Capitalismo dependente e questão social:  
apontamentos sobre eugenia e serviço social  
Dependent capitalism and the social question:  
notes on eugenics and social work  
Larisse Miranda de Brito*  
Resumo: Vinculado ao pensamento marxista e  
ao materialismo-histórico-dialético, através de  
uma densa pesquisa bibliográfica, este trabalho  
discute a emergência da questão social e do  
serviço no social no contexto do capitalismo  
dependente que surge no Brasil, entre finais do  
século XIX e início do século XX. Para isso,  
historiciza-se o surgimento do trabalho livre, da  
sociedade de classes, das políticas eugênicas no  
país e seus rebatimentos nos primeiros anos de  
emergência e consolidação da questão social e  
do serviço social brasileiro. Os resultados  
apontam que a emersão da questão social no  
país, ocorre no bojo de instituição de políticas  
eugênicas e higienistas que projetavam a  
identidade nacional como desprovida de  
qualquer problema racial. Ao mesmo tempo,  
sinalizam para o impacto da pseudociência  
eugênica na formação e atuação dos primeiros  
profissionais de serviço social, além de apontar  
para a necessária investigação científica em  
torno do tema.  
Abstract: Linked to Marxist thought and  
historical-dialectical materialism, through a  
dense bibliographical research, the emergence  
of the social question and social service in the  
context of dependent capitalism that emerged in  
Brazil between the end of the 19th century and  
the beginning of the 20th century is discussed.  
To this end, the emergence of free labor, class  
society, eugenic policies in the country and their  
repercussions in the first years of emergence  
and consolidation of the social question and  
Brazilian social service are historicized. The  
results indicate that the emergence and  
consolidation of the social question in the  
country occurred in the midst of the  
consolidation of eugenic and hygienist theses  
that projected the national identity as devoid of  
any racial problem. At the same time, they point  
to the impact of eugenic pseudoscience on the  
training and performance of the first social  
service professionals and point to the necessary  
scientific investigation around the subject.  
Palavras-chaves: Capitalismo dependente;  
Keywords: Dependent capitalism; Social issue;  
Questão social; Eugenia; Serviço social.  
Eugenics; Social work.  
* Universidade Federal da Bahia. E-mail: britolarisse@gmail.com  
DOI: 10.34019/1980-8518.2025.v25.47735  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 13/03/2025  
Aprovado em: 09/06/2025  
Capitalismo dependente e questão social: apontamentos sobre eugenia e serviço social  
Introdução  
O pensamento marxiano fundamenta-se a partir da compreensão ontológica do ser  
social, buscando apreender como são produzidas as condições materiais objetivas de existência  
do Ser enquanto sujeito social, que elabora seu próprio devir através da transformação da  
natureza (Lukács, 2012). Para Marx (2023), é o trabalho o principal responsável por essa  
mediação, por isso ele é fundante do ser social. Assim, a apreensão da realidade social requer  
que conheçamos as formas de organização, produção, reprodução e apropriação do trabalho em  
cada sociedade. A realidade, entretanto, não se apresenta tal como ela é, em sua essência, pois,  
no cotidiano, ela irá se apresentar em sua forma aparente, pseudoconcreta. Nesse sentido, a  
apreensão da realidade requer a suspensão do véu das aparências ou a destruição da  
pseudoconcreticidade, a fim de apreender a concretude dos fenômenos sociais como alertou  
Kosik (2017).  
Dessa maneira, o materialismo-histórico-dialético estabelece que o entendimento da  
concretude requer o desvelamento da relação entre essência e aparência. Busca, portanto,  
suspender a pseudoconcreticidade e atingir a realidade concreta das relações sociais. Para isso,  
reconhece a historicidade como uma elaboração humana que se processa em atos singulares,  
contraditórios e heterogêneos de pessoas em suas individualidades e/ou de forma coletivizada,  
que se unificam através do movimento dinâmico e contraditório do real, formando uma  
unicidade dialética (Lukács, 2012). Dessa forma, a totalidade aparece como categoria  
fundamental, pois nos auxilia a entender a unidade dialética formada a partir das  
particularidades históricas (situadas em seus contextos) e, assim, atingir uma compreensão  
universalista da realidade estudada.  
181  
A ideia de universalismo, presente no método marxiano, diverge do universalismo  
proposto pelo iluminismo, pois enquanto o segundo buscou, através de relações dicotômicas  
(racionalista/irracionalista;  
bom/ruim;  
bem/mal;  
evoluído/involuído;  
desenvolvido/subdesenvolvido), estabelecer parâmetros para a experiência social, o primeiro  
tem como perspectiva a compreensão da humanidade como essa matéria orgânica possuidora  
de unicidade que atua para a construção de sua própria história. No método materialista-  
histórico-dialético, a ideia de universalidade reside na compreensão de que a humanidade cria  
a história e sua essência é justamente essa: a elaboração de si mesma através de relações sociais  
que se processam pelas inter-relações de atos heterogêneos, sintetizados através de múltiplos  
complexos que produzem a totalidade (Lukács, 2012).  
A historicidade tem, portanto, caráter desigual uma vez que sociedades diferentes, em  
seus diversos e contraditórios movimentos, produzem condições materiais e objetivas próprias,  
Larisse Miranda de Brito  
particulares. Sob a égide do capital, essas dinâmicas particulares, como complexos singulares  
em relação, produzem a totalidade histórica do capitalismo como sistema forjado por essa  
interdependência global, que possui leis universais como motor de sua existência, a exemplo  
da lei do valor, com destaque para o valor de troca, a exploração, a mais-valia e a alienação  
como processos inerentes e específicos da realização do trabalho no capitalismo (Marx, 2023).  
Trabalho aqui não está sendo tomado em sua dimensão fundante do ser social, como referimos  
acima, mas antes como forma específica de organização própria do sistema capitalista, como  
processo de trabalho particular e inerente a essa sociedade, organizado a partir da divisão  
sociotécnica do trabalho tanto em nível nacional (local, regional) como em nível internacional.  
Nesse caminho, para o entendimento do capitalismo como fenômeno concreto que se  
expande a nível mundial, a partir da modernidade ocidental, é preciso que consigamos  
apreender as processualidades que demarcam relações sociais de produção distintas, conectadas  
com o mercado mundial. Essas processualidades se apresentam como as particularidades da  
história produzida em contextos específicos. Nesse sentido, Marini (2011) nos ajuda a pensar  
como surge, nos países latino-americanos, um tipo de capitalismo sui generis, nomeado por ele  
– acompanhado por Vânia Bambirra (1940-2015) e Theotônio dos Santos (1936-2018) – como  
capitalismo dependente que prescinde de uma análise própria e apropriada, pois não pode ser  
comparado aos modos de desenvolvimento capitalista, observados em países europeus.  
Destarte, propõe que a análise marxista – no contexto latino-americano e, em especial, no caso  
brasileiro – deve ser orientada pela emergência de categorias adequadas às heterogeneidades  
históricas observadas nessas realidades (Marini, 2023).  
182  
Na análise de autores como Marini (2023, 2011), Moura (2014; 2019) e Fernandes  
(2009; 2011), o desenvolvimento do capitalismo - como resultado da expansão comercial  
empreendida pela Europa, no cenário das Grandes Navegações iniciadas entre os séculos XV e  
XVI, com o intuito de aquecer o mercado - foi subsidiado pelo colonialismo empreendido  
contra os povos latino-americanos. Ao favorecer o aumento do fluxo de mercadorias e  
dinamizar as formas de pagamento, a colonização contribuiu para o desenvolvimento  
manufatureiro e a emergência da grande indústria, o que deu origem ao capital internacional e  
à expansão do capital bancário no cenário europeu. Nesse sentido, concordamos com Souza  
(2020), para quem o sistema colonial e o escravismo não resultam da síntese de modos de  
produção preexistentes, como ocorre no cenário europeu. Ao contrário disso, derivam de uma  
ruptura com os modos de organização dos povos colonizados, como algo externo que aliena  
suas formas de produção e reprodução da vida social.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 180-203, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Capitalismo dependente e questão social: apontamentos sobre eugenia e serviço social  
É no contexto da situação colonial, quando os europeus estabelecem o domínio colonial  
(Fernandes, 2009) sobre os povos originários e africanos – através da expropriação e exploração  
das terras, mas também da apropriação, exploração e objetificação de seus corpos e imposição  
de suas formas socioculturais e políticas contra “os jeitos de ser e conviver” desses povos –,  
que são forjadas as bases para a inserção “dependente” dos países latino-americanos no  
processo de consolidação da divisão internacional do trabalho.  
Assim, para atingirmos o objetivo deste trabalho – compreender o capitalismo  
dependente e a emergência da questão social e do serviço social no contexto de surgimento e  
consolidação da política eugênica no Brasil –, faremos uma breve incursão acerca do  
capitalismo dependente latino-americano. A partir de então, buscaremos debater as  
particularidades da situação de dependência no capitalismo brasileiro, o surgimento da eugenia  
e do higienismo como política estatal que consolida uma sociabilidade capitalista pautada no  
racismo e seus impactos para o surgimento da questão social e do serviço social no contexto  
nacional. Percorrido esse caminho, apontaremos, de modo breve, as transformações recentes  
no bojo da profissão e os desafios no que tange ao entendimento das conexões entre eugenia,  
questão social e serviço social. Por último, realizaremos breves apontamentos conclusivos  
acerca do tema proposto.  
No que se refere aos aspectos metodológicos, o estudo apresentado foi realizado a partir  
de uma densa revisão bibliográfica. No primeiro momento, elegemos obras de autores  
vinculados ao método marxista, mais especificamente à teoria da dependência com foco na  
realidade brasileira. Em seguida, concentramo-nos na análise de obras marxistas que  
trouxessem, como foco de análise, a questão étnico-racial como marcador do surgimento e  
expansão do capitalismo latino-americano e nacional. Para a escolha das referências na área do  
serviço social, optamos por utilizar pesquisadores reconhecidos pelo desenvolvimento de  
estudos que vinculassem questão social, questão étnico-racial e eugenia como marcadores  
importantes para o surgimento do serviço social no contexto das relações sociais capitalistas no  
país. A análise foi empreendida a partir do estabelecimento de contraste entre as obras e autores  
escolhidos, percebendo suas aproximações e distanciamentos para produzirmos sínteses  
apropriadas em nosso estudo. Esse processo nos levou a eleger os autores e obras mencionadas  
ao longo do texto.  
183  
Colonialismo e capitalismo dependente na América Latina  
De acordo com Marini (2011), muito embora seja no bojo do colonialismo, através da  
transferência de metais preciosos e gêneros exóticos, que são estabelecidas as bases da dinâmica  
Larisse Miranda de Brito  
da dependência, não se pode confundir a situação colonial com a situação de dependência. Para  
ele, embora a empreitada colonizadora tenha possibilitado a acumulação primitiva de capital  
no contexto europeu, a emergência da indústria manufatureira e a expansão do capital comercial  
e bancário – bases para o nascente capitalismo mercantil – na situação de dependência, cujo  
surgimento ocorre a partir do início do século XIX, no contexto de independência das antigas  
colônias, os países latino-americanos passam a figurar no mercado internacional como  
exportadores de matérias-primas (de origem agrícola, pecuária, mineral, ambiental) para a  
grande indústria surgida a partir da revolução industrial.  
A diferença à qual o autor se refere, pode ser compreendida a partir das formas de  
dominação exercidas pelos países envolvidos com a empreitada colonizadora e o continuum  
desse poder no período de desagregação do poder colonial. Desse modo, Fernandes (2009)  
esclarece que, no contexto do colonialismo, operou o tipo de dominação colonial,  
caracterizado pela apropriação da terra, do povo negro e indígena como mercadorias e  
meios de produção em benefício dos colonizadores e do fornecimento/transferência de  
alimentos e metais preciosos por parte das colônias para as metrópoles; no processo de  
desagregação do sistema colonial, opera a dominação neocolonial/pós-colonial estabelecida  
pelo neocolonialismo (ou seja, a reatualização das posições de poder colonial) como forma de  
controle de mercado e processos econômicos estabelecidos pelo capitalismo central. Nesse  
cenário, os países latino-americanos passam a ser fornecedores de matérias-primas que  
subsidiaram o desenvolvimento tecnológico, resultante nas diferentes fases da Revolução  
Industrial europeia. Esse tipo de dominação fornece as bases para a reorganização do sistema  
mundial que forjou uma nova forma de dominação, nomeada pelo autor como dominação  
imperialista que caracteriza o surgimento do capitalismo dependente o qual, no contexto  
latino-americano, associa-se à desintegração do escravismo, ao surgimento do trabalho livre e  
da sociedade de classes.  
184  
Para Fernandes (2009), Marini (2011) e Moura (2019), isso se dá em função da própria  
lógica de funcionamento do capitalismo que – para sua expansão a níveis mundiais – no  
processo de divisão internacional do trabalho, relegou às ex-colônias latino-americanas o local  
de fornecedoras de matérias-primas (alimento, metais, etc.), enquanto os países centrais ficaram  
responsáveis pela produção de bens duráveis, mais rentáveis para geração e apropriação de  
lucro. Isso resulta em uma espécie de inserção subordinada dos países latino-americanos no  
mercado mundial e terá rebatimentos específicos nas formas de organização das classes entre  
nós.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 180-203, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Capitalismo dependente e questão social: apontamentos sobre eugenia e serviço social  
Portanto, nesse sentido, Iamamoto (2011) sustenta a ideia de que a “política colonial”  
forjou as bases para a fusão entre capital bancário e industrial, fornecendo lastro para a divisão  
internacional do trabalho, na qual a posição ocupada pelos países latino-americanos é de  
dependência do mercado internacional. Esse cenário sustenta o imperialismo na (atual) era dos  
monopólios e vai incidir na emergência do capital financeiro como marca atual do capitalismo  
global, forjando a quarta forma de dominação externa explicada por Fernandes (2009), uma  
espécie de dominação monopolista, como momento no qual os países latino-americanos estão  
submetidos ao capital internacional a partir dos monopólios e corporações empresariais.  
Nesse caminho, Moura (2014) sinaliza que, na situação colonial, os colonizadores  
estabelecem a distinção entre aqueles que possuíam os meios de produção – a terra e o  
escravizado também como meio, pois, além da extração de sua força de trabalho foi convertido  
em objeto/mercadoria do Senhor colonial – e aqueles que, apesar de produtores, eram alienados  
do produto por eles produzidos: os escravizados. O escravizado, por conseguinte, ocupava o  
lugar de produtor-mercadoria e produtor de mercadoria, uma vez que era vendido como  
mercadoria para converter-se em “tecnologia”, meio de produção. Assim, esse autor afirma que,  
no período colonial, são estabelecidas as duas classes fundamentais capitalistas: senhores e  
escravos, que se converteriam, não sem conflitos e singularidades, nas classes fundamentais  
que operam no capitalismo: capitalistas x trabalhadores.  
185  
Em função dessas particularidades e assentado na ideia de historicidade em Marx,  
Marini (2011) sugere que a apreensão das condições materiais objetivas de surgimento do  
capitalismo, na América Latina, desafia-nos a encontrar, a partir do horizonte marxiano,  
categorias que deem conta das objetivações particulares do(s) capitalismo(s) latino-  
americano(s). Nesse caminho, o autor sugere que a situação de dependência latino-americana  
está associada a três fatores principais: 1) o intercâmbio desigual no mercado internacional; 2)  
a superexploração do trabalho; e a 3) a agudização das contradições inerentes ao ciclo do  
capital.  
A primeira dimensão diz respeito ao processo de troca de mercadorias no mercado  
internacional. Nessa dinâmica, os países de “economia periférica” – ao produzirem artigos  
primários (matérias-primas de origem agrícola, pecuária, mineral, ambiental) e venderem com  
valor agregado reduzido – partem de uma posição deficitária com relação aos países de  
economia central que importam essas matérias-primas com valor reduzido e vendem o produto,  
tecnologicamente transformado, com um valor agregado maior, aos países periféricos. A  
posição, portanto, é deficitária e subordinada.  
Larisse Miranda de Brito  
A segunda dimensão, intimamente ligada à primeira e à terceira, diz respeito à  
especificidade inerente ao processo de extração de mais-valia/mais valor. A superexploração  
se organiza a partir de três características principais: 1) aumento da mais-valia a partir da  
intensificação do trabalho; 2) prolongamento da jornada de trabalho; 3) redução do consumo  
por parte do/a trabalhador/a. Esse quadro é processado através de um rebaixamento extremo do  
salário repassado para o/a trabalhador/a. Nesse cenário, embora o/a trabalhador/a produza, em  
seu processo de trabalho, como já demonstrado por Marx (2023), o valor necessário para a  
reprodução da sua força de trabalho somado ao valor excedente apropriado pelo capitalista  
como forma de mais-valia, há uma espécie de compressão salarial. Isso se constitui pelo não  
repasse real do que é produzido pelo trabalhador/a como tempo necessário para reprodução de  
sua força de trabalho. É o que conhecemos como arrocho salarial (Carvalho; Iamamoto, 2001).  
Esse quadro contribui para um aumento da produtividade a partir de uma maior extração  
de mais-valia e não como resultado do incremento da capacidade produtiva. O prolongamento  
da jornada de trabalho, converte-se, dessa forma, em extração da mais-valia absoluta em sua  
forma clássica (Marini, 2011). Assim, uma parte do fundo necessário à reprodução do/a  
trabalhador/a, em sua forma salário, será apropriada pelo capital como mais-valia. Esse cenário  
é sustentado ainda pela ampliação daquilo que Marini (2014) chamou de subproletariado,  
(francamente constituído por desempregados) que assumirá, nos países da América Latina,  
proporções muito maiores do que aquelas que podem ser observadas em países de capitalismo  
central.  
186  
Aterceira dimensão está associada ao ciclo do capital tal como preconizou Marx (2023),  
realizada através do processo de produção, circulação e consumo das mercadorias. Nesse  
cenário, o capital monetário transforma-se em capital produtivo através da compra de  
mercadoria (em forma de força de trabalho e meios de produção, entre eles, a matéria-prima),  
para, através delas, gerar “artigos acabados, fabricados”, que novamente serão vendidos, com  
valor agregado, para adquirir mais dinheiro em forma de capital mercantil, repetindo o ciclo  
(capital monetário – capital produtivo – capital mercantil) de formação do capital industrial. No  
caso das economias capitalistas de países centrais, as mercadorias fabricadas circularão tanto  
no mercado interno – uma vez que a exploração de seus trabalhadores não se dá em termos de  
superexploração, garantindo condições específicas de consumo para essa classe – quanto no  
mercado externo, através da venda dos produtos industrializados para outros países.  
Contudo, nos países latino-americanos, isso ocorre de maneira diferente porquanto a  
venda e consumo de seu principal produto, a matéria-prima, se dá via mercado externo. Afinal,  
a produção de bens, “artigos acabados, fabricados”, através da indústria de transformação, será  
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Capitalismo dependente e questão social: apontamentos sobre eugenia e serviço social  
monopolizada pelo capital estrangeiro, seja na forma de importação – empréstimo para  
incremento da industrialização dos países periféricos (gerando assim, a dívida pública) – ou  
através do monopólio de indústrias estrangeiras em solo nacional que se beneficiam dos baixos  
salários pagos aos trabalhadores e das riquezas naturais disponíveis. O cenário desenhado, a  
partir das três dimensões do capitalismo dependente, gera uma transferência do mais-  
valor/mais-valia interna para as economias externas, o que aprofunda sua posição deficitária e  
subalterna diante dos países centrais.  
Contudo, como aponta Fernandes (2009), as elites nacionais não estão interessadas em  
subverter a lógica da dependência, pois entendem que seu lucro – embora subalterno e  
dependente, em função da particularidade inerente ao ciclo do capital nos países latino-  
americanos, como exposto acima – pode ser extraído através da superexploração do trabalho  
em razão da mais-valia extraordinária por ele adquirida nesse processo. Em outras palavras, se  
o aumento da produtividade possibilita o rebaixamento do valor individual da mercadoria, seu  
lucro é garantido pela superexploração do trabalho, através do arrocho salarial que atinge a  
classe trabalhadora. Assim, o capitalista latino-americano garante sua lucratividade, não pelo  
intercâmbio de mercadorias por meio da finalização do ciclo do capital na economia interna,  
como proposto por Marx (2023), mas especialmente pela superexploração do trabalho que  
garante o rebaixamento do capital gasto (em salário) na produção da matéria-prima. Há,  
portanto, uma maior extração de mais-valia, somado aos ganhos do intercâmbio desigual.  
De acordo com Fernandes (1978), a transição da situação colonial para a situação de  
dependência se dá de maneira particular em cada país da América Latina, sendo marcada pela  
desagregação do sistema colonial. Esse processo foi acompanhado pelo estabelecimento do  
trabalho livre, do assalariamento e da origem da sociedade de classes, condições materiais  
objetivas para implantação do sistema capitalista. Por isso, interessa-nos, nesse momento,  
entender como isso se desenhou no contexto brasileiro, quais as suas implicações para a  
emergência da questão social e do serviço social no cenário nacional e seus imbricamentos com  
a política eugenista presente no país, em finais do século XIX até meados do século XX. É  
sobre isso que discutiremos a seguir.  
187  
Capitalismo dependente no Brasil  
De acordo com Moura (2014, 2019), é na transição do escravismo para o trabalho livre  
que se dá a emergência do capitalismo brasileiro, período que tem início entre fins do século  
XIX e entrada do século XX. Nesse sentido, no contexto do que ele denomina escravismo tardio  
(1851-1888), consolidar-se-á, entre nós, o capitalismo de tipo dependente que tem no latifúndio,  
Larisse Miranda de Brito  
na superexploração do trabalho, no racismo e no endividamento externo suas categorias  
fundantes, como aponta Souza (2020). Moura (2014, 2019) esclarece que o escravismo  
brasileiro é marcado por dois momentos: o escravismo pleno, o qual operou entre 1550 e 1850,  
no bojo do colonialismo, e o segundo, denominado escravismo tardio, que vigorou entre 1851  
e 1888, quando a escravatura foi “extinta” do cenário nacional. O autor sinaliza que, no  
chamado escravismo pleno, constituem-se as bases materiais, sociais, políticas e econômicas  
sob as quais se sustentam o ingresso do país no sistema capitalista.  
O colonialismo escravista estava assentado sob uma estrutura jurídico-administrativa  
rígida, centralizadora, repressora e violenta, na qual o escravizado africano e indígena –  
constituído como mercadoria e meio de produção de mercadorias – e a expropriação/exploração  
da terra, convertida em grande propriedade latifundiária, eram o alicerce da unidade econômica  
que sustentava o capitalismo mercantil e permitiu a acumulação primitiva de capital por parte  
da Europa. O Brasil foi uma de suas empresas mais rentáveis, dada a extensão de seu território  
e suas condições geográficas favoráveis ao tráfico de pessoas. Esse processo resultou em um  
número alarmante de escravizados sequestrados de variados países de África, em função do  
genocídio voraz contra os povos originários. Concordamos com Souza (2020), para quem foi  
o caráter mercantil da empreitada colonizadora que definiu o tipo de trabalho (escravo) e o  
número de trabalhadores/as necessários/as para a produção de mercadorias requeridas. Nesse  
cenário, como já dissemos, os/as próprios/as trabalhadores/as são convertidos/as em  
mercadoria, para além daquelas arrancadas da terra (especiarias, metais, madeira).  
188  
Souza (2020) sinaliza que a coisificação, através da escravização de povos africanos (e  
indígenas), está fundamentada em uma explicação econômica e é realizada com a função do  
fortalecimento do capital comercial/mercantil para acumulação primitiva do capital que  
subsidiou a revolução industrial europeia e projetou a hegemonia da burguesa internacional.  
Assim, como aponta Fernandes (2009), essa burguesia internacional subalterniza as burguesias  
nacionais latino-americanas aos seus interesses. Desse modo, Souza (2020) sugere que o  
colonialismo se constitui como método do imperialismo, sendo, portanto, condição sine qua  
non para estabelecimento e expansão do capitalismo. Do mesmo modo, o genocídio – físico,  
cultural e intelectual (Nascimento, 2017) – constitui-se método do colonialismo e,  
posteriormente, do capitalismo dependente como dispositivo da burguesia nacional para  
manutenção do status quo.  
Sob a égide da sociedade colonial, as mediações que alienam o/a trabalhador/a dos  
meios de produção são: 1) escravismo colonial; 2) desumanização dos/as trabalhadores/as e 3)  
a mistificação das diferenças, sob as quais repousam nosso interesse nesse momento (Souza,  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 180-203, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Capitalismo dependente e questão social: apontamentos sobre eugenia e serviço social  
2020). O processo de mistificação se deu através da autoafirmação da civilização europeia,  
particularmente do homem cisgênero europeu, como sinônimo de avanço e racionalidade.  
Assim, forjou-se o racismo e a cisheteronormatividade como fundantes para a reprodução  
sociopolítica e cultural da sociedade burguesa (Moraes, 2023). Desse modo, o racismo e o  
sexismo passam a constituir-se como forças ideológicas fundamentais para dominação étnico-  
política na garantia da estrutura desigual e determinação das relações de produção e reprodução  
social. Através desse pano de fundo, ganham forças as teses eugênicas entre nós, em meados  
do século XIX, no contexto do escravismo tardio.  
[...] baseadas no darwinismo social e mais especialmente nas teses de Francis  
Galton. Amplamente difundidas através dos etnólogos e antropólogos  
europeus [...] como pressupostos para compreender os territórios colonizados,  
encarcerando-os nas ideias de sub-raça em função da mestiçagem, [essas teses  
foram aceitas e disseminadas no país, através das Faculdades de Direito (1827)  
em Pernambuco e São Paulo e a Faculdade de Medicina na Bahia (1832)] que  
adotavam as [ideias] de Cesare Lombroso (1835-1909) [grande disseminador]  
de interpretações racistas tanto no campo das ciências jurídicas e criminais  
quanto nas ciências da saúde, especialmente nos temas voltados à higiene  
pessoal e saúde mental. Dessa forma, a população negra e indígena foi  
apontada, através das técnicas de antropometria, como responsáveis pela  
estagnação política e intelectual da nação, que descendendo do hibridismo  
biológico estava fadada à degeneração. Era preciso, portanto, impedir a  
proliferação da mestiçagem para combater a degeneração socio racial e, enfim,  
criar uma nação possível de progresso. Inicia-se aqui os discursos eugênicos  
que atravessa toda a política brasileira dos primeiros anos do século XX  
(Brito, 2024, p. 64).  
189  
Em contraste com esse cenário, Schwarcz (1993) e Shucman (2013) apontam que,  
justamente nesse período, as teses eugênicas estão a perder forças no cenário europeu, isso em  
virtude dos interesses econômicos da época. É o período em que havia necessidade de expandir  
o capitalismo imperialista, liberar mão de obra para o modelo assalariado e o mercado  
consumidor. Nesse contexto, como esclarece Moura (2019), ocorre uma espécie de  
modernização nacional, fruto de interesses externos, especialmente da Inglaterra que,  
interessada em expandir o mercado mundial, proibiu a comercialização de pessoas escravizadas  
desde o continente africano, com a consequente promulgação da Lei Eusébio de Queirós, cujo  
impacto na mão-de-obra resultou na implantação do trabalho livre em território nacional, como  
condição material objetiva para a consolidação da empresa capitalista. Além disso, como alerta  
Moura (2019), o enfraquecimento do escravismo é também resultado dos desgastes causados  
no sistema colonial, escravista, pelo que ele nomeou insurgência negra-escrava. Esse desgaste  
se apresenta em três níveis diferentes: 1) econômico; 2) político; 3) psicológico.  
O primeiro nível é representado pelas constantes fugas dos escravizados e pela  
destruição das lavouras e das propriedades, por parte dos escravizados, com consequentes  
Larisse Miranda de Brito  
gastos gerados a partir dessa realidade. No segundo nível, o autor salienta a criação dos  
quilombos como forma de resistência e prática política que buscou alterar as formas de  
organização do trabalho e da própria sociedade, representando uma profunda ameaça para a  
classe senhorial, além da articulação com outros grupos oprimidos, como contrabandistas com  
quem os escravizados mantinham comércio clandestino e trocavam informações sobre as  
possíveis ofensivas senhoriais.  
O terceiro nível é marcado pelo que o autor nomeia, baseado em documentos da época,  
como “síndrome do medo da insurgência negra”, assentada na ideia de uma possível articulação  
dos escravizados com negros de outros países e a influência da Revolta Haitiana, assim como  
a possível articulação com escravizados rebeldes nacionais ou o medo do estupro contra as  
mulheres brancas. Esse cenário levou à promulgação de uma legislação violentamente punitiva  
contra os escravizados insurgentes, e uma espécie de modernização da classe senhorial que  
passa a criar leis de autoproteção.  
Moura (2019) esclarece que, nesse processo, operou-se uma espécie de modernização  
do ambiente e dos hábitos que não alterou as relações de produção. Houve uma dinamização da  
economia nacional, através de uma tímida inserção tecnológica e mecanização da comunicação  
e do setor de transporte. Essa primeira fase da modernização foi subsidiada pelo capital  
estrangeiro, com a importação de mercadorias e corresponde aos primeiros anos da  
independência (1822). É tributário desse contexto a relação violenta que se estabelece, nos anos  
posteriores, entre as classes dominantes e as classes dominadas, com aval do Estado que,  
atuando como “comitê da burguesia” nacional, promulga leis que passarão a coibir a  
manifestação político-cultural dos estratos negros da sociedade brasileira.  
190  
No plano político-econômico, assistia-se à transferência do polo econômico colonial,  
centrado no Nordeste e no Norte – com destaque para Salvador, Recife e Ceará – para o polo  
econômico industrial, concentrado no Sul e Sudeste, especialmente, São Paulo, Rio de Janeiro,  
Minas Gerais e Paraná, o que ocasionou profundas disparidades regionais em termos de  
dinamização econômica. Era o início de um longo e desigual processo de urbanização que  
materializa uma tensão a qual será agravada ao longo dos anos: a reprodução do campo x cidade,  
como acentua Ianni (2004). Contudo, essa “modernização” não extinguiu o trabalho escravo,  
ao contrário disso, combinou “novos hábitos” do capitalismo clássico – trazido de fora – com  
a permanência do trabalho escravo e a exclusão dos escravizados da possibilidade de fazer parte  
desse novo cenário, como apontam Moura (2019) e Fernandes (1978).  
Nos primeiros anos, o monopólio dos países centrais, especialmente a Inglaterra,  
continuou estabelecendo as regras para os intercâmbios comerciais assentados na lógica do  
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Capitalismo dependente e questão social: apontamentos sobre eugenia e serviço social  
intercâmbio desigual, descritas acima a partir das contribuições de Marini (2011). Entretanto,  
esse quadro irá sofrer algumas alterações a partir de marcadores fundamentais como aponta  
Ianni (2004), que sinaliza para a dinamização da economia nacional através do predomínio da  
cafeicultura, a adoção da Lei Alves Branco, em 1844, que buscou aumentar as taxas  
alfandegárias e a campanha contra o livre-cambismo. Esses acontecimentos beneficiaram as  
atividades produtivas não-agrícolas e ampararam, ainda que de maneira tímida, o mercado  
interno, que passou a ser dinamizado.  
Além disso, para o autor, a extinção do tráfico negreiro, em 1850, liberou o capital da  
burguesia agrícola para investimento, ainda que tímido, em outros setores da economia como o  
fabril, e fortaleceu o setor de serviços e artesanato que ajudou a dinamizar a economia nacional.  
Esse cenário não se desenhou sem tensões, uma vez que a conversão das fazendas de café em  
empresa capitalista e de seu dono em empresário, não ocorre de maneira linear. Assim, nasce  
uma ruptura entre as elites nacionais: de um lado, a burguesia cafeeira, latifundiária que detinha  
o monopólio financeiro; de outro, uma burguesia liberal que – adepta da industrialização e  
proprietária de comércios – interessada nos debates externos para expansão do capitalismo,  
iniciou uma campanha abolicionista no cenário nacional, menos pela humanização do ex-  
escravizado e mais pelo seu interesse nos novos rumos da economia mundial (Moura, 2019).  
Nesse contexto, como esclarece Fernandes (1978), processa-se a desagregação do  
sistema colonial e do escravismo no Brasil, entre meados e finais do século XIX, acompanhada  
do estabelecimento do trabalho livre, do assalariamento, da origem da sociedade de classes  
como condições materiais objetivas para implantação do sistema capitalista, em território  
nacional. Assim, a combinação do trabalho livre com o escravismo forneceu o lastro sobre o  
qual se desenhou a possibilidade de acumulação primitiva das burguesias nacionais, o que não  
significou, contudo, um rompimento com a lógica da dependência. A superexploração do  
trabalho assume aqui características sui generis, em função da manutenção do trabalho escravo  
até 1888, quando se deu sua “completa” extinção. Até lá, como sustenta Moura (2014, 2019), é  
o escravismo que vai garantir a produção de um excedente que permanecerá em território  
nacional, garantindo uma certa acumulação primitiva interna. Portanto, a população negra será  
mais atingida com a superexploração, ao mesmo tempo em que dará maior contribuição para a  
acumulação de capital.  
191  
Moura (2014, 2019) esclarece que pelo menos cinco medidas foram essenciais para a  
consolidação do capitalismo dependente no país. O autor corrobora com Ianni (2004) acerca da  
importância da 1) Tarifa Alves Branco (1844) e da 2) Lei Eusébio de Queirós (1850) e  
acrescenta a 3) Lei de Terras (1850), a 4) entrada do Brasil na Guerra do Paraguai (1865) e a 5)  
Larisse Miranda de Brito  
política de imigração/branqueamento – procedimento eugênico – adotada a partir de 1837 e  
fortalecida em meados de 1860, em função da Guerra do Paraguai, como medidas fundamentais  
para modernização do país. De acordo com Moura (2014), até a adoção da Lei de Terras, o  
Estado (na figura do Rei) era o responsável pela distribuição das terras nacionais, contudo, com  
a promulgação da Lei n° 601, a terra passa a ser uma mercadoria vendável. A Lei previa sua  
posse, apenas através da compra ou da herança, assim, não apenas dificultou o acesso da  
população negra à terra – uma vez que esta não possuía os meios necessários para a compra,  
tampouco gozava da condição de herdeiros/as de bens – como também criou entraves para a  
distribuição de terra no pós-abolição. Em outras palavras, impediu a realização de uma reforma  
agrária.  
A política de imigração que favoreceu a entrada de trabalhadores das mais diversas  
partes da Europa (italianos, poloneses, etc.) marcou o surgimento do trabalho livre a partir da  
diferenciação racial entre aqueles destinados aos “melhores” postos e condições de trabalho e  
aqueles que continuariam subjugados pelo trabalho escravo (Ianni, 2004). Nesse sentido  
Fernandes (1978), assegura que a inserção do trabalho livre no Brasil condenou os estratos  
negros a uma condição de pauperização e exclusão social, que vai impactar nas gerações  
posteriores. Ademais, a entrada do Brasil na Guerra do Paraguai significou o envio de boa parte  
da população negra para o confronto, isso resultou, de acordo com Ianni (2004), em um  
aprofundamento da política migratória, o que elevou a entrada de trabalhadores europeus em  
território nacional, especialmente nos centros de crescimento industrial. Além disso, para  
Moura (2014), a participação dos escravizados na guerra se deu como dispositivo de  
reordenamento étnico da sociedade, uma vez que esses eram enviados pelo próprio Estado,  
quando detinha sua posse, ou pelos Senhores que, ao invés de alistarem-se para servir, se auto  
substituíam pelos escravizados sob sua posse, promovendo assim uma limpeza étnica através  
de um genocídio em massa, praticado de forma indireta pelo Estado nacional.  
192  
Dessa maneira, portanto, Moura (2014) considera que a modernização no Brasil  
combinou o moderno: avanços científicos e tecnológicos subsidiados pelo capital internacional,  
especialmente o inglês – sustentado, por conseguinte, por um endividamento externo – ao  
mesmo tempo em que sustentou o arcaico: alicerçando esse avanço em bases escravistas que só  
foram extintas a partir de 1888, com a promulgação da Lei Áurea, desacompanhada de qualquer  
medida de amparo social à população ex-escravizada. Ao contrário disso, crescia a política de  
branqueamento assentada nas teses eugênicas, fortalecidas entre finais do século XIX e início  
do século XX, como apontam Schucman (2013) e Schwarcz (1993). Assim, a pseudociência  
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Capitalismo dependente e questão social: apontamentos sobre eugenia e serviço social  
eugênica atribuía o atraso nacional à presença do negro entre nós, e propunha, como solução, o  
embranquecimento da população.  
Eugenia, questão social e serviço social  
A política de branqueamento aprofundada na primeira metade do século XX, imbricou-  
se ao mito da democracia racial1 que surge no contexto nacional também nesse período, quando  
se desenvolvem políticas de cunho nacionalista com o intuito de forjar a identidade nacional a  
fim de fortalecer as bases econômicas, sociais e políticas do país. Ainda sob domínio de uma  
burguesia agrária, iniciava-se um pequeno surto industrial e uma expansão dos direitos em  
função da desagregação do escravismo e da agitação social em torno de garantias trabalhistas  
que, de acordo com Marini (2023), vai resultar na “revolução de 1930” e na chegada de Getúlio  
Vargas ao poder. O mito da democracia racial forneceu as bases para a idealização do Brasil,  
não como país atrasado em função da grande população negra, mestiça existente, mas antes  
como uma nação irmanada que conseguiu aplacar as disputas raciais cuja principal prova era a  
existência do “mulato2”.  
Nesse sentido, concordamos com Fernandes (1978) quando considera que o mito da  
democracia racial trouxe ao menos três consequências incontornáveis para a sociedade  
brasileira em termos ideológicos: 1) um estado de espírito farisaico que atribuía à incapacidade  
intelectual e moral do negro a sua não inserção em bons postos de trabalho, afinal, a sociedade  
era aberta à sua participação e até permitia trocas afetivas entre negros e brancos; 2) a isenção  
da responsabilidade, por parte do Estado, dos estratos da elite branca nacional resulta na  
exclusão e ou inserção subalternizada dos negros na nascente sociedade de classes; 3) uma falsa  
consciência social a nível nacional e internacional da realidade racial brasileira, forjando uma  
narrativa de convivência harmônica entre as diferentes raças no contexto nacional e  
escamoteando o racismo existente na realidade concreta. Nesse mesmo caminho, Nascimento  
(2017) sinaliza para o fato de a política de branqueamento representar um verdadeiro genocídio  
contra os negros brasileiros uma vez que contribuiu para que essa população buscasse negar  
sua origem étnico-racial, fazendo aquilo que Fanon (2008) revelou como sendo a eterna  
tentativa de corpos negros revestirem-se de máscaras brancas.  
193  
1 O mito da democracia racial, amplamente difundido por Gilberto Freyre, com o intuito de forjar uma identidade  
nacional, propalou a ideia de convivência harmônica entre raças no território brasileiro. Dessa maneira, o Brasil  
projetava-se para o mundo como lugar ideal sem conflito de raças (no sentido sociológico do termo). Assim o  
mestiço – figura execrável para a eugenia – despontava como a figura aglutinadora dessa união racial. Funcionou  
como um véu que acoberta a realidade, uma narrativa pseudoconcreta daquilo que se experimentava e ainda se  
experimenta na sociedade brasileira.  
2 Mantemos o termo apenas para sermos fidedignos aos debates da época.  
Larisse Miranda de Brito  
A falta de acesso a políticas públicas que garantissem sua subsistência fez com que essa  
população fosse “jogada à própria sorte”, experimentando um pauperismo extremo,  
especialmente nos anos iniciais da década de 1900, o que impactou na informalidade como  
principal meio de sustento (Fernandes, 1978; Ianni, 2004). Entre as décadas de 1930 e 1950, a  
inserção da população negra (e indígena) no mercado de trabalho emergente se materializava  
de modo precário, a partir do desenvolvimento de atividades autônomas e precarizadas,  
especialmente no setor de serviços. No caso dos indígenas, não eram incomuns trabalhos  
análogos à escravidão em função da concentração desses povos nas extensões territoriais onde  
se mantiveram os latifúndios e a agricultura de baixa tecnologia como principal atividade  
produtiva (Ianni, 2004).  
Além disso, era essa a parte da população que constituía o bolsão de desempregados do  
período, sofrendo com o discurso ideológico corrente de que essa realidade se construíra pela  
propensão dessa população à marginalidade devido ao seu caráter indisciplinado, preguiçoso,  
vadio e pouco “afeito” ao trabalho assalariado (Fernandes, 1978; Gonzalez; Hasenbalg, 2022).  
Nesse caminho, Gonzalez e Hasenbalg (2022) esclarecem que houve uma precarização quanto  
à participação da população negra no trabalho livre, assalariado no contexto nacional. Dessa  
forma, entre 1930 e 1950, essa população enfrenta um crescente desemprego e a favelização de  
sua condição social.  
194  
Por isso, Carvalho e Iamamoto (2001) vão considerar que o advento do trabalhador  
livre no Brasil é profundamente marcado pela escravidão. Assim, sustentamos, amparados  
nas contribuições de Moura (2014, 2019), que as diferenças raciais vão marcar as posições de  
classes no contexto nacional. Nelas, os antigos senhores coloniais brancos e descendentes de  
europeus convertem-se na classe capitalista, enquanto negros, indígenas e migrantes irão  
constituir uma classe trabalhadora fortemente heterogênea e moldada por fortes tensões raciais  
internas haja vista – como sustentam Fernandes (1978), Ianni (2004) e Gonzalez e Hasenbalg  
(2022) – os negros e indígenas não apenas terem sido relegados a postos mais precarizados de  
trabalho, como também foram remetidos a situações de exclusão e desemprego.  
Desprovidos, portanto, de trabalho e enfrentando o desemprego, a população negra  
passa a ser alvo da propalada Lei da Vadiagem, promulgada em 1941, através do decreto-lei n.  
3.688 que previa, através do artigo 59, a vadiagem como contravenção penal, assim a definia  
como:  
Art. 59. Entregar-se alguém habitualmente à ociosidade, sendo válido para o  
trabalho, sem ter renda que lhe assegure meios bastantes de subsistência, ou  
prover a própria subsistência mediante ocupação ilícita: Pena - prisão simples,  
de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses. Parágrafo único. A aquisição  
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Capitalismo dependente e questão social: apontamentos sobre eugenia e serviço social  
superveniente de renda, que assegure ao condenado meios bastantes de  
subsistência, extingue a pena (Brasil, 1941).  
Concordamos com Elpídio (2023, p. 5), para quem a referida lei responsabilizava o  
indivíduo por seu fracasso social, “[...] que essa lógica (moralizante) entrelaçada às teorias  
eugenistas e racialistas, estigmatiza e identificava nas pessoas negras e indígenas a falha, a  
precariedade e incapacidade à dignidade e a sobrevivência”. Dessa forma, consideramos que a  
sociabilidade capitalista operou para o aprofundamento das distinções raciais, amparadas pelo  
racismo, e promoveu a eugenia como solução para os problemas do atraso nacional.  
É importante sinalizar que, já em 1918, foi fundada, em São Paulo, a Sociedade  
Eugênica do Brasil cujo presidente era Renato Kehl. Em 1920, é fundada a Liga Brasileira de  
Higiene Mental, que incorporava os ensinamentos eugênicos com especial interesse e assim  
difundiu um higienismo eugênico no país (Benedicto, 2019). A Liga, como sugere Procópio  
(2022), pode ter influenciado o ensino através de disciplinas específicas presentes nos cursos  
de serviço social, especialmente a partir da década de 1950, pois – embora suas primeiras  
escolas tenham surgido no país, em 1936 e 1937, respectivamente, em São Paulo e Rio de  
Janeiro – seu reconhecimento como profissão com formação superior, se dá apenas nos  
primeiros anos da década de 1950.  
Acerca do contexto de nascimento do serviço social, além da forte influência da Igreja  
Católica no surgimento das primeiras escolas, salientamos que o estímulo à educação eugênica  
em todos os níveis aparecia na Constituição nacional de 1934, através do artigo 138, que  
incumbia “[...] à União, aos Estados e aos Municípios [...] estimular a educação eugênica.  
Notadamente [o Estado estimulava] a política de branqueamento [através da] educação” (Brito,  
2024, p. 71). Teriam as primeiras escolas de serviço social passado ilesas a esse debate? Os  
estudos de Procópio (2022) parecem sugerir que não.  
195  
Como sabemos, o surgimento do serviço social é, em larga medida, fruto da emergência  
da questão social no cenário político nacional. De acordo com Carvalho e Iamamoto (2001, p.  
185), “[...] a “questão social”, seu aparecimento, diz respeito diretamente à generalização do  
trabalho livre”. Dessa forma, compreendemos que o reconhecimento da questão social no  
contexto nacional, se dá no bojo da consolidação do trabalho livre e da sociedade de classes,  
quando emerge o que se convencionou chamar de novo operariado nacional3, fruto da extinção  
3
Marini (2023) define esse “novo proletariado” como o momento no qual o trabalho livre foi consolidado no  
cenário nacional – com a abolição da escravatura – mas, especialmente, quando os trabalhadores adquirem lugar  
próprio na sociedade brasileira, sendo reconhecido seu poder político no contexto nacional, através da sua  
capacidade organizativa.  
Larisse Miranda de Brito  
do trabalho escravo e da primeira tentativa de intensificação da industrialização nacional com  
consequente expansão da urbanização no país.  
Na tradição intelectual do serviço social, identifica-se o nascimento da questão social,  
no contexto brasileiro, a partir de 1930, como resultado não apenas do surgimento do novo  
operariado nacional, mas também de adoção, por parte do Estado e do empresariado, de  
medidas institucionais – notadamente as políticas sociais – no âmbito da política estatal para  
atender às reivindicações trabalhistas que cresciam no país desde 1920. Como afirma Marini  
(2023), as tensões de classe4 se acirram no cenário nacional a partir de 1922 até, pelo menos,  
1937, quando, com a chegada de Getúlio Vargas ao poder, houve uma espécie de estabilização  
da burguesia nacional – cindida, como dissemos anteriormente, entre latifundiários, industriais  
e comerciantes – e um esquema particular de relação com o proletariado cujas “concessões”  
sociais – materializadas, por exemplo, na aceitação da organização sindical e na Consolidação  
das Leis Trabalhistas (CLT), em 1943 – conseguiram apaziguar a luta trabalhista.  
Aquestão social é entendida – a partir das contribuições de Carvalho e Iamamoto, 2001  
e Iamamoto, 2011 – como o conflito de interesses entre capitalistas e trabalhadores e as  
respostas elaboradas pelo Estado e pelo empresariado, objetivadas nas políticas sociais, a fim  
de gerir os problemas sociais (ou expressões da questão social) decorrentes dessa disputa. Para  
Iamamoto (2001), a análise da questão social deve estar associada às configurações assumidas  
pelo trabalho. O que significa dizer que sua compreensão requer que sejamos capazes de  
desvendar o processo de acumulação capitalista e a consequente divisão social das classes. Por  
isso, a autora considera que a questão social se desdobra em expressões, desigualdades sociais  
expressas em diferenciações econômicas, políticas, mediadas por relações de gênero, étnico-  
raciais e territoriais.  
196  
Dessa forma, a partir de tudo que foi debatido até aqui, em função das particularidades  
do surgimento do capitalismo no contexto latino-americano e brasileiro, com as consequências  
materiais e objetivas geradas por ela na constituição da classe trabalhadora nacional,  
compreendemos que o racismo se constitui como fundante da questão social no contexto  
nacional. Em face do pauperismo ao qual foi relegada a população descendente de africanos e  
indígenas escravizados entre nós, e sendo ele um acirramento das condições desiguais sob as  
quais se assenta a expansão capitalista e a questão social no contexto europeu, como aponta  
4 Para Gonzalez e Hasenbalg (2022), em função da subalternização da população negra (e acrescentamos indígena)  
na inserção do trabalho livre no Brasil, a participação desse estrato na luta trabalhista irá ser fragilizada em função  
desse contexto. Ademais, concordamos com Moura (2019), para quem a participação negra na luta trabalhista  
ocorre de forma mais tímida em função da perseguição violenta e genocida experimentada por essa população,  
desde o escravismo pleno, passando pelo escravismo tardio até o advento da república.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 180-203, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Capitalismo dependente e questão social: apontamentos sobre eugenia e serviço social  
Netto (2011), não podemos esquecer, como sinaliza Martins (2012), que esse processo foi  
experimentado no contexto brasileiro pelos estratos negros, o que vai impactar em sua exclusão  
ou inserção desigual em processos de trabalho.  
A questão racial não é, portanto, apenas expressão dos antagonismos de classe, mas –  
como demonstram os trabalhos de Fernandes (1978, 2009), Moura (2014, 2019), Ianni (2004)  
– fundamenta esses antagonismos, atingindo, inclusive, as disputas internas na própria classe  
trabalhadora, como dissemos anteriormente. Além das medidas no âmbito das concessões  
trabalhistas, o serviço social desponta como um dos instrumentos da burguesia nacional como  
forma de conter a luta trabalhista (Carvalho; Iamamoto, 2001). Associada, em seu nascedouro,  
à elite católica como trabalhadores/as vinculados/as à sistematização da caridade, quando são  
criadas as primeiras escolas no país, a profissão será inserida na divisão sociotécnica do trabalho  
no contexto nacional, a partir de sua institucionalização, como afirma Iamamoto (2011), o que  
ocorre com a regulamentação da profissão por volta de 1950.  
Assim, em 1953, é estabelecida a Lei n. 1889, que regulamenta os cursos de serviço  
social em nível superior, com duração mínima de 3 e máxima de 5 anos e, posteriormente, em  
1957, promulga-se a Lei n. 3.252, que dispõe sobre o exercício da profissão de Assistente  
Social, regulamentando seu status profissional através do decreto 994/1962. Nesse período,  
como afirma Souza (1994), a produção em serviço social preocupava-se com uma espécie de  
metodologização da profissão para distanciar sua prática caritativa em estreita relação com a  
Igreja Católica. Dessa forma, seus profissionais recorreram ao funcionalismo e ao positivismo,  
somados à filosofia neotomista, como lastros para a formação profissional.  
197  
Como observam Carvalho e Iamamoto (2001), o surgimento do serviço social é uma  
estratégia de legitimação da burguesia diante do proletariado nascente, e é o reconhecimento da  
questão social “como caso de política”, que irá subsidiar sua inserção na divisão sociotécnica  
do trabalho. Nesse sentido, a proposta curricular de 1953, previa, em seu art. 2º, inciso III, que  
o ensino do Serviço Social deveria ter como finalidade “[...] contribuir para criar ambiente  
esclarecido que [proporcionasse] a solução adequada dos problemas sociais” (Brasil, 1954).  
Essas soluções deveriam promover o ajustamento dos trabalhadores ao sistema vigente  
(Caravalho; Iamamoto, 2001; Netto, 2011).  
A proposta curricular, apresentada no art. 3º, previa a seguinte organização:  
I - Sociologia e Economia Social; Direito e Legislação Social; Higiene e  
Medicina Social; Psicologia e Higiene Mental; Ética Geral e Profissional.  
II - Introdução e fundamentos do Serviço Social: Métodos do Serviço Social;  
Serviço Social de Casos - de Grupo - Organização Social da Comunidade:  
Serviço Social em suas especializações; Família - Menores - Trabalho -  
Médico.  
Larisse Miranda de Brito  
III - Pesquisa Social (Brasil, 1953, grifo nosso).  
Embora Procópio (2022, p. 48) reconheça, acertadamente, “[...] a necessidade do  
aprofundamento de pesquisas nos programas e conteúdos curriculares [de] uma análise do  
quanto a imbricação entre higienismo e eugenia esteve presente na formação das primeiras  
assistentes sociais”, não podemos deixar de considerar que o discurso eugênico atravessou  
sobremaneira a Liga Higienista Brasileira, como braço do movimento eugênico,  
institucionalizado por Renato Kehl, como supramencionado (Brito, 2024). As aproximações do  
serviço social, no bojo de seu nascimento, com a área médica e, ao mesmo tempo, como  
dispositivo profissional de controle e ajustamento ao status quo da classe trabalhadora e dos  
estratos pauperizados, são amplamente discutidas por Carvalho e Iamamoto (2001) e Iamamoto  
(2011).  
Esse cenário nos permite considerar a forte influência do pensamento eugênico na  
formação, não apenas das assistentes sociais formadas com o currículo de 1953, mas,  
especialmente, daquelas cujas formações ocorrem nas primeiras escolas de serviço social, no  
contexto de uma constituição que previa, como já referido, o ajustamento das instituições de  
ensino à educação eugênica. Conforme Benedicto (2019), a educação eugênica associava a  
população negra ao atraso, à falta de higiene e educação e à inadaptabilidade para o trabalho  
assalariado. O relato trazido por Carolina Maria de Jesus, escritora negra da favela do Canindé,  
em seu livro “Quarto de Despejo”, é revelador no sentido de entendermos a atuação profissional  
nesse período:  
198  
Em junho de 1957 eu fiquei doente e percorri as sedes do Serviço Social.  
Devido eu carregar muito ferro fiquei com dor nos rins. Para não ver os meus  
filhos passar fome fui pedir auxílio ao propalado Serviço Social. Foi lá que eu  
vi as lágrimas deslizar dos olhos dos pobres. Como é pungente ver os dramas  
que ali se desenrola. A ironia com que são tratados os pobres. A única coisa  
que eles querem saber são os nomes e os endereços dos pobres (Jesus, 2014,  
p. 41).  
Podemos inferir, a partir do relato da autora, um atendimento protocolar, irônico e  
desprovido de qualquer criticidade acerca da estrutura social capitalista. Além disso, como  
afirma Marques Júnior (2013), a partir da análise do inquérito social escrito por Maria Esolina  
– profissional pioneira –, o dado “cor” era recolhido para a descrições de “menores infratores”,  
o que nos leva a pensar a importância da “raça” para o estudo da situação social das pessoas  
atendidas pelas primeiras assistentes sociais. Isso, contudo, não reflete no debate teórico-  
metodológico e técnico-operativo da época haja vista que os fundamentos do período estavam  
alinhados com a manutenção do status quo e o ajustamento dos indivíduos ao sistema.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 180-203, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Capitalismo dependente e questão social: apontamentos sobre eugenia e serviço social  
É possível considerar que essa falta de debate acerca do quesito cor, nas produções da  
época, dialoga com o momento de afirmação do mito da democracia racial como lastro da  
identidade nacional, como sinalizamos anteriormente. Ademais, concordamos com Procópio  
(2022) para quem, dadas as condições históricas de surgimento do trabalho livre e da classe  
trabalhadora no Brasil, há “[...] uma intrínseca relação entre a questão racial e a questão social  
no país”. Entretanto, a produção sociológica do período endossava o discurso de convivência  
harmônica entre os estratos sociais racializados, existentes no país.  
As transformações pelas quais passou a profissão a partir da década de 1960, com o  
movimento de reconceituação latino-americano que impacta na Renovação brasileira, operaram  
mudanças significativas no que se refere aos fundamentos teórico-metodológicos, técnico-  
operativos e ético-político da profissão. No contexto desses acontecimentos, na década de 1980,  
a profissão vai operar mudanças radicais no que concerne à formação e prática profissional.  
Assim, a partir da aproximação com a teoria crítica marxista, o serviço social “rompe” com sua  
vertente conservadora, alinhada aos interesses da burguesia na manutenção do status quo, com  
impactos fundamentais na Lei de regulamentação da Profissão de 1993, que materializa o  
Código de Ética Profissional de 1993 e as Diretrizes Curriculares (DC) de 1996, como resultado  
do currículo mínimo, desenhado em 1982.  
Esse novo direcionamento aponta para um compromisso ético-político com os  
trabalhadores, mas especialmente com uma formação e exercício profissional orientados para  
a extinção de qualquer discriminação baseada na etnia, na classe e no gênero. No âmbito da  
formação, organizada em núcleos5, o segundo refere-se aos “Fundamentos da Formação Sócio-  
histórica da Sociedade Brasileira”, o documento preconiza  
199  
Este núcleo remete ao conhecimento da constituição econômica, social,  
política e cultural da sociedade brasileira, na sua configuração dependente,  
urbano industrial, nas diversidades regionais e locais, articulada com a análise  
da questão agrária e agrícola, como um elemento fundamental da  
particularidade histórica nacional. Esta análise se direciona para a apreensão  
dos movimentos que permitiram a consolidação de determinados padrões de  
desenvolvimento capitalista no país, bem como os impactos econômicos,  
sociais e políticos peculiares à sociedade brasileira, tais como suas  
desigualdades sociais, diferenciação de classe, de gênero e étnico raciais,  
exclusão social, etc. (ABEPSS, 1996, p. 11).  
Nesse sentido, o debate acerca da unidade dialética classe, raça e gênero (Davis, 2016)  
é urgente para pôr em prática aquilo que está previsto na regulamentação da formação e prática  
5 As Diretrizes Curriculares organizam o currículo do curso em três núcleos de fundamentação: 1. Fundamentos  
Teórico-Metodológicos da Vida Social; 2. Fundamentos da Formação Sócio-histórica da Sociedade Brasileira; 3.  
Núcleo de Fundamentos do Trabalho Profissional; que devem ser trabalhados de maneira articuladas e assentados  
no pensamento crítico cujo trabalho constitui categoria fundante.  
Larisse Miranda de Brito  
profissional. Reconhecemos os avanços no que concerne a esses debates nos últimos anos, com  
um esforço especial das entidades de organização política da profissão, com destaque para as  
campanhas antirracistas e antissexistas elaboradas pelo conjunto CFESS/CRESS e o documento  
elaborado pela ABEPSS, em 2018, “Subsídios para o debate sobre a questão étnico-racial na  
formação em serviço social”, como resultado dos esforços do Grupo Temático de Pesquisa  
“Serviço Social, Relações de Exploração/Opressão de Gênero, Raça/Etnia e Sexualidades”,  
criado em 2010, no âmbito do Encontro Nacional de Pesquisadores e Pesquisadoras em Serviço  
Social (ENPESS).  
Entretanto, amparadas em Procópio (2022) e Martins (2014), concordamos que ainda  
são escassas as pesquisas que associam a questão racial como fundamento da sociabilidade  
capitalista e, portanto, da emergência da questão social entre nós. Por isso, reiteramos a  
necessidade da produção de conhecimento nessa direção para avançarmos com a materialização  
do nosso projeto ético-político através da formação e prática profissional. Esse debate é urgente  
para que possamos combater de modo preemente as tendências neoconservadoras que têm  
tentado galgar maiores espaços no âmbito profissional.  
Considerações finais  
O texto buscou fazer alguns apontamentos quanto aos imbricamentos existentes entre a  
política eugênica que ganha força no Brasil, a partir da emergência e consolidação do  
capitalismo dependente no contexto nacional, a emergência da questão social e do serviço social  
na realidade brasileira. Isso porque consideramos que a suspensão da pseudoconcreticidade,  
entre nós, requer o reconhecimento da unidade dialética, raça, classe e gênero como lastro da  
sociabilidade capitalista no cenário brasileiro. Nesse sentido, foi possível identificar como a  
política eugênica contribuiu para a formação de uma classe trabalhadora marcada pela  
heterogeneidade racial que relegou os povos negros e indígenas à condição de inserção na  
sociedade de classes de uma forma subalternizada, sendo esses os estratos que mais sofrem com  
a superexploração como condição sine qua non do capitalismo dependente latino-americano.  
Reconhecemos, portanto, a questão racial como base fundamental para a emergência da  
questão social no país. Assim, há forte imbricamento do racismo no surgimento da questão  
social, especialmente porque seu reconhecimento, no cenário político, se dá no processo de  
emergência das políticas eugênicas e no mito da democracia racial como vetores que buscavam  
projetar a identidade nacional como desprovida de qualquer problema racial gerado pelo  
colonialismo. Ao mesmo tempo, esse estudo sugere o possível impacto da pseudociência  
eugênica na formação e atuação dos primeiros profissionais de serviço social e aponta para a  
200  
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 180-203, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518  
Capitalismo dependente e questão social: apontamentos sobre eugenia e serviço social  
necessária investigação científica em torno do tema como forma de fortalecer e materializar o  
projeto de formação e exercício profissional presentes no projeto ético-político profissional,  
através do Código de Ética de 1993 e das Diretrizes Curriculares de 1996.  
Dessa forma, sugerimos que a eugenia possa ser abordada no currículo do serviço social,  
porquanto entendemos que o tema está relacionado ao surgimento da profissão, impactando em  
seu processo de consolidação e expansão no contexto nacional. O aprofundamento nesse debate  
pode conduzir a uma formação que subsidie, entre estudantes e profissionais da área, o  
desenvolvimento de habilidades para uma prática antirracista. Nesse sentido, consideramos que  
o aprofundamento em pesquisas que tenham como foco a investigação da relação entre eugenia,  
capitalismo dependente, questão social e serviço social, é de grande importância para a  
efetivação dos princípios e valores presentes em nosso Código de ética, que orientam para uma  
atuação pautada na participação da construção coletiva de uma sociabilidade sem discriminação  
de classe, etnia e gênero.  
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