente,  
ao mesmo tempo que ajudávamos a população a se conscientizar da sua força, dos seus  
direitos…  
Depois de um certo tempo que eu vivia isso, eu também quero dizer que quando é que  
eu e outras decidimos pela militância política partidária, porque exatamente o sindicato, a  
associação profissional, a CUT (Central Única dos Trabalhadores)... nós estávamos  
acompanhando a evolução do movimento sindical, nós apoiávamos a greve dos metalúrgicos...  
a gente ia para os eventos.  
999  
Eu me lembro de uma companheira nossa que se chamava Maria Odete... era só  
profissional, não tinha apelo político, mas ela descobriu a política na profissão naquele  
momento. Ela fazia lenços para usarmos nos atos contra o gás lacrimogêneo da polícia… Foi  
um processo muito rico, muito bonito e que fica…  
Aí veio a nossa opção partidária e a ideia do mandato de vereadora, a própria profissão  
e os movimentos entendiam que era importante ter um mandato de vereadora. Então veio não  
por eu querer ser não, veio como consequência desse processo. Então, eu fui a vereadora  
levando os movimentos para dentro da Câmara… Essa mesma dinâmica que a gente imprimia  
à profissão junto aos movimentos, a gente passou a adotar essa dinâmica no espaço institucional  
no exercício de um mandato de um partido que nascia com uma vocação socialista, o Partido  
dos Trabalhadores. Que nascia na porta das fábricas, na porta dos sindicatos, na luta do campo,  
na luta das periferias, na luta pela reforma agrária. Portanto, um partido genuinamente do povo,  
24 Para uma explicitação da relação da APASSP com as lutas sociais aqui referidas, conferir Abramides, Duriguetto  
e Batistoni (2025).  
Maria Lúcia Duriguetto; Maria Beatriz Costa Abramides; Maria Rosângela Batistoni  
nasceu do povo e o povo se formando com ele. Os petistas de origem se formaram na construção  
do partido, eles não acharam o partido pronto, eles acharam primeiro a luta e como membro da  
luta, viam a necessidade de ter uma ferramenta mais forte… não era suficiente o sindicato, a  
CUT, são necessários, mas não suficientes.  
O suficiente era você disputar o poder político, porque é o poder político que muda as  
estruturas junto com o poder popular. Mas só que, com o tempo, esses partidos que nasceram  
com a vocação de ser poder popular - nascer com o poder popular e exercitar-se como poder  
popular - se perdeu e passou a se encastelar nos espaços institucionais de poder e se afastou do  
povo...Muita gente que veio do movimento se pendurou em mandatos, tirou lideranças dos  
movimentos, isso ao longo do tempo… Mas o processo anterior nos formava a gente de tal  
forma que a gente não conseguia fazer diferente.  
Entrevistadoras: Este movimento na profissão também estava acontecendo na  
América Latina.  
Luiza Erundina: O processo de formação política que teve no Brasil aquela  
expressão que culminou com o Congresso de 1979 também se dava um movimento na  
América Latina… a partir da resistência do povo às ditaduras… A categoria de Assistentes  
Sociais também participou desse movimento no Movimento de Reconceituação,  
reconceituando as bases teóricas que davam sustentação ao trabalho da profissão… E teve a  
integração da resistência dos profissionais na América Latina e do Brasil e a construção do novo  
no Serviço Social que era o processo de reconceituação.  
1000  
Entrevistadoras: E fizemos aqueles encontros na época com o apoio do CELATS  
(Centro Latino-Americano de Trabalho Social) que era a unificação desses assistentes sociais  
com os movimentos sociais na América Latina e no Brasil em que já discutíamos isso, nós  
fizemos o encontro em Itapecerica, antes do Congresso de 79. Antes deste Congresso, com esta  
relação direta que a Luiza está trazendo, em que a gente começa a se organizar estando coladas  
nas lutas sociais, junto com os movimentos sociais como assistentes sociais, nós vamos  
caminhando para essa direção antes, e com esses apoios como o do CELATS que vai apoiar a  
experiência do INOCCOP, a CENEAS, e que nos possibilitou organizar antes para o Congresso  
da Virada.  
Luiza Erundina: As oposições sindicais do Serviço Social fazendo oposição aos  
sindicatos antigos. Uma inserção real nos fatos, nas conjunturas e influenciando as  
conjunturas… Por conta desse movimento na categoria e relacionado a outras categoriais que  
teve impacto na formação profissional. Éramos nós que estávamos na formação profissional,  
mas, já na condição de ter engajamento político…  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 987-1005, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Mas é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre”:  
entrevista com a Assistente Social Luiza Erundina de Sousa  
Entrevistadoras: E era via associações que as Universidades vinham. Nós puxávamos  
as universidades, lembra quando a gente fez aquele ato pelas creches diretas na PUC, depois a  
defesa da moradia... Era nossa relação direta com a luta social como assistentes sociais e  
influenciando as universidades.  
Luiza Erundina: Uma questão importante foi a relação da profissão com os  
trabalhadores assalariados e a relação dos trabalhadores assalariados com a profissão. Quando  
da greve dos metalúrgicos de 1978, quando Lula fez aquela denúncia no estádio da Vila  
Euclides25 que a Volkswagen estava contratando Assistentes Sociais para aliciar os  
trabalhadores a saírem da greve... Quando no encerramento do Congresso (de 1979), o Lula foi  
convidado… para compor a mesa de comissão de honra do Congresso, porque nós destituímos  
a comissão de honra fruto da preparação nossa três dias antes do Congresso, que a gente não  
concordava com o Congresso, com como ele foi construído, com a programação, os custos, a  
exclusão dos estudantes... Nós fizemos uma denúncia a tudo isso... (Erundina rememora aqui  
a dinâmica de denúncias e mudanças produzidas no Congresso de 79 pelas associações  
profissionais)26.  
25  
Em abril e maio de 1979, Luiz Inácio Lula da Silva, na condição de líder sindical, realizou discursos e  
assembleias históricas no Estádio da Vila Euclides, em São Bernardo do Campo, como parte da greve geral dos  
metalúrgicos do ABC. No discurso que Erundina faz como paraninfa da turma de Serviço Social da Faculdade de  
Serviço Social de São Paulo, em março de 1979, ela explicita: “... injusta e arbitrária intervenção do Governo nos  
Sindicatos dos Metalúrgicos do ABCD e à odiosa repressão policial de que estão sendo vítimas os trabalhadores  
daquela região. Estão sendo punidos por reivindicarem um direito. Seu ´crimeconsiste em exigirem um tratamento  
mais justo nas injustas relações de trabalho, usando, para isto, do legítimo recurso de greve... Não podemos deixar  
de repudiar, nesta oportunidade, tais arbitrariedades, em incorrer em grave omissão e sem trair nosso compromisso  
profissional. Não é suficiente, porém, denunciar e repudiar. Temos que assumir, enquanto categoria profissional,  
posição ativa de apoio ao movimento dos trabalhadores” (Sousa, 1991, p. 45-46). Nos discursos para a turma da  
Faculdade de Serviço Social das Faculdades Metropolitanas Unidas de São Paulo e da PUC de Campinas,  
respectivamente em 1979 e 1980, também repudia as demissões de profissionais que estavam ocorrendo em órgãos  
públicos e empresas privadas por suas posições críticas à ditadura: 24 Assistentes Sociais e outros profissionais do  
Instituto de Orientação às Cooperativas Habitacionais de São Paulo (Inocoop); 05 Assistentes Sociais da Fundação  
de Promoção Social da Prefeitura de Santo André ; Assistentes Sociais do Hospital dos Servidores Públicos do  
Estado e 06 professores da Faculdade Paulista de Serviço Social (Sousa, 1991, p. 47-48; 118-119).  
1001  
26 Nos dias 21 a 23 de setembro de 1979 realizou-se na cidade de São Paulo o III Encontro Nacional de Entidades  
Sindicais de Assistentes Sociais, do qual participaram 21 entidades e criaram a Comissão Executiva Nacional de  
Entidades Sindicais de Assistentes Sociais (CENEAS), que teve a APASSP na coordenação. Um dos temas deste  
Encontro foi a avaliação da organização do Congresso, em que destacaram o caráter acrítico dos temas que seriam  
debatidos, como o das políticas sociais, representantes governistas na composição das mesas, descompromisso  
com as lutas de resistência à ditadura, entre outras questões. O III CBAS foi realizado de 23 a 28 de setembro,  
com cerca de 2500 profissionais. No segundo dia do Congresso, foi chamada uma assembleia (dentro do  
Congresso), na hora do almoço, quando estava programada uma visita às entidades sociais. “No refeitório, com  
600 congressistas, viramos o jogo do Congresso. Dissemos: Vamos tomar a direção do Congresso. Propusemos,  
e foi aprovado, que aquela Comissão de Honra composta à revelia da categoria, pelo então Presidente da  
República, General João Batista Figueiredo; o Ministro do Trabalho, Murilo Macedo, (que havia cassado a  
diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, cujo presidente era Luiz Inácio Lula da Silva); o Ministro da  
Previdência, Jair Soares; o Governador de São Paulo, Paulo Salim Maluf, o Prefeito de São Paulo, Reynaldo de  
Barros e o secretário da Promoção social do Estado de São Paulo, Antônio Salim Curiati, seria substituída por  
representantes dos dirigentes sindicais cassados; do Comitê Brasileiro pela Anistia; do Movimento Contra a  
Carestia; da Associação Popular de Saúde; da Frente Nacional do Trabalho, em homenagem aos trabalhadores  
Maria Lúcia Duriguetto; Maria Beatriz Costa Abramides; Maria Rosângela Batistoni  
Eu queria chegar no momento do discurso do Lula (no Congresso) que começa dizendo  
assim: agora eu descobri que tem Assistente Social e tem Assistente Social, tem Assistente  
Social que está do lado do trabalhador e tem Assistente Social que está do lado do patrão. Isso  
eu aprendi nesse Congresso…  
Foi um momento importante politicamente dessa descoberta, porque para nós que  
estávamos ligadas na resistência à ditadura e construindo uma nova profissão… de ser  
denunciado para milhares de trabalhadores que estavam na Vila Euclides...que Assistentes  
Sociais estavam sendo contratados para tirar os trabalhadores da greve, foi uma denúncia que  
pegou pesado na gente, nós que estávamos lá… Aí ele lembrou desse fato, aliás foi uma  
assistente social que levou o convite para ele fazer o encerramento do Congresso… isso foi um  
momento importante, que foi o resgate dos Assistentes Sociais pelos trabalhadores27.  
Entrevistadoras: Uma questão agora é em relação à ocupação da Gleba do Pêssego.  
Luiza Erundina: A população queria cobrar do governo algumas providências… aí nós  
trouxemos um grupo bastante grande… para ser recebido pelo Coronel Ávila e ele não recebeu.  
Então nós entramos na marra...ele chamou polícia para cercar o prédio e queria que a população  
saísse e que ficássemos só nós, Assistentes Sociais. Aí a população disse não, nós não vamos  
sair… e saímos juntos só de madrugada...28  
Entrevistadoras: Luiza, nas suas entrevistas, no seu livro29, você fala que carregou na  
sua trajetória política até os dias atuais muito do seu compromisso, da sua concepção e visão  
profissional. Queríamos que você falasse disso.  
1002  
Luiza Erundina: Eu tenho consciência de que toda essa trajetória, essa busca, esses  
avanços, também recuos, também tem perdas... vinha a minha formação profissional. A minha  
opção profissional marca cada momento dessa trajetória minha. Eu fui a Assistente Social que  
fui pela minha formação profissional de compromisso com o povo e de acreditar no povo. Que  
o povo é a origem do poder, portanto, estar com o povo, é estar com o poder e colocar esse  
poder a serviço do povo.  
brasileiros e todos os que morreram na luta em defesa da democracia. A assembleia de encerramento contou com  
a presença da Comissão de Honra, eleita democraticamente pelos congressistas, ocasião em que várias Moções  
importantes foram aprovadas destacando-se, entre outras, a de repúdio à intervenção nos sindicatos e prisão de  
líderes sindicais; contra o projeto de Anistia restritiva e contra a devastação e ocupação da Amazônia” (Sousa,  
2009, n.p.).  
27  
As demais propostas aprovadas e os discursos proferidos por Erundina e por Lula no Congresso estão  
reproduzidos em Sousa (1991, p. 91-112).  
28 Apergunta refere-se a um trabalho de assistentes sociais e demais profissionais da SEBES junto a um movimento  
de moradia no período de 1979 a 1982. Este trabalho e o processo de tensionamento, de repressão e de  
criminalização imposto pelo órgão institucional aos profissionais foram desenvolvidos em Abramides e Duriguetto  
(2024).  
29 Sousa (1991).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 987-1005, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Mas é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre”:  
entrevista com a Assistente Social Luiza Erundina de Sousa  
Outro dia eu encontrei meu discurso de posse como vereadora... é incrível como esse eu  
já tinha o pensamento político na relação com a profissão… Eu me surpreendi como aquilo era  
a expressão daquilo que eu carregava comigo desde sempre. Quando eu cheguei como  
vereadora e de lá para cá eu fui a prefeita que fui, a deputada que fui e continuo sendo a  
deputada que fui tem a marca daquela luta e do meu compromisso profissional. É muito  
forte. Por isso eu digo se eu tivesse que escolher outra profissão outra vez eu escolheria o  
Serviço Social. Para mim, não tem uma formação tão determinante, na vida de uma pessoa,  
determinação na formação profissional de uma pessoa como foi para mim o Serviço Social. Eu  
não queria ser Assistente Social, queria ser médica… Me encontrei com o Serviço Social, já  
estava na luta pela reforma agrária. É muito forte o Serviço Social. É uma profissão realmente  
que muda a pessoa e promove mudanças. Se você realmente se organiza politicamente para  
isso. Realiza. E é uma profissão que não é prestigiada, que não tem bom salário… Mas é uma  
opção que se faz…  
Se não te passar essa visão da profissão, a formação profissional fica muito reduzida às  
técnicas… e deixa de ter a marca que teve em toda a América Latina e passou a ser respeitada  
pela sociedade.  
Entrevistadoras: Nossa pesquisa tem esse objetivo também de reafirmar esse tempo,  
essa posição, esse trabalho de relação político-ideológica com os movimentos sociais, em que  
segmentos profissionais articularam seu trabalho, nos espaços sócio-ocupacionais, com as  
mobilizações e as organizações populares que estavam acontecendo naquela época em São  
Paulo. Ao mesmo tempo em que tinha um trabalho profissional muito vinculado às demandas  
populares (tanto as organizadas quanto as não organizadas), também tinha uma dimensão da  
militância política seja no sindicato, seja no partido. E foi essa conjugação de uma ação  
profissional comprometida nas e com as lutas mais a militância política que formaram a época  
de vocês, dos Assistentes Sociais dessa época que fizeram tanta coisa maravilhosa. Que lição  
que isso fica?  
1003  
Luiza Erundina: Fica nas pesquisas que vocês estão fazendo, e essas pesquisas vão  
mexer com a cabeça das novas gerações. Não queremos transferir para elas essa nossa  
experiência que já não serve mais, é outra época, é outro momento. Não é que aquilo lá não  
serve mais, não serve mais para fazer face a essa conjuntura. Então capacitar as pessoas a avaliar  
o que é uma conjuntura, como ela se apresenta em um determinado momento e como isso é  
base da formação profissional… É o que se pretende com essa profissão naquele tempo que  
você está vivendo.  
Maria Lúcia Duriguetto; Maria Beatriz Costa Abramides; Maria Rosângela Batistoni  
O que marca a profissão nesse momento como resposta a realidade que está aí… tem  
que ter uma dimensão política que é a força da ação profissional, é a opção política do  
profissional. Eu não vejo um profissional que lida com o povo, que lida com as contradições da  
sociedade, que não tenha um posicionamento político a respeito daquele momento, da  
sociedade, do país. É isso que nos dá elã, expectativa de futuro. Não fica preso ao cotidiano, a  
rotina profissional que mata qualquer ânimo, qualquer alento, qualquer sonho. Tem que sonhar.  
É o tipo de profissão que se não sonhar, se não se apaixonar, não muda muita coisa, e não dá  
alegria.  
Estamos aqui vibrando com o que vivemos a quarenta, cinquenta anos atrás. É muito  
legal chegar ao momento que a gente está e olhar que a gente viveu isso, isso foi bom para nós  
e para os que viveram naquele tempo. O país tem jeito. É possível fazer diferente, e a história  
vai acontecendo... Eu sou muito feliz por ter feito essa opção profissional. Te juro. Eu faria  
outra vez essa opção, o Serviço Social.  
Referências bibliográficas  
ABRAMIDES, Maria Beatriz Costa, DURIGUETTO, Maria Lúcia. “Serviço Social e lutas  
sociais: o relato de uma experiência de trabalho profissional na prefeitura municipal de São  
Paulo (1979-1982)”. Revista Ser Social, Brasília (DF), v. 26, nº 55, de julho a dezembro de  
2024.  
ABRAMIDES, Maria Beatriz Costa; DURIGUETTO, Maria Lúcia; BATISTONI, Maria  
Rosângela “Lutas da classe trabalhadora e sua relação com a organização sindical do Serviço  
Social na realidade paulistana”. Revista Em Pauta, 23(59), 2025.  
1004  
CABRA MARCADO PARA MORRER. Direção: Eduardo Coutinho. Produção: Mapa Filmes  
/ C.P.C. Centro Popular de Cultura da UNE / MPC Movimento de Cultura Popular de  
Pernambuco,  
1984.  
Documentário,  
119  
min.  
Disponível  
em:  
FREIRE. Paulo. Prefácio. In: SOUSA, Erundina Luiza de. Exercício da paixão política. São  
Paulo: Cortez, 1991.  
SOUSA, Erundina Luiza de. Exercício da paixão política. São Paulo: Cortez, 1991.  
JULIÃO, Francisco. Que são as Ligas Camponesas? Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,  
1962.  
MEDEIROS, Leonilde Sérvolo de. História dos movimentos sociais no campo. São Paulo:  
Editora FASE, 1987.  
MEMORIAL  
DAS  
LIGAS  
CAMPONESAS.  
©
2025.  
Disponível  
em:  
www.ligascamponesas.org.br. Acesso em: 7 nov. 2025.  
Entrevistas concedidas por Luiza Erundina de Sousa  
SOUSA, Luiza Erundina de. Luiza Erundina (depoimento, 2001). Rio de Janeiro,  
CPDOC/Ministério da Previdência e Assistência Social - Secretaria de Estado de Assistência  
Social, 2002.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 987-1005, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
“Mas é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre”:  
entrevista com a Assistente Social Luiza Erundina de Sousa  
ERUNDINA, Luiza. Memória da Associação Profissional dos Assistentes Sociais (APASSP).  
associacao-profissional-dos.html. Acesso em: 14 nov. 2025.  
1005  
Resenha  
DEPAULIS, Alain. Naissance de la transdisciplinarité.  
Paris: Éditions L’Harmattan, 2024. 230 p.  
_________________________________________  
Interpenetrabilidade epistêmica como modelo  
contemporâneo de construção do conhecimento:  
reflexões a partir de Alain Depaulis  
Epistemic interpenetrability as a contemporary model for knowledge  
construction: reflections on Alain Depaulis  
Fábio Luiz Nunes*  
A fragmentação do conhecimento em disciplinas especializadas é um fenômeno que tem  
provocado debates sobre o progresso científico (Balietti; Mäs; Helbing, 2015) e a própria  
estrutura da produção de saberes (Lightman; Sera-Shriar, 2022). Em um ambiente de  
permanente questionamento das fronteiras disciplinares, a publicação da obra Naissance de la  
transdisciplinarité (Éditions L'Harmattan, 2024), ainda sem tradução para a língua portuguesa,  
representa uma leitura bastante dedicada sobre a gênese de um campo de saber que busca  
precisamente articular diferentes domínios do conhecimento. Seu autor, o psicanalista francês  
Alain Depaulis, é membro da École Freudienne e possui um percurso profissional que  
fundamenta seu interesse teórico no tema. Atuando como psicoterapeuta no Centre Médico-  
* Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais. E-mail: fabio.nunes.fln@cefetmg.br  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.50305  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 20/09/2025  
Aprovado em: 08/12/2025  
Interpenetrabilidade epistêmica como modelo contemporâneo de construção do conhecimento:  
reflexões a partir de Alain Depaulis  
psycho-pédagogique (CMPP) e na Consultation Médico-psychologique (CMP), localizados no  
departamento francês de Creuse, Depaulis cofundou o ateliê PLURIACT, focado na aplicação  
de múltiplos conhecimentos no atendimento a pessoas vulneráveis.  
Naissance de la transdisciplinarité inicia-se com um prefácio de Pascal Roggero,  
professor de sociologia na Université de Toulouse 1-Capitole, que posiciona o trabalho  
de Depaulis (2024) como um exame do conflito histórico entre concepções unitárias e diversas  
do conhecimento científico. Roggero aponta a filiação do autor à linhagem intelectual que  
valoriza a complexidade e a multiplicidade, estabelecendo um percurso que vai de Giordano  
Bruno a Gaston Bachelard e que encontra em Edgar Morin um referencial teórico central. Na  
introdução, Depaulis (2024) apresenta o “paradoxo do Um e do Múltiplo” enquanto problema  
fundamental que dá vida a sua investigação. O autor reconstitui a origem dos termos, mostrando  
que emergência lexical de transdisciplinaridade data de 1972, em um artigo do biólogo  
cognitivista Jean Piaget, uma evidência que encontra correspondência em levantamentos  
históricos que também apontam para o seminário da Organização para a Cooperação e  
Desenvolvimento Econômico (OCDE) de 1970 como o evento que inaugura a circulação da  
palavra (Bernstein, 2015). A introdução organiza ainda a estrutura do livro, cujo objetivo é  
traçar as condições de gestação, os debates e as resistências que marcaram a constituição do  
pensamento transdisciplinar.  
1007  
O trajeto histórico da obra tem seu ponto de partida no capítulo um, que descreve como,  
na virada do século XX, os trabalhos de Paul Valéry, Sigmund Freud e Carl Gustav Jung  
conduzem à fragmentação da noção de um sujeito unificado, condição preliminar para a  
superação de uma visão monocular da realidade. O capítulo dois debruça-se sobre a ascensão  
do pluralismo no campo epistemológico, com as contribuições do escritor belga Rosny aîné e  
do epistemólogo e químico francês Émile Meyerson. O capítulo três, por sua vez, narra as  
resistências a esse movimento, materializadas no verificacionismo do Círculo de Viena e no  
célebre critério de refutabilidade de Karl Popper. O conjunto desses capítulos apresenta ao leitor  
as premissas históricas de uma reorganização epistemológica que demanda a interpenetração  
de saberes distintos, um princípio fundamental do pensamento complexo, conceito fulcral de  
Morin (2005). O capítulo seguinte investiga as fontes do pluralismo anglo-saxão, com especial  
atenção à filosofia de William James, estudioso que, influenciado por Hegel, Fechner e  
Bergson, desenvolve um pensamento fundamentado na experiência concreta. Esse itinerário  
intelectual descrito por Depaulis (2024) antecipa a formulação de novos postulados, como os  
axiomas da transdisciplinaridade que instituem os níveis de realidade e a lógica do terceiro  
Fábio Luiz Nunes  
incluído1 como ferramentas para a unificação de campos do conhecimento sem a fusão destes,  
como afirma Nicolescu (2012).  
Nesses capítulos iniciais, Depaulis (2024) põe em evidência uma argumentação  
interessante (e relativamente inovadora) ao eleger a fragmentação psíquica como o antecedente  
necessário das revoluções na física e na filosofia, provando que a quebra da unidade do sujeito  
precisava ocorrer antes da quebra da unidade da ciência. A recuperação de figuras injustamente  
laterais, a exemplo de Rosny aîné, e a justaposição com a busca meyersoniana pela identidade  
conferem densidade teórica ao texto, salvando-o de ser uma compilação histórica banal. É  
notável a franqueza com que o autor desautoriza a assepsia do Círculo de Viena e a  
inflexibilidade do modelo popperiano, tratando-os menos como ápices da racionalidade e mais  
como obstáculos sanitários à compreensão do real. Rejeitando a obsessão pela clareza  
linguística que esteriliza o pensamento, Depaulis toma partido, e tal atitude fortalece sua tese,  
na visão deste resenhista.  
No quinto capítulo de sua obra, Depaulis (2024) desenvolve um diálogo improvável  
entre o racionalismo absoluto de Husserl, com o ideal de uma filosofia universal e a busca pela  
verdade pura, e o racionalismo em extensão de Bachelard, para quem o progresso científico por  
meio de rupturas epistemológicas e da superação de obstáculos. O próximo capítulo investiga  
a promessa não concretizada do pluralismo na sociologia, apresentando a constituição da  
disciplina desde o positivismo comtiano e sua classificação rígida das ciências e a distinção de  
Dilthey entre as ciências da natureza e as ciências do espírito, até a sociologia da ação de  
Simmel. Nesse ponto, Depaulis (2024) afirma que o rigor metodológico inspirado nas ciências  
naturais limitou o potencial de diálogo disciplinar, uma limitação que estudiosos como o  
analista do discurso Patrick Charaudeau (2010) ajuda a elucidar, à medida que diferencia a mera  
justaposição de saberes de uma interação que reconfigura os campos envolvidos. O sétimo  
capítulo, por seu turno, é dedicado ao pluralismo anarquista de Paul Feyerabend, cuja crítica  
radical ao método científico é apresentada como uma reação necessária ao dogmatismo, o que  
se amolda à crítica de Morin (2005) ao chamado paradigma de simplificação que mutila o  
conhecimento ao isolar os saberes.  
1008  
1 Os níveis de realidade podem ser entendidos como um conjunto de sistemas regidos por leis idênticas, como o  
mundo quântico e o nosso mundo macroscópico. A lógica do terceiro incluído é o que permite articular esses  
níveis: diferente da lógica clássica (na qual algo é A ou não-A), ela compreende um terceiro estado que é A e não-  
A ao mesmo tempo. Essa aparente contradição se resolve porque esse estado unificado existe em um nível de  
realidade diferente, como no caso da luz, que no mundo quântico se comporta simultaneamente como partícula e  
onda, unindo características que seriam excludentes em nossa realidade cotidiana (Nicolescu, 2012).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 1006-1012, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Interpenetrabilidade epistêmica como modelo contemporâneo de construção do conhecimento:  
reflexões a partir de Alain Depaulis  
A partir do oitavo capítulo, Depaulis (2024) analisa as grandes revoluções do  
conhecimento, iniciando pela copernicana, que é descrita como uma profunda mutação  
intelectual no campo da astronomia que reconfigurou a relação humana com o cosmos. O  
capítulo nove trata, então, dos mecanismos de construção do saber, pondo em contato a teoria  
dos paradigmas de Thomas Kuhn (o que inclui sua distinção entre ciência normal e ciência  
extraordinária) e a epistemologia genética de Piaget. Depaulis (2024) faz destacar o papel desse  
último teórico na introdução do conceito de transdisciplinaridade, um ponto que Klein (2011)  
aprofunda ao classificar os diferentes graus de interação e integração entre disciplinas,  
permitindo localizar a proposição piagetiana como um nível superior de organização do saber.  
De sua parte, o décimo capítulo observa a revolução quântica, mostrando que os princípios da  
descontinuidade, da incerteza e da não separabilidade desmantelaram a física clássica, de base  
newtoniana. O autor compreende que a dissolução da causalidade e do determinismo,  
exemplificada pelos debates entre Bohr e Einstein, constitui a manifestação de uma  
complexidade irredutível no real, um fenômeno que Morin (2005) conceitua por meio de  
princípios como o dialógico, que sustenta a coexistência de lógicas contraditórias.  
O leitor poderá perceber que essa sequência de capítulos opera uma desconstrução  
vigorosa das pretensões absolutistas do saber científico, merecendo elogios pela forma como  
reabilita figuras teóricas frequentemente marginalizadas pela ortodoxia acadêmica. À medida  
que confronta o purismo fenomenológico de Husserl com a abertura epistemológica  
bachelardiana e denuncia o bloqueio imposto pelo positivismo de Durkheim à sociologia das  
interações de Simmel, Depaulis expõe inteligentemente as fraturas estruturais causadas pela  
especialização excessiva. A validação do anarquismo metodológico de Feyerabend coloca-se,  
nesse contexto, como uma contraposição quase niilista à arrogância institucional. A narrativa  
do autor ganha fôlego por vincular as rupturas cosmológicas iniciadas por Copérnico e a quebra  
do determinismo clássico na física quântica à urgência de novos modelos cognitivos. Nessa  
direção, a interpretação dada à complementaridade de Bohr e à espiral epistemológica de Piaget  
comprova que a transdisciplinaridade não representa um luxo teórico, senão uma imposição da  
realidade complexa.  
1009  
Depaulis (2024), no capítulo onze, discorre sobre a posição do observador, partindo dos  
trabalhos de Georges Devereux para questionar a separação radical entre sujeito e objeto. Suas  
reflexões estendem-se à cibernética de segunda ordem no capítulo doze, com especial atenção  
a Heinz von Foerster, segundo o qual o conhecimento precisa incluir o próprio conhecedor no  
processo, instituindo um movimento de autorreflexão. Essa circularidade encontra um  
fundamento no capítulo treze, dedicado à lógica da energia de Stéphane Lupasco, cujo princípio  
Fábio Luiz Nunes  
de antagonismo e estado-T (terceiro incluído) instituem uma dinâmica contraditória nos  
fenômenos (Nicolescu, 2012). O movimento de superação da lógica clássica, que segrega  
elementos, é um passo importante para a compreensão da complexidade, já que admite a  
coexistência de estados opostos como um componente intrínseco da realidade (Bernstein,  
2015).  
O
capítulo quatorze dedica-se finalmente ao “ato de nascimento” da  
transdisciplinaridade, centralizado na figura do físico teórico de origem romena Basarab  
Nicolescu e na formalização de seus três axiomas: os níveis de realidade, a lógica do terceiro  
incluído e a complexidade (Nicolescu, 2012). Segundo Depaulis (2024), a institucionalização  
desse campo é marcada pela Carta da Transdisciplinaridade de 1994, assinada no Convento da  
Arrábida, em Portugal. Em seguida, no capítulo quinze, a obra de Morin é tida como uma  
fundamentação filosófica para essa nova atitude científica. Seus três princípios (dialógico,  
recursivo e hologramático)2 são descritos como operadores do pensamento complexo, um  
pensamento que aproxima saberes e restitui os objetos de conhecimento a seus contextos  
(Vallejo-Gómez, 2008). Depaulis (2024) finaliza sua obra com uma conclusão que aborda as  
noções de reliance (o ato de ligar) e dialogie (a convivência dos contrários) como eixos de uma  
prática científica que assume a incerteza e, ao mesmo tempo, exige uma postura ética e reflexiva  
do pesquisador.  
1010  
Os capítulos finais da obra tornam-se reféns de um viés psicodinâmico que,  
ironicamente, limita a prometida abertura epistemológica. No décimo primeiro capítulo, quando  
discute o problema da observação, o autor recorre a Devereux e a Lacan, o que faz o leitor  
associar a complexa questão do conhecimento a mecanismos de angústia e defesa psíquica,  
patologizando a relação sujeito-objeto. Essa tendência de psicologizar a epistemologia se  
mantém no capítulo doze, seção em que a cegueira cognitiva de von Foerster é lida sob a ótica  
do recalque, e segue no capítulo treze, no qual a lógica de Lupasco busca validação em sua  
proximidade pessoal com Lacan, como se a mecânica quântica carecesse de chancela clínica.  
Mesmo a exposição sobre Nicolescu e Morin, nos capítulos subsequentes, é concebida por essa  
perspectiva que converte a transdisciplinaridade em uma terapêutica de um idealizado “sujeito  
interior”, o que, no ver deste resenhista, desvia o foco das estruturas do saber para o sofrimento  
ontológico subjetivista. A obra finaliza-se a partir desse confinamento teórico: no momento em  
que baseia a definição de “Real” nas categorias lacanianas de Simbólico e Imaginário e na  
2 O postulado dialógico de Morin associa instâncias ao mesmo tempo complementares e antagonistas; no princípio  
recursivo, os efeitos retroagem sobre as causas em um anel produtor; já no princípio hologramático, entende-se  
que não apenas a parte está no todo, mas o todo está inscrito na parte.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 1006-1012, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Interpenetrabilidade epistêmica como modelo contemporâneo de construção do conhecimento:  
reflexões a partir de Alain Depaulis  
heterologia de Bataille, Depaulis filia-se a um dogmatismo psicanalítico que contradiz a  
liberdade investigativa alardeada, o que ameaça transformar o projeto transdisciplinar em um  
subproduto de teorias do inconsciente.  
Apesar do exposto, é possível depreender que Naissance de la transdisciplinarité possui  
respeitável pertinência por reconstituir a gênese do modelo transdisciplinar. O estudo, é  
verdade, parece despreocupar-se dos perigos de uma flexibilização imprudente dos padrões da  
ciência, que uma interpretação superficial ou enviesada do conceito pode suscitar. Com efeito,  
mesmo que se admita a importância da interligação de saberes para a resolução de problemas  
de alta complexidade (Bernstein, 2015), é imperativo que o exame rigoroso do compromisso  
metodológico e da ética científica norteie a colaboração entre as disciplinas. Essa estruturação  
é, na visão do resenhista, necessária para rechaçar sistemas de pensamento manifestamente  
pseudocientíficos, que podem se apropriar do discurso da integração de conhecimentos para  
legitimar proposições desprovidas de sustentação empírica ou lógica. A construção de um novo  
paradigma cognitivo (Morin, 2005) reivindica, diante disso, a aplicação de instrumentos  
teórico-metodológicos adaptados, como a investigação dialética,3 que permitem gerir a  
complexidade sem sacrificar o compromisso com a produção criteriosa do conhecimento.  
Referências bibliográficas  
1011  
BALIETTI, S.; MÄS, M.; HELBING, D. On disciplinary fragmentation and scientific progress.  
PLoS ONE, [s. l.], v. 10, n. 3, e0118747, 2015.  
BERNSTEIN, J. H. Transdisciplinarity: a review of its origins, development, and current  
issues. Journal of Research Practice, [s. l.], v. 11, n. 1, p. R1, 2015.  
BULÉON, P. Spatialités, temporalités, pensée complexe et logique dialectique moderne. [S. l.:  
s. ed.], 2002.  
CHARAUDEAU, P. Pour une interdisciplinarité «focalisée» dans les sciences humaines et  
sociales. Questions de Communication, [s. l.], n. 17, p. 195-222, 2010.  
DEPAULIS, A. Naissance de la transdisciplinarité. Paris: Éditions L’Harmattan, 2024.  
KLEIN, J. T. Une taxinomie de l’interdisciplinarité. Nouvelles Perspectives en Sciences  
Sociales, [s. l.], v. 7, n. 1, p. 15-48, 2011.  
LIGHTMAN, B.; SERA-SHRIAR, E. (ed.). Victorian interdisciplinarity and the sciences:  
rethinking the specialization thesis. Pittsburgh (Estados Unidos da América): University of  
Pittsburgh Press, 2022.  
MORIN, E. Introduction à la pensée complexe. Paris (França): Éditions du Seuil, 2005.  
NICOLESCU, B. Transdisciplinarity: the hidden third, between the subject and the  
object. Human and Social Studies, Iaşi (Romênia), v. 1, n. 1, p. 13-28, 2012.  
3 Na essência, esse tipo de investigação se mobiliza segundo os princípios fundamentais da dialética, como a lei  
da compenetração dos opostos e a lei da negação da negação. Isso significa que ela busca compreender os  
fenômenos a partir de suas contradições internas e do modo como estas se resolvem e se transformam, gerando  
novas realidades. É um método que reconhece a existência de uma conexão fundamental entre todos os elementos,  
mesmo quando eles parecem isolados, e aceita que as soluções e verdades encontradas são sempre provisórias,  
parte de um processo contínuo de superação (Buléon, 2002).  
Fábio Luiz Nunes  
VALLEJO-GÓMEZ, N. La pensée complexe: antidote pour les pensées uniques: entretien avec  
Edgar Morin. Synergies Roumanie, [s. l.], n. 3, p. 77-90, 2008.  
1012  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 1006-1012, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Esta edição da Libertas apresenta o dossiê sobre  
os fundamentos históricos, teórico-metodológicos  
e ético-políticos do Serviço Social. No âmbito  
desta temática estão incluídos os estudos e  
pesquisas que tratam das dimensões  
teórico-metodológicas, ético-políticas e  
técnico-operativas do Serviço Social.  
Agregam-se ainda produções que  
abordam as demandas e perfis dos  
sujeitos que utilizam os serviços  
sociais; as relações estabelecidas  
entre assistentes sociais e as  
lutas/movimentos sociais  
na mediação com as  
políticas sociais;  
e as formas de  
organização  
profissional  
do Serviço  
Social.  
Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil