Formação das sociedades angolana e brasileira:  
dominação e resistências dos povos originários  
Formation of angolan and brazilian societies:  
domination and resistance by native peoples  
Boás dos Santos*  
Edna Maria Goulart Joazeiro**  
Resumo: O presente artigo evidencia as  
contribuições dos povos originários na  
formação das sociedades angolana e brasileira,  
com foco na educação, cultura e identidade,  
destacando o papel das mulheres na resistência  
e preservação cultural. Trata-se de um estudo de  
natureza conceitual, com base na produção da  
literatura especializada. A análise revela que, no  
decorrer da história, embora a colonização tenha  
tentado apagar a herança cultural, os povos  
originários resistiram, preservando sua língua,  
cosmologias, saberes e identidades, o que  
impactou profundamente a educação, cultura e  
identidade de Angola e do Brasil. Nesse  
processo, as mulheres desempenharam um  
papel central, sendo responsáveis pela  
transmissão de conhecimentos por meio da  
educação oral, pela preservação de valores  
tradicionais e pela luta pela autonomia e direitos  
territoriais, tornando-se protagonistas na  
resistência e ressignificação cultural. Portanto,  
o estudo destaca a importância das práticas  
culturais na construção das identidades  
nacionais e a necessidade de políticas públicas  
que garantam os direitos territoriais e culturais  
desses povos.  
Abstract: This article highlights the  
contributions of indigenous peoples to the  
formation of Angolan and Brazilian societies,  
with a focus on education, culture and identity,  
emphasising the role of women in resistance  
and cultural preservation. This is a conceptual  
study based on the production of specialised  
literature. The analysis shows that throughout  
history, although colonisation has tried to erase  
the cultural heritage, the original peoples have  
resisted,  
preserving  
their  
language,  
cosmologies, knowledge and identities, which  
has had a profound impact on the education,  
culture and identity of Angola and Brazil. In this  
process, women played a central role, being  
responsible for transmitting knowledge through  
oral education, preserving traditional values and  
fighting for autonomy and territorial rights,  
becoming protagonists in resistance and cultural  
re-signification. The study therefore highlights  
the importance of cultural practices in the  
construction of national identities and the need  
for public policies that guarantee the territorial  
and cultural rights of these peoples.  
Palavras-chaves: Povos originários; Mulheres;  
Keywords: Original peoples; Women; Cultural  
Resistência cultural; Educação; Identidade.  
resistance; Education; Identity.  
* Universidade Federal do Piauí. E-mail: boas.santos@ucan.edu  
** Universidade Federal do Piauí. E-mail: ednajoazeiro@ufpi.edu.br  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.47754  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 10/03/2025  
Aprovado em: 16/05/2025  
Boás dos Santos; Edna Maria Goulart Joazeiro  
Introdução  
O processo de colonização do Brasil e de Angola, objeto da análise deste artigo, não  
ocorreu sem resistências. A participação das mulheres nesse processo, especialmente entre os  
povos originários, foi muitas vezes marginalizada, invisibilizada ou subestimada, embora nossa  
análise neste artigo busque evidenciar que elas foram figuras-chave na resistência à  
colonização. Ao contrário da visão tradicionalmente imposta pela noção de feminilidade  
europeia, branca, que as via como figuras passivas, as mulheres foram, e continuam a ser,  
protagonistas na transmissão de saberes na dinâmica do processo de resistência cultural. A  
educação oral, como estratégia vital de preservação cultural, foi, em grande parte, liderada por  
mulheres, sendo fundamental para a reconfiguração das línguas e dos valores dos povos  
originários, populações indígenas e afrodescendentes.  
Neste contexto, a análise do território, enquanto espaço de resistência e identidade,  
revela-se central. O território, entendido como campo de vivência e espaço de trocas culturais,  
foi reconfigurado pela imposição colonial. Contudo, “o território não é apenas o conjunto dos  
sistemas naturais e de sistemas de coisas superpostas; o território tem que ser entendido como  
o território usado, não o território em si. O território usado é chão mais identidade. A identidade  
é o sentimento de pertencer àquilo que nos pertence” (Santos, 2006, p. 14).  
A relação dos povos originários com seus territórios foi profundamente afetada pela  
colonização, que não apenas ocupou fisicamente esses espaços, mas também alterou as  
representações simbólicas que esses povos construíam sobre eles. Apesar disso, as mulheres,  
com seu papel ativo na preservação de conhecimentos e saberes, continuaram a ser as guardiãs  
desses territórios simbólicos, garantindo que as relações com a terra e o espaço permanecessem  
expressões da identidade cultural.  
158  
A colonização portuguesa, ao impor novas práticas na dinâmica da vida destas  
populações, dentre elas a própria imposição do uso de línguas europeias, também resultou na  
fusão de saberes, especialmente com a diáspora africana, que trouxe ao Brasil as culturas  
africanas, em particular as de Angola. Esse processo de interconexão cultural entre os dois  
países, embora distintos, gerou uma significativa relação de troca de influências, especialmente  
nas manifestações artísticas, na gastronomia, na música e nas práticas religiosas, que se  
tornaram símbolos de resistência e de identidade compartilhada.  
No entanto, essa troca cultural não foi isenta de desigualdades, pois, como destaca  
Falola (2020), no decorrer deste denso processo de colonização, havia aqueles que  
consideravam que “as mulheres são cidadãs de segunda classe” (p. 390). No entendimento de  
Falola (2020), os estereótipos culturais frequentemente posicionam as mulheres como frágeis e  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 157-179, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Formação das sociedades angolana e brasileira: dominação e resistências dos povos originários  
incapazes de exercer liderança, relegando-as ao papel de administradoras do espaço doméstico.  
Essa visão reflete a marginalização das mulheres, particularmente nas esferas de poder, como  
resultado das estruturas patriarcais que configuraram as dinâmicas sociais e políticas.  
A opressão das mulheres é particularmente visível entre as populações de povos  
originários, que, embora tenham desempenhado papéis fundamentais na resistência à  
colonização, enfrentaram obstáculos nas esferas jurídicas e sociais. As legislações,  
predominantemente elaboradas por homens, negavam e continuam negando a elas direitos  
essenciais, especialmente no que tange a questões de herança e divórcio, perpetuando, assim,  
sua subordinação e marginalização em diversas dimensões da vida cotidiana.  
Além disso, a discriminação de gênero se reflete também na educação e na saúde, áreas  
fundamentais para o desenvolvimento humano. Ao se referir à realidade africana, Falola (2020,  
p. 391) considera que, “na educação, as mulheres ainda estão atrás dos homens, mesmo onde o  
acesso é universal; a taxa de abandono é maior entre as mulheres, em parte devido à gravidez e  
ao casamento precoce, à preferência dos pais em atender às necessidades dos meninos em vez  
das meninas”, e ao excesso de tarefas domésticas. No que diz respeito à saúde, as mulheres  
continuam a não deter o controle total sobre sua capacidade reprodutiva, enfrentando  
dificuldades significativas no atendimento às suas necessidades nutricionais e de saúde.  
Esse quadro de desigualdade e marginalização das mulheres nas sociedades pós-  
coloniais, tanto na África quanto nas Américas, reflete uma construção histórica que precisa  
ser compreendida e enfrentada. A luta pela igualdade de gênero, pela preservação das culturas  
e pela afirmação da identidade continua sendo uma questão central no processo de  
ressignificação cultural das sociedades angolana, brasileira e de outros povos que, de diversas  
formas, foram submetidos às dinâmicas culturais e de poder supramencionadas.  
159  
Desse modo, a reflexão proposta neste artigo reveste-se de grande importância, pois  
se insere no contínuo processo de compreensão do nosso projeto de pesquisa de doutorado  
intitulado “Política de educação e de saúde e a marginalização de adolescentes grávidas no  
espaço escolar em Luanda, Angola”, enquadrado no Programa de Pós-Graduação em Políticas  
Públicas da Universidade Federal do Piauí (UFPI), especialmente no que se refere aos desafios  
enfrentados pelas mulheres no acesso a direitos fundamentais, como educação, saúde e  
cidadania. O debate aqui apresentado demanda atenção tanto no contexto de Angola quanto do  
Brasil, onde a luta pela preservação das culturas e a afirmação da identidade continuam a ser  
questões centrais e indissociáveis.  
Boás dos Santos; Edna Maria Goulart Joazeiro  
O objetivo deste trabalho é evidenciar as contribuições dos povos originários na  
formação das sociedades angolana e brasileira, com foco na educação, cultura e identidade,  
destacando, especialmente, o papel das mulheres na resistência e preservação cultural. Para  
atingir esse objetivo, realizamos uma análise conceitual, ancorada na literatura esepcializada,  
com base bibliográfica, cujos principais resultados são organizados em três seções: na primeira,  
abordamos o contexto histórico e a formação das sociedades angolana e brasileira, com ênfase  
na educação, cultura e identidade; na segunda, analisamos os processos de colonização e seus  
impactos sobre as populações originárias; e, finalmente, na terceira, tratamos da resistência  
cultural e do papel da mulher na ressignificação cultural durante e após a colonização.  
A colonização na formação das sociedades angolana e brasileira: dominação e  
resistências  
A formação das sociedades angolana e brasileira é um processo marcado por  
transformações impostas pelo colonialismo, que alteraram suas estruturas sociais, culturais e  
educacionais. Antes da chegada dos colonizadores, tanto em Angola quanto no Brasil, as  
populações originárias já possuíam sistemas de organização social, educação e cultura,  
intimamente relacionados à natureza e ao território.  
Deste modo, a intenção aqui é desvendar os aspectos históricos de formação dessas  
sociedades, sem estabelecer uma hierarquia entre elas. Embora compartilhem algumas  
semelhanças, cada uma passou por processos históricos distintos. Portanto, nesta seção,  
focamos no contexto histórico de ambas as sociedades, com ênfase nos aspectos relacionados  
à educação, cultura e identidade, começando por Angola e, em seguida, pelo Brasil.  
A palavra “Angola” tem origem no termo ngola, que se refere ao nome de uma dinastia  
de povos, posteriormente conhecidos como Ambundu. Esses povos migraram da Região Sul da  
África Central até o Rio Kwanza, onde fundaram um dos mais poderosos reinos do país.  
Localizada na Zona Austral do continente africano, Angola possui uma vasta extensão  
territorial de 1.246.700 km2, o que corresponde a um território duas vezes maior do que a França  
e a Grã-Bretanha, e catorze vezes maior que Portugal. Além disso, o país tem uma área marítima  
de 1.650 km e faz fronteira ao Norte com a República Democrática do Congo, a Leste com a  
Namíbia e ao Sul com o Congo-Brazzaville.  
160  
Em Angola, a diversidade étnica reflete-se na composição do grupo bantu. A palavra  
bantu origina-se do radical ntu, comum a várias línguas bantu, e significa “homem” ou “pessoas  
humanas”. O prefixo “ba” forma o plural da palavra muntu (pessoa). Portanto, bantu significa  
“seres humanos”, “pessoas”, “povo” (Altuna, 2006). Este grupo constitui a maioria da  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 157-179, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Formação das sociedades angolana e brasileira: dominação e resistências dos povos originários  
população angolana e tem origem no Vale de Benue, entre os Camarões e a Nigéria, por volta  
do Século XIII.  
A população bantu, de África, faz parte de um vasto conjunto de aproximadamente  
500 povos, totalizando mais de 150 milhões de pessoas com características étnicas e culturais  
comuns. Esse grupo é um dos mais importantes de África, com uma distribuição geográfica que  
vai desde a orla sudanesa até o Cabo e do Atlântico ao Índico (Altuna, 2006). No contexto de  
Angola, representam cerca de um terço da população total.  
Em Angola, cerca de 100 grupos etnolinguísticos formam a população, organizados  
em nove principais subgrupos: Ovimbundu, Ambundu, Bakongo, Lunda-Tchokwe, Nganguela,  
Nhaneka-Humbi, Ambó, Herero e Xindonga. Além disso, o país abriga outros povos não-bantu  
e pré-bantu, como os Khoisan e os Vátuas, que enriquecem ainda mais a diversidade étnica  
(Menezes, 2000; Neves 2012).  
Figura 1: Grupos étnicos de Angola.  
161  
Entre os grupos que habitam o espaço sócio-cultural de Angola, os Ovimbundu são os  
maiores, com cerca de 40% da população total, e são compostos pelos povos: vienos, bailundos,  
seles, sumbis, lumbos e outros, os quais ocupam a parte Ocidental de Angola, nas províncias  
(estados) do Huambo, Benguela e Bié, e têm uma organização social complexa, baseada em  
reinos, como: o Reino do Bailundo, Bié, Huambo, Chiyala, Galange, Andulo, etc. Esse grupo  
tem uma forte tradição agrícola e comercial, além de um sistema espiritual e jurídico próprio.  
Boás dos Santos; Edna Maria Goulart Joazeiro  
Por outro lado, são um dos grupos que melhor se adaptaram e mais resistiram à presença dos  
colonizadores. A língua umbundu, falada por esse grupo, é um exemplo de preservação da  
identidade frente à imposição do português.  
Os Ambundu representam 20% da população de Angola e ocupam uma extensa área  
do território, desde o Oceano Atlântico até algumas províncias do Nordeste do país, como  
Luanda, Bengo, Kuanza-Norte, Kuanza-Sul e Malanje. Falam a língua kimbundu, tendo sido  
um dos grupos mais influenciados pela cultura europeia, com atividades centradas no cultivo  
de arroz e café. O grupo inclui povos como ambundos, luandas, hungos, zuangos, ntendos,  
dembos, ngolas e outros.  
Outro grupo bantu de grande relevância em Angola são os Bakongo1, representando  
cerca de 15% da população que habitam nas províncias do Norte do país, como Cabinda, Uíge  
e Zaire, sendo compostos por 18 povos, entre eles: muxicongos, sossos, pombos, solongos,  
zombos, iacanas, sucos, entre outros. Tradicionalmente, os Bakongo praticam a agricultura de  
subsistência, com destaque para o cultivo de mandioca e café, tendo contribuído para que o país  
se tornasse um dos maiores produtores mundiais desses produtos.  
Os Lunda-Tchokwe, falantes da língua tchokwe, são um importante grupo étnico-  
linguístico e ocupam a Região Leste de Angola, nas províncias do Moxico, Lunda Norte e  
Lunda Sul, sendo conhecidos pela manipulação de metais, caça e agricultura. Esses e outros  
povos que habitam o território angolano desde o período pré-colonial, mantêm suas tradições  
culturais. Além disso, os povos Nganguela, Nhaneka-Nkumbi, e outros, que compõem cerca de  
10% da população, também mantêm suas línguas e práticas tradicionais, o que evidencia a  
diversidade étnica e cultural do país.  
162  
A cultura bantu é caracterizada por uma rica tradição oral, que engloba contos,  
provérbios, música2, dança e mitos. A educação, é vista como um bem coletivo da comunidade.  
A educação tradicional, portanto, era transmitida de forma coletiva3, tendo como educadores os  
pais e outros familiares, que desempenhavam papéis importantes no processo de ensino dos  
filhos. Ou seja, “ninguém escapava da educação familiar em casa, educação no campo, na  
caça, nas manifestações culturais e, de modo geral, todos se envolviam em um processo de  
1
Este foi o grupo étnico que teve os primeiros contatos com os europeus a partir do Reino do Congo em 1482,  
parte deles habitam a República Democrática do Congo, sendo considerados também como “guardiões” das  
tradições culturais do grupo banto.  
2 As músicas populares descreviam virtudes, sendo usadas tanto para expressar sentimentos quanto para orientar a  
educação. Através dessas músicas, os nativos de Angola também expressavam sentimentos, atitudes, crenças e  
valores.  
3 Vale clarificar que, embora não possuíssem estabelecimentos de ensino conforme a configuração atual da escola,  
não se pode afirmar que a educação e a instrução entre eles fossem orientadas ao acaso.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 157-179, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Formação das sociedades angolana e brasileira: dominação e resistências dos povos originários  
ensino e aprendizagem, para saber, para fazer, para ser ou conviver; todos os dias misturando  
a vida com a educação” (Neto, 2000, p. 56, destaques nossos).  
Esse aspecto colaborativo da educação também se reflete nas práticas cotidianas dos  
povos originários, que transmitiam seus saberes de geração para geração, enfatizando a conexão  
com a natureza e a preservação de suas identidades. Outrossim, entre os bantu, a educação não  
pode ser dissociada da religião; conforme enfatizado por Neto (2000, p. 46):  
Para os bantu, a visão do mundo se emparelha à crença em Deus como força  
primordial de onde tudo inicia. Ela existe em tudo, e há toda uma formalização  
do uso dessa força, que na visão do mundo do bantu é descrita como uma  
pirâmide. O homem vivo ocupa o centro da pirâmide, acima dele só os  
ancestrais e acima desses está Deus. Entre a pirâmide e o homem existe uma  
relação de forças iniciais. O homem é o grande manipulador dessas forças;  
ele trabalha na relação com a natureza e com os homens. A doença é vista  
como uma minimização da força, enquanto a saúde é vista como um esforço  
das forças iniciais. E ele põe todo esse universo que o cerca, ao seu serviço.  
Vale destacar que, antes da invasão colonial, a sociedade angolana era formada em  
reinos, dos quais os dois maiores eram os Reinos do Congo e Ndongo. Outros reinos  
relativamente menores existiram no planalto, no Centro e no Sul de Angola, como o Reino de  
Uambu, fundado pelo Rei Uambu-kalunga, situado na atual província do Huambo; o Reino de  
Thiyaka, formado pelo Reino Tchilulu; o Reino de Ndulu, do Rei Katekulu-Mengu, com sede  
na atual cidade do Andulo; o Reino do Bailundo, do Rei Katiavala; o Reino do Bié, do Rei  
Viyé; o Reino de Kandonda, do Rei Kakonda; o Reino da Lunda e o do Planalto Central  
(Mandume e Kuaniama) (Neto, 2000).  
163  
Cada reino possuía um rei que detinha autoridade sobre o território. A sociedade era  
organizada em grupos familiares, com papéis definidos conforme a idade e o gênero, refletindo  
as condições econômicas e culturais da época. Assim, a posição e função social de cada membro  
eram determinadas pela linhagem étnica ou pela tradição, embora essas estruturas estivessem  
sujeitas a transformações com o surgimento de novas dinâmicas econômicas e sociais.  
Entretanto, a chegada dos colonizadores portugueses, em 1482, provocou uma  
transformação dramática, alterando as dinâmicas sociais e culturais desses povos. A imposição  
do cristianismo, da língua portuguesa e dos valores europeus procurou desintegrar os sistemas  
educacionais autênticos e forçar a adaptação dos povos nativos ao novo modelo colonial. A  
colonização visava, assim, subverter as identidades dos povos e estabelecer uma relação  
desigual de poder, com o objetivo de subordiná-los às necessidades da exploração territorial e  
econômica.  
Após a independência de Angola, em 11 de novembro de 1975, a luta pela preservação  
da cultura e identidade dos povos nativos continuou sendo uma questão central. Para Samba  
Boás dos Santos; Edna Maria Goulart Joazeiro  
(2014), apesar das tentativas de homogeneização cultural impostas pelo colonialismo, os  
nativos de Angola, sobretudo os bantu, mantiveram sua diversidade étnica, cultural e  
linguística. Até hoje, o português, como língua oficial, é amplamente utilizado, mas 2/3 da  
população falam línguas da família bantu, como o umbundu, kikongo, tchokwe, nganguela,  
kimbundu, refletindo a pluralidade linguística e cultural do país.  
Assim como em Angola, o Brasil também apresenta uma complexidade única, fruto  
de um longo processo histórico que envolveu a fusão de diversos grupos étnicos e culturais.  
Esse processo, imerso em lutas e resistências, reflete-se na diversidade e pluralidade do país. O  
Brasil, com suas dimensões continentais, destaca-se entre os países latino-americanos. Sua  
extensão territorial de 8,5 milhões de km2 corresponde a quase 1,6% de toda a superfície do  
planeta, ocupando 5,6% das terras emersas do globo, 20,8% da área de toda a América e 48%  
da área da América do Sul.  
Essa grandiosidade territorial não apenas configura o Brasil como o terceiro maior país  
das Américas e o quinto maior do mundo, mas também como um território de contrastes e de  
vasta diversidade cultural. O país é composto por 26 estados e o Distrito Federal, onde se  
encontra a capital Brasília, distribuídos em cinco regiões: Norte, Nordeste, Centro-Oeste,  
Sudeste e Sul. Essa diversidade territorial reflete-se nas múltiplas realidades sociais e culturais  
do Brasil, que, historicamente, têm sido forjadas pelos processos de colonização, resistência e  
adaptação dos povos originários.  
164  
A grandeza do país está, assim, intimamente ligada à sua história de transformações,  
marcada pela luta pela preservação das identidades culturais e pela reorganização social de um  
povo em constante movimento. Por outro lado, a educação desses povos era essencialmente  
voltada para a transmissão de saberes ancestrais, principalmente por meio de rituais, mitos e  
práticas cotidianas, com um foco claro na integração com a natureza e na manutenção do  
território.  
No entanto, a chegada dos colonizadores portugueses em 1500, deu início a um  
processo de subordinação dessas culturas autênticas. Como esclarece Gomes (2012, p. 18), “a  
questão indígena nasceu com o descobrimento do Brasil, da América em geral, e continuará a  
existir [...]”. A imposição do modelo europeu, incluindo o uso da língua portuguesa e a adoção  
do catolicismo, foi um dos instrumentos utilizados para eliminar os sistemas educacionais dos  
nativos, desintegrando suas culturas e buscando a assimilação forçada ao modelo colonial e à  
visão eurocêntrica.  
Por outro lado, a análise histórica da luta e conquista dos povos originários pelo direito  
à terra no contexto da sociabilidade capitalista requer uma breve caracterização da relação entre  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 157-179, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Formação das sociedades angolana e brasileira: dominação e resistências dos povos originários  
as instâncias de poder e os povos originárias na formação social brasileira. No Brasil, assim  
como em outros contextos coloniais, a invasão e exploração territorial desempenharam papel  
central no rompimento das relações tradicionais dos povos originários com a terra, alterando  
suas dinâmicas sociais e culturais.  
A invasão, ocupação e exploração do solo brasileiro foram e continuam sendo  
determinantes para as transformações profundas que os povos originários sofreram ao longo de  
cinco séculos. Silva (2018) destaca que esse longo processo de devastação física e cultural  
resultou na eliminação de grandes grupos e numerosas etnias indígenas, especialmente devido  
a ruptura histórica entre os indígenas e a terra.  
A tentativa de extinção dos povos originários no Brasil é evidente pelo drástico  
declínio de sua população, que caiu de cinco milhões em 1500 para cerca de 230.000 hoje. A  
perda de 95% dessa população em menos de 500 anos reflete um processo sistemático de  
destruição, onde a sobrevivência foi uma exceção, e não a regra. O termo “sobrevivência” perde  
o seu significado diante de uma tragédia histórica de tal magnitude, caracterizada por violência,  
deslocamento e marginalização (Gomes, 2012).  
A destruição física e cultural causada pela colonização deixou marcas profundas na  
história dos povos originários, comprometendo sua autonomia e autossuficiência. Apesar dessa  
repressão, os povos originários resistiram de diversas maneiras, o que reflete a contínua luta  
pela preservação de suas culturas e pelo reconhecimento de sua contribuição à formação da  
identidade nacional.  
165  
Nesse contexto, a questão dos povos originários no Brasil reflete a luta não apenas pela  
sobrevivência, mas também pela (re)valorização da história e da cultura indígena, com uma  
ênfase especial na preservação das línguas e práticas religiosas. Dito de outro modo, Silva  
(2018, p. 482) afirma que “a diversidade dos grupos étnico-linguísticos da América Latina não  
cabe nesse termo genérico [‘índio’], expressando a marca histórica contraditória da  
colonização”. A diversidade dos grupos indígenas, suas línguas, culturas e práticas sociais,  
reflete a resistência a um processo que buscava o apagamento de suas identidades.  
Além disso, é importante ressaltar que a educação indígena não foi exclusivamente um  
processo unilateral de dominação. Pois, “alguns povos indígenas, como os Guarani, Terena,  
Guajajara, Tikuna, Macuxi, e outros mais, que têm mais de duzentos anos de contato com o  
mundo luso-brasileiro, parecem ter adquirido reforço biológico e cultural para defender-se das  
adversidades” (Gomes, 2012, p. 17). Essa adaptação não se limitou à sobrevivência, mas  
também ao fortalecimento das identidades indígenas, que conseguiram resistir e, em muitos  
casos, preservar suas culturas em face das pressões coloniais.  
Boás dos Santos; Edna Maria Goulart Joazeiro  
Esse contexto da reprodução histórica de preconceitos e de toda forma de violência da  
escravidão, perseguições e catequização, a trajetória institucional da atuação dos órgãos de  
“proteção” também registrou a diversidade de formas de organização social e resistência dos  
povos originários língua, tipo físico e cultura , constatando a diversidade de troncos  
linguísticos indígenas divididos em inúmeros subgrupos (Silva, 2018).  
O debate sobre o papel dos povos originários no Brasil continua a ser central, pois, “a  
questão indígena se processa numa dimensão histórica mais ampla do que aquela que define a  
história brasileira ou mesmo a americana em geral” (Gomes, 2012, p. 19), visto que, apesar da  
marginalização e do apagamento, a presença indígena persiste, desafiando as narrativas  
dominantes sobre a formação da nação. Esse fenômeno também se observa em Angola, onde,  
após a independência, a preservação da identidade e cultura desempenhou um papel crucial na  
resistência ao regime colonial português.  
Portanto, tanto a sociedade angolana quanto a brasileira foram marcadas pelos  
processos de resistência e adaptação dos povos originários, que, apesar das tentativas coloniais  
de destruição, preservaram suas culturas ao longo dos séculos. A educação, a cultura e a  
identidade desses povos só podem ser plenamente compreendidas ao se reconhecer sua  
contribuição fundamental para a formação destas sociedades. Por outro lado, a resistência e a  
presença contínua dos povos originários nas duas sociedades, não se restringem a um passado  
distante, mas representam uma contribuição vital para a consolidação das identidades nacionais  
e o fortalecimento das culturas locais.  
166  
Dominação do europeu branco português e seus impactos sobre as populações  
originárias  
O processo de colonização em Angola e no Brasil, assim como em outras partes do  
mundo, foi marcado pela imposição de uma nova ordem social e cultural, resultando em  
violência e destruição das formas de organização e identidade das populações originárias. Trata-  
se do processo de acumulação primitiva, que, segundo Marx (1985), ocorreu por meio de  
espoliações e expropriações das riquezas no novo mundo, dominadas, fundamentais para  
colocar a Europa no topo das relações capitalistas de produção e reprodução social. Com a  
chegada dos colonizadores portugueses em Angola, em 1482, e no Brasil, em 1500, os povos  
originários foram profundamente afetados pela imposição de um modelo social, econômico,  
político e cultural europeu, um processo de dominação e opressão, material e imaterial.  
Como observa Keita (2009), o continente africano já vivia um movimento de  
crescimento, expresso em suas estruturas político-econômicas e socioculturais, antes da  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 157-179, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Formação das sociedades angolana e brasileira: dominação e resistências dos povos originários  
chegada dos europeus. No entanto, a partir do Século XVI, essa evolução foi abruptamente  
interrompida com o início do tráfico de pessoas.  
Esse processo de subordinação, segundo Falola (2020), não foi limitado a uma única  
região do continente, mas afetou praticamente toda África e os seus povos. Falola (2020, p. 93)  
afirma que “o tráfico de escravos foi um ataque contínuo à dignidade e ao desenvolvimento da  
África. O continente foi vítima da violência e da pilhagem”, o que reflete a marginalização  
histórica da África, um processo que, como ele coloca, “afeta a imagem do continente até os  
dias de hoje”. A brutalidade do tráfico de escravos, especialmente no contexto da África  
Ocidental e Central, interrompeu seu desenvolvimento, com as populações locais sendo  
despojadas de uma parte significativa de sua força de trabalho jovem e vital.  
Em Angola, a violência contra os povos originários manifestou-se tanto de forma  
física, por meio de massacres e deslocamentos forçados, quanto cultural, através da tentativa de  
destruição de suas línguas, crenças e tradições. Nesta sequência, Menezes (2000, p. 114-115)  
considera que,  
A Região de Angola, “descoberta” em 1482, com a chegada de Diogo Cão  
na foz do do Rio Congo, passou a ser explorada no início do Século XVI,  
especialmente após a fundação da cidade de Luanda, em 1576, marcando a  
consolidação da presença portuguesa na área e a sistematização da captura de  
mão-de-obra escrava com propósitos comerciais.  
167  
Esse processo brutal de subordinação não se limitou às fronteiras de Angola, como  
descrito anteriormente, mas se estendeu a outros países da África. Desse modo, Falola (2020,  
p. 95) afirma que “o colonialismo foi implacável, trágico e brutal”, com “as conquistas coloniais  
implicando subordinação e perda de soberania” sobre os nativos, o que reflete diretamente as  
consequências da imposição de uma ordem colonial que subjugou os povos africanos por  
aproximadamente cinco séculos.  
A violência, segundo Fanon (2022, p. 14), “[...] é uma besta bifronte. Ela é fundante  
e mantenedora do mundo binariamente cindido entre as zonas do ser e do não ser. Da mesma  
forma, é força e linguagem descolonizadoras, ruptura histórica, reabilitadora do  
reconhecimento e da comunicação entre os colonizadores [...]”'. Esse conceito é essencial para  
entender como, paradoxalmente, a violência, embora inicialmente usada pelos colonizadores  
para subjugar e desumanizar os povos colonizados, também se transforma em um instrumento  
de resistência e emancipação, permitindo a ruptura com a ordem colonial e a reconstrução  
identitária dos sujeitos oprimidos.  
Embora não existam estimativas precisas sobre o número de escravos provenientes de  
Angola, milhões foram traficados, principalmente por Luanda e Benguela, para diversas  
Boás dos Santos; Edna Maria Goulart Joazeiro  
regiões, incluindo as colônias portuguesas e espanholas na América, a América do Norte, a  
Oceania e a Europa, onde a mão de obra escravizada era amplamente utilizada.  
O controle colonial português sobre Angola foi exercido de maneira sistemática e  
brutal. O regime colonial português, especialmente a partir do governo de Salazar, iniciado em  
1933 e finalizado em 1974 com a Revolução dos Cravos, consolidou uma estrutura autoritária,  
na qual a repressão a qualquer tentativa de resistência tornou-se a norma (Hernandez, 2008). O  
tráfico de escravos foi uma das principais fontes de riqueza para a coroa portuguesa, com  
milhões de africanos sendo forçados a atravessar o Atlântico para as Américas. Este tráfico teve  
implicações globais, alimentando uma rede de exploração que atingia os continentes africano,  
americano e europeu, estabelecendo uma dinâmica desigual de poder que perduraria por  
séculos.  
No entendimento de Kobayashi (2021), o tráfico de escravos atingiu seu auge no  
Século XVIII, quando aproximadamente 6,4 milhões de pessoas foram capturadas na África  
Atlântica. A maioria delas foi transportada para o Brasil, por meio do domínio de Portugal no  
Atlântico Sul, como pode ser conferido na Tabela 1.  
Tabela 1: Volume de pessoas traficadas ao longo dos séculos.  
Período histórico  
650-800  
Número de vítimas  
150.000  
Média anual  
1.000  
168  
800-900  
300.000  
3.000  
900-1100  
1.740.000  
1.650.000  
430.000  
8.700  
1100-1400  
1400-1500  
1500-1600  
5.500  
4.300  
550.000  
5.500  
Fonte: Keita (2009, p. 296).  
Esses números assustadores revelam o impacto devastador do tráfico transatlântico  
sobre as sociedades africanas, interrompendo seu crescimento e desenvolvimento ao retirar  
das comunidades uma grande parte de sua juventude e força de trabalho, privando-as da chance  
de se desenvolver plenamente. Esse movimento forçado de pessoas, especialmente de jovens,  
mulheres e crianças, afetou não apenas o desenvolvimento econômico, mas também o  
fortalecimento cultural e social das comunidades africanas, com ênfase na angolana.  
A violência e a exploração também marcaram a experiência Colonial no Brasil, onde  
a condição dos indígenas, embora oficialmente reconhecida, foi pouco respeitada. O Estado  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 157-179, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Formação das sociedades angolana e brasileira: dominação e resistências dos povos originários  
português, por meio do Regimento de 1549, tentava estabelecer um tratamento respeitoso para  
com os indígenas, mas, na prática, a subordinação prevalecia.  
O processo de subordinação também se estendeu à independência do Brasil, que se  
diferenciou da experiência de outros países latino-americanos. Enquanto em diversas nações  
da América Latina espanhola a independência ocorreu por meio de intensos combates militares  
e com forte participação popular, no Brasil ela foi resultado de um acordo entre as elites no  
poder, excluindo o protagonismo popular e utilizando a coerção estatal. Além disso, o Brasil  
preservou sua estrutura econômica baseada nos latifúndios monocultores de exportação e na  
exploração do trabalho escravo, sendo o último país a abolir a escravidão nas Américas. Esse  
contexto deixou marcas profundas na formação econômico-social do país, tanto em relação ao  
racismo estrutural quanto às desigualdades de classe e raça, além da violência estatal contra  
as camadas mais pobres (Castelo; Ribeiro; Rocamora, 2020).  
No entendimento de Gomes (2012), embora o Estado português tenha se preocupado,  
em algum momento, com o tratamento dos indígenas, suas políticas estavam voltadas para a  
exploração, essencial para viabilizar a expansão econômica. Dessa forma, a dinâmica colonial  
era de dominação, onde os povos originários eram vistos como obstáculos à expansão territorial  
e frequentemente considerados seres inferiores, necessitando ser assimilados ao modelo  
europeu.  
169  
Em ambos os casos, o processo colonial foi acompanhado de uma redefinição das  
relações de poder, com os colonizadores estabelecendo um sistema hierárquico que subjugava  
as populações originárias a um status inferior, com pouca ou nenhuma autonomia. Essa  
subordinação dos povos originários às novas estruturas de poder estabelecidas pelos  
colonizadores se refletiu nas questões de terra e propriedade, fundamentais para a organização  
das sociedades coloniais.  
Neste contexto, Silva (2018, p. 483) entende que “o processo de apropriação de terras  
pelos colonizadores e a subsequente implementação dessas políticas pelo Estado brasileiro teve  
um impacto devastador, não só sobre as populações indígenas, mas também sobre a estrutura  
social do país”.  
No Brasil, o processo de colonização esteve intrinsecamente ligado à acumulação  
primitiva mercantilista, que criou as condições materiais para o processo de acumulação  
industrial e, portanto, está relacionado ao nascente capitalismo europeu. As matérias-primas  
expropriadas incluíam a cana-de-açúcar e a exploração das minas de ouro. As terras comuns  
dos povos originários foram expropriadas, divididas em capitanias e desbravadas pelos  
bandeirantes. Essa concentração fundiária favoreceu a formação de uma estrutura agrária  
Boás dos Santos; Edna Maria Goulart Joazeiro  
desigual, resultando na marginalização dos povos originários, cujas terras foram tomadas sem  
qualquer compensação. A consequência direta foi a construção de uma hierarquia social  
profundamente marcada pela etnia, um reflexo das relações de exploração e subordinação que  
perduraram ao longo dos séculos.  
De maneira similar, em Angola, a expropriação das terras e a exploração de recursos  
naturais como petróleo e diamantes impuseram devastadoras consequências para as  
comunidades locais. Muitas dessas populações foram submetidas a formas de trabalho forçado  
e brutalmente reprimidas pelas autoridades coloniais. A colonização portuguesa em Angola  
também se caracterizou pela imposição de um sistema de exploração para atender às  
necessidades do capitalismo nascente na Europa, o que gerou profundas desigualdades e a  
subordinação das populações nativas, sendo esse processo acompanhado por uma repressão  
violenta.  
O impacto da colonização em Angola não se restringiu à colônia. O regime colonial,  
conforme destacado por Menezes (2000), foi intensificado com a liderança de Salazar, que  
consolidou o aparelho repressivo do Estado, criando a polícia política secreta PIDE e  
proibindo manifestações políticas, permitindo apenas um partido de caráter fascista. No Brasil,  
a independência não significou uma ruptura com a estrutura de dominação europeia, dando  
origem a relações capitalistas locais dependentes destes países centrais, seja no modelo  
agrário-exportador, ou da industrialização por substituição de importações.  
170  
Segundo Moura (2020), a miscigenação no Brasil, embora tenha dimensões biológicas,  
não resultou em uma democracia racial. Ela esteve subordinada a uma estrutura de subordinação  
sociopolítica que impediu o acesso de grande parte da população a espaços sociais que  
conferissem status econômico ou prestígio, perpetuando as desigualdades sociais, agora de  
classe e de raça/etnia, com maiores consequências negativas para as mulheres pobres, negras e  
da classe trabalhadora.  
Esses mecanismos de seleção étnica compulsórios, que reproduziam as desigualdades  
estruturais do período colonial, são a base das dinâmicas de marginalização racial que persistem  
até os dias de hoje. O desejo de ascensão social e de aproximação ao modelo imposto pelos  
colonizadores, embora muitas vezes negado, ilustra como a cultura e os valores da metrópole  
se impõem sobre as populações colonizadas.  
No contexto brasileiro, esse processo de subordinação também foi evidenciado nas  
políticas de integração forçada dos povos indígenas ao novo projeto nacional. Após a  
independência, figuras como José Bonifácio de Andrade e Silva tentaram encontrar um lugar  
para os indígenas no Brasil, mas a verdadeira aceitação de suas culturas nunca ocorreu. Como  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 157-179, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Formação das sociedades angolana e brasileira: dominação e resistências dos povos originários  
salientado por Gomes (2012), a tentativa de integrar os indígenas foi marcada por uma  
ambiguidade histórica, onde “hoje amigos, amanhã inimigos”. A abordagem do Estado nunca  
foi genuína em relação à valorização da cultura indígena.  
A integração dos povos indígenas ao Estado nacional brasileiro foi, portanto, uma  
tentativa de assimilação forçada, que desconsiderou as identidades e culturas desses povos, as  
quais haviam sido marginalizadas desde a chegada dos portugueses. O processo de integração  
não levou em conta a diversidade cultural e formas de organização social dos povos indígenas,  
tratando-os como elementos a serem absorvidos e adaptados ao modelo europeu, sem respeito  
por sua autonomia ou por suas tradições. Essa ambiguidade também se estendeu ao contexto  
angolano, onde movimentos anticolonialistas começaram a emergir no Século XX.  
A luta pela independência em Angola teve início com a formação de movimentos de  
libertação. Em 1954, surgiu a União dos Povos de Angola (UPA), liderada por Holden Roberto,  
que posteriormente se transformaria na Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA). Em  
1956, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), com figuras como Agostinho  
Neto, Mário Pinto de Andrade e Viriato da Cruz, passou a defender a independência com uma  
ideologia marxista. A partir de 1966, a União Nacional para a Independência Total de Angola  
(UNITA), liderada por Jonas Malheiro Savimbi, emergiu como um novo movimento de  
resistência.  
171  
Neste período, alguns estudantes das colônias portuguesas, como Amílcar Cabral,  
Eduardo Mondlane, Agostinho Neto, Marcelino dos Santos, Noémio de Souza, Viriato da Cruz,  
António Jacinto, Mário de Andrade, Alda Espírito Santo, António Pimentel Domingues,  
Guilherme Espírito Santo, Francisco Tenreiro, entre outros, formaram-se, tornaram-se  
profissionais nos anos 50 e voltaram a seus países impregnados de ideias libertadoras. Esses  
líderes, ao retornar à sua terra natal, trouxeram consigo não apenas um conhecimento teórico  
adquirido em seus estudos, mas também uma visão mais crítica sobre a opressão colonial  
Menezes (2000).  
A formação acadêmica adquirida nas universidades europeias e a experiência vivida  
nas metrópoles, muitas vezes com dificuldades e discriminação, ajudaram a consolidar um  
pensamento político e revolucionário que reverberaria na luta pela liberdade e  
autodeterminação dos povos africanos. Esses elementos formaram a base do pensamento  
anticolonialista que marcaria as décadas seguintes da história de Angola e de outros países  
africanos que buscavam se libertar do domínio europeu.  
Além disso, o impacto do tráfico de escravos, que atravessou as fronteiras dos impérios  
coloniais portugueses e espanhóis, exerceu um papel fundamental na formação das sociedades  
Boás dos Santos; Edna Maria Goulart Joazeiro  
brasileiras e angolanas. A diáspora africana, impulsionada pelo tráfico de escravos, deixou  
marcas em ambas as sociedades. No Brasil, a presença de milhões de africanos escravizados e  
seus descendentes configurou a formação da população, gerando uma sociedade marcada pela  
desigualdade racial e pela marginalização dos negros de processos decisórios e políticos.  
O legado dessa marginalização racial e social é um reflexo da estrutura de dominação  
colonial, que favorecia as elites brancas em detrimento dos povos africanos e indígenas. Como  
afirma Pankararu (2022, p. 187), “a condição colonial da realidade brasileira e a função  
econômica da escravidão contribuíram para a reprodução social e histórica do racismo e da  
condição de subalternidade imposta aos povos indígenas no contexto contemporâneo [...]”.  
Portanto, o legado da colonização no Brasil e em Angola reflete um processo violento  
de exploração e dominação, cujas consequências ainda são sentidas até hoje. A tentativa de  
integrar os povos originários e reconhecer suas culturas foi sempre um esforço subordinado,  
caracterizado por uma marginalização contínua, que continua a moldar as relações sociais e  
políticas nesses países.  
No entanto, como as mulheres, frequentemente marginalizadas, desempenharam  
papéis de resistência cultural durante e após o período colonial? De que maneira suas ações  
contribuíram para a ressignificação e preservação das identidades culturais, apesar das  
estruturas opressivas impostas? Essas questões são essenciais para compreender o papel  
central da mulher na resistência e transformação cultural em contextos de dominação.  
172  
“Não há dominação sem resistências”: o papel da mulher na ressignificação  
cultural durante e após a colonização  
A resistência cultural dos povos originários à colonização, com especial destaque para  
as mulheres, representa um fenômeno multifacetado que transita por aspectos de sobrevivência,  
adaptação, e ressignificação identitária. No contexto da colonização portuguesa, tanto no Brasil  
quanto em Angola, as políticas de extermínio cultural, social e até físico dos povos originários  
visavam a imposição de uma ordem colonial que negava, marginalizava e destruía as culturas  
autênticas dessas populações.  
No entanto, as formas de resistência manifestadas por esses povos, especialmente por  
suas mulheres, contribuíram para a preservação de identidades culturais e formas de  
organização social, cujas ressonâncias podem ser observadas até os dias atuais. A dinâmica de  
resistência cultural que permeou o colonialismo reflete, assim, não apenas um processo de  
subversão das estruturas coloniais, mas também um esforço contínuo de reinvenção das  
tradições.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 157-179, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Formação das sociedades angolana e brasileira: dominação e resistências dos povos originários  
No Brasil, a resistência indígena à colonização reflete um movimento que se estendeu  
ao longo dos séculos e se intensificou com o tempo, como bem descreve Gomes (2012), que  
sublinha o crescimento, nas últimas três décadas, de várias etnias indígenas que há muito tempo  
eram consideradas à beira da extinção. Estes povos, como os Guarini, Terena, Guajajara,  
Karajá, entre outros, passaram por transformações profundas, não apenas pela imposição de um  
novo sistema político e econômico, mas também pela necessidade de se adaptar e sobreviver à  
violência do processo colonial.  
A resistência a essa imposição cultural não foi apenas uma resposta a uma forma de  
dominação externa, mas também uma reapropriação dos próprios valores, práticas e  
identidades. Através de um processo de negação e reinterpretação das imposições coloniais,  
esses povos conseguiram preservar, em muitos aspectos, sua organização social, seus costumes,  
suas línguas e seus saberes tradicionais.  
A relevância do papel feminino nesse processo de resistência é fundamental. As  
mulheres indígenas, sobretudo no contexto brasileiro, apesar de historicamente estarem  
inseridas em uma estrutura patriarcal que limitava o seu papel social, têm sido as principais  
agentes de transmissão cultural. Elas não só asseguraram a continuidade da memória histórica  
das suas comunidades, mas também desempenharam um papel ativo na preservação de práticas  
de subsistência e na luta pela autonomia territorial. Isso é ainda mais claro quando se observa  
que, com a intensificação da luta pela demarcação de terras indígenas, as mulheres, muitas  
vezes à frente dos processos de mobilização local, se tornaram figuras centrais nas lutas por  
justiça e reconhecimento.  
173  
As comunidades indígenas têm resistido não apenas contra a destruição física de suas  
terras, mas também contra a imposição de um sistema educacional que não considera suas  
particularidades culturais, o que tem levado muitas dessas mulheres a se envolverem na luta  
por uma educação intercultural que respeite seus modos de vida, suas crenças e sua cosmologia  
(Amaral, 2020).  
Em Angola, como sublinhamos nas seções anteriores, o colonialismo português  
resultou em uma negação sistemática das identidades culturais angolanas, forjando um processo  
de destruição das formas de organização social tradicionais. Como destaca Samba (2014), o  
impacto socioeconômico da colonização em Angola foi devastador, levando ao êxodo rural,  
desagregação familiar e perda de valores culturais fundamentais. No entanto, a sociedade  
angolana, mesmo diante dessas condições adversas, conseguiu resistir e evoluir.  
As mulheres angolanas desempenharam um papel essencial na preservação das  
tradições orais, na manutenção de saberes ancestrais e na reapropriação dos valores culturais,  
Boás dos Santos; Edna Maria Goulart Joazeiro  
especialmente em um contexto de resistência ao colonialismo. A educação formal imposta  
pelo colonizador refletia a subordinação cultural, mas a resistência das mulheres,  
principalmente no espaço privado e na vida comunitária, foi fundamental para a sobrevivência  
dos valores africanos (bantu) nas práticas sociais, religiosas, musicais e de dança. No entanto,  
apesar de alguns avanços, diversos desafios persistem, especialmente em realidades em que o  
papel feminino continua restrito ao âmbito doméstico.  
Esse fenômeno é visível no contexto angolano, desde o período pré-colonial até os  
dias atuais, especialmente em algumas comunidades rurais. Como destaca Samba (2014, p.  
41), “cabe às mulheres o trabalho no campo e no lar”, enquanto aos homens são atribuídas  
responsabilidades que garantem maior autonomia, como a caça e a pesca. A desigualdade de  
gênero também se reflete na educação, onde, nas zonas rurais, prevalece a ideia de que os  
meninos têm mais direito à escolarização do que as meninas.  
Samba (2014) observa que, no contexto escolar angolano, especialmente nas  
províncias do interior e nas zonas rurais, há uma escassez de meninas na escola. Isso ocorre  
porque, nessas localidades, os pais preferem que as filhas se dediquem às tarefas domésticas  
e ao cuidado dos irmãos mais novos, em vez de frequentarem a escola. Nesse contexto, a  
escola tende a ser mais acessível aos meninos, pois os pais consideram que as meninas são  
mais úteis dentro do espaço doméstico.  
174  
Falola (2020, p. 367) também reforça a ideia de uma estrutura familiar patriarcal  
enraizada nas sociedades africanas, afirmando que “no interior das famílias, ainda que os  
papéis de gênero sejam complementares, os homens são considerados os chefes da família,  
enquanto a importância da mulher será associada ao seu papel de mãe e esposa.” Essa  
perspectiva revela a continuidade das desigualdades de gênero que limitam as oportunidades  
das mulheres, afetando diretamente sua educação e autonomia, uma realidade ainda observada  
em muitas regiões de Angola.  
Em Angola, embora 75% das meninas frequentem a escola primária, essa proporção  
diminui drasticamente para apenas 15,5% no Ensino Secundário, coincidente com a fase da  
adolescência. Além disso, apesar de o país seguir diversos instrumentos internacionais,  
regionais e nacionais relacionados à promoção e proteção dos direitos das mulheres, as taxas  
de casamento precoce e gravidez na adolescência continuam elevadas. Cerca de 30% das  
meninas em Angola são casadas antes de completarem 18 anos, e 8% delas são casadas antes  
dos 15 anos (UNFPA, 2022).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 157-179, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Formação das sociedades angolana e brasileira: dominação e resistências dos povos originários  
Dados do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA, 2020) indicam que as  
adolescentes que engravidam em Angola são, na sua maioria, aquelas com baixos níveis de  
escolaridade, que vivem em contextos de pobreza e residem em zonas rurais e Peri urbanas. Em  
relação à Saúde e aos Direitos Sexuais e Reprodutivos (SDSR), Angola apresenta uma das taxas  
de fecundidade mais altas do mundo, com uma média de 6,2 filhos por mulher. Além disso, um  
terço das meninas têm filhos antes dos 18 anos. Esta situação é consequência do acesso limitado  
aos serviços de saúde sexual e reprodutiva, devido algumas normas sociais e culturais que  
restringem a autonomia das mulheres sobre seus próprios corpos. O tempo de espera nos centros  
de saúde, a qualidade insuficiente dos serviços e o estigma relacionado ao uso dos serviços de  
saúde sexual também são fatores que dificultam o acesso a esses cuidados (Pena; Teixeira,  
2022).  
É importante observar que Angola possui uma das populações mais jovens do mundo,  
com mais de dois terços da população abaixo dos 25 anos (UNFPA, 2022). Isso significa que,  
para o desenvolvimento futuro do país, é fundamental enfrentar esses desafios estruturais que  
limitam as oportunidades educacionais e reprodutivas das mulheres, a fim de garantir um futuro  
mais equitativo para todos os cidadãos.  
Dando sequência, um aspecto notável da resistência cultural feminina em Angola de  
acordo ao contexto histórico, se relaciona diretamente com o movimento de mulheres que se  
opuseram à hegemonia colonial através de movimentos messiânicos e religiosos. O  
messianismo, representado por figuras como Simon Kimbangu e Simão Gonçalves Toco,  
propôs não apenas uma resistência religiosa, mas também uma alternativa à educação e aos  
valores impostos pelos colonizadores (Hernandez, 2008).  
175  
A Igreja Tocoista, por exemplo, liderada por Simão Toco, rejeitava as interpretações  
do cristianismo colonial e resgatava as tradições africanas, transformando a religião em um  
veículo para a luta contra a opressão e pela autonomia cultural. Toco, ao contrário das religiões  
imposta pelo império colonial, defendia uma educação que resgatasse os valores africanos e  
promovesse a unidade dos povos negros contra a opressão. A Igreja Tocoista não se limitava  
ao âmbito religioso, mas tinha um caráter político de resistência cultural, tornando-se um dos  
principais espaços de organização política, social e educacional, sendo também um espaço  
importante para a mobilização feminina. As mulheres em Angola, assim, não só se tornaram  
agentes de resistência cultural, mas também se posicionaram como líderes espirituais, sociais e  
políticas.  
A resistência educacional em Angola foi um reflexo do Movimento Nacional de  
Emancipação, que também passava pela luta pelo direito à educação. Como nos diz Hernandez  
Boás dos Santos; Edna Maria Goulart Joazeiro  
(2008), as associações políticas e estudantis, como a Liga Angolana (1912) e o Grêmio Africano  
(1913), desempenharam um papel crucial na luta por uma educação que não apenas se opusesse  
ao modelo colonial, mas que refletisse as necessidades e especificidades culturais angolanas.  
Essas associações foram, em muitos casos, formadas por intelectuais e líderes comunitários que  
viam na educação uma ferramenta essencial para a luta pela independência e pela construção  
de um Estado autônomo e culturalmente afirmativo. Dentro dessa resistência educacional, as  
mulheres emergiram não apenas como defensoras da educação, mas também como pensadoras  
e organizadoras de espaços alternativos de ensino que permitissem a preservação das tradições  
e o fortalecimento da identidade nacional.  
O Movimento de Resistência à Educação Colonial se reflete também nas questões de  
gênero, com as mulheres assumindo um papel central na luta contra a alienação cultural imposta  
pelos colonizadores. Campos (2022) aponta que as mulheres indígenas, ao se envolverem com  
essas lutas de resistência, não estavam apenas lutando por sua sobrevivência, mas também pela  
reapropriação dos espaços de poder, conhecimento e cultura que haviam sido sequestrados pelas  
potências coloniais.  
A luta pela educação, no contexto da resistência cultural, se entrelaça com a busca pela  
emancipação das mulheres, pela garantia de seus direitos civis e pela reafirmação de suas  
identidades culturais, tanto em Angola quanto no Brasil.  
176  
Esse processo de ressignificação cultural, liderado também por mulheres, representa  
uma forma de resistência à colonialidade que vai além da simples preservação de práticas  
culturais. Ele reflete uma reapropriação ativa do conhecimento e dos espaços sociais,  
desafiando a estrutura de poder imposta pelos colonizadores e criando novos modelos de  
educação, organização social e identidade. A resistência das mulheres indígenas e angolanas à  
colonização é, portanto, uma luta pela autonomia, não apenas sobre suas terras, mas também  
sobre seus corpos, suas famílias, suas identidades e seus destinos.  
Em suma, a resistência cultural dos povos originários, com destaque para as mulheres  
de ambas as sociedades, durante e após o período colonial reflete um dos aspectos mais  
profundos das histórias de sobrevivência e reapropriação cultural desses povos. As mulheres  
não se limitaram ao papel de vítimas, mas se tornaram agentes ativas de resistência, sendo  
fundamentais na preservação das culturas, na criação de alternativas educacionais e na  
afirmação de suas identidades. Esta resistência, contudo, ainda enfrenta desafios na atualidade,  
como a persistente desigualdade de gênero, o acesso restrito à educação e aos direitos sexuais  
e reprodutivos, além da violência doméstica e o casamento precoce. Apesar dessas  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 157-179, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Formação das sociedades angolana e brasileira: dominação e resistências dos povos originários  
adversidades, elas continuam a ser líderes nas lutas pela demarcação de territórios, pelo direito  
à educação e pela afirmação das culturas que o colonialismo procurou destruir.  
Considerações finais  
As contribuições dos povos originários para a formação das sociedades angolana e  
brasileira são essenciais para compreender a constituição das identidades culturais e sociais  
desses países. Embora a colonização tenha imposto rupturas significativas, as resistências  
dessas comunidades, especialmente das mulheres, foram determinantes para a preservação das  
suas culturas e identidades. As mulheres desempenharam um papel central nesse processo,  
sendo responsáveis por manter e transmitir saberes tradicionais, muitas vezes adaptando suas  
práticas culturais frente às imposições coloniais. Esse fenômeno, mais do que um fato simples,  
deve ser reconhecido como uma força ativa na preservação e reinvenção das culturas dos  
povos originários.  
No Brasil, a colonização resultou em rupturas nas relações dos povos originários com  
a terra, mas a luta pela demarcação de terras e a valorização de suas formas tradicionais de  
educação continuam sendo instrumentos de resistência e afirmação da identidade indígena. A  
educação, voltada para a transmissão de saberes ancestrais e para o vínculo com a natureza,  
reflete uma resistência contínua ao modelo educacional imposto, reforçando a importância do  
reconhecimento das especificidades culturais.  
177  
Em Angola, a colonização portuguesa também visou a imposição da língua e da  
religião, mas os povos bantu, especialmente as mulheres, preservaram suas práticas culturais  
e educacionais. Elas foram responsáveis por adaptar e manter os saberes tradicionais,  
funcionando como guardiãs da memória coletiva. A educação tradicional, que se baseava na  
transmissão oral e no aprendizado através da convivência com a comunidade e a natureza, foi  
crucial para a preservação das identidades culturais.  
O papel das mulheres foi determinante não só para a preservação das culturas, mas  
também para a promoção da autonomia e da luta pelos direitos territoriais. Elas foram figuras-  
chave na resistência contra a aculturação e na construção de alternativas educacionais que  
respeitassem as identidades próprias dos povos originários.  
Portanto, as resistências dos povos originários e, em particular, das mulheres, foram  
centrais para a (re)configuração e promoção das culturas, bem como para a construção das  
identidades nacionais. A valorização dessas contribuições exige o reconhecimento dos direitos  
territoriais dos povos originários e a implementação de políticas educacionais que respeitem  
suas tradições e modos de vida.  
Boás dos Santos; Edna Maria Goulart Joazeiro  
O estudo evidencia, assim, a importância das práticas culturais tradicionais na  
construção das identidades nacionais e a necessidade de políticas públicas que garantam os  
direitos territoriais e culturais desses povos. As lutas travadas no passado continuam a ser um  
fundamento para a construção de um futuro mais justo e culturalmente diverso, tanto em  
Angola como no Brasil.  
Referências bibliográficas  
ALTUNA, Raul Ruiz de Asúa. Cultura Tradicional Bantu. Lisboa: Paulinas, 2006.  
AMARAL, Wagner Roberto do.; BILAR, Jenifer Araújo Barroso. A questão indígena no  
Serviço Social: um debate necessário na profissão. Revista em Pauta, Rio de Janeiro, 2º  
Sem. 2020 n. 46, v. 18, p. 180-195.  
CASTELO, Rodrigo; RIBEIRO, Vinicius, ROCAMORA, Guilherme de. Capitalismo  
dependente e as origens da “questão social” no Rio de Janeiro. Serv. Soc. Soc., São Paulo,  
n. 137, p. 15-34, jan./abr. 2020.  
FALOLA, Toyin. O poder das culturas africanas. Tradução de Beatriz Silveira Castro  
Filgueiras. Petrópolis, RJ: Vozes, 2020.  
FANON, Frantz. Os condenados da terra. Tradução de Ligia Fonseca Ferreira e Regina  
Salgado Campos. Rio de Janeiro: Zahar, 2022.  
FANON, Frantz. Pele negra, máscaras brancas. Tradução de Sebastião Nascimento e  
colaboração de Raquel Camargo e Regina Salgado Campos. São Paulo: Ubu, 2020.  
GOMES, Mércio Pereira. Os índios e o Brasil: passado, presente e futuro. São Paulo: Contexto,  
2012.  
HERNANDEZ, Leila Leite. A África na Sala de Aula: visita à história contemporânea. 2ª ed.  
São Paulo Selo Negro, 2008.  
178  
KEITA, Boubakar. História da África Negra. São Paulo: Texto Editores, 2009.  
KOBAYASHI, Kazuo. Tecendo redes imperiais: uma dimensão asiática do comércio britânico  
de escravos no Atlântico no século XVIII. Afro-Ásia, n. 63, p. 11-39, 2021.  
MARX, Karl. O capital: crítica da economia. Tradução de Regis Barbosa e Flávio R. Kothe. 2.  
ed. São Paulo: Nova Cultura, 1985.  
MENEZES, Solival. Mamma Angola: Sociedade e economia de um país nascente. São Paulo:  
Fapesp, 2000.  
MOURA, Clóvis. Racismo e luta de classes no Brasil textos escolhidos de Clóvis Moura.  
Editora Terra sem Amos: Brasil, 2020.  
NETO, Tereseja José Adelina da Silva. Contribuição a história da educação e cultura de  
Angola: Grupos nativos, colonização e a independência. Tese (doutorado) Universidade  
Estadual de Campinas, Faculdade de Educação. Campinas, São Paulo, 2004.  
NEVES, Tony. Angola: Justiça e Paz nas Intervenções da Igreja Católica (1989-2002).  
Córdova: Texto Editores, 2012.  
PANKARARU, Elizângela Cardoso de Araújo Silva. Trabalho, expropriação, povos indígenas  
no Brasil e a lógica do capital. Revista Temporalis, Brasília (DF), n. 43, p. 174-179,  
jan./jun.2022.  
PENA, A. P.; TEIXEIRA, M. Diagnóstico Igualdade de Género Angola 2022: facilidade de  
diálogo UE. Angola. Luanda, 2022.  
SAMBA, Simão João. Adolescência em Situação de Risco e Educação Social em Luanda.  
Jundial: Paco Editorial, 2014.  
SANTOS, Milton. O dinheiro e o território. In SANTOS, Milton et al. Território e territórios:  
ensaios sobre o ordenamento territorial. Rio de Janeiro: DPA, p. 13-22, 2006.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 157-179, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Formação das sociedades angolana e brasileira: dominação e resistências dos povos originários  
SILVA, Elizângela Cardoso de Araújo. Povos indígenas e o direito à terra na realidade  
brasileira. Rerv. Soc. Soc., São Paulo, n. 133, p. 480-500, set./dez. 2018.  
UNFPA. Relatório Anual: resumo de actividades e resultados. Luanda/Angola, 2020.  
UNFPA. Relatório Anual: resumo de actividades e resultados. Luanda/Angola, 2022.  
179