Ofensiva da direita, crise da democracia e  
ameaças às conquistas civilizatórias1  
Right-wing offensive, crisis of democracy and threats to civilizing  
achievements  
Ana Elizabete Mota*  
Resumo: Neste artigo discorro sobre a ofensiva  
da extrema direita mundial no âmbito da reação  
burguesa à crise do capitalismo e identifico a  
emergência de conservadorismos de novo tipo,  
assim como uma mudança no modo de operar a  
democracia burguesa. A cultura política de  
enfrentamento dessa crise é mediada por  
ideologias fascistas (Matos, 2020), diretrizes  
neoliberais, contrarreformas do Estado e  
estratégias de controle e exploração do trabalho  
que afetam as condições de vida e a  
sociabilidade das classes trabalhadoras e  
subalternas e suas estratégias e táticas possuem  
significativas diferenciações com o fascismo  
clássico. Elenco tendências do que estou  
denominando de conservadorismos de novo tipo  
(Mota; Rodrigues, 2020) e, ao final, apresento  
hipóteses que sinalizam os desafios de nosso  
tempo histórico.  
Abstract: In this article, I discuss the global far-  
right offensive in the context of the bourgeois  
reaction to the crisis of capitalism and identify  
the emergence of new types of conservatism, as  
well as a change in the way bourgeois  
democracy operates. The political culture  
addressing this crisis is mediated by fascist  
ideologies (Badaró Matos, 2020), neoliberal  
guidelines, state counter-reforms, and strategies  
of control and exploitation of labor that affect  
the living conditions and sociability of the  
working and subalterns classes, with their  
strategies and tactics showing significant  
differences from classic fascism. I outline  
trends that I am referring to as new types of  
conservatism (Mota and Rodrigues, 2020) and,  
in the end, present hypotheses that indicate the  
challenges of our historical time.  
Palavras-chaves: Capitalismo; Ofensiva da  
direita; Neofascismo; Crise da democracia;  
Classes subalternas.  
Keywords: Capitalism; Right-wing offensive;  
Neofascism; Crisis of democracy; Subalterns  
classes.  
1 As ideias centrais deste ensaio foram originalmente apresentadas por ocasião da Aula Inaugural do Programa de  
Pós-graduação em Políticas Públicas, vinculado ao Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do  
Maranhão em abril/2025; igualmente, contém extratos do exposição realizada no VII Seminário Internacional de  
Política Social (VII SIPS): desafios para a política social e a democracia no capitalismo tardio: tecnologia,  
corporações, desinformação e o avanço da direita, promovido pelo Programa de Pós-graduação em Política Social  
em julho/2024. Para esta publicação, adaptamos à versão escrita a linguagem oral de ambos, fazendo revisões e  
acréscimos nos materiais.  
* Universidade Federal de Pernambuco. E-mail: bmota@elogica.com.br  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.49127  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 16/06/2025  
Aprovado em: 23/06/2025  
Ana Elizabete Mota  
Introdução  
Neste artigo abordo a ofensiva da extrema direita mundial no âmbito da reação burguesa à  
crise do capitalismo e identifico a emergência de conservadorismos de novo tipo, assim como  
uma mudança no modo de operar a democracia burguesa. Refiro-me à crise de 2008  
considerando sua dimensão global e a existência de elementos compatíveis com a teorização  
gramsciana de crise orgânica, referindo-se à realidade italiana dos anos 1920, período que  
desaguou no fascismo italiano sob o regime de Mussolini (Konder, 2009). A cultura política de  
enfrentamento dessa crise é mediada por ideologias fascistas (Matos, 2020), diretrizes  
neoliberais, contrarreformas do Estado e estratégias de controle e exploração do trabalho que  
afetam as condições de vida e a sociabilidade das classes trabalhadoras e subalternas. Ressalto  
o peso da formação de culturas, sociabilidades e práticas que afetam direitos, descuram dos  
avanços civilizatórios do pós-segunda guerra e fomentam constrangimentos sócio-políticos e  
morais na tentativa de construir consensos de classe, legitimadores dos projetos da extrema  
direita, ainda que enfrentando resistências e tensões. Entendo que as estratégias e táticas que  
orientam os mecanismos de dominação em processamento na realidade brasileira possuem  
marcas de ideologias neofascistas, mas são significativas as suas diferenças em relação ao  
fascismo clássico (Matos, 2020). Elenco tendências do que estou denominando de  
conservadorismos de novo tipo (Mota; Rodrigues, 2020) presentes nas hostes burguesas, na  
atuação do Estado classista, na instrumentalização da democracia e na correlação de forças  
entre as classes. Concluo com algumas hipóteses que sinalizam os desafios do nosso tempo  
histórico.  
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Os cenários da ofensiva da extrema direita mundial e no Brasil  
Os mecanismos de enfrentamento das crises capitalistas a partir dos anos 1970 expõem  
os paradoxos e contradições da sociedade regida pelo capital, cujos desequilíbrios,  
instabilidades e incertezas geram a tendência histórica, cíclica, de queda tendencial das taxas  
de lucros. Qualificadas como crise de acumulação, seus determinantes imediatos nem sempre  
revelam sua verdadeira origem, porém, invariavelmente, suas particulares manifestações  
mobilizam a unidade das estratégias de classe para seu enfrentamento e superação. Esse enredo,  
aqui genericamente referido, nos motivou a refletir sobre os atuais mecanismos de  
enfrentamento da crise capitalista, particularmente a de 2008, com destaque para as políticas de  
austeridade implementadas pelas classes dominantes (Mattei, 2023, p. 397-420) através das  
contrarreformas do Estado e das mudanças na correlação de forças com a emergência da  
extrema direita mundial e suas manifestações no Brasil.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 1-17, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Ofensiva da direita, crise da democracia e ameaças às conquistas civilizatórias  
Ao tempo em que abordo a relação entre a ofensividade da extrema direita, as ideologias  
fascistas e o ultraneoliberalismo no enfrentamento da crise de subprime de 2008 - que a partir  
dos Estados Unidos atingiu todas as economias centrais e periféricas, entendo, como Avelãs  
Nunes (2021, p. 511), que “os ventos que provocaram a maior crise do capitalismo desde 1929  
tornaram claro o papel do Estado capitalista, enquanto ditadura do grande capital financeiro”  
(Nunes, 2021, p. 521); crise que foi agravada pela pandemia mundial do corona vírus.  
As mediações desses processos dizem respeito às estratégias das frações dominantes,  
através dos seus aparelhos privados de hegemonia e da ação do Estado que, implementam  
medidas de austeridade “fascistas ou democráticas” (Mattei, 2023 p. 377). Historicamente, as  
classes proprietárias têm, em última instância, o propósito de redefinir diretrizes que favoreçam  
a retomada do crescimento econômico e o controle das insurgências dos subalternos que  
apontem projetos para além do capital. Fato é que, nos países centrais e periféricos, a atuação  
da direita e extrema direita expande-se nas últimas décadas e seu foco é a passivização das  
classes trabalhadoras e subalternas. Sem menosprezar o uso de violências de toda ordem, o  
objetivo da burguesia é obter adesão ao projeto da classe exploradora, opressora e dominante,  
tornando-o universal – constitutivo de hegemonia dos grupos dominantes.  
Nessa conjuntura, a reeleição de Donald Trump robusteceu a extrema direita com o seu  
ufanismo personalista, ao afirmar, no discurso de posse que a era de ouro da América começa  
agora mesmo com a retomada radical da prosperidade americana, argumento que justificaria –  
modo contínuo – a violência contra os migrantes (América para os americanos), o desmonte  
das instituições de direitos humanos e solidariedade internacional e o deslanchar de uma guerra  
comercial imperialista. Na realidade latino-americana – lembradas as suas abissais diferenças  
em relação ao contexto americano, são emblemáticos os casos do Brasil e da Argentina, cujos  
mandatos do ex-presidente Jair Bolsonaro (2019/2022) e de Millei, em andamento, revelam  
filiações à extrema direita e organicidade com as propostas trumpistas.  
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Há, todavia, registros de rebeldias na realidade brasileira: o ano 2013 foi palco de  
manifestações de descontentamento estudantil e popular, sem filiação partidária explicitas, mas  
dando sinais de alerta do que estaria por vir: o surgimento de movimentos e organizações de  
direita e extrema direita, com protagonismo de jovens lideranças que capitanearam os interesses  
e insatisfações daquelas manifestações espontâneas, politizando-as à direita. Essa  
processualidade avança com o golpe jurídico-parlamentar de 2016 – o impeachment da  
presidenta Dilma Rousseff; segue-se a criação da Operação Lava Jato, sob a ideologia midiática  
da anticorrupção que evolui para a defesa da militarização do Estado, com desqualificações da  
esquerda, culminando com a prisão e inelegibilidade do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva.  
Ana Elizabete Mota  
Ao mesmo tempo se inicia a campanha eleitoral e a eleição do candidato da extrema  
direita para a presidência da República, cujo mandato estendeu-se de 2018 a 2022. Em face da  
derrota da reeleição de Jair Bolsonaro em 2022 e a posse de Lula da Silva em 2023, a fração  
bolsonarista implementa uma tentativa fracassada de golpe de Estado, objeto de criminalização  
da militância vinculada ao ex-presidente Bolsonaro. O atual governo Lula da Silva, um mandato  
de coalizão que vai do centro-direita ao centro esquerda, enfrenta um ambiente parlamentar  
ultraconservador e, a despeito de implementar algumas medidas de cunho social, mantém-se  
fiel à austeridade fiscal. Politicamente aposta no poder judiciário e na capilaridade popular dos  
processos ético-políticos referentes ao julgamento dos golpistas de 2023 que se tornaram  
objetos de uma acirrada disputa parlamentar e entre eleitores e militantes à esquerda e à direita,  
na antessala da eleição presidencial de 2026.  
Se o pós-primeira guerra mundial, como pesquisou Clara Mattei (2023, p. 84-85),  
evidenciou uma nova contextualidade política, protagonizada pela ação dos trabalhadores,  
particularmente na Itália e Grã-Bretanha, com a emblemática criação dos comitês de fábrica  
nos anos 1920, afirma a autora que, em face dessa ação organizada dos trabalhadores, “o  
establishment desperta seus maiores temores e consolidou um bloco antissocialista entre  
liberais, nacionalistas e conservadores [....] que se fundiram na ofensiva armada do fascismo e  
na ampla agenda da austeridade [...] a nova paladina do capitalismo para excluir qualquer  
alternativa a ele, quando a classe dominante impõe o seu domínio” (Mattei, 2023, p. 184-185).  
Em síntese: a lição histórica e teórica da emergência de conservadorismos de inspiração  
fascista tem orgânica relação com as crises do capital, a luta de classes, as crises de hegemonia  
e a ofensividade da burguesia na tentativa de restaurar a ordem capitalista. Essa conjuntura  
como já aventado, pode ser problematizada com os aportes da categoria gramsciana crise  
orgânica2 em função das ranhuras na hegemonia das classes dominantes e das limitadas  
perspectivas de superação dessa crise. Isto é: trata-se de um período em que crise econômica e  
poder político de classe deságuam em processos de transição, nos quais determinado padrão de  
dominação de classes foi abalado (porém, não cancelado), mobilizando processos políticos cuja  
remissão ao campo da hegemonia obriga-nos a situá-los no âmbito das relações de força entre  
as classes. Essa abordagem, ao situar os processos de transição no âmbito da hegemonia,  
permite tematizar medidas de austeridade como parte do processo e projeto da burguesia que  
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Uma das características da crise orgânica é a concomitância entre a crise econômica (de acumulação) e a  
emergência de uma crise política, determinada pelo acirramento dos conflitos entre as classes e, no seu interior,  
entre as frações de classe. Na concepção de Gramsci, essa crise orgânica afeta o conjunto das relações sociais e é  
a condensação das contradições inerentes à estrutura social. Para uma síntese do conceito cf. VOZA, P.; LIGUORI,  
G. Dicionário Gramsciano. São Paulo, Boitempo, 2017, p. 162-164.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 1-17, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Ofensiva da direita, crise da democracia e ameaças às conquistas civilizatórias  
exigem nova direção ideopolítica, ancorada em ideologias fascistas e em novos usos da  
democracia burguesa, afinando questões atinentes às situações de relação de forças. Nesse  
campo, as estratégias de dominação adquirem particularidades, a exemplo da criação de modos  
de operar a democracia burguesa e de novas mediações culturais ultraconservadoras. Aconselha  
Gramsci:  
§ 17. Análises das situações: relações de força. É o problema das relações  
entre estrutura e superestrutura que precisa ser posto e resolvido para que se  
possa chegar, com exatidão, a uma análise correta das forças que atuam na  
história de um determinado período e determinar a relação entre elas. É  
necessário mover-se no âmbito de dois princípios: 1) o de que nenhuma  
sociedade se põe a tarefas para cuja solução ainda não existam as condições  
necessárias e suficientes ou que pelo menos não estejam em vias de aparecer  
e se desenvolver; 2) e o de que nenhuma sociedade se dissolve e pode ser  
substituída antes que se tenham desenvolvido todas as formas de vida  
implícitas em suas relações (verificar a exata enunciação destes princípios).  
(Gramsci, 2024, CC 13, p. 716)  
Ao fortalecer a necessidade de rigorosa contextualização econômica e ideopolítica, em  
consonância com as particularidades do capitalismo em cada país e região, Álvaro Bianchi,  
referindo-se ao estudo das ideologias fascistas, sugere que (...) “o estudo da ideologia não pode  
ser separado das realidades políticas e sociais nas quais ela se afirma” (Bianchi, 2024 p. 56).  
Nessas realidades, são a correlação de forças que determinam a atualização das ideologias, suas  
tendências e novas configurações. Esse parece ser um dos maiores desafios que a realidade  
coloca para a pesquisa concreta de situações concretas.  
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Nova fase de dominação burguesa  
Como referido em outra ocasião, está em andamento, desde a crise de 2008, uma espécie  
de atualização das estratégias de dominação burguesa, caracterizada por “um conservadorismo  
de novo tipo” (Mota; Rodrigues, 2020), reacionário, de caráter neofascista e neoliberal,  
protagonizado pela direita e extrema direita, com pretensões de tornar-se universal – enquanto  
ideário burguês que deve pautar os modos de ser e viver das classes subalternas. As medidas de  
austeridade requerem a instrumentalização da democracia burguesa: mantem-se o sufrágio  
eleitoral, mas as regras das campanhas eleitorais são flexibilizadas. De um lado, o  
financiamento multimilionário, privado, das eleições. De outro, a mediação das mídias digitais  
(redes sociais e fake news) na criação de candidatos outsiders políticos da extrema direita,  
apoiados por celebridades, influencers e youtubers em torno de temas como anticomunismo e  
pautas libertárias. Manobras jurídicas são acionadas para manter limitados os controles públicos  
das mídias. O fundamental é manter o instituto democrático do sufrágio, mas permitir as novas  
modalidades de campanhas eleitorais, manipulando e reificando o senso comum: a nova  
Ana Elizabete Mota  
política antissistêmica, sem conluios parlamentares, anticorruptivel, de inspiração religiosa, sob  
acirrada guerra cultural e pautada pelo conservadorismo moral e reacionário.  
As classes subalternas - onde estão incluídos assalariados, trabalhadores por conta  
própria, segmentos pauperizados e precarizados -, subsumidos formal e realmente ao capital,  
sob relações de exploração e dominação, são o alvo dessa ofensiva que é adensada por opressões  
e discriminações em face da sua composição de classe e diversidade de raça, gênero, geração e  
sexualidades.  
Parece-me inconteste que a ofensiva da extrema direita espraia-se como cultura  
autoritária e anticivil, eivada de violências e ressignificações da democracia liberal,  
particularmente com a negação de direitos políticos, sociais e civis sob a narrativa da  
inauguração de uma nova era. Em recente artigo, Bianchi faz uma síntese dos estudos sobre o  
fascismo e endossa a afirmação de que “historicamente o aspecto central da ideologia fascista  
expressava-se por meio da recorrente afirmação de um recomeço, ou de uma nova ordem, que  
permitiria a superação de uma fase de crise ou declínio” (Griffin, 1991, p. 32-33 apud Bianchi,  
2024, p. 53). Segundo Bianchi, (2024, p. 60),  
a ideologia do fascismo é ultranacionalista, estatólatra, antidemocrática,  
anticomunista e atribui à violência a capacidade redentora de criar uma ordem  
política para promover o renascimento nacional. É essa ideologia que conecta  
o fascismo do entreguerras aos novos movimentos neofascistas.  
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Em outros termos: essa ideologia deriva da programática econômica e direção  
ideopolítica socializadora dos requerimentos do capital. Dentre outras linhas de ação, a  
burguesia movimenta-se nesse processo com a defesa da centralidade do mercado em  
detrimento da esfera pública e estatal e do apagamento dos controles sociais públicos,  
empenhada na formação de uma cultura neoliberal em que a democracia ajusta-se à liberdade  
mercantil.  
Como refletido em outro momento, para as classes trabalhadoras e subalternas, a  
conjuntura de crise e de contrarreformas do capital, antes que tudo, incidem nas suas condições  
de vida e na sua cultura política. No Brasil, desde o exaurimento da ditadura empresarial-militar,  
com a restauração democrática, na década de 1980, o movimento organizado dos trabalhadores  
comportava lutas e reivindicações sociais por condições de trabalho, salários, direitos políticos,  
sociais e civis, ademais de demandas por serviços sociais protetivos públicos, dentre outros.  
Essa processualidade continha dimensões ideopolíticas e impactos econômicos que  
imprimiam, tendencialmente, características anticapitalistas, ao confrontar o genético  
antirreformismo burguês, tanto em termos legais e constitucionais, como na definição de  
recursos para o financiamento de políticas sociais públicas como atestam muitos dos artigos da  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 1-17, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Ofensiva da direita, crise da democracia e ameaças às conquistas civilizatórias  
Constituição de 1988. Como ocorreu com a Emenda Constitucional 95/2016, que submeteu os  
gastos sociais às rígidas regras de controle do chamado teto de gastos, esses parâmetros vêm  
modificados.  
Na atualidade, a fragmentação partidária, sindical e político-organizativa dos  
trabalhadores e trabalhadoras afeta profundamente o campo das esquerdas em resultado das  
diferenciações de pautas, táticas e estratégias. Sejam elas resultantes da ofensividade das  
medidas econômicas, sejam elas afetadas pelas ressignificações teórico-políticas de valores,  
princípios, diretrizes e modos de vida.  
Segundo Lukács, o principal trunfo fascista para formar nas massas as suas ideias “é a  
manipulação da ontologia do cotidiano no contexto capitalista” (Lukács, 2013, p. 561).  
Poderíamos, na trilha do pensador húngaro, falar dessa condição de “desideologização”  
(Lukács, 2013, p. 268) do cotidiano [...] “para exercer uma influência motivadora somente sobre  
o entendimento e os instintos dessa particularidade” (Lukács, 2013, p. 268). Trata-se, sem  
dúvidas, do peso da categoria “ideologia” no processo de produção e reprodução social, tema  
fundamental neste debate3.  
Assim posto, entendo que as ideologias “neofacistas” confrontam-se diretamente com  
a direção progressista das lutas sociais classistas, quer no horizonte da emancipação política  
(conquista e exercício de direitos), quer no das lutas libertárias e/ou anticapitalistas (dos e das  
trabalhadoras, dos e das ambientalistas, das feministas, das liberdades sexistas e antirracistas),  
operando inflexões em todas as esferas da vida social – econômica, política, social, ambiental  
e cultural, ainda que não elimine contradições, nem resistências.  
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Os conservadorismos de inspiração fascista possuem diversas vertentes e muitos  
historiadores, filósofos e pensadores são cuidadosos em nominar o fenômeno como  
“neofascismo, protofascismo ou pós-fascismo, todavia suas determinações – como já referido  
– remontam à relação entre a crise capitalista e a recomposição do capitalismo financeiro global.  
Traverso (2023a), autor que possui significativa produção intelectual sobre o tema,  
assim como Bianchi (2024), problematizam essa conjuntura, nominando-a de pós-fascismo.  
Traverso afirma sua dimensão global e o despertar da memória do fascismo, todavia em um  
contexto histórico que desautoriza analogias stricto sensu. Para ele, o pós-fascismo deve ser  
entendido tanto em termos cronológicos como políticos: “não são totalmente fascistas no  
sentido dos anos 20/30 do século XX, nem são totalmente distintos” e aponta algumas  
3 Seja na abordagem lukácsiana, sobre o capitalismo manipulatório, seja na vertente gramsciana, da crise orgânica,  
a ideologia se constitui num dos principais pilares ideopoliticos que media, contraditória e dialeticamente, a relação  
entre a base material e as superestruturas jurídico-políticas, formadoras de sociabilidades classistas.  
Ana Elizabete Mota  
características: relaciona-se com as derrotas revolucionárias do século XX, com a governança  
neoliberal mundial, aposta em forças ditas antissistêmicas e na aversão à esquerda (Traverso,  
2023a). “É nacionalista, antifeminista, homofóbico, xenófobo e alimenta uma clara hostilidade  
contra a ecologia, arte contemporânea e o intelectualismo” (Traverso, 2023a, p. 23). Integram-  
se tanto às lógicas e às tecnologias deste século, como recorrem a estratégias utilizadas pelo  
fascismo clássico que, ao fim e ao cabo, recriam o anticomunismo, cortejam o presentismo,  
apoiam-se em teorias conspirativas e em práticas xenófobas (Traverso, 2023a). Para Judith  
Butler (2023, p. 59-60), feminista de esquerda, o eixo ideopolítico da extrema direita é o  
antifeminismo, dado que reconstituem o patriarcado e renegam as denominadas políticas de  
gênero. Segundo a pensadora, esse é um elemento novo em relação ao fascismo do século XX  
e argumenta que, os ataques à “ideologia de gênero(Butler, 2023, p. 60) têm crescido em todo  
o mundo, mobilizado pelas redes sociais e pelo pensamento conservador das igrejas católicas e  
evangélicas, sob a justificativa da defesa da família tradicional. É nacionalista, transfóbico,  
misógino e reacionário. Ao atacar o gênero, se opõem a liberdade reprodutiva das mulheres e o  
direito das famílias monoparentais, a proteção das mulheres vítimas de violência doméstica,  
dentre outros. Para Stefanoni (2022), pesquisador e periodista argentino, trata-se de uma direita  
que se apresenta como “rebeldesob o discurso de pseudo-práticas antissistêmicas, com a  
centralidade do discurso da “nova política”. Essa rebeldia, segundo o pensador, também é um  
traço novo das estratégias da extrema direita: são rebeldes na forma, mas reacionárias no  
conteúdo. “Para além dos resultados eleitorais [...] as direitas conduzem sua batalha cultural em  
vários níveis” (Stefanoni, 2022, p. 23). Comenta, ainda, que a nova direita utiliza espaços como  
a Internet em todo o mundo e “está disputando o sentido comum do momento, travando  
sua batalha cultural antiprogressista. Essa batalha antiprogressista une pessoas de diferentes  
direitas, mas o inimigo comum e principal é o progressismo. Trata-se de um antiprogressismo  
de novo tipo” (Stefanoni, 2022, p. 27).  
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Nesse diapasão, Feierstein et al. (2023) destacam a capacidade da nova direita de apropriar-  
se das insatisfações e desalentos dos jovens, como um dos traços dessa investida mundial e na  
América Latina. O historiador Badaró Matos (2020) utiliza as categorias “neofascismo” e  
“autocracia burguesa” para tratar as ideologias da extrema direita e a particularidade da  
formação social brasileira, tendo como universo o “bolsonarismo” no Brasil. Como ele, assumo  
a categoria neofascismo, entendendo-a como uma ideologia e prática portadora de traços  
fascistas que não são uma reprodução do passado - não se trata de uma reedição do fascismo da  
primeira metade do século XX.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 1-17, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Ofensiva da direita, crise da democracia e ameaças às conquistas civilizatórias  
Em resumo: a ofensividade da extrema direita incide na esfera econômica, sociocultural,  
ambiental e de costumes sob uma suposta ameaça do comunismo e no combate moral e legal  
às lutas sociais contra todas as formas de exploração, discriminação e opressões originárias dos  
trabalhadores e trabalhadoras, especialmente as afetas às mulheres (a exemplo do aborto), aos  
jovens das periferias, às pautas étnico-raciais, sexistas, anticapacitistas, dentre outras. Segundo  
Traverso (2023a), ponderando sobre as diversas categorias utilizadas para denominar as  
ideologias e práticas da direita, é importante destacar que, nesse momento, o fascismo é mais  
que uma área de estudos históricos, é uma questão da agenda contemporânea mundial.  
Em outra publicação, (Mota; Rodrigues, 2020, p. 2), afirmamos tratar-se de um  
“conservadorismo de novo tipo”, hipótese também presente no livro de Jamerson Souza (2024),  
dados os instrumentos, meios e propósitos presentes na sua difusão. Sob nosso ponto de vista,  
esse conservadorismo não contém um sistema coerente de ideias, mas apresenta “ideários  
comuns, de cunho moral, político e de fundamentalismo religioso que tratam de santificar a  
família, a propriedade e o mercado, assim como, de demonizar conquistas e costumes relativos  
aos direitos individuais, sociais e do trabalho” (Mota; Rodrigues, 2020, p. 5). Afirmamos que:  
Essencialmente antimoderno no conteúdo, mas moderno na forma, esse novo  
conservadorismo de tipo reacionário faz uso de ferramentas e estratégias high  
techs e de inovações tecnológicas, como a utilização intensa das redes sociais  
e robôs. Essas novas dinâmicas digitais surgem como meio de ampliação de  
sua capilaridade social e da defesa de ideias retrógradas, através de um  
discurso sintonizado com as premissas neoliberais de desregulamentação,  
privatização, mercantilização e apelo ao empreendedorismo (Mota;  
Rodrigues, 2020, p. 6).  
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Concordamos com Badaró Matos (2020, p. 79), quando diz que “é possível pensar que  
os neofascismos ganham fôlego, na média duração, com a crise social decorrente das políticas  
neoliberais do século XX, e sua ascensão ganha novas dimensões após a crise capitalista global  
em 2008”.  
Em síntese, considero que, na atual conjuntura, as ideias conservadoras têm capacidade  
de mobilização de massas (nacionalismo, anticomunismo, anti-intelectualismo, militarismo,  
com traços de racismo, machismo e heterossexismo) e tendem a despertar motivações nos  
médio-assalariados, profissionais liberais e segmentos das classes subalternas. Comenta  
Casimiro (2020, p. 23):  
A classe burguesa moderna, nessa linha, se perpetua através de operações de  
hegemonia – isto é, por meio de atividades e iniciativas de uma ampla rede de  
organizações culturais, movimentos políticos, instituições educacionais,  
meios midiáticos e as próprias redes sociais on-line (cada vez mais eficazes e  
sedutoras), que difundem e naturalizam capilarmente pela sociedade sua  
concepção do mundo e seus valores, constituindo-se como alicerces,  
Ana Elizabete Mota  
trincheiras da dominação de classe.  
Sua natureza mundializada e seus traços de unidade, contudo, não eliminam suas  
particularidades nos Estados Unidos, Europa, América Latina e Caribe, onde se inclui o Brasil.  
Na América Latina, segundo recente artigo, intitulado A onda neoconservadora no cenário  
ocidental: revisão histórica, social e política (Vieira; Rebelatto; Almeida, 2024), esse  
movimento foi influenciado principalmente pelos EUA, tanto nos setores políticos e sociais  
quanto culturais. As ideias e suas manifestações estão ligadas à ascensão das igrejas (tanto  
evangélicas como da renovação carismática) a partir de fins dos anos 1970, orientadas pelo  
contexto da Guerra Fria (1945-1989): competiram com os movimentos sociais que se formavam  
nos países da região em torno de bandeiras neoconservadoras, contrapondo-se à Teologia da  
Libertação, surgida no seio da Igreja católica progressista na década de 1960 (El Salvador,  
México, Equador, Peru, Brasil e Uruguai), com o apoio da Casa Branca de Reagan. Conforme  
explica Carvalho (2023), esses cristãos, através das missões evangélicas, fomentaram a agenda  
norte-americana e tentavam desaconselhar as pessoas a entrarem em movimentos sociais.  
Acreditavam que seu trabalho na região era uma missão bíblica: conquistar o mundo para o  
cristianismo.  
Articulada em escala transnacional, desde o final da guerra fria, como brilhantemente  
tratou Clara Mattei (2023) no seu livro A ordem do capital: como economistas inventaram a  
austeridade e abriram o caminho para o fascismo, publicado pela Boitempo, a direita ganhou  
amplitude e novas dimensões com a crise de 2008, criando outros meios de restaurar lucros  
capitalistas e avançando na implementação de políticas que operaram novas expropriações  
(Mota, 2018; Fontes, 2018), ampliando a pilhagem do fundo público (Behring, 2018),  
avançando na “supercapitalização”, segundo a perspectiva mandeliana com a criação de novos  
mercados, à custa das privatizações, parcerias público/privadas, entidades de direito privado  
e/ou terceiro setor, inclusive através das privatizações atípicas de bens e serviços originalmente  
públicos (educação, saúde, previdência, energia, extrativismo, comunicações), transformados  
em grandes negócios (Fontes, 2018).  
10  
Essa conjuntura, marcada por iniciativas que atingem as condições de vida e o acesso  
aos meios de sobrevivência das classes trabalhadoras e segmentos pauperizados, revela a  
ofensiva do capital, levada a efeito pelas classes proprietárias e dominantes, em resposta aos  
seus interesses, plenas de apelos ideológicos, culturais e religiosos, utilizando-se de mídias  
corporativas, do discurso das igrejas conservadoras, das fake news, das redes sociais, blogs e  
youtubers, num verdadeiro espetáculo de mentiras, anti-intelectualismo, reacionarismo e  
comunicação popular. Uma espécie de contrarrevolução midiática e reacionária para atingir  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 1-17, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Ofensiva da direita, crise da democracia e ameaças às conquistas civilizatórias  
jovens, pequenos comerciantes, trabalhadores autônomos, lumpemburguesia (Demier, 2020) e  
segmentos médio-assalariados insatisfeitos.  
Conservadorismos, sociabilidade e subjetividade das classes subalternas.  
A permeabilidade que esse conservadorismo reacionário tem junto às classes subalternas  
tem uma importância fundamental nesse avanço da extrema direita. E isso não é fortuito, trata-  
se de um processo socialmente determinado que não podemos deixar de historicizar. Como  
tratou Jamerson Souza (2020, p. 78):  
Em momentos de crise do capital, o conservadorismo termina por ganhar  
fôlego e expressão entre as classes dominadas e no senso comum, pois  
concentra esforços no sentido de dar vazão ao ressentimento generalizado  
entre as frações menores da pequena burguesia, dos trabalhadores e do  
lumpemproletariado, por meio da indicação abstrata de razões para a crise e  
as dificuldades práticas do cotidiano.  
Com a agudização das contradições do próprio capitalismo, a insatisfação da classe  
trabalhadora se amplifica e torna-se essencial estabelecer novas formas de obtenção do  
consenso social, para além, é claro, da coerção e violência. São necessários elementos  
irracionais e uma visão fatalista e conformista da vida, para manter os sujeitos passivos e fiéis  
à ordem. Trata-se de valorizar o presente, sem pretensões futuras, apenas adaptadas às  
condições existentes, generalizando-se o medo do desemprego, o trabalho a qualquer custo, o  
fim do horizonte das aposentadorias, a convivência com a precariedade dos serviços públicos  
etc. A prioridade é garantir a sobrevivência, afastando os sujeitos de quaisquer perspectivas  
mais amplas e significativas de ação e inserção política e social (Castro, 2021).  
11  
A subjetividade da classe trabalhadora deve ater-se à sua sobrevivência imediata e  
cotidiana, ajustando-se – objetiva e subjetivamente – aos imperativos da sociabilidade  
capitalista, amparada que é pela genética desigualdade social e pelos interesses antagônicos e  
contraditórios entre capital e trabalho. Parametrada pela consciência individual de consumidor  
e do “salve-se quem puder”, por vezes essa subjetividade nega a “organização da classe  
trabalhadora e a sua mobilização para os embates, embora também a precarização da sua vida  
possa atingir limites concretos de sobrevivência ao ponto de insurgirem-se” (Castro, 2021, p.  
45). Essa insurgência pode nascer desorganizada e espontaneamente, como no caso das  
denúncias contra a escala de trabalho 6x1, no Rio de Janeiro e São Paulo, até alcançar  
organicidade e unidade nacional, mediada pela ação de sindicatos e partidos políticos.  
Ana Elizabete Mota  
Considero pertinente recuperar a categoria cultura da crise4 (Mota, 1995), por entender  
que a formação da cultura (como forma de ser e ideologia) é um processo social que estabelece  
o nexo entre crise, sociabilidade e constituição de hegemonia no interior das estratégias das  
classes dominantes e da resistência e/ou consentimento das classes trabalhadoras e subalternas.  
Pode-se aventar que, nessa nova etapa de ofensiva regressiva, o neofascismo impõe  
novos elementos à cultura da crise e, com algum êxito, conseguem legitimar medidas e  
iniciativas que respondem positivamente à remoção de todos os obstáculos à expansão do  
capital. É nesse ambiente que as classes dominantes tentam tornar universal o seu projeto  
societal que se pretende hegemônico. Tem incidência no mundo do trabalho, nos mecanismos  
de proteção social públicos e no cotidiano e senso comum das classes subalternas. O cenário é  
de expropriações de direitos, mercantilização de serviços, precarização das relações e condições  
de trabalho. Aspectos duplamente afetados, particularmente, pelo racismo e outras opressões de  
gênero.  
Não se pode menosprezar o potencial de capilaridade dessa “nova cultura regressiva na  
sociedade” brasileira (Mota, 2018), uma vez que seu discurso reacionário e de ódio converge  
com as particularidades de uma formação social marcada pela desigualdade social, pelo  
patrimonialismo, patriarcado, racismo, machismo, misoginia, homofobia e antirreformismo  
radical.  
12  
Essa contextualidade também está presente no atual governo brasileiro: no limite,  
representou a resistência ao neofascismo na conjuntura de 2022 e ainda contém os embriões  
desta, mas são complexas suas contradições. De um lado, o peso das coalizões de centro-direita  
e a força parlamentar das bancadas conservadoras, assim como os arranjos econômicos,  
particularmente para alinhar-se à ortodoxia da administração do déficit público e dos ajustes  
fiscais que atingem frontalmente o orçamento e o financiamento das políticas sociais; de outra  
parte, a fragmentação das esquerdas (partidos, sindicatos, movimentos) e as expressões de  
consentimento passivo das classes subalternas, ora mediado pelos novos perfis dos jovens das  
classes trabalhadoras nos serviços, dos trabalhadores autônomos e de aplicativos e das  
populações pauperizadas e sobrantes, fruto das mudanças no trabalho, da regressão de direitos  
4
A categoria cultura da crise foi por mim construída como um artifício reflexivo para tratar das ideologias  
formadoras de consensos de classe quando da reforma da previdência social brasileira nos anos 1990, tratada  
originalmente na minha tese de doutoramento, publicada em 1995. Desde então venho sistematicamente  
enriquecendo e identificando os significados dessa cultura, saturada de ideologias que passivizam a consciência  
social e a luta dos trabalhadores e trabalhadoras, sob determinadas condições históricas. Por suposto, contando  
com a necessária atualização histórica, a tese central me parece válida para compreender criticamente as estratégias  
e táticas da burguesia para realizar suas contrarreformas, inclusive mediadas por ideologias conservadoras. Sobre  
o tema, consultar MOTA, Ana Elizabete. Cultura da Crise e Seguridade Social: um estudo sobre as tendências da  
previdência e assistência social brasileira nos anos 80 e 90. São Paulo: Cortez, 1995.  
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Ofensiva da direita, crise da democracia e ameaças às conquistas civilizatórias  
e da ofensiva ideopolitica da direita, cujo espraiamento no cotidiano das classes trabalhadoras  
é fato.  
Note-se, por exemplo, a reorientação do tratamento de temas que tiveram visibilidade  
em todo o mundo desde os anos 60 do século XX, demandantes de políticas e direitos civis,  
sociais e políticos, operando uma espécie de restauração conservadora que se espraia como  
despolitização e negação de conquistas sociais.  
Em postagem no Blog da Boitempo Editorial, Leda Paulani (2024) analisando o Novo  
Arcabouço Fiscal, referência a hipótese de que o regime republicano brasileiro sempre teve  
características patrimonialistas que operam determinações históricas. Utiliza a metafórica  
expressão “fina camada de gelo” para apontar as fragilidades e dificuldades por onde caminha  
o governo Federal, materializadas nos super poderes do Banco Central, no conservadorismo do  
Congresso Nacional e no fato do fascismo estar à espreita.  
A rigor, como comenta Demier (2024), o capitalismo monopolista enfrenta uma  
crescente dificuldade política de efetivar a acumulação capitalista, “o que exige cada vez mais  
contrarreformas, austeridade e espoliações, por meio do regime democrático-blindado, e o  
crescimento do neofascismo talvez seja a melhor expressão disso”.  
Assim, é possível dizer que, frente à crise do capital, à hipertrofia do capital financeiro  
e à ofensiva ultraconservadora e ultraneoliberal, as classes dominantes – nacional e  
internacionalmente – promoveram as condições materiais e subjetivas para a passivização das  
classes subalternas aos seus interesses materiais e políticos. E o fazem na tentativa de exercitar  
sua dominação direta, malgrado a resistência de importantes setores da esquerda. Além de  
classe dominante, a burguesia investe em tornar-se classe dirigente (sob o signo do seu projeto)  
e, para isso, precisa passivizar as classes subalternas, ao tempo em que arregimenta meios  
institucionais e materiais de coerção. Consoante com a histórica postura antirreformista,  
patrimonialista e autoritária da burguesia brasileira, as classes trabalhadoras devem assimilar,  
como seus, os costumes e as ideias propagandeadas pelos aparelhos privados de hegemonia da  
direita (Mota; Rodrigues, 2020).  
13  
Do meu ponto de vista, o momento permite repor a célebre formulação gramsciana em  
função do atual momento, “no qual o velho não morreu e o novo não nasceu”, explico-me:  
transita entre o espólio de um dado modo “de ser e viver” – a herança fordista-keynesiana (o  
ethos da integração pelo trabalho e do Estado Social) que devem ser particularizados na  
periferia capitalista, e a peleja para parir o novo que está encapsulado pelas novas  
determinações da acumulação (supercapitalização dos serviços, financeirização, apropriação do  
fundo público, mercantilização da esfera pública, uberização do trabalho e expropriações de  
Ana Elizabete Mota  
toda ordem), afetando diretamente o trabalho e os trabalhadores, a divisão social, internacional,  
generificada e racializada do trabalho e a eversão de mecanismos civilizatórios e de proteção  
social, numa avassaladora criação de meios e estratégias de dominação que tem por objetivo a  
destruição de resistências e o impulso para as classes exploradas assumirem os projetos da  
classe que os explora e domina. São atravessados pela pequena e grande política no âmbito das  
propostas e ideias das classes dominantes que ao inventarem formas modernas de comunicação  
e manifestação popular, apresentam-se sob um suposto novo modo de fazer política que  
detonam resistências à esquerda.  
Esses meios, condições e estratégias têm tamanha incidência objetiva que podem, e por  
vezes conseguem, tornar subjetiva a objetividade da ordem burguesa (note-se que jovens  
trabalhadores consideram impossível ter o direito à aposentadoria; assim como desconhecem a  
formalização do trabalho com carteira assinada e os mecanismos legais de proteção social ao  
trabalhador), assumindo como imutáveis e definitivas as novas formas de ser do trabalho e da  
seguridade social.  
A unidade classista, sempre ameaçada pela natureza estrutural e diversa da exploração  
do trabalho e das opressões raciais, étnicas, anticapacitistas, geracionais, etárias, de gênero e  
sexualidade, são socialmente reproduzidas via postulações culturais que contribuem para  
fraturar a unidade das lutas sociais e as ideologias insurgentes à ordem. Fazem-no:  
ressignificando questões estruturais que afetam as modalidades de exploração do trabalho e o  
desemprego, sob a defesa do empreendedorismo, da formalização dos MEI, das loas à liberdade  
dos que não tem patrões, mas estão formal e realmente subsumidos às relações capitalistas;  
sugerindo medidas complementares privadas, como planos de saúde e de aposentadorias para  
fazer frente à precarização das políticas públicas. Também tematizam a destruição dos recursos  
naturais como uma questão de sustentabilidade e tratam as diversidades como multiculturalismo  
cujos conteúdos são negadores das pelejas políticas dos subalternos, em prol de um novo que é  
reprodução ampliada da velha ordem.  
14  
Considerações finais  
A conjuntura atual é marcada por uma nova fase de dominação burguesa em prol do  
projeto político das classes dominantes. Sob diretrizes econômicas, sociais, culturais e morais  
– de caráter neoliberal e neofascista, liderado pela direita e extrema direita (ainda que com  
tensões intraburguesas), alimentam a unidade do seu projeto dominante. Através de modernas  
e supostamente rebeldes manifestações de rua, do uso das redes sociais e da atuação de  
youtubers, difundem fake news e pedagogizam a difusão do pensamento conservador,  
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Ofensiva da direita, crise da democracia e ameaças às conquistas civilizatórias  
ressignificando formas de opressões étnico-raciais, de gênero, sexistas e religiosas que deverão  
pautar a sociabilidade dos trabalhadores, da pequena burguesia e do lumpemproletariado  
(Demier, 2020).  
Esse processo – em andamento – requereu a instrumentalização da democracia liberal  
burguesa (parlamentar e eleitoral), refinando a sua “decadência ideológica” (Coutinho, 2010) e  
cimentando novos meios de exercício de dominação, onde se incluem as benesses do poder  
legislativo (de que é exemplar no Brasil a subordinação do financiamento público às emendas  
parlamentares), as representações institucionais (a exemplo da autonomia do Banco Central) e  
de novas lógicas argumentativas, reveladoras de interesses privados, sob o beneplácito da  
democracia eleitoral (mediante financiamentos multimilionários das campanhas eleitorais).  
Suas implicações imediatas e mediatas na derruição de conquistas civilizatórias são  
concretizadas em violações de direitos civis, políticos e sociais. Conquistas de cunho libertário  
são desqualificadas, assim como são suprimidos direitos do trabalho e da proteção social. As  
políticas sociais, responsáveis pela oferta de serviços sociais, são objeto de contrarreformas que  
traduzem a austeridade requerida pela redução e desfinanciamento do serviço público e das  
carreiras de Estado, generalizando o estímulo ao consumo privado e à produção de novas  
mercadorias no campo dos serviços.  
Avento a hipótese de que são redefinidas as modalidades estratégicas de enfrentamento  
às manifestações da questão social, de que são exemplos: o já referido empreendedorismo e o  
trabalho por conta própria, como mecanismos de enfrentamento do desemprego, ajustamento  
às mudanças do trabalho e esvaziamento das políticas de trabalho e renda. São novas estratégias  
para tornar produtivo o exército industrial de reserva e rebaixar o valor da força de trabalho.  
Note-se a centralidade da sobrevivência e a captura da superação da pobreza pelas políticas de  
transferência de renda, na esfera da assistência social. Comenta Casimiro (2020, p. 23) que,  
15  
a classe burguesa moderna, nessa linha, tenta se perpetuar através de  
operações de hegemonia – isto é, por meio de atividades e iniciativas de uma  
ampla rede de organizações culturais, movimentos políticos, instituições  
educacionais, meios midiáticos e as próprias redes sociais on-line (cada vez  
mais eficazes e sedutoras), que difundem e naturalizam capilarmente pela  
sociedade sua concepção do mundo e seus valores, constituindo-se como  
alicerces e trincheiras da dominação de classe.  
Nesse ponto, vale retomar a questão da crise orgânica...ora, “as condições necessárias  
para o romper da crise orgânica são duas: a) o fracasso da política da classe dirigente; b)  
organização das classes subalternas, sem o que a crise não causará repercussões no seio da  
primeira (Liguori; Voza, 2017, p. 163). Refletindo sobre a citação gramsciana, Demier (2024)  
afirma que, se houve fracasso em algum grande empreendimento político para o qual [a classe  
Ana Elizabete Mota  
dominante] pediu ou impôs pela força o consenso das grandes massas” (Gramsci, 2007 apud  
Demier, 2024), pode-se apontar o fracasso do projeto neoliberal com a “promessa de que, com  
a redução dos gastos sociais do Estado e a privatização de alguns setores e serviços públicos,  
haveria crescimento econômico e o mercado se encarregaria de melhor alocar os recursos  
segundo as necessidades dos cidadãos” (Demier, 2024).  
Eis uma questão que nos desafia: na sua fase “gloriosa”, o capitalismo necessitava da  
democracia para consolidar o pacto de classes do pós-guerra; na atualidade, ele compatibiliza  
a democracia às necessidades da acumulação financeirizada, razão maior dos laivos  
antidemocráticos da direita sob formas modernas e arrojadas para contrarreformar o Estado,  
adotando como universal uma espécie de pensamento único: menos Estado para os interesses  
dos subalternos, mais mercado, menos emprego, mais empreendedorismo, menos proteção e  
mais auxílios focais. Isso porque as ideologias conservadoras, ao tempo em que funcionam  
como uma frente de atuação de setores dominantes, oferecem um sistema de crenças coerente  
o suficiente para dar suporte ideológico e valorativo aos setores dominados, num arrojado apelo  
para obtenção do consenso das massas.  
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