Interpenetrabilidade epistêmica como modelo contemporâneo de construção do conhecimento:
reflexões a partir de Alain Depaulis
heterologia de Bataille, Depaulis filia-se a um dogmatismo psicanalítico que contradiz a
liberdade investigativa alardeada, o que ameaça transformar o projeto transdisciplinar em um
subproduto de teorias do inconsciente.
Apesar do exposto, é possível depreender que Naissance de la transdisciplinarité possui
respeitável pertinência por reconstituir a gênese do modelo transdisciplinar. O estudo, é
verdade, parece despreocupar-se dos perigos de uma flexibilização imprudente dos padrões da
ciência, que uma interpretação superficial ou enviesada do conceito pode suscitar. Com efeito,
mesmo que se admita a importância da interligação de saberes para a resolução de problemas
de alta complexidade (Bernstein, 2015), é imperativo que o exame rigoroso do compromisso
metodológico e da ética científica norteie a colaboração entre as disciplinas. Essa estruturação
é, na visão do resenhista, necessária para rechaçar sistemas de pensamento manifestamente
pseudocientíficos, que podem se apropriar do discurso da integração de conhecimentos para
legitimar proposições desprovidas de sustentação empírica ou lógica. A construção de um novo
paradigma cognitivo (Morin, 2005) reivindica, diante disso, a aplicação de instrumentos
teórico-metodológicos adaptados, como a investigação dialética,3 que permitem gerir a
complexidade sem sacrificar o compromisso com a produção criteriosa do conhecimento.
Referências bibliográficas
1011
BALIETTI, S.; MÄS, M.; HELBING, D. On disciplinary fragmentation and scientific progress.
PLoS ONE, [s. l.], v. 10, n. 3, e0118747, 2015.
BERNSTEIN, J. H. Transdisciplinarity: a review of its origins, development, and current
issues. Journal of Research Practice, [s. l.], v. 11, n. 1, p. R1, 2015.
BULÉON, P. Spatialités, temporalités, pensée complexe et logique dialectique moderne. [S. l.:
s. ed.], 2002.
CHARAUDEAU, P. Pour une interdisciplinarité «focalisée» dans les sciences humaines et
sociales. Questions de Communication, [s. l.], n. 17, p. 195-222, 2010.
DEPAULIS, A. Naissance de la transdisciplinarité. Paris: Éditions L’Harmattan, 2024.
KLEIN, J. T. Une taxinomie de l’interdisciplinarité. Nouvelles Perspectives en Sciences
Sociales, [s. l.], v. 7, n. 1, p. 15-48, 2011.
LIGHTMAN, B.; SERA-SHRIAR, E. (ed.). Victorian interdisciplinarity and the sciences:
rethinking the specialization thesis. Pittsburgh (Estados Unidos da América): University of
Pittsburgh Press, 2022.
MORIN, E. Introduction à la pensée complexe. Paris (França): Éditions du Seuil, 2005.
NICOLESCU, B. Transdisciplinarity: the hidden third, between the subject and the
object. Human and Social Studies, Iaşi (Romênia), v. 1, n. 1, p. 13-28, 2012.
3 Na essência, esse tipo de investigação se mobiliza segundo os princípios fundamentais da dialética, como a lei
da compenetração dos opostos e a lei da negação da negação. Isso significa que ela busca compreender os
fenômenos a partir de suas contradições internas e do modo como estas se resolvem e se transformam, gerando
novas realidades. É um método que reconhece a existência de uma conexão fundamental entre todos os elementos,
mesmo quando eles parecem isolados, e aceita que as soluções e verdades encontradas são sempre provisórias,
parte de um processo contínuo de superação (Buléon, 2002).