Anitta, Spotify e polarização política:
análise da controvérsia em torno de Envolver
Alékis de Carvalho Moreira1, Beatriz Polivanov2, Simone Pereira de Sá3 e Pauline Saretto4
Resumo
Em um cenário marcado pelas chamadas guerras culturais, que entrelaçam as esferas da música pop e da política, este artigo busca contribuir para o debate a partir da análise de uma controvérsia relacionada à cantora Anitta: as acusações de uma possível “manipulação do algoritmo” do Spotify por parte da artista e de seus fãs, que teriam feito com que sua canção Envolver chegasse ao topo das paradas na plataforma. Para isso, coletamos de março de 2022 a fevereiro de 2023, 8.582 publicações no X/Twitter com menções à cantora e à suposta “manipulação”. Em seguida, realizamos a Análise de Conteúdo de uma amostra de 758 publicações a partir de quatro eixos: posicionamento político, valência, presença de desinformação e veículos de notícia. Os resultados da análise mostram que 74% das publicações eram negativas e que 51,3% dos perfis que a acusavam de manipulação do algoritmo do Spotify eram pró-Bolsonaro. Além disso, os perfis apresentaram em 43,1% das postagens links para sites com desinformação, demonstrando que a pauta foi instrumentalizada por perfis vinculados à extrema direita política visando gerar engajamento nas redes sociais.
Palavras-chave
Anitta; Desinformação; Política; X/Twitter; Análise de Conteúdo.
1 Doutorando e mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) da Universidade Federal Fluminense (UFF) com bolsa CAPES, pesquisador do Laboratório de Estudos de Internet e Mídias Sociais (NetLab/UFRJ) e do grupo de pesquisa MiDICom. E-mail: alekismoreira@gmail.com.
2 Professora do Depto. de Estudos Culturais e Mídia e do PPGCOM da UFF, doutora, líder do grupo de pesquisa MiDICom. E-mail: beatrizpolivanov@id.uff.br.
3 Professora Titular do Depto. de Estudos Culturais e Mídia e do PPGCOM da UFF, Bolsista PQ-1C CNPq, líder do grupo de pesquisa LabCult. E-mail: simonesa@id.uff.br.
4 Doutoranda e mestra pelo PPGCOM da UFF com bolsa da CAPES, participante dos grupos de pesquisa LabCult e MusiLab. E-mail: pauline.saretto@gmail.com.
Anitta, Spotify, and Political Polarization:
an analysis of the controversy surrounding Envolver
Alékis de Carvalho Moreira1, Beatriz Polivanov2, Simone Pereira de Sá3 and Pauline Saretto4
Abstract
In a scenario marked by ongoing culture wars, that increasingly intertwine the spheres of pop music and politics, this article aims to contribute to the debate through the analysis of a controversy related to the singer Anitta: the accusations of potential “manipulation of the algorithm” on Spotify by the artist and her fans, which would have made her song Envolver reach the top of the charts on the platform. We collected 8,582 posts on X/Twitter that mentioned the singer and the alleged “manipulation”, posted from March 2022 to February 2023. We then carried out a Content Analysis of a sample of 758 publications based on four axes: political positioning, valence, presence of disinformation, and news organizations. The analysis results show that 74% of the posts expressed a negative tone and that 51.3% of the profiles that accused Anitta and her fans of manipulating Spotify´s algorithm were pro-Bolsonaro. In addition, in 43.1% of the posts, the profiles provided links to disinformation sites, demonstrating that the agenda was used by profiles linked to the political far-right in order to generate engagement on social media.
Keywords
Anitta; Disinformation; Politics; X/Twitter; Content Analysis.
1 Doutorando e mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) da Universidade Federal Fluminense (UFF) com bolsa CAPES, pesquisador do Laboratório de Estudos de Internet e Mídias Sociais (NetLab/UFRJ) e do grupo de pesquisa MiDICom. E-mail: alekismoreira@gmail.com.
2 Professora do Depto. de Estudos Culturais e Mídia e do PPGCOM da UFF, doutora, líder do grupo de pesquisa MiDICom. E-mail: beatrizpolivanov@id.uff.br.
3 Professora Titular do Depto. de Estudos Culturais e Mídia e do PPGCOM da UFF, Bolsista PQ-1C CNPq, líder do grupo de pesquisa LabCult. E-mail: simonesa@id.uff.br.
4 Doutoranda e mestra pelo PPGCOM da UFF com bolsa da CAPES, participante dos grupos de pesquisa LabCult e MusiLab. E-mail: pauline.saretto@gmail.com.
Introdução
Nos últimos anos, o cenário político brasileiro tem se entrelaçado de maneira crescente com o entretenimento, especialmente no campo da música pop. Um exemplo desse fenômeno é a trajetória da cantora Anitta, uma das principais artistas da música brasileira contemporânea, que se tornou alvo de ataques de perfis de direita e apoiadores de Bolsonaro nas redes sociais, sobretudo a partir de um posicionamento crítico ao governo Bolsonaro, declarando apoio ao candidato do PT à presidência, Luiz Inácio Lula da Silva em 2022 (No Twitter […], 2022).
Dentre as inúmeras controvérsias em torno da artista ao longo daquele ano, chamou-nos a atenção a forma como o sucesso internacional de sua música Envolver (Anitta, 2022a) que chegou ao topo do chart global da plataforma Spotify impulsionada por campanhas de engajamento de fãs, gerou acusações de “manipulação algorítmica” por parte de perfis bolsonaristas nas plataformas de redes sociais.
Diante desse contexto, entendemos, com inspiração nas ideias de Latour (2005), que o “caso” da canção Envolver pode ser pensado enquanto uma controvérsia, na qual participam actantes humanos – como os fãs da cantora – e não humanos – como a plataforma X/Twitter – formando uma intrincada rede a partir do lançamento e alcance da canção. Nosso objetivo é mapear os atores envolvidos nesse debate e analisar seus posicionamentos, investigando em que medida perfis bolsonaristas se mobilizaram para atacar Anitta, amplificando conteúdos negativos e recorrendo a links de notícias de sites vinculados à extrema direita. Partimos da hipótese de que a cantora foi alvo de um volume considerável de publicações negativas produzidas por esses grupos, reforçando a narrativa de manipulação algorítmica.
O artigo está organizado em quatro partes. Primeiramente, apresentamos os principais pontos da controvérsia em torno de Envolver. Em seguida, discutimos a relação entre a “cultura bolsonarista” e as guerras culturais contemporâneas, explorando como entretenimento e política se entrelaçam. Na terceira seção, abordamos a produção e análise dos dados, que envolveu o levantamento de 8.582 publicações coletadas de março de 2022 a fevereiro de 2023, mencionando a cantora e as supostas “manipulações”. Na quarta seção, apresentamos os resultados da análise de uma amostra de 758 postagens, aplicando a Análise de Conteúdo (Sampaio; Lycarião, 2021), que classificou as publicações e os perfis em quatro eixos: (i) posicionamento político, (ii) valência, (iii) presença de desinformação e (iv) veículos de notícia. Os dados analisados revelam que a pauta foi instrumentalizada pela extrema direita, com um pico de ataques coordenados entre perfis e sites ocorrendo em 12 de abril, data de lançamento do novo álbum da cantora.
Dessa maneira, ao identificar e cartografar os principais atores envolvidos na controvérsia, entendemos que este estudo contribui para a compreensão das dinâmicas sociotécnicas que sustentam essas disputas, demonstrando como a cultura digital e a música pop brasileira se inserem em batalhas contemporâneas de significado e poder nas plataformas digitais.
A trajetória de Envolver, entre práticas de fãs e acusações de fraudes
Anitta é uma cantora e compositora nascida no bairro de Honório Gurgel, na cidade do Rio de Janeiro, com o nome de batismo de Larissa Macedo. Lançada pela equipe de funk Furacão 2000 como MC Anitta, ela ascendeu ao topo da indústria do entretenimento rapidamente e, neste momento, é uma das artistas com maior visibilidade no cenário nacional e internacional da música pop.
Interessa-nos sublinhar dois aspectos da sua bem-sucedida trajetória. O primeiro é sua expressiva presença na internet, com quase 65 milhões de seguidores no Instagram (Anitta, 2012), 15 milhões de seguidores no X [1] e números extraordinários de visualizações de seus videoclipes no YouTube (Anitta, 2011). Nesse cenário, destaca-se um aguerrido exército de fã-clubes digitais prontos para produzir engajamento, trabalhar em prol da carreira de sua diva e disputar espaço com fandoms de outras artistas – supostamente concorrentes ou desafetos de Anitta.
O segundo aspecto foi o crescente envolvimento de Anitta com a política institucional brasileira, com críticas ao governo Bolsonaro, sobretudo a partir da pandemia de Covid-19 [2], fazendo com que ela se tornasse um dos alvos de ataques da militância bolsonarista. Aspecto que se acirrou a partir da declaração de apoio à candidatura de Lula no pleito presidencial de 2022 [3].
É nesse contexto que a controvérsia em torno de Envolver ganha fôlego. No dia 11 de novembro de 2021, a música – quarto single do álbum de estúdio Versions of Me – gravada pela cantora em espanhol é lançada pela Warner Records. Em março de 2022, sua coreografia viraliza no TikTok. Ao longo desse mesmo mês, fãs da cantora se engajaram em uma campanha para levá-la ao Top 10 do Spotify e, posteriormente, ao Top 1 – rankings feitos pela plataforma para indicar os artistas mais ouvidos. Envolver chega ao Top 10 no dia 19 de março de 2022, alcançando o primeiro lugar do ranking no dia 24, permanecendo lá até o dia 26.
Aproveitando a repercussão, no dia 24 de março, Anitta fez uma publicação pedindo que o mesmo empenho dos fãs fosse usado para retirar o então presidente Jair Bolsonaro do poder (Anitta, 2022b). No dia 08 de abril, o site de notícias sobre tecnologia Rest of the World publica uma matéria em inglês com o título: “Como mega fãs de Anitta manipularam o Spotify para ajudar a criar o primeiro título para o Brasil de líder global das paradas” (Marasciulo, 2022) [4].
A publicação repercute no Brasil em matérias da Folha de São Paulo, publicada no dia 11 de abril (Martins et al., 2022), e do UOL, publicada no dia 12 (Como […], 2022). Ambas trazem como linha argumentativa uma suposta “manipulação dos algoritmos” do Spotify para fazer a música Envolver alcançar o Top 1.
Essa conjuntura abriu espaço para que outros sites ampliassem a polêmica, difundindo-a sob uma ótica baseada na desinformação. A alegada “manipulação” foi apresentada de forma sensacionalista, e a questão foi tratada como um fato consumado. Em meio a isso, no dia 12 de abril, Anitta lança seu 5º álbum de estúdio, Versions of Me.
No caso das acusações de suposta “manipulação”, o Brasil representou uma parcela significativa dos números que fizeram Anitta alcançar o Top 1 – com 6,4 milhões de execuções (4,1 milhões vindas do Brasil). O perfil do X/Twitter intitulado QG da Anitta – fã-clube da cantora verificado na plataforma e com conexão direta com a equipe de Anitta – publicou, na metade de março, o seguinte comentário: “Enviem nesse Tweet o print ouvindo Envolver que vamos sortear alguns códigos do Spotify Premium pra presentear vocês” (QG da Anitta, 2022). No dia anterior, outro fã-clube, Upload Anitta, havia publicado essa postagem: “bora trabalhar galera, usem todas as contas do Spotify, e não se esqueça de trocar de conta a cada 20 plays” (Upload Anitta, 2022). Essas publicações constam na reportagem veiculada pelo site Rest of the World (Marasciulo, 2022).
Contudo, não houve confirmação por parte do Spotify de que o título conquistado tenha envolvido manipulação ou fraude. A plataforma informa que monitora constantemente seu serviço no sentido de identificar, investigar e combater atividades fraudulentas. Nos termos de uso do Spotify não está claro o que constitui “manipulação”, nem em que medida isso difere do comportamento de fãs, como o identificado aqui. Nas diretrizes do usuário a plataforma afirma que não é permitido:
Aumentar artificialmente as contagens de reprodução ou seguidores, promover artificialmente o conteúdo ou outra manipulação, incluindo (i) usar qualquer bot, script ou outro processo automatizado, (ii) fornecer ou aceitar qualquer forma de compensação (financeira ou de outra forma) ou (iii) qualquer outro meio (Diretrizes […], 2023).
A organização mobilizada dos fãs em prol da promoção de seus ídolos faz parte das dinâmicas que constituem o fanativismo na atualidade, com um exército engajado de fãs que não mede esforços para promover seus ídolos, atuando num terreno nebuloso e passível de especulações sobre manipulação e fraudes (Burgess et al., 2022).
No caso de Anitta, a primeira matéria a divulgar a suposta “manipulação” aborda a questão da seguinte forma:
A campanha “Envolver” cai numa zona cinzenta, dado que aparentemente muitas das transmissões foram geradas por um exército de fãs altamente engajados, e não por bots, que o Spotify se tornou muito hábil em detectar e expulsar de sua plataforma. “Do ponto de vista do marketing digital, não há nada de errado com os fãs fazendo isso. Se um artista tem pessoas dispostas a fazer isso, isso só mostra o quão poderosas elas são”, disse Faria (Marasciulo, 2022, tradução nossa) [5].
De acordo com matéria do portal G1, Anitta teria chegado ao top 10 mesmo sem o Brasil, mas não ao primeiro lugar (Ortega, 2022).
Cultura pop, entretenimento e política no contexto das guerras culturais
Barros e Chagas apontam duas vertentes principais do bolsonarismo: a “institucionalista” e a “histórico-antropológica”. A partir disso, propõem uma terceira vertente, que busca compreender o bolsonarismo a partir de uma visada culturalista (2023, p. 2). Considerando “variáveis de caráter simbólico-cultural”, os autores definem cinco características da cultura política digital do bolsonarismo. A primeira é a “superficialização da política”, exemplificada pelo antipetismo, que reforça uma divisão binária simplista de “nós contra eles”. A segunda apresenta o “par politização/despolitização”, que trata a política como um ambiente corrompido, e por isso, algo a ser evitado. A terceira é o individualismo político ou o culto à ação autônoma. A quarta característica envolve o improviso e a ação errática como estratégias, onde piadas com teor racista e misógino tornaram-se comuns entre bolsonaristas. A quinta e última característica destaca uma leitura adversarial da imprensa, levando à criação de fontes alternativas de informação, geralmente hiperpartidarizadas. Esse sistema de distribuição de informações, estruturado em múltiplas plataformas e liderado por influenciadores de alcance nacional, regional ou local, fundamenta a base das ações coordenadas bolsonaristas.
Em diálogo com os autores, somamos à compreensão do bolsonarismo uma moldura mais ampla para entendimento das práticas políticas contemporâneas, que é a das chamadas “guerras culturais” (Hunter, 1991). Termo que, inicialmente, refere-se a um conjunto de práticas que dizem respeito às transformações sociopolíticas e culturais dos Estados Unidos na década de 1960, tais como as crescentes reivindicações das minorias, gerando como resposta uma reação conservadora organizada – mas que se espraiou para um contexto mais amplo no qual o Brasil, sob a presidência de Bolsonaro, tornou-se um exemplo eloquente. Dessa maneira,
as guerras culturais caracterizam o momento em que as pautas morais ganham protagonismo na política institucional, deslocando a centralidade da discussão econômica e distributiva que organizou os partidos tradicionais e os sindicatos até os anos 1960 (Pereira de Sá; Alberto, 2023, p. 5).
Entendemos que as cinco características elencadas por Barros e Chagas, enquanto marcas do bolsonarismo, não são específicas do contexto brasileiro, mas podem ser reconhecidas como “a forma atual do debate no espaço público” (Melo; Vaz, 2021, p. 9). Forma, esta, na qual se destaca o recrudescimento discursivo que troca a moderação clássica, mais próxima do centro democrático, pela radicalização como programa. Assim, seja nos Estados Unidos de Donald Trump, seja no Brasil de Bolsonaro, observa-se o uso político da internet para a produção contínua de clivagens morais e agendamentos de conflitos através da polarização, que tem como resultado a naturalização de posições como racismo, homofobia, xenofobia, elitismo, machismo, associadas na mesma cadeia de significantes. Posições que se disseminam e são amplificadas por meio de características algorítmicas das redes sociotécnicas, com seu poder de espalhamento, compartilhamento e propagação de conteúdo a partir de interesses específicos dos usuários.
Procedimentos metodológicos
Entendemos que o caso da música Envolver pode ser compreendido, no sentido latouriano, enquanto uma controvérsia. Com esse enquadramento sobre o fenômeno buscamos chamar a atenção para “as dimensões materiais e políticas da formação do social (Latour, 2005) em artefatos tecnológicos como o Twitter” (D'Andrea, 2018, p. 28). Buscamos atentar, assim, para as singularidades de uma controvérsia que se dá nas mediações de plataformas. Em diálogo com Marres (2015), apostamos aqui em uma abordagem primordialmente discursiva.
Nosso estudo se baseia metodologicamente na Análise de Conteúdo (Maia; Hauber; Paula, 2022), através da qual, para sua aplicação, Sampaio e Lycarião (2021) definem doze microetapas divididas em três momentos: conceituação, desenho e análise.
A primeira etapa abrange a identificação do problema e o estabelecimento dos objetivos de pesquisa e das hipóteses que nortearam a coleta e análise dos dados, discutidos na introdução.
Para a segunda etapa, consideramos como unidades de análise (Maia; Hauber; Paula, 2022, Sampaio; Lycarião, 2021) os conteúdos das postagens e dos perfis no X/Twitter. A coleta das publicações ocorreu entre março de 2022 e fevereiro de 2023 [6]. Utilizamos a ferramenta Netlytic (2025), que identificou 86.475 postagens com os termos “algoritmo” e “spotify”, no idioma português.
Aplicamos um filtro utilizando o termo “anit”, para que permanecessem apenas as publicações que mencionaram a cantora Anitta. Restaram 8.582 postagens que traziam a suposta “manipulação do algoritmo” do Spotify. Separamos uma amostra de 758 postagens para análise. Essas publicações dividem-se em 408 tweets originais, 317 replies e 33 quotes. As 758 publicações analisadas representam 8,8% do total identificado. Desconsideramos apenas os retweets, que corresponderam a 7.824 publicações.
Para classificar os conteúdos, iniciamos com a identificação de categorias a partir de uma leitura preliminar dos tweets. Seguindo as práticas recomendadas para a formulação de categorias na análise (Sampaio; Lycarião, 2021), essa abordagem exploratória destacou categorias dedutivas iniciais, que serviram de base para a categorização final.
Em seguida, para a codificação, elaboramos uma planilha de anotação com os dados coletados (Anitta, [202-a]), além de um livro de códigos (Anitta, [202-b]) que detalha cada categoria. A classificação dos tweets foi realizada por dois anotadores. Realizamos um teste de confiabilidade, conforme definem Maia, Hauber e Paula (2022), além de Sampaio e Lycarião (2021), para avaliar a concordância entre os resultados obtidos, alcançando um valor de 0,736 no alpha de Krippendorff [7].
Quanto à amostragem, escolhemos a plataforma X/Twitter por ser muito utilizada em estudos na área de Comunicação e apresentar – até então – a possibilidade de coleta gratuita. Em fevereiro de 2023, após a compra da empresa pelo empresário Elon Musk, a plataforma encerrou o acesso gratuito à sua API. Antes disso, o X/Twitter permitia a coleta equivalente a apenas 1% do que era publicado sobre o termo pesquisado. Portanto, nossos resultados não são representativos da população como um todo.
Para testar nossa hipótese e alcançar os objetivos, definimos quatro eixos de análise, sendo eles: (V01) o posicionamento político da publicação e/ou do perfil; (V02) a valência do conteúdo da publicação; (V03) a presença de desinformação nos conteúdos e (V04) que veículo de notícias estava associado ao link.
No eixo V01, buscamos compreender a partir de qual posicionamento político os perfis repercutem a questão. Através da análise do conteúdo da publicação e do perfil que realizou a postagem, classificamos como sendo de um perfil “pró Lula”, “pró Bolsonaro”, ou como “não se aplica”.
Ao analisarmos os perfis, consideramos a verificação dos conteúdos das abas “Posts”, “Mídia” e perfis seguidos e seguidores. Além disso, fizemos buscas na interface do X/Twitter utilizando como filtro os termos “Bolsonaro” e “Lula”, junto ao nome do perfil responsável pela publicação.
A categorização ocorreu a partir de evidências inequívocas de que a publicação ou o perfil apresentava alguma relação de apoio e adesão aos políticos e suas pautas. Identificamos, ainda, perfis suspensos que não eram passíveis de avaliação.
No eixo V02, através da análise do conteúdo da publicação, e da relação com o perfil que o publicou, classificamos a valência como “positiva”, “negativa”, “neutra” ou “ambivalente”. Para a definição destas categorias levamos em consideração as pesquisas realizadas por Miguel (2015) e Feres Jr (2016) [8].
Buscamos compreender se a maior parte das publicações repercute um posicionamento negativo, estabelecendo uma relação entre esse e o primeiro eixo, identificando o quanto esse posicionamento negativo é propagado por perfis bolsonaristas.
Ao todo, 390 publicações (51,5% do total analisado) tinham ao menos um link associado. Nesses casos, abrimos o link e analisamos de forma sistemática o conteúdo das notícias. O Spotify nunca confirmou nenhum tipo de manipulação envolvendo Anitta e a canção Envolver. A partir disso, consideramos desinformação (Wardle; Derakhshan, 2017) [9] no eixo V03, quando o link direcionava para conteúdo noticioso que repercutia a suposta “manipulação do algoritmo” como um fato.
Na interface dos sites identificados pesquisamos pelos termos “Bolsonaro” e “Lula” buscando identificar o enquadramento dado. Este eixo (V04) foi pensado para mensurar a presença de sites hiperpartidários e o quão relevante eles foram nas publicações. A classificação considerou sites (i) hiperpartidários – quando havia um favorecimento a partidos e políticos de forma clara e inequívoca nos conteúdos –, (ii) imprensa tradicional, (iii) veículos internacionais, (iv) “outros”, e, quando não havia link, (v) “não se aplica”. A partir disso, seguimos para a última grande etapa da AC, a análise e interpretação dos dados (Maia; Hauber; Paula, 2022; Sampaio; Lycarião, 2021).
Resultados
Ao analisarmos as 758 publicações e seus perfis associados, identificamos no primeiro eixo um total de 389 postagens classificadas como pró-Bolsonaro (51,3% do total). Não foi possível avaliar 332 – 43,8% da amostra –, uma vez que o perfil não estava mais disponível, ou a conta havia sido suspensa. Já entre os perfis pró-Lula, identificamos 37 publicações (4,9%).
Quanto ao eixo V02, os resultados trazem 561 postagens negativas – 74% das publicações. Postagens consideradas ambivalentes corresponderam a 12% (91). A valência positiva foi identificada em apenas 77 postagens (10,2%), enquanto 29 foram consideradas neutras (3,8% da amostra).
Pouco mais da metade das publicações (394 – 52%) não trazia link associado, enquanto 364 tinham ao menos um link. Identificamos notícias com desinformação em 43,1% das publicações, onde 327 postagens traziam prints ou links para notícias que apresentavam a suposta manipulação como um fato. Apenas 41 publicações (5,4%) traziam notícias sem desinformação.
Sites considerados hiperpartidários foram identificados em 170 postagens (46,7% das publicações com algum link associado), todos alinhados à extrema direita bolsonarista. A imprensa tradicional está associada a 124 postagens (34% das publicações com links), enquanto sites classificados como “outros” foram identificados em 63 publicações (17,3% das publicações com links). Links para sites internacionais estavam presentes em 7 publicações (2% das publicações com links).
O gráfico a seguir ilustra a presença dessas categorias nas publicações ao estabelecer uma relação entre os quatro eixos. Perfis bolsonaristas se destacam nas publicações negativas envolvendo o uso da parte das matérias de sites hiperpartidários da extrema direita. Perfis de esquerda representam uma pequena parcela, relacionada a postagens positivas.
Gráfico 1 – Classificação e relação entre os quatro eixos de análise.
Fonte: Elaborado pelos autores (2024).
Distribuímos as 758 publicações classificadas pela valência entre os meses de março de 2022 e fevereiro de 2023. O mês de março apresentou o maior índice de mensagens positivas, devido às publicações feitas por fãs que se engajaram em levar a música para o top 1. Embora o volume seja baixo em relação ao mês seguinte, percebemos sete vezes mais publicações positivas (37) do que negativas (5).
Na sequência, a questão é instrumentalizada pela extrema direita, que dissemina a possibilidade de Anitta ter “manipulado o algoritmo” do Spotify. O mês de abril trouxe um pico significativo nos dados, com 530 publicações que representam 69,9% das 758 postagens analisadas. Dentre elas, 431 são negativas.
A maior parte das publicações ocorreu no dia 12 de abril, data de lançamento do 5º álbum de estúdio de Anitta. Após a sequência de acontecimentos de março, no início de abril ocorre uma ação coordenada para atacar e descredibilizar Anitta, levada a cabo por perfis e sites alinhados à extrema direita. Se considerarmos o total de publicações, ou seja, as 8.582 postagens identificadas com o termo “anit”, 51% delas (4.385) foram realizadas no dia 12.
No mês de maio, com 67 publicações (8,8% do total), temos uma diminuição drástica de postagens, enquanto pequenos picos ocorrem em outros dois meses. Em julho, Anitta declara voto ao candidato à presidência Lula, o que faz com que sejam veiculadas 37 postagens (4,9%). No mês de outubro, em meio ao primeiro e segundo turno das eleições, a cantora apresentou 23 publicações (3%) ainda reverberando acusações de suposta “manipulação” algorítmica.
Gráfico 2 – Valência e volume das publicações ao longo do tempo.
Fonte: Elaborado pelos autores (2024).
O próximo gráfico ilustra os resultados da análise dos eixos V03 (“Desinformação”) e V04 (“Veículo Noticioso”). Ao examinarmos o conteúdo das publicações, identificamos que 390 delas (51,5%) não continham links ou imagens de notícias.
A desinformação foi identificada em 327 postagens (43,1%) que incluíam links ou imagens de notícias que alegavam manipulação algorítmica. Em 170 publicações (22,4%), foram identificados veículos considerados hiperpartidários, apresentando algum viés político-ideológico. Os 19 sites identificados nessa categoria demonstravam alinhamento com pautas da extrema-direita.
A imprensa tradicional disseminou desinformação em 123 postagens (16,2%), com destaque para o UOL, presente em 119 delas. Já os sites classificados como “Outros”, que também continham desinformação, foram identificados em 24 postagens (3,2%), enquanto veículos internacionais apareceram em sete publicações (0,9%). Imagens contendo manchetes de notícias com desinformação foram encontradas em três postagens (0,4%), nas quais não foi possível identificar o veículo de origem, sendo estas classificadas como “não se aplica (N/A)”.
Por fim, 41 publicações (5,4%) não continham desinformação. Uma parcela pequena se considerarmos as postagens com algum link associado. Dessas, 39 (5,1%) citavam veículos classificados como “outros”, enquanto apenas uma (0,1%) pertencia à imprensa tradicional. Uma publicação incluía uma manchete de notícia sem identificação do veículo, e foi classificada como “não se aplica (N/A)”.
Gráfico 03 – Desinformação e veículos noticiosos.
Fonte: Elaborado pelos autores (2024).
Veículos de notícia hiperpartidários foram identificados em 170 publicações, ou seja, 46,7% das postagens que possuíam links. Esses sites formam um ecossistema que busca direcionar a audiência para fontes de desinformação alinhadas à agenda bolsonarista. Entre eles, os mais frequentes foram Terra Brasil Notícias (86 vezes, 23,6% dos links) e Jornal da Cidade Online (43 vezes, 11,8% dos links). A matéria do Terra Brasil Notícia não está mais disponível. Porém, identificamos a página na ferramenta Wayback Machine, onde pode ser lida na íntegra (Bomba […], 2022).
Em terceiro lugar, o Agora Notícias Brasil apareceu em onze publicações. O Pleno News, em quarto, teve sete publicações associadas ao site, enquanto o Gazeta Brasil foi identificado em quatro.
Entre todas as 8.582 que citam Anitta, o Terra Brasil Notícias foi o segundo site mais compartilhado, com 1.746 republicações. O veículo utiliza a expressão sensacionalista “Bomba” no título da matéria, que dá como certa a “manipulação”. Ainda considerando todas as 8.582 publicações do corpus, a frase que mais se repete aparece 2.907 vezes (33,8%). Trata-se de uma reprodução do título da matéria do Terra Brasil Notícias: “Bomba: Anitta esteve no primeiro lugar do Spotify por fraude no algoritmo, diz site”.
Além de dar como certa a suposta “manipulação”, o Jornal da Cidade Online também faz uso de expressão sensacionalista no título: “Informação vaza”. O veículo foi o sexto mais retuitado (241 vezes), e afirma que “Anitta não engrena por nada” (Informação […], 2022).
Entre os links classificados como “imprensa tradicional”, identificamos que 124 publicações (34% dos 364 links) redirecionam os usuários para matérias de veículos do grupo UOL. Com uma presença significativa nesse eixo, os links de notícias do grupo reproduzem a “manipulação” como algo dado.
Os links também foram disseminados pelos perfis do grupo UOL no X/Twitter, onde aparecem entre os mais republicados, se considerarmos as 8.582 publicações que citam Anitta. Com 401 retweets, o perfil UOL aparece em quarto lugar. Na 13ª posição, o perfil tilt_uol possui 86 republicações.
Observamos, ainda, uma predominância de links de veículos do grupo UOL sustentando ataques de perfis bolsonaristas e sendo repercutidos por sites hiperpartidários. Isso evidencia como a imprensa tradicional contribui para conferir credibilidade ao que esses perfis e sites divulgam.
Um link do portal G1 aparece nesse grupo uma única vez (Ortega, 2017), e não apresenta conteúdo sobre a suposta “manipulação” de Anitta, mas uma notícia sobre o uso de estratégias parecidas por cantores sertanejos.
Links de sites da categoria “outros” foram identificados em 63 publicações (17,3% dos links). Os quatro sites mais presentes nesse grupo abordam questões sobre tecnologia em suas notícias. Em primeiro lugar, o TecMundo apresentou 29 publicações com links para uma matéria sobre a “manipulação” (Santos, 2022). Com 8 links, o site Showmetech apresenta matéria afirmando que fãs teriam “burlado o algoritmo” (Queiroz, 2022). O Olhar Digital apareceu em 6 publicações, enquanto o Canaltech em 4. Sites internacionais estavam presentes em 7 postagens (1,9%), onde alguns repercutiam o estudo feito pelo Rest of the world.
Considerando todas as 8.582 publicações é possível identificar padrões entre as frases mais frequentes. Acusações envolvendo uma perspectiva sexista e moralista expõem a produção de narrativas muitas vezes pautadas por uma radicalização e polarização dos discursos responsáveis por uma excitação constante da audiência. A pauta dos costumes atua como um instrumento de despolitização, ao colocar em evidência no debate aspectos relacionados a um moralismo, relegando para segundo plano aspectos estruturais do debate. A segunda frase com mais presença no corpus (1.766 vezes), traça uma relação sexista entre Anitta e um artista do gênero masculino: “Gusttavo Lima chegou ao top 1 do Spotify Brasil, sem trapacear com o algoritmo e sem tirar a roupa ou colocar mulheres semi-nuas em seus clipes. A Anitte deve estar com inveja – difícil ver alguém chegar ao topo por ter talento e inteligência”.
Pautas bolsonaristas também foram acionadas ao fazer uma associação entre Anitta, o Partido dos Trabalhadores, Lula e o crime organizado. Corroborando o que Barros e Chagas (2023) chamam de “superficialização da política”, uma frase aparece 353 vezes no corpus e diz: “Gente do céu, depois de manipular o algoritmo da Spotify pra alcançar o topo da plataforma, eis q agora a tatuada no toba tá apoiando o luleco? #AnittaApoiaOCrime”. O mesmo pode ser identificado em outro exemplo, presente em 159 publicações: “A Anita, conhecida por ter o cano de escape tatuado e fraudar o algoritmo do Spotify, fez um vídeo tirando o corpo fora caso o governo do Ladrão seja uma merda. Ela é ricaça e se aqui feder, ela vai pros EUA comprar bolsas de 50k, mas os otários que a seguiram vão revirar lixo”.
Também identificamos ataques à imprensa em frase presente em 174 publicações: “Como a militância de redação desinforma. Chamam a fraude no algoritmo do Spotify produzida pelos fãs da Anitta de ‘impulso’. Isso se chama comportamento inautêntico. Se fosse uma artista com visão de direita, estaria sendo criticada por isso. Como é de esquerda…”. Já este outro exemplo ataca a Globo, um dos principais alvos dos bolsonaristas: “@usuário @TerraBrasilnot William Bonner @_BonnerOficial o que você diz disso: Você irá falar no JN que foi fraudado o algoritmo e por essa razão a Anitta esteve em ‘1° lugar’ no Spotify? Se você sonegar essa informação, você passará atestado de covarde e que não possui um pingo de vergonha na cara”.
Publicações também relacionam a suposta “fraude” envolvendo Anitta a uma fraude nas urnas eletrônicas. Em ano eleitoral, a pauta apresentou-se como prioridade entre os bolsonaristas, envolvendo inclusive ataques ao Supremo Tribunal Federal e apelos às Forças Armadas, como fica claro nessa publicação: “Fraude de algoritmo, passou a ser o pesadelo da Anitta, mas também é nosso pesadelo. Estas urnas do Barroso são fraudáveis tanto quanto o primeiro lugar da Anitta no Spotify. Atenção FFAA”.
Quanto às alegações de suposta “manipulação do algoritmo” do Spotify por Anitta e seus fãs, os resultados desta pesquisa confirmam nossa hipótese ao apontarem para uma parte considerável das publicações feitas por perfis bolsonaristas que instrumentalizaram a questão para, em um cenário de ano eleitoral, atacar a cantora. As publicações veiculam desinformação através de links para notícias, em muitos casos, de veículos alinhados à extrema direita bolsonarista.
Uma segunda constatação é sobre a articulação das práticas bolsonaristas, identificadas por Barros e Chagas (2023), ao cenário mais amplo das táticas das guerras culturais (Hunter, 1991), na qual temas aleatórios são pautados a fim de manter uma estratégia de polarização (nós contra eles), através da guerrilha permanente “contra o inimigo”.
No discurso dos perfis bolsonaristas, percebe-se que sexismo, moralismo, demonização do funk, manipulação de algoritmos, fraude nas urnas e associação entre Anitta e “Lula ladrão” – assuntos que, a rigor, nada têm a ver um com o outro – passam a fazer parte da mesma cadeia de acusações que visam deslegitimar o oponente, superficializar o debate e produzir engajamento nas redes sociais através de discursos de ódio.
Considerações Finais
Neste artigo, conduzimos uma análise empírica de dados de plataformas de mídias sociais, mapeando atores e narrativas e articulando-os a abordagens teóricas que exploram a interseção entre política e entretenimento a partir de uma controvérsia específica.
Ao seguir os atores envolvidos nas postagens na plataforma X/Twitter e suas interações, foi possível cartografar a controvérsia (Latour, 2005) em torno da acusação de “manipulação do algoritmo” imputada à cantora Anitta. Esse mapeamento permitiu identificar actantes, momentos de instabilidade, os argumentos mobilizados e as alianças formadas, além de acompanhar o processo de estabilização do debate, evidenciando as dinâmicas sociotécnicas que estruturaram o fenômeno.
A análise apontou para evidências quanto a articulações e instrumentalização das acusações de “manipulação” por perfis bolsonaristas e sites hiperpartidários, com o intuito de disseminar desinformação. Acreditamos que essa perspectiva é crucial e demanda desdobramentos mais aprofundados, especialmente por parte de pesquisadores que desejam expandir o debate sobre os grupos vinculados à extrema direita e sua relação com a música pop no contexto brasileiro.
Além disso, num contexto de guerras culturais, enfatizamos que as publicações consideradas positivas evidenciam a presença de contra-argumentos que se infiltram no debate com a intenção de subvertê-lo. A performatividade da cultura exerce, portanto, uma transformação sobre o campo político, criando pontos de interseção flexíveis e permitindo que o imaginário político não se restrinja ao discurso de ódio às diferenças, às corporeidades não conformistas e às particularidades das formas de vida que buscam navegar em espaços marginais.
Por fim, reiteramos o papel central da cultura pop e do entretenimento nas disputas políticas contemporâneas, que se desenrolam em um ambiente de alta visibilidade nas redes sociais.
Notas
[1] Informações coletadas em 29 set. 2024.
[2] Vale ressaltar que Anitta frequentemente enfatiza seu desinteresse por partidos e pela política institucional, numa postura que consegue dialogar com parte da juventude atual, que desconfia de políticos tradicionais. Porém, este artigo não tem como objetivo analisar as estratégias de posicionamento adotadas pela cantora, que teve uma atuação bastante mais tímida no segundo turno das mesmas eleições presidenciais, mas compreender como essa disputa de narrativas se insere no contexto mais amplo das guerras culturais, articulando as esferas do entretenimento e da política.
[3] Para uma análise detalhada do envolvimento de Anitta com a política, ver Pereira de Sá (2021), especificamente o capítulo 8. Também destacamos a pesquisa Quaest que aponta Anitta como a terceira maior influenciadora política do Brasil no ano de 2020 (Couto; Saconi, 2020).
[4] How Anitta megafans gamed Spotify to help create Brazil’s first global chart-topper.
[5] The ‘Envolver’ campaign falls within a gray zone, given that apparently many of the streams were generated by an army of highly engaged fans, not bots, which Spotify has become very adept at detecting and expelling from its platform. ‘From a digital marketing perspective, there’s nothing wrong with fans doing it. If an artist has people willing to do that, it only shows how powerful they are,’ Faria said.
[6] Em fevereiro de 2023 o X/Twitter optou por encerrar o acesso gratuito à sua API (Application Programming Interface), impossibilitando que a coleta se estendesse.
[7] Para indicar um nível razoável de confiabilidade entre anotadores, o mínimo aceitável para o alpha de Krippendorff é de 0,667.
[8] Reconhecemos que há uma controvérsia sobre o uso da abordagem metodológica envolvendo a valência, amplamente discutida em trabalhos como os de Miguel (2015) e Feres Jr (2016). No entanto, optamos por utilizá-la neste estudo devido à sua capacidade de fornecer uma análise sistemática das narrativas discursivas, especialmente em contextos de campanhas políticas e comunicação de massa. A valência permite uma avaliação das tonalidades emocionais e persuasivas presentes nas mensagens, o que é essencial para identificar padrões de aprovação ou rejeição que permeiam a opinião pública e moldam o debate político.
[9] Desinformação é entendida aqui como uma forma de propaganda que envolve a disseminação de informações falsas, criadas deliberadamente para prejudicar uma pessoa, grupo social, organização ou país. Essa prática visa alcançar ganhos políticos ou financeiros, sempre com a intenção de enganar, influenciar a opinião pública ou distorcer a verdade.
Artigo submetido em 01/11/2024 e aceito em 02/04/2025.
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