Reforma agrária e alternativas à fome: o Plantio Solidário na Zona da Mata Mineira
que operou a transformação da agricultura num ramo de negócios, no qual a produção de
alimentos se torna uma mera mercadoria a ser negociada para obtenção delucros.
A mercadorização dos alimentos é analisada pelo sociólogo Jean Ziegler (2013), em
entrevista ao jornalista Márcio Zonta para a Revista Brasil de Fato, como um negócio
altamente lucrativo. Para ele, o problema da fome está relacionado à questão da especulação
financeira, ao dumping (concorrência desleal de mercado) agrícola e à destinação das terrasà
produção de bicombustíveis. Afirma que é a primeira vez na história da humanidade que o
problema da fome está relacionado não à escassez de alimentos, mas ao excesso. Nesse sentido,
é fundamental destacarmos as contribuições de Josué de Castro, pioneiro no debate da fome,
já que “[...] os interesses e preconceitos de ordem moral e de ordem política e econômica de
nossa chamada civilização ocidental tornaram a fome um tema proibido, ou pelo menos pouco
aconselhável de ser abordado” (Castro, 1992, p. 29). Em sua mais reconhecida obra “Geografia
da Fome”, ele desmente a falsa ideia, amplamente aceita em seu tempo, de que fome era
resultante do aumento do contingente populacional ou da escassez. Josué caracteriza o
problema da fome como expressão das relações sociais e econômicas historicamente impostas
e reproduzidas, além da incapacidade (ou desinteresse) do Estado burguês de buscar
alternativas para enfrentar a questão, já que não vai de encontro aos interesses da classe
dominante.
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A fome no Brasil (...) é consequência, antes de tudo, de seu passado histórico,
com os seus grupos humanos, sempre em luta e quase nunca em harmonia com
os quadros naturais. Luta, em certos casos, provocada e por culpa, portanto,
da agressividade do meio, que iniciou abertamente hostilidades, mas, quase
sempre, por inabilidade do elemento colonizador, indiferente a tudo que não
significasse vantagem direta e imediata para os seus planos de aventura
mercantil. Aventura desdobrada, em ciclos sucessivos de economia destrutiva
ou, pelo menos, desequilibrante da saúde econômica da nação: o do pau-brasil,
o da cana-de-açúcar, o da caça ao índio, o da mineração, o da “lavoura
nômade”, o do café, o da extração da borracha e, finalmente o de certo tipo de
industrialização artificial, baseada no ficcionismo das barreiras alfandegárias
e no regime de inflação. É sempre o mesmo espírito aventureiro se insinuando,
impulsionando, mas logo a seguir corrompendo os processos de criação de
riqueza no país (...). É a impaciência nacional do lucro turvando a consciência
dos empreendedores e elevando-os a matar sempre todas as suas “galinhas de
ovos de ouro”. Todas as possibilidades de riqueza que a terra trazia em seu
bojo. Em última análise, esta situação de desajustamento econômico e social
foi consequência da inaptidão do Estado Político para servir de poder
equilibrante entre os interesses privados e o interesse coletivo (Castro, 1992,
p. 280-281).
Dessa forma, o autor caracteriza o subdesenvolvimento e a insegurança alimentar como
um produto inevitável do próprio desenvolvimento (nos moldes capitalistas), pautado na
exploração colonial e neocolonial está colocada em diferentes regiões do globo. A fome dá-se