Eliana Andrade da Silva
Segundo Simionatto15 (2004), a chegada de Gramsci à América Latina já pode ser
identificada desde os anos de 1920, por meio de José Carlos Mariátegui. É digno destacar que
não há uma recorrência direta às elaborações do pensador sardo, mas este contato se opera por
meio de Piero Gobetti.16 Ao Brasil, Gramsci chega em 1960 através da iniciativa de Carlos
Nelson Coutinho, Leandro Konder e Luiz Mario Gazzaneo. Neste período, suas ideias não
tiveram muita ressonância. Aliado a isto, a obra sofreu deturpações, fragmentação e seleção
devido aos interesses políticos, teóricos de seus interlocutores17. Somente a partir da segunda
metade dos anos de 1970, os escritos gramscianos passam a ser amplamente estudados e
divulgados. A aproximação de Gramsci ao itinerário ideopolítico do Serviço Social remete ao
processo de Renovação desta18 profissão, momento no qual esta realiza questionamentos sobre
seus fundamentos teórico-metodológicos, ético-políticos e técnico-operativos.
Na década de 1960, algumas ideias de Antonio Gramsci já circulavam pelo Brasil,
quando o Serviço Social apenas iniciava sua jornada de enfrentamento ao tradicionalismo e ao
conservadorismo19. No entanto, a década de 1970 traz modificações à direção profissional, não
obstante, se reproduzissem as iniciativas repressivas por parte do Estado. Marcante iniciativa
na perspectiva de crítica ao projeto modernizador pode ser observada na experiência elaborada
na Escola de Serviço Social da Universidade Católica de Minas Gerais. Trata-se do conhecido
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15 Em levantamento realizado por Simionatto (2004) a autora distingue dois momentos da chegada das concepções
de Gramsci: a) publicações da década de 1960 produzidas por Carlos Nelson Coutinho, Leandro Konder e
Michael Lowy e Otto Maria Carpeux; b) publicações da década de 1970 que, na década seguinte se ampliam,
representando um novo patamar de produções sobre a obra do autor sardo. São listados neste grupo autores
como Demerval Saviani, Moacir Gadotti, Paolo Nosella, Edmundo Fernandes Dias. Na passagem da década de
1970 para 1980, no contexto da reabertura política, ocorre uma nova iniciativa de inserção das ideias de
Gramsci, agora com bastante influência, colaborando para que o autor se torne referência teórica para várias
áreas de saber. Na ótica de Simionatto (2004), é nesta fase que o pensamento de Gramsci será incorporado de
forma global e mais apropriada.
16 Piero Gobetti foi um símbolo da luta contra o fascismo na Itália. Após a Segunda Guerra Mundial, passou a ser
comumente associado à figura de Antonio Gramsci nos debates sobre a democracia e o socialismo na Itália.
17 Segundo Coutinho (2003), no período entre 1966 e 1968 – em meio as constrições do ciclo autocrático burguês,
algumas das mais importantes obras de Gramsci foram publicadas em solo brasileiro. A decretação do AI 5
torna desfavorável o ambiente para tornar públicas suas ideias, deixando suas obras sob uma sombra de um
desconhecimento momentâneo. Simionatto (2004) destaca que no Brasil as ideias de Gramsci no interior da
esquerda brasileira que era influenciada pela Terceira Internacional, ou seja, pelo Marxismo-leninismo).
18
Conforme análises de Paulo Netto (2005) a Renovação do Serviço Social no Brasil se opera a partir de três
vertentes: Modernizadora (referenciada na matriz funcional-estruturalista, Reatualização do conservadorismo
(referenciada na matriz fenomenológica) e na Intenção de Ruptura (referenciada na matriz marxista).
19
Sob o contexto da Ditadura Civil Militar iniciada em 1964, a profissão encontra nas formulações da matriz
estrutural funcionalista as respostas às preocupações com o aperfeiçoamento do instrumental técnico e
operativo, especialmente com seus métodos de atuação. A sistematização destas preocupações ficou conhecida
como Documentos de Araxá (1967) e de Teresópolis (1970) – ambos filiados à tradição funcionalista norte-
americana. Conforme Simionatto (2004), estas formulações não ultrapassam as tendências conservadoras que
marcam o passado da profissão e estabelecem vínculos entre o Serviço Social e o projeto da autocracia burguesa.
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 204-222, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518