A vida cotidiana em Paterson e as categorias fenomenológicas
do pensamento
Marcos Paulo da
Silva[1]
Victor Hugo Sanches
Pereira[2]
Resumo: O artigo volta-se
à análise do longa-metragem Paterson
(2016), do diretor norte-americano Jim Jarmusch, obra que apresenta como
principal referência os eventos que sucedem a vida cotidiana. A trama do
romance acontece em um cenário urbano, sob o protagonismo de um tranquilo
motorista de ônibus que descreve os acontecimentos do seu dia a dia em
abstrações poéticas. O trabalho propõe-se a uma reflexão sobre os impactos que
provém da organização da vida cotidiana ordenada pelo tempo da produção linear.
A vida cotidiana pode ser compreendida a partir de um cenário progressivo de
fenômenos mediados por acontecimentos ordinários e regulares (instância
temporal), que respaldam — e encontram respaldo — no senso comum como forma de
conhecimento (instância da produção de significados). A partir de análise de
sequências do filme, o artigo indica uma reflexão sobre a constituição da vida cotidiana
em interface com as categorias do pensamento fenomenológico oriundas da
filosofia peirceana. Compreende-se, em sintonia com Cañizal (2001), que as
formas de expressão poética mobilizadas pelo longa-metragem endereçam a uma
ruptura do conhecimento padronizado, sublinhando a poiésis como categoria
metafísica que expande os aspectos de representação da realidade.
Palavras-chave:
Comunicação; Análise Fílmica; Vida Cotidiana;
Fenomenologia; Senso Comum.
Everyday
life in Paterson and phenomenological categories of thoughts
Marcos Paulo da Silva[3]
Victor Hugo Sanches
Pereira[4]
Abstract: The article intends to
analyze the movie Paterson (2016), by American director Jim Jarmusch, a
movie that presents as main reference the events that follow everyday life. The
novel plot takes place in an urban setting under the guise of a quiet bus
driver describing the events of his daily life in poetic abstractions. This
paper proposes a reflection on the impacts that come from the organization of
daily life ordered by the time of linear production. Everyday life can be
understood from a progressive scenario of phenomena mediated by ordinary and
regular events (temporal instance), which support — and find support — in common sense as
a form of knowledge (instance of the production of meanings). From the analysis
of sequence the film, the article proposes a
reflection on the constitution of daily life in interface with the categories
of phenomenological thought originating from Peirce philosophy. It can be
understood, in line with Cañizal (2001), that the
poetic expression forms mobilized by the movie address a rupture in
standardized knowledge, underlining poiésis as
a metaphysical category that expands the aspects of representation of reality.
Keywords: Communication;
Film Analysis; Everyday Life; Phenomenology; Common Sense.
Para situar o debate
O
artigo propõe uma análise da interface entre a concepção de vida cotidiana e as
categorias fenomenológicas do pensamento peirceano a partir do longa-metragem Paterson (2016), dirigido pelo cineasta
norte-americano Jim Jarmusch. Indicado à Palma de Ouro no Festival de Cannes em
2016 e lançado no Brasil em 2017, o filme possui duração de uma hora e
cinquenta e dois minutos e enquadra-se nos gêneros romance e comédia. O roteiro
apresenta como protagonista um pacato motorista de ônibus (Adam Driver) da
cidade de Paterson, localizada no
estado de Nova Jersey, nos Estados Unidos. A narrativa mostra a rotina de
trabalho do personagem e os fatos ordinários que envolvem as relações de seu
cotidiano durante um período ficcional de sete dias. O protagonista também
recebe o nome de Paterson, o que permite associar, metaforicamente, a
personalidade do mesmo (calma e pacata) como uma representação das situações
que envolvem o cotidiano da cidade. Toda a narrativa se desenvolve em torno das
rotinas: familiar (o dia a dia com a esposa e o cão de estimação); de trabalho (a
regularidade do trajeto da linha de ônibus); do motorista, ressaltando suas
banalidades, repetições e — ainda que sutilmente — formas de resistência aos ritos
alienantes do dia-a-dia.
Os
acontecimentos ordinários da rotina de Paterson inspiram poemas anotados pelo
personagem em um pequeno caderno[1]. Mesmo
que os eventos sigam uma estrutura-padrão na narrativa, as informações e fatos
registrados pelo protagonista em seus versos denotam situações com sentidos
dissonantes. O cotidiano mediado no filme por acontecimentos repetitivos,
curiosamente, constitui o fator de inspiração que estimula o protagonista a
produzir suas distintas reflexões poéticas, também influenciadas pelo poeta e
conterrâneo William Carlos Williams (1883-1963), foco de inúmeras analogias ao
largo da trama.
O
longa-metragem faz provocações aos hábitos rotineiros que permeiam a vida
cotidiana das pessoas da cidade e remetem a uma espécie de alienação — a perda de sentido — ligada a seus movimentos
repetitivos. Nesse ínterim, embora a produção de Jim Jarmusch enquadre-se no
escopo da ficção com enredo calcado em personagens imaginários e em uma
narrativa descontínua, entende-se que a construção da trama de Paterson remete a uma “condição real” de
mundo e as experiências interpretadas pelos personagens ao longo de uma semana
encontram respaldo em contextos que representam situações e acontecimentos
típicos da vida cotidiana e de suas instâncias constituintes, o que ressalta a
pertinência do tema como objeto de análise.
O pensamento fenomenológico de Peirce: interfaces com a vida cotidiana
Conhecida
como Ciência Geral dos Signos, a Semiótica do filósofo norte-americano Charles
Sanders Pierce (1839-1914) oferece elementos oportunos de análise a respeito
das instâncias constitutivas da vida cotidiana ao considerar qualquer fenômeno
cultural como um sistema provido de significação. Desse modo, todo elemento
visual, sonoro, verbal, para além do campo linguístico — como a fala e a escrita — são englobados pela Semiótica de
Peirce, que também se apoia em outras ciências, especialmente a Fenomenologia. Para
o pensamento peirceano, a consciência, diante de qualquer fenômeno, produz
signos baseados nas experiências e os estruturam em três categorias universais
do pensamento: a Primeiridade, a Secundidade e a Terceiridade.
De
acordo com Ibri (2015, p.25), “as três faculdades requeridas podem”,
respectivamente, “ser resumidas como ver, atentar para e generalizar,
despindo a observação de recursos especiais de cunho mediativo”. A Primeiridade
é a categoria que carrega em si a ideia de primeiro, ou seja, literalmente
sugere que sob ela não há “outro”. Segundo Peirce (CP 1.302), “a ideia de Primeiro é predominante
nas ideias de novidade, vida, liberdade. Livre é aquilo que não tem outro atrás
de si determinando suas ações”[2]. Essa
primeira faculdade da mente pode ser caracterizada por uma “qualidade”, isto é,
um tipo de sentimento que manifestado não permite discernir sobre o tempo e a
consciência de alteridade. Em outros termos, a categoria representa:
Este estado de consciência
de experienciar uma mera qualidade, como uma cor ou um som, caracteriza-se por
ser uma experiência imediata em que não há, para essa mesma consciência, fluxo
de tempo. [...] Ela é uma consciência que, por ser o que é sem referência a
mais nada, está absolutamente no presente, na sua ruptura com passado e futuro
(IBRI, 2015, p. 30).
A
segunda faculdade da mente é aquela que sugere “atentar para”, ou seja, permite
entender a existência de um outro. Trata-se do sentimento de dualidade na
mente, dada por uma sensação motivada por algo externo (um segundo), que se
associa (corresponde) a uma qualidade (um primeiro). A Secundidade é a
categoria que descobre o objeto, que objeta e, consequentemente, permite tomar
consciência da existência do eu e também do outro. Portanto, a qualidade
constitui-se parte de um fenômeno, uma vez que para a existência fenomenológica
é necessária a materialização do outro — conjuntura que se mostra latente na
vida cotidiana. Para Ibri (2015), o tensionamento binário de ideias permite um
julgamento da consciência:
Assim é que no fenômeno
surge a ideia de outro, de alter, de alteridade; com ela aparece a ideia de
negação, a partir da ideia elementar de que as coisas não são o que queremos
que sejam, nem, tampouco, são estatuídas pelas nossas concepções. A binaridade
presente neste se opor a traz consigo a ideia de segundo em relação a, constituindo
uma experiência direta, não mediatizada. Parece que algo reage contra nós,
fazendo-nos experienciar uma dualidade bruta. (IBRI, 2015, p. 26).
Nota-se
na Secundidade um mundo que reage ao confrontar determinadas concepções de um
indivíduo sobre algo imaginário, aparente ou possível. A partir dessa oposição
binária de ideias, as relações são mediadas por estímulos e respostas (ação e
reação) experienciadas pela consciência, que exerce força no elemento negativo
do ser (alteridade). De acordo com Peirce (CP 1.324), o aspecto individual do Segundo
transfigura-se para o ego sua negação, um não-ego. “Tornamo-nos
conscientes do eu ao nos tornarmos conscientes do não eu”[3].
A
Terceiridade, por seu turno, é a categoria da mente que, a partir das relações
opositivas (ação e reação), provoca na consciência a ideia de um terceiro
(mediador) entre o primeiro e o segundo. Conforme aponta Ibri (2015, p.35), “a
experiência de mediar entre duas coisas traduz-se numa experiência de síntese,
numa consciência sintetizadora”. Portanto, o terceiro interpõe, entre o
primeiro e o segundo, ideias gerais que os representam. As representações
ocorrem entre as qualidades de consciência (“o que pode ser”) e os fatos
experienciados (“o que é”), resultando na síntese de um “o que deve ser”. A
Terceiridade, naturalmente, estimula a mente a produzir generalizações que
condicionam os processos de aprendizagem, bem como a percepção dos fluxos de
tempo. O aprendizado será relativo ao tempo, que envolve as relações e a
mediação de um pensamento que permite à consciência comparar e concluir.
O
arcabouço teórico-conceitual de Peirce, portanto, possibilita reconhecer a
existência de uma realidade concreta (Secundidade) e de uma realidade abstrata
das coisas (Primeiridade e Terceiridade), manifestadas no campo eidético. Tal
conceituação se mostra pertinente para uma reflexão sobre os processos de
aprendizagem e resistência existentes nas experiências da vida diária. Nessa
perspectiva, os processos repetitivos do cotidiano não impõem para as experiências
ordinárias, no que tange, especialmente, o senso comum — como instância de
produção de significados da vida cotidiana — uma simples linearidade desprovida
de complexidade.
Finalmente,
deve-se sublinhar que a filosofia de Peirce divide-se em três áreas de
conhecimento: a Fenomenologia, as Ciências Normativas e a Metafísica. De acordo
com Peirce (CP 1.284), a Fenomenologia é entendida como a ciência dos fenômenos
(faneron), isto é, “o total coletivo de tudo aquilo que está de qualquer
modo presente na mente, sem qualquer consideração se isso corresponde a
qualquer coisa real ou não”[4]. É responsável por investigar e classificar a
manifestação dos fenômenos a partir dos processos mentais que constituem uma
significação abstrata, reflexiva ou intelectual para o indivíduo, a partir das
experiências universais (diárias) de mundo. A Semiótica, por sua vez, consiste
na disciplina que estuda os fenômenos já dotados de sentido (signos) e os
processos que fundamentam essa significação simbólica. Ou seja, busca
compreender, potencialmente, as aparências (qualidades da realidade)
experienciadas pelos indivíduos na vida cotidiana. Tratam-se de aspectos gerais
que permeiam tais relações, em efeito, motivadas por qualquer experiência
interior ou exterior. Portanto, uma lembrança, um sonho, um pensamento qualquer
ou todo o mundo exterior são considerados fenômenos. A Fenomenologia, assim,
não se fundamenta em observações excepcionais, mas em todas as manifestações
que envolvem as experiências cotidianas das pessoas.
Ademais, não busca ser uma ciência que investiga a
realidade, mas aponta para ela no aspecto das aparências, ou seja, dos
fenômenos que representam signos. Nesse escopo, Pierce compreende que as
categorias da mente são:
Primeira, sentimento, a
consciência que pode ser incluída com um instante de tempo, consciência passiva
de qualidade, sem reconhecimento ou análise; segunda, consciência de
interrupção no campo da consciência, sentido de resistência, de um fato
externo, de alguma outra coisa; terceira, consciência sintética, ligação com o
tempo, sentido de aprendizagem, pensamento. (PEIRCE, CP 1.377)[5].
Dessa forma,
considerando a perspectiva fenomenológica, a consciência desenvolve sentido por
meio das experiências que constituem a vida cotidiana — foco da discussão
adiante.
A vida cotidiana e suas instâncias constitutivas
A vida
cotidiana pode ser compreendida a partir de um cenário progressivo de fenômenos
mediados por acontecimentos ordinários e regulares (instância temporal) que
respaldam — e encontram respaldo — no senso comum como forma de conhecimento
(instância da produção de significados). Nesse contexto, a concepção de tempo
no interior dos processos constitutivos da vida cotidiana vincula-se a um
processo histórico mais amplo de solapamento de uma temporalidade densa e
multifacetada oriunda das culturas populares pelas rotinas produtivas do modo
de acumulação capitalista.
Para Martin-Barbero
(2003), a cultura
popular e a cultura massiva são delimitadas por um longo processo histórico de
enculturação condicionado pela hegemonia e pela constituição das classes
dominantes. Essas mudanças sociais, por conseguinte, são reflexos dos
tensionamentos de forças políticas, econômicas e culturais que ganham corpo
desde o século XVI. A emergência do Estado-Nação, do capitalismo industrial
(considerando séculos de maturação do mercantilismo) e das políticas econômicas
do Estado moderno, ao lado da disseminação do cristianismo pós-Reforma
Protestante, remetem à introdução na sociedade da valorização de uma unidade
monetária (o dinheiro), bem como de outras unidades de sentido para a ideia de
cultura popular: a valorização de idiomas hegemônicos (frente aos dialetos
populares), da religião centralizada (frente às múltiplas práticas regiliosas
populares) e do ensino disciplinador (frente às formas populares do saber),
entre outros.
Por seu
turno, a cultura de massa emerge historicamente da lógica do capitalismo
industrial, que coloca como cerne das organizações sociais a produção e,
principalmente, a reprodução de novos hábitos. A noção do tempo cíclico — das
festas, dos cultivos, dos astros —, responsável por sinalizar a organização das
práticas e hábitos no âmbito do popular, passa, nessa conjectura, por um
processo de desvalorização e destituição de sentido, sendo ressignificada pela
lógica do tempo linear dos meios produtivos. Para Martin-Barbero (2003), o
surgimento do relógio colabora com essa conjuntura ao unificar os tempos e
impor um novo sentido de temporalidade calcado na acumulação:
Do tempo do mercador ao do
capitalismo industrial se conserva a primazia alcançada pelo tempo-medida e
pelo tempo-valor em face do tempo-vivido, mas se produz uma mudança profunda: o
tempo valorizado, ou melhor, a fonte de valor, já não é o da circulação do
dinheiro e das mercadorias, mas o da produção, o do trabalho enquanto tempo
irreversível e homogêneo. [...] Abstrato, o tempo da produção desvaloriza
socialmente os tempos dos sujeitos — individuais ou coletivos — e institui um tempo único e homogêneo — o dos objetos — fragmentável
mecanicamente, tempo puro. E irreversível, pois se produz como “tempo geral da
sociedade” e da história cujo “segredo” está na dinâmica da acumulação
indefinida e cuja razão suprime toda alteridade ou a torna anacrônica.
(MARTÍN-BARBERO, 2003, p. 137-138).
No interior dessa linha
de raciocínio e a despeito da distinção metodológica apresentada por Agnes
Heller (1972) sobre a vida cotidiana e seus eixos constitutivos (trabalho, vida
privada, descanso, lazer e atividade social), compreende-se a emergência
histórica do conceito notadamente no desenvolvimento capitalista e em seus
consequentes modos discrepantes de organização da atividade produtiva.
Argumenta Souza Martins (2010):
Justamente quando, com o
desenvolvimento do capitalismo, a finalidade do trabalho passa a ser o próprio
trabalho, tenha sentido ou não, e o trabalhador se põe numa relação de divórcio
e alteridade com sua obra, que se acumula sem destino, na acumulação pela
acumulação, é que o trabalho sem sentido dá origem à vida cotidiana. (SOUZA
MARTINS, 2010, p.126).
A
ideia de alienação é ressignificada e desponta, assim, como uma espécie de
“mal-estar da vida cotidiana e do mundo moderno”, uma vez que, conforme chama
atenção Souza Martins (2010, p.74-75), no pensamento modernizante a consciência
social do homem cotidiano se empobrece como imaginação (instância “criadora e
revolucionária”) e se enrijece como imaginário. Reconhece-se, nesse contexto,
que a lógica de produção e a linearidade temporal edificam sobre a vida
cotidiana uma maneira pragmática de agir e reagir, culminando na concatenação
de acontecimentos rotineiros que se mostram progressivamente esvaziados de
compreensão — embora a chave emancipatória da suspensão crítica do cotidiano
resida exatamente em tal falta de sentido, como denotam no filme os poemas
manuscritos de Paterson.
Os
dias e as horas da vida cotidiana, idealizada pelos afazeres cartesianos de uma
sociedade devotada à lógica da produção, são responsáveis pela constituição do
homem comum moderno, individualizado e individualizante, dotado de novas formas
de conhecimento e de apreensão da realidade calcadas em sentidos, socialmente
partilhados (o senso comum) que são inscritos no cotidiano. De acordo com Souza
Martins (2010, p. 52), este senso comum é desqualificado na perspectiva erudita
por ser “banal, destituído de verdade, fonte de equívocos e distorções”. Posto
isso, são nas categorias fenomenológicas de apreensão da realidade
materializadas na vida cotidiana e no senso comum que a análise se volta agora para
uma leitura do longa-metragem Paterson.
A
vida cotidiana em Paterson: uma
análise sobre as categorias fenomenológicas
Incensado
pela crítica especializada por seu teor poético e, ao mesmo passo, provocativo
(DARGIS, 2016), Paterson constitui
uma narrativa cinematográfica que coloca em primeiro plano uma série de eventos
que remetem à concepção de vida cotidiana. A trama se passa em um cenário
urbano, que representa alguns contextos da cidade de Paterson, fundada em 1843
no estado de Nova Jersey, nos Estados Unidos. Embora não explicite as dimensões
populacionais da localidade — que, de acordo com o censo estadunidense, possui
cerca de 150 mil habitantes, sendo o terceiro município mais populoso do estado
—, o longa-metragem apresenta cenas que representam a vida ordinária de uma
cidade essencialmente interiorana.
Paterson
é também o nome do protagonista, um motorista de ônibus do transporte público
local, que possui personalidade pacata, demonstrando equilíbrio e uma incômoda
passividade ao lidar com suas situações cotidianas[6]. A narrativa intercala uma abordagem
cinematográfica em terceira pessoa — fio condutor da trama — e extratos de
narração em primeira pessoa a partir de versos de poesia construídos pelo
personagem a respeito dos acontecimentos ordinários de sua vida. Além do
protagonista, o roteiro do filme conta com a participação de outros seis
personagens com relativo destaque na trama: Laura (Golshifte Farahani),esposa
de Paterson; Donny (Rizwan Manji), colega de trabalho; Doc (Barry Shabaka Henley),
amigo; Marie (Chasten Harmon) e Everett (William Jackson Harper), conhecidos; e
Marvin, o cachorro de estimação.
De
modo geral, todos os personagens que aparecem na trama permitem uma série de
interpretações sobre aspectos complexos que instituem a vida cotidiana. Laura,
por exemplo, institui-se como uma representação metafórica do “pensamento
modernizante” (SOUZA MARTINS, 2010) de perda de sentido da consciência social.
A personagem mostra-se excessivamente condicionada por “padrões”, uma dependência
que, essencialmente, se manifesta pelo comportamento compulsivo de produzir e
reproduzir formas geométricas — sempre nas cores branca e preta — em quase
todas as situações de vida. De maneira poética, a atitude da personagem
representa uma perspectiva da linearidade cotidiana — enquanto instância de
sentido de vida, onde as coisas adquirem valor e profusão sem um determinado
critério ou propriamente uma necessidade. Ademais, Laura expressa ideias
inautênticas e anseios vagos motivados por estímulos superficiais, explícitos
ora pela “ambição” em ter uma fábrica de cupcakes; ora pelo “anseio” em
ser uma cantora da música country (DARGIS,
2016).
No
filme, é evidente a inspiração sobre o poeta estadunidense William Carlos
Williams, especialmente sobre sua obra também intitulada “Paterson –
(1946-1958)”, que originalmente é composta por cinco volumes e traz uma escrita
de estilo documental na qual é possivel perceber as semelhanças entre a mente
do homem moderno e a cidade. Assim, pode-se notar a “presença” de Williams em
vários fragmentos ao longo da narrativa, referências diretas e indiretas; desde
a aparição de livros, nomes, diálogos entre os personagens e, até mesmo,
citações de alguns de seus versos. Para tanto, nota-se que a “essência” de
Williams é relacionada principalmente ao perfil do protagonista; especialmente
nos momentos de reflexão poética, onde é patente a semelhança da linguagem ao
descrever “visualmente” as peculiaridades de um mundo fugaz, diminuto e
demasiadamente interessante.
Ao
longo da trama, as interações do protagonista com os outros personagens ocorrem
de maneira premeditada, ordenadas pelas condições e horários da datação que a
narrativa sugere nas cenas — principalmente pela unidade de tempo progresivo
que é situado ao espectador pelos “dias” da semana. Paterson, por exemplo,
acorda todas as manhãs e antes de se levantar para o café estabelece um breve
diálogo com sua esposa Laura, que comenta sobre os sonhos que teve. No ambiente
de trabalho, logo na abertura do expediente, o personagem cumprimenta com
poucas palavras seu colega Donny antes de deixar a garagem e seguir com o
ônibus para as ruas. O intervalo do almoço mostra-se o momento dedicado pelo
protagonista à redação de seus versos em um pequeno caderno. Ao fim do dia, Paterson
retorna para sua casa e desenvolve um diálogo mais humorado com sua esposa.
Após o jantar, o personagem leva seu cachorro para caminhar, trajeto que segue
diuturnamente até o bar de seu amigo Doc. O dia do protagonista chega ao
desfecho regularmente após conversas sobre músicos locais, celebridadades do
mundo e acontecimentos ordinários — metaforicamente representados como uma
partida de xadrez —, enquanto degusta uma cerveja no balcão do respectivo
estabelecimento.
As
ações e interações de Paterson com os outros personagens evidenciam os efeitos
das relações sociais de senso comum e da lógica rotineira do tempo da produção
instituída na vida cotidiana. O motorista acorda todos os dias por volta das
6h15 da manhã, momento no qual, instintivamente, o introduz na temporalidade
linear do dia a dia ao colocar seu relógio de pulso. É o único horário
explícito durante a narrativa e o personagem galga os degraus de sua rotina até
encerrar o expediente, período em que — ao lado dos esporádicos momentos nos
quais se coloca a redigir versos — encontra situações explícitas de lazer.
Nesse ínterim, a narrativa fílmica denota que o protagonista, em momentos de
reflexões poéticas (estimuladas por acontecimentos rotineiros), encontra
alternativas que rompem a redoma da vida cotidiana, atingindo, pela produção de
significados calcada no senso comum, uma espécie de suspensão frente aos
acontecimentos repetitivos do dia-a-dia.
Trata-se,
portanto, de uma leitura sociológica do senso comum como instância emancipadora
do homem ordinário frente às contradições e à falta de sentido da vida de todo
dia. Para Souza Martins (2010):
No refúgio da vida
cotidiana o homem descobre a eficácia política (e histórica) de sua aparente
solidão, impõe, também, o reconhecimento de que o senso comum não é apenas
instrumento das repetições e dos processos que imobilizam a vida de cada um e
de todos. (SOUZA MARTINS, 2010, p. 52).
O
senso comum permite ao indivíduo, dessa maneira, obter concepções variáveis e
interpretações potencialmente emancipadoras de situações da vida cotidiana.
Numa interface com as ideias de Peirce, o conceito também se insere como
chave-explicativa para as experiências abstratas, cognitivas e imaginárias
presentes nas categorias do pensamento fenomenológico.
Semelhantemente
à noção de senso comum, o aspecto temporal apresentado pelo filme mostra-se
essencial para as reflexões a respeito da concepção de vida cotidiana. Mesmo
que a produção corresponda ao gênero ficcional do cinema, as escolhas de Jim
Jarmusch dialogam com a realidade do cotidiano da localidade em tela, pois
representam um ordenamento regular no fluxo linear de tempo materializado no
dia a dia de Paterson (da cidade e do personagem). O roteiro, que totaliza uma
narrativa com duração de 112 minutos, compõe-se de sequências fílmicas descontínuas
que se intercalam em um período temporal fictício de sete dias. Desse modo, a
narrativa obedece a uma sequência, ao mesmo passo, linear e circular, na qual o
início e o fim são demarcados por uma manhã de segunda-feira.
As
sequências que representam — de forma relacional — os dias da semana também denotam
um determinado critério temporal latente às intenções do cineasta. Na trama, a
duração de cada dia equivale à média de 16 minutos — estética provocativa do diretor
que, em efeito, permite ao espectador identificar simbolicamente a concepção de
tempo físico (equivalente a 24 horas diárias) na estrutura narrativa do filme. Faz-se
possível, assim, estabelecer um padrão de tempo, onde o aspecto da regularidade
nas representações das sequências “diárias” permite que o espectador tenha uma
experiência essencialmente similiar ao ordenamento da vida cotidiana. Com o
intuito de acentuar a ideia de quantificação do tempo na estrutura da
narrativa, considera-se pertinente a constatação dos dados que representam a
duração de cada dia no longa-metragem.
Tabela
1: Indicação do tempo de duração de cada parte do dia representado no
filme.
Tempo das sequências
fílmicas |
|||||||
Dia |
Segunda |
Terça |
Quarta |
Quinta |
Sexta |
Sábado |
Domingo |
Duração |
14:29s |
19:18s |
11:37s |
22:14s |
17:22s |
12:48s |
15:27s |
Inicio |
1:09s |
15:38s |
34:56s |
45:53s |
1:07:27s |
1:24:09s |
1:36:57s |
Fim |
15:38s |
34:56s |
45:53s |
1:07:27s |
1:24:09s |
1:36:57s |
1:51:44s |
Fonte: Elaborada pelos autores
(2021)
Do ponto de vista das
categorias fenomenológicas do pensamento, o desenvolvimento das sequências ao
longo do filme oferece novas chaves de leitura. As ocorrências iniciais da
trama, que narram a manhã de uma segunda-feira, por exemplo, apresentam um
diálogo entre Paterson e sua esposa. Deitada na cama e ainda sonolenta, Laura
comenta o sonho que teve: “Tivemos dois
filhos velhos. Gêmeos. Se tivéssemos filhos, gostaria que eles fossem gêmeos?”.
Paterson, também sonolento responde: “Sim.
Gêmeos...”. Naquela manhã, durante o trajeto para o trabalho, o protagonista
realiza reflexões poéticas a respeito de fatos que envolvem seu cotidiano
quando se depara com dois senhores “gêmeos” sentados em um banco: uma quebra na
rotina em face do diálogo matinal com a esposa.
Figura 1: Frames
das sequências escolhidas do filme para ilustrar a análise.
Fonte: Longa-metragem
Paterson – Eurovideo (2016)
A
narrativa que envolve a sequência desperta no protagonista características das
faculdades fenomenológicas da mente. A priori, as “qualidades primeiras” são
manifestadas quando Paterson se depara com os “gêmeos velhos” e apresenta a
sensação de surpresa, unicidade, algo novo. Posteriormente, verifica-se a
Secundidade, que permite ao protagonista tomar consciência daquela sensação,
quando compreende a existência do outro na realidade. A partir disso, pela
ótica do personagem, faz-se possível perceber ao longo da narrativa a
transmutação daquele acontecimento singular em uma ideia de Terceiridade.
Durante a rotina de trabalho representada nas cenas seguintes, o motorista se depara
em outras quatro ocasiões com “gêmeos” e, diante das circunstâncias, denota uma
dinâmica de generalização de sentido sobre o “acontecimento primeiro”.
Constata-se, então, uma vez mais, uma reflexão singular do personagem que o
leva a um potencial movimento de suspensão da vida cotidiana.
Na
sequência da trama, outras situações, aparentemente ordinárias, também provocam
efeitos de ruptura no cotidiano de Paterson — o que remete, hipoteticamente, a
estímulos na mente do personagem em processos de generalização e aprendizagem.
Tais fenômenos se reordenam diuturnamente na narrativa, a exemplo da cena em
que Paterson ao visualizar (Primeiridade) dois retratos exóticos de um cão
pintado na parede de sua casa, em seguida, observa Marvin, o cachorro de
estimação, sentado sob o sofá (Secundidade), direcionando a uma terceira
relação a partir dessa representação na consciência: a aptidão pouco
convencional da esposa para as artes (Terceiridade).
A
análise do filme permite compreender que a noção de tempo e as experiências que
estimulam as ideias gerais nas sequências da narrativa fílmica
(generalização/aprendizagem), necessariamente, não ocorrem de maneira ordenada.
Um novo caso ilustrativo lança luz à reflexão: a sequência que narra o jantar
do casal na noite de quarta-feira. Laura coloca sobre a mesa uma torta
(Secundidade) e logo é indagada por Paterson: “Temos torta para o jantar?”. Laura responde: “Sim, mas uma torta-jantar”. A expectativa do protagonista sobre a
refeição, até então generalizada por um conhecimento gastronômico prévio
(Terceiridade), é colocada em xeque. Laura questiona: “O que acha que há dentro?”. Paterson, então inerte, busca na mente
referências que possam substanciar sua resposta: possíveis recheios e sabores
de torta. A cena é concluída com a revelação de Laura sobre o misterioso sabor —
queijo cheddar e couve-de-bruxelas —, o que revela em Paterson o
condicionamento para uma nova experiência qualitativa (Primeiridade).
Figura 2: Frames
das sequências escolhidas do filme para ilustrar a análise.
Fonte: Longa-metragem
Paterson – Eurovideo (2016)
Com
base no exposto, entende-se que a vida cotidiana, para além do campo eidético,
possibilita processos de generalização/aprendizagem por meio de experiências
concretas de suspensão da regularidade materializada no mundo externo — ou, em
outros termos, por meio de experiências de ruptura aos eventos rotineiros que
estimulam no indivíduo um reordenamento de ideias, tal como denotado na cena do
jantar.
Outra
sequência peculiar, nesse sentido, efetua-se na representação cinematográfica
do último dia útil da semana no longa-metragem, a sexta-feira. Pela primeira
vez, desde a sequência de segunda-feira, o protagonista acorda atrasado,
sozinho na cama e, num ato quase constrangedor de surpresa, depara-se com Laura
na cozinha confeitando cupcakes para
comercialização, o que outrora nunca se havia efetivado. No mesmo dia, durante
a rotina de trabalho, a trama revela outras vicissitudes que representam
rupturas na vida cotidiana de Paterson: o ônibus que conduz apresenta problemas
mecânicos e interrompe o funcionamento no meio do trajeto; sem utilizar e
entender necessário qualquer equipamento tecnológico que permita comunicação
móvel, o motorista obriga-se a solicitar o empréstimo de um telefone a uma passageira
para contatar o resgate. Trata-se, portanto, de um dia substancialmente atípico
na vida ordinária do protagonista, que endereça, num vértice analítico, às
categorias fenomenológicas do pensamento de Pierce: a Primeiridade (as
novidades), a Secundidade (o reconhecimento das alteridades) e a Terceiridade
(as relações de generalização que o personagem extrai das ocorrências).
Figura 3: Frames das sequências escolhidas do filme para ilustrar a análise.
Fonte: Longa-metragem
Paterson – Eurovideo (2016)
Por
consequência, a respectiva sequência fílmica permite uma interpretação
semiótica de maior complexidade, substancialmente uma significação de uma
eventual função poética da vida cotidiana. A sexta-feira de Paterson mostra fenômenos
de resistência à rotinização já dotados de sentido (signos) na realidade. De
acordo com Cañizal (2001), as formas de expressão poética evidenciam uma
ruptura do conhecimento padronizado, considerando a existência de pressupostos
invariáveis; uma categoria metafísica que expande os aspectos de representação
da realidade, ou seja:
De fenômenos que alteram
as formas expressivas e semânticas dos componentes de um sistema de signos
qualquer. Os efeitos dessas transgressões se fazem sentir em unidades
morfológicas ou sintáticas e, também, nos enunciados de uma frase ou de um
relato. (CAÑIZAL, 2001, p.30).
A
sequência final do filme (o domingo) torna ainda mais poética as possibilidades
de suspensão, ou vice-versa, da vida cotidiana. Na cena, Paterson encontra-se
desolado após Marvin, o cachorro, fazer em pedaços na noite anterior seu
caderno de poemas. Com a situação, o protagonista busca consolo em uma
solitária caminhada até o seu lugar favorito da cidade, a “cachoeira” (a
cascata do Rio Passaic, localizada em Paterson, que ambientou inúmeros poemas
de William Carlos Williams). No local, Paterson é abordado por um desconhecido —
um personagem de ascendência oriental não nominado no filme. Uma vez mais, no
contexto da rotina de Paterson, a função poética estabelece uma ruptura ao
inserir na narrativa um turista asiático no cotidiano da cidade interiorana.
O
personagem desconhecido, não casualmente de origem asiática, indaga o
protagonista enquanto retira de sua bolsa a obra “Paterson”, de
Williams, escritor com destacadas influências orientais em seu estilo de
escrita objetivo e marcado por imagens visuais: “Conhece o grande poeta William Carlos Williams?”, seguido da
resposta de Paterson: “Bem, conheço os
poemas dele”. O diálogo se reveste de complexidade quando a interlocução
ganha um novo questionamento do turista: “Você
também é um poeta?”; ao que sutilmente responde o protagonista: “Não, sou motorista de ônibus, só um
motorista de ônibus”.
Na
semiótica de Peirce, o signo não é, propriamente, o objeto e, sim, sua respectiva
representação, “ele apenas está no lugar do objeto” (SANTAELLA, 1983, p.58).
Nesse sentido, a forma como o personagem desconhecido — mas agora já dotado de
alteridade (Secundidade) — encerra a conversa mostra-se substancial: “Um motorista de ônibus em Paterson? Isso é muito poético,
poderia ser um poema do William Carlos Williams”. Segue-se, então, a cena
na qual o personagem oriental presenteia Paterson com um novo caderno e o
aconselha: “Às vezes uma página vazia dá
mais possibilidades” — o que denota, em termos analíticos, que qualquer
linha pode sugerir um poema da mesma maneira que os fenômenos que permeiam a
vida de todos os dias não se mantêm restritos à lógica da temporalidade linear
e da falta de sentido da repetitividade.
Depreende-se,
assim, que o longa-metragem de Jim Jarmusch expressa, a partir de seus cenários
e personagens, circunstâncias propícias da vida cotidiana e do senso comum que
constituem fenômenos de aprendizagem tanto concretos quanto abstratos.
Finalmente, embora se reconheça a característica da falta de sentido da vida
cotidiana manifestada na repetição desordenada e irrefletida de acontecimentos
tidos como corriqueiros e banais (SOUZA MARTINS, 2010), conclui-se que o filme Paterson é ávido ao sublinhar a
instância do senso comum — não raramente relegada a um segundo plano pelo
pensamento erudito — como categoria multifacetada de análise que permite a
suspensão e o discernimento da regularidade cotidiana e a operacionalização no
âmbito da teoria do conhecimento das complexas categorias fenomenológicas do
pensamento.
Algumas Considerações Finais
A
vida cotidiana materializa-se em um cenário progressivo de fenômenos que,
mediados por acontecimentos ordinários e regulares, instituem no senso comum
potencialidades de reordenamento dos significados, considerando as categorias
do pensamento fenomenológico como análogas a essas dinâmicas de significação da
vida. Por assim dizer, como pode-se depreender da análise de Paterson, a concepção de senso comum não
deve ser restrita aos processos repetitivos (e aparentemente sem sentido) que
constituem a esfera social da vida em coletividade. As condições (e
contradições) do cotidiano, nesse horizonte, não colocam o indivíduo sobre uma
estagnação intelectual, considerando que qualquer fenômeno cultural se
manifesta na conjunção de sistemas (concretos ou abstratos) providos de
múltiplos significados — o que permite movimentos emancipatórios de suspensão
da regularidade cotidiana, novamente conforme denota, a partir da poética, a
produção cinematográfica de Jim Jarmusch.
Nesse
ínterim, de forma suficientemente interessante, as experiências ordinárias
representadas nas sequências fílmicas de Paterson
remetem a diferentes percepções sobre o mesmo contexto socialmente partilhado
(o senso comum). No interior do arcabouço teórico conceitual peirceano, tais
relações cotidianas podem ser compreendidas como processos binários de
aprendizagem, situações que são interpretadas socialmente de maneira distinta e
relativa. No caso da narrativa de Jim Jarmusch, o protagonista Paterson
apresenta uma releitura crítica dos fatos que envolvem sua rotina (seu mundo)
por meio de poemas que demonstram observações criativas (rupturas de sentido).
Trata-se, por conseguinte, de uma forma emancipatória de manifestação das categorias
do pensamento que medeiam os eventos repetitivos do senso comum e estimulam os
indivíduos à compreensão da vida cotidiana a partir da existência de fenômenos —
alguns concretos, outros abstratos — da realidade constituída.
Notas
[1] Os poemas redigidos
pelo personagem — e que aparecem escritos na tela em sobreposição às cenas de
fundo — são extraídos da obra do escritor estadunidense Ron Padgett, cujos
versos provocam e tensionam as supostas banalidades do dia a dia.
[2] No original: “The idea of First is predominant in the ideas of freshness, life,
freedom. The free is that which has not another behind it, determining its
actions”. Por opção teórico-metodológica, vale-se nesta pesquisa
da tradução em língua portuguesa da obra de Charles Sanders
Peirce já validada academicamente pelos trabalhos de
Ivo Assad Ibri. Para
detalhes, ver: Ibri (2015, p. 29).
[3] No original: “We become aware of ourself inbecoming aware of
the not-self”. Tradução de Ivo Assad Ibri. Ver: (IBRI, 2015, p. 27).
[4] No original: “Imean the
collective total of all that is in any way or in any sense present to the mind,
quite regardless of whether it corresponds to any real thing or not”. Tradução de Ivo Assad Ibri. Ver:
(IBRI, 2015, p. 22).
[5]
No original: “First, feeling, the consciousness which can be included with an
instant of time, passive consciousness of quality, without recognition or
analysis; second, consciousness of an interruption into the field of
consciousness, sense of resistance, of an external fact, of another something;
third, synthetic consciousness, binding time together, sense of learning,
thought”. Tradução de Ivo Assad Ibri.
Ver: (IBRI, 2015, p. 35).
[6] O teor provocativo de Jim Jarmusch nas tensões
entre a natureza ficcional da trama cinematográfica e o compasso da realidade
mostra-se não casualmente presente na escolha do ator Adam Driver para
interpretar um motorista ao mesmo passo em que recebe um nome figurativo em
sintonia com a cidade onde o filme se passa.
Referências
CAÑIZAL, Eduardo Peñuela.
Poética da Imagem. Novos Olhares, v.8, n.8, p. 29-34, 2001. Disponível em:< https://www.revistas.usp.br/novosolhares/article/download/51359/55426/63922>.
Acesso em: 1 abr. 2021.
UNITED
STATES CENSUS BUREAU. Censo Paterson 2000. Disponível em: <https://www.census.gov/main/www/cen2000.html>
Acesso em: 03. Jul. 2018.
DARGIS, Manohla. Review: In Jim Jarmusch’s
‘Paterson,’ a meditative flow of words into poetry. The New York Times, Nova York, 27. dez. 2016.
Disponível
em: <https://www.nytimes.com/2016/12/27/movies/paterson-review.html>. Acesso em:
03. Jul. 2018.
HELLER, Agnes. O Cotidiano e a História. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1972.
IBRI, Ivo Assad. Kósmos Noetós: A arquitetura metafísica de Charles S. Peirce. São Paulo: Paulus,
2015.
MARTÍN-BARBERO, Jesús. Dos meios às mediações: Comunicação,
cultura e hegemonia. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2003.
PATERSON. Direção: Jim
Jarmusch. [S. l.]: Eurovideo, 2016.
(112 min), son., color.
PEIRCE, Charles S. The Collected Papers of Charles Sanders
Peirce. Vols. 1-6, Hartshorne and
Weiss (eds.); vols.
7-8, Burks.
(ed.) Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1931-58. [Referida como CP]
SANTAELLA, Lucia. O que é semiótica. São Paulo:
Brasiliense, 1983.
SOUZA MARTINS, José de. A sociabilidade do homem simples: cotidiano e história na modernidade
anômala. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2010.
[1] Professor do Programa de Pós-Graduação em
Comunicação e do Curso de Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso do
Sul (UFMS). E-mail: silva_mp@uol.com.br.
[2]
Mestrando do Programa de Pós-Graduação
em Comunicação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). E-mail: victorhugosanches9@gmail.com.
[3] Professor do Programa de Pós-Graduação em
Comunicação e do Curso de Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso do
Sul (UFMS). E-mail: silva_mp@uol.com.br.
[4]
Mestrando do Programa de Pós-Graduação
em Comunicação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). E-mail: victorhugosanches9@gmail.com.