Ana Carolina do Nascimento Rodrigues
Introdução
Segundo Guerra e Batista (2021), a “questão social” se põe na agenda de pesquisa para
o Serviço Social a partir da aprovação das Diretrizes Curriculares da Associação Brasileira de
Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS) em 1996. Essa novidade na direção da
formação profissional representa o legado crítico do Processo de Renovação da profissão1.
Junto de outros marcos normativos importantes como a Lei de Regulamentação da Profissão
(Lei nº 8.662/1993) e o Código de Ética Profissional do ano de 1993, as Diretrizes Curriculares
da ABEPSS expressam o amadurecimento e a consolidação do Projeto Ético-Político de
vertente marxista como hegemônico no Serviço Social Brasileiro. No referido documento, a
“questão social” aparece como fundamento básico para a existência do Serviço Social
(ABEPSS, 1996).
Entretanto, a expressão “questão social” pode possuir sentidos diversos a depender do
campo teórico em que se baseia (Netto, 2001), e mesmo entre autores do campo marxista, a
concepção sobre a relação entre “questão social” e Serviço Social pode apresentar diferentes
pontos de vista, aparecendo “como eixo fundante da profissão, como seu objeto/matéria prima,
âmbito de intervenção e/ou como uma categoria teórica explicativa” (Guerra; Batista, 2021, p.
184). Tal diversidade marca a importância e a sutileza do debate.
A obra de Iamamoto e Carvalho (2014), originalmente publicada em 1982 é um marco
na produção de conhecimento na área do Serviço Social brasileiro visto que inaugura a
aproximação teórica da profissão com a tradição marxista. Os autores fundamentam sua análise
nas categorias explicitadas por Marx para a compreensão da sociedade capitalista e desvendam
o surgimento do Serviço Social nesta sociabilidade. Ao tratarem da dinâmica da sociedade
capitalista, fundamentalmente vão à exploração da classe trabalhadora pela burguesia, sem a
qual não é possível explicar as relações sociais no capitalismo. Tal exploração não ocorre sem
contradições e, portanto, tais relações também são marcadas pelo elemento da luta de classes,
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Em meados da década de 1960, impulsionado pelo Movimento de Reconceituação da América Latina, o Serviço
Social brasileiro iniciou seu Processo de Renovação, que não se deu de forma homogênea, mas foi atravessado
por diferentes perspectivas. Em um bloco, duas vertentes que, de forma geral, defendiam uma modernização
técnica da profissão sem questionar as suas bases conservadoras e o seu reforço à manutenção da sociabilidade do
capital. Em contraponto a este bloco, havia a perspectiva da Intenção de Ruptura, que trouxe o questionamento
das bases teórico-práticas da profissão, a aproximação com a teoria social crítica de Marx e inserção de parte da
categoria em movimentos sociais e sindicais. É na década de 1980 que a Intenção de Ruptura se fortalece na
academia e começa a se expandir para a base da categoria profissional, o que só foi viável porque é nesse período
que o regime ditatorial entra em decadência e é iniciado o processo de redemocratização no país. Nessas
circunstâncias, o coletivo da categoria, através de suas entidades representativas, passou a repensar o projeto
profissional do Serviço Social e gestou-se o chamado Projeto Ético-Político, que se relaciona com a superação da
ordem do capital e para tanto, deve disseminar os valores necessários à construção de uma nova sociabilidade,
como: democracia, liberdade e justiça social (Netto, 1991).
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 2, p. 595-610, jul./dez. 2025. ISSN 1980-8518