Resenha  
DEPAULIS, Alain. Naissance de la transdisciplinarité.  
Paris: Éditions L’Harmattan, 2024. 230 p.  
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Interpenetrabilidade epistêmica como modelo  
contemporâneo de construção do conhecimento:  
reflexões a partir de Alain Depaulis  
Epistemic interpenetrability as a contemporary model for knowledge  
construction: reflections on Alain Depaulis  
Fábio Luiz Nunes*  
A fragmentação do conhecimento em disciplinas especializadas é um fenômeno que tem  
provocado debates sobre o progresso científico (Balietti; Mäs; Helbing, 2015) e a própria  
estrutura da produção de saberes (Lightman; Sera-Shriar, 2022). Em um ambiente de  
permanente questionamento das fronteiras disciplinares, a publicação da obra Naissance de la  
transdisciplinarité (Éditions L'Harmattan, 2024), ainda sem tradução para a língua portuguesa,  
representa uma leitura bastante dedicada sobre a gênese de um campo de saber que busca  
precisamente articular diferentes domínios do conhecimento. Seu autor, o psicanalista francês  
Alain Depaulis, é membro da École Freudienne e possui um percurso profissional que  
fundamenta seu interesse teórico no tema. Atuando como psicoterapeuta no Centre Médico-  
* Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais. E-mail: fabio.nunes.fln@cefetmg.br  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.50305  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 20/09/2025  
Aprovado em: 08/12/2025  
Interpenetrabilidade epistêmica como modelo contemporâneo de construção do conhecimento:  
reflexões a partir de Alain Depaulis  
psycho-pédagogique (CMPP) e na Consultation Médico-psychologique (CMP), localizados no  
departamento francês de Creuse, Depaulis cofundou o ateliê PLURIACT, focado na aplicação  
de múltiplos conhecimentos no atendimento a pessoas vulneráveis.  
Naissance de la transdisciplinarité inicia-se com um prefácio de Pascal Roggero,  
professor de sociologia na Université de Toulouse 1-Capitole, que posiciona o trabalho  
de Depaulis (2024) como um exame do conflito histórico entre concepções unitárias e diversas  
do conhecimento científico. Roggero aponta a filiação do autor à linhagem intelectual que  
valoriza a complexidade e a multiplicidade, estabelecendo um percurso que vai de Giordano  
Bruno a Gaston Bachelard e que encontra em Edgar Morin um referencial teórico central. Na  
introdução, Depaulis (2024) apresenta o “paradoxo do Um e do Múltiplo” enquanto problema  
fundamental que dá vida a sua investigação. O autor reconstitui a origem dos termos, mostrando  
que emergência lexical de transdisciplinaridade data de 1972, em um artigo do biólogo  
cognitivista Jean Piaget, uma evidência que encontra correspondência em levantamentos  
históricos que também apontam para o seminário da Organização para a Cooperação e  
Desenvolvimento Econômico (OCDE) de 1970 como o evento que inaugura a circulação da  
palavra (Bernstein, 2015). A introdução organiza ainda a estrutura do livro, cujo objetivo é  
traçar as condições de gestação, os debates e as resistências que marcaram a constituição do  
pensamento transdisciplinar.  
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O trajeto histórico da obra tem seu ponto de partida no capítulo um, que descreve como,  
na virada do século XX, os trabalhos de Paul Valéry, Sigmund Freud e Carl Gustav Jung  
conduzem à fragmentação da noção de um sujeito unificado, condição preliminar para a  
superação de uma visão monocular da realidade. O capítulo dois debruça-se sobre a ascensão  
do pluralismo no campo epistemológico, com as contribuições do escritor belga Rosny aîné e  
do epistemólogo e químico francês Émile Meyerson. O capítulo três, por sua vez, narra as  
resistências a esse movimento, materializadas no verificacionismo do Círculo de Viena e no  
célebre critério de refutabilidade de Karl Popper. O conjunto desses capítulos apresenta ao leitor  
as premissas históricas de uma reorganização epistemológica que demanda a interpenetração  
de saberes distintos, um princípio fundamental do pensamento complexo, conceito fulcral de  
Morin (2005). O capítulo seguinte investiga as fontes do pluralismo anglo-saxão, com especial  
atenção à filosofia de William James, estudioso que, influenciado por Hegel, Fechner e  
Bergson, desenvolve um pensamento fundamentado na experiência concreta. Esse itinerário  
intelectual descrito por Depaulis (2024) antecipa a formulação de novos postulados, como os  
axiomas da transdisciplinaridade que instituem os níveis de realidade e a lógica do terceiro  
Fábio Luiz Nunes  
incluído1 como ferramentas para a unificação de campos do conhecimento sem a fusão destes,  
como afirma Nicolescu (2012).  
Nesses capítulos iniciais, Depaulis (2024) põe em evidência uma argumentação  
interessante (e relativamente inovadora) ao eleger a fragmentação psíquica como o antecedente  
necessário das revoluções na física e na filosofia, provando que a quebra da unidade do sujeito  
precisava ocorrer antes da quebra da unidade da ciência. A recuperação de figuras injustamente  
laterais, a exemplo de Rosny aîné, e a justaposição com a busca meyersoniana pela identidade  
conferem densidade teórica ao texto, salvando-o de ser uma compilação histórica banal. É  
notável a franqueza com que o autor desautoriza a assepsia do Círculo de Viena e a  
inflexibilidade do modelo popperiano, tratando-os menos como ápices da racionalidade e mais  
como obstáculos sanitários à compreensão do real. Rejeitando a obsessão pela clareza  
linguística que esteriliza o pensamento, Depaulis toma partido, e tal atitude fortalece sua tese,  
na visão deste resenhista.  
No quinto capítulo de sua obra, Depaulis (2024) desenvolve um diálogo improvável  
entre o racionalismo absoluto de Husserl, com o ideal de uma filosofia universal e a busca pela  
verdade pura, e o racionalismo em extensão de Bachelard, para quem o progresso científico por  
meio de rupturas epistemológicas e da superação de obstáculos. O próximo capítulo investiga  
a promessa não concretizada do pluralismo na sociologia, apresentando a constituição da  
disciplina desde o positivismo comtiano e sua classificação rígida das ciências e a distinção de  
Dilthey entre as ciências da natureza e as ciências do espírito, até a sociologia da ação de  
Simmel. Nesse ponto, Depaulis (2024) afirma que o rigor metodológico inspirado nas ciências  
naturais limitou o potencial de diálogo disciplinar, uma limitação que estudiosos como o  
analista do discurso Patrick Charaudeau (2010) ajuda a elucidar, à medida que diferencia a mera  
justaposição de saberes de uma interação que reconfigura os campos envolvidos. O sétimo  
capítulo, por seu turno, é dedicado ao pluralismo anarquista de Paul Feyerabend, cuja crítica  
radical ao método científico é apresentada como uma reação necessária ao dogmatismo, o que  
se amolda à crítica de Morin (2005) ao chamado paradigma de simplificação que mutila o  
conhecimento ao isolar os saberes.  
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1 Os níveis de realidade podem ser entendidos como um conjunto de sistemas regidos por leis idênticas, como o  
mundo quântico e o nosso mundo macroscópico. A lógica do terceiro incluído é o que permite articular esses  
níveis: diferente da lógica clássica (na qual algo é A ou não-A), ela compreende um terceiro estado que é A e não-  
A ao mesmo tempo. Essa aparente contradição se resolve porque esse estado unificado existe em um nível de  
realidade diferente, como no caso da luz, que no mundo quântico se comporta simultaneamente como partícula e  
onda, unindo características que seriam excludentes em nossa realidade cotidiana (Nicolescu, 2012).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 1006-1012, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Interpenetrabilidade epistêmica como modelo contemporâneo de construção do conhecimento:  
reflexões a partir de Alain Depaulis  
A partir do oitavo capítulo, Depaulis (2024) analisa as grandes revoluções do  
conhecimento, iniciando pela copernicana, que é descrita como uma profunda mutação  
intelectual no campo da astronomia que reconfigurou a relação humana com o cosmos. O  
capítulo nove trata, então, dos mecanismos de construção do saber, pondo em contato a teoria  
dos paradigmas de Thomas Kuhn (o que inclui sua distinção entre ciência normal e ciência  
extraordinária) e a epistemologia genética de Piaget. Depaulis (2024) faz destacar o papel desse  
último teórico na introdução do conceito de transdisciplinaridade, um ponto que Klein (2011)  
aprofunda ao classificar os diferentes graus de interação e integração entre disciplinas,  
permitindo localizar a proposição piagetiana como um nível superior de organização do saber.  
De sua parte, o décimo capítulo observa a revolução quântica, mostrando que os princípios da  
descontinuidade, da incerteza e da não separabilidade desmantelaram a física clássica, de base  
newtoniana. O autor compreende que a dissolução da causalidade e do determinismo,  
exemplificada pelos debates entre Bohr e Einstein, constitui a manifestação de uma  
complexidade irredutível no real, um fenômeno que Morin (2005) conceitua por meio de  
princípios como o dialógico, que sustenta a coexistência de lógicas contraditórias.  
O leitor poderá perceber que essa sequência de capítulos opera uma desconstrução  
vigorosa das pretensões absolutistas do saber científico, merecendo elogios pela forma como  
reabilita figuras teóricas frequentemente marginalizadas pela ortodoxia acadêmica. À medida  
que confronta o purismo fenomenológico de Husserl com a abertura epistemológica  
bachelardiana e denuncia o bloqueio imposto pelo positivismo de Durkheim à sociologia das  
interações de Simmel, Depaulis expõe inteligentemente as fraturas estruturais causadas pela  
especialização excessiva. A validação do anarquismo metodológico de Feyerabend coloca-se,  
nesse contexto, como uma contraposição quase niilista à arrogância institucional. A narrativa  
do autor ganha fôlego por vincular as rupturas cosmológicas iniciadas por Copérnico e a quebra  
do determinismo clássico na física quântica à urgência de novos modelos cognitivos. Nessa  
direção, a interpretação dada à complementaridade de Bohr e à espiral epistemológica de Piaget  
comprova que a transdisciplinaridade não representa um luxo teórico, senão uma imposição da  
realidade complexa.  
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Depaulis (2024), no capítulo onze, discorre sobre a posição do observador, partindo dos  
trabalhos de Georges Devereux para questionar a separação radical entre sujeito e objeto. Suas  
reflexões estendem-se à cibernética de segunda ordem no capítulo doze, com especial atenção  
a Heinz von Foerster, segundo o qual o conhecimento precisa incluir o próprio conhecedor no  
processo, instituindo um movimento de autorreflexão. Essa circularidade encontra um  
fundamento no capítulo treze, dedicado à lógica da energia de Stéphane Lupasco, cujo princípio  
Fábio Luiz Nunes  
de antagonismo e estado-T (terceiro incluído) instituem uma dinâmica contraditória nos  
fenômenos (Nicolescu, 2012). O movimento de superação da lógica clássica, que segrega  
elementos, é um passo importante para a compreensão da complexidade, já que admite a  
coexistência de estados opostos como um componente intrínseco da realidade (Bernstein,  
2015).  
O
capítulo quatorze dedica-se finalmente ao “ato de nascimento” da  
transdisciplinaridade, centralizado na figura do físico teórico de origem romena Basarab  
Nicolescu e na formalização de seus três axiomas: os níveis de realidade, a lógica do terceiro  
incluído e a complexidade (Nicolescu, 2012). Segundo Depaulis (2024), a institucionalização  
desse campo é marcada pela Carta da Transdisciplinaridade de 1994, assinada no Convento da  
Arrábida, em Portugal. Em seguida, no capítulo quinze, a obra de Morin é tida como uma  
fundamentação filosófica para essa nova atitude científica. Seus três princípios (dialógico,  
recursivo e hologramático)2 são descritos como operadores do pensamento complexo, um  
pensamento que aproxima saberes e restitui os objetos de conhecimento a seus contextos  
(Vallejo-Gómez, 2008). Depaulis (2024) finaliza sua obra com uma conclusão que aborda as  
noções de reliance (o ato de ligar) e dialogie (a convivência dos contrários) como eixos de uma  
prática científica que assume a incerteza e, ao mesmo tempo, exige uma postura ética e reflexiva  
do pesquisador.  
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Os capítulos finais da obra tornam-se reféns de um viés psicodinâmico que,  
ironicamente, limita a prometida abertura epistemológica. No décimo primeiro capítulo, quando  
discute o problema da observação, o autor recorre a Devereux e a Lacan, o que faz o leitor  
associar a complexa questão do conhecimento a mecanismos de angústia e defesa psíquica,  
patologizando a relação sujeito-objeto. Essa tendência de psicologizar a epistemologia se  
mantém no capítulo doze, seção em que a cegueira cognitiva de von Foerster é lida sob a ótica  
do recalque, e segue no capítulo treze, no qual a lógica de Lupasco busca validação em sua  
proximidade pessoal com Lacan, como se a mecânica quântica carecesse de chancela clínica.  
Mesmo a exposição sobre Nicolescu e Morin, nos capítulos subsequentes, é concebida por essa  
perspectiva que converte a transdisciplinaridade em uma terapêutica de um idealizado “sujeito  
interior”, o que, no ver deste resenhista, desvia o foco das estruturas do saber para o sofrimento  
ontológico subjetivista. A obra finaliza-se a partir desse confinamento teórico: no momento em  
que baseia a definição de “Real” nas categorias lacanianas de Simbólico e Imaginário e na  
2 O postulado dialógico de Morin associa instâncias ao mesmo tempo complementares e antagonistas; no princípio  
recursivo, os efeitos retroagem sobre as causas em um anel produtor; já no princípio hologramático, entende-se  
que não apenas a parte está no todo, mas o todo está inscrito na parte.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 1006-1012, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518  
Interpenetrabilidade epistêmica como modelo contemporâneo de construção do conhecimento:  
reflexões a partir de Alain Depaulis  
heterologia de Bataille, Depaulis filia-se a um dogmatismo psicanalítico que contradiz a  
liberdade investigativa alardeada, o que ameaça transformar o projeto transdisciplinar em um  
subproduto de teorias do inconsciente.  
Apesar do exposto, é possível depreender que Naissance de la transdisciplinarité possui  
respeitável pertinência por reconstituir a gênese do modelo transdisciplinar. O estudo, é  
verdade, parece despreocupar-se dos perigos de uma flexibilização imprudente dos padrões da  
ciência, que uma interpretação superficial ou enviesada do conceito pode suscitar. Com efeito,  
mesmo que se admita a importância da interligação de saberes para a resolução de problemas  
de alta complexidade (Bernstein, 2015), é imperativo que o exame rigoroso do compromisso  
metodológico e da ética científica norteie a colaboração entre as disciplinas. Essa estruturação  
é, na visão do resenhista, necessária para rechaçar sistemas de pensamento manifestamente  
pseudocientíficos, que podem se apropriar do discurso da integração de conhecimentos para  
legitimar proposições desprovidas de sustentação empírica ou lógica. A construção de um novo  
paradigma cognitivo (Morin, 2005) reivindica, diante disso, a aplicação de instrumentos  
teórico-metodológicos adaptados, como a investigação dialética,3 que permitem gerir a  
complexidade sem sacrificar o compromisso com a produção criteriosa do conhecimento.  
Referências bibliográficas  
1011  
BALIETTI, S.; MÄS, M.; HELBING, D. On disciplinary fragmentation and scientific progress.  
PLoS ONE, [s. l.], v. 10, n. 3, e0118747, 2015.  
BERNSTEIN, J. H. Transdisciplinarity: a review of its origins, development, and current  
issues. Journal of Research Practice, [s. l.], v. 11, n. 1, p. R1, 2015.  
BULÉON, P. Spatialités, temporalités, pensée complexe et logique dialectique moderne. [S. l.:  
s. ed.], 2002.  
CHARAUDEAU, P. Pour une interdisciplinarité «focalisée» dans les sciences humaines et  
sociales. Questions de Communication, [s. l.], n. 17, p. 195-222, 2010.  
DEPAULIS, A. Naissance de la transdisciplinarité. Paris: Éditions L’Harmattan, 2024.  
KLEIN, J. T. Une taxinomie de l’interdisciplinarité. Nouvelles Perspectives en Sciences  
Sociales, [s. l.], v. 7, n. 1, p. 15-48, 2011.  
LIGHTMAN, B.; SERA-SHRIAR, E. (ed.). Victorian interdisciplinarity and the sciences:  
rethinking the specialization thesis. Pittsburgh (Estados Unidos da América): University of  
Pittsburgh Press, 2022.  
MORIN, E. Introduction à la pensée complexe. Paris (França): Éditions du Seuil, 2005.  
NICOLESCU, B. Transdisciplinarity: the hidden third, between the subject and the  
object. Human and Social Studies, Iaşi (Romênia), v. 1, n. 1, p. 13-28, 2012.  
3 Na essência, esse tipo de investigação se mobiliza segundo os princípios fundamentais da dialética, como a lei  
da compenetração dos opostos e a lei da negação da negação. Isso significa que ela busca compreender os  
fenômenos a partir de suas contradições internas e do modo como estas se resolvem e se transformam, gerando  
novas realidades. É um método que reconhece a existência de uma conexão fundamental entre todos os elementos,  
mesmo quando eles parecem isolados, e aceita que as soluções e verdades encontradas são sempre provisórias,  
parte de um processo contínuo de superação (Buléon, 2002).  
Fábio Luiz Nunes  
VALLEJO-GÓMEZ, N. La pensée complexe: antidote pour les pensées uniques: entretien avec  
Edgar Morin. Synergies Roumanie, [s. l.], n. 3, p. 77-90, 2008.  
1012  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 1006-1012, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518