Murilo Amadio Cipollone
Dessa forma:
Aqui, reservaremos o termo “sociedade urbana” à sociedade que nasce da
industrialização. Essas palavras designam, portanto, a sociedade constituída
por esse processo que domina e absorve a produção agrícola. Essa sociedade
urbana só pode ser concebida ao final de um processo no curso do qual
explodem as antigas formas urbanas, herdadas de transformações
descontínuas (Lefebvre, 1999, p. 15).
Importante, assim, ter em vista que a cidade, tal como hoje manifestada (“o urbano”)
nasce da industrialização, surgindo, pois, com o processo de explosão das antigas formações
urbanas. Tal definição, ao mesmo tempo em que acaba com a falsa perspectiva de que qualquer
cidade seja a sociedade urbana, é capaz, como dito, de vincular a análise às relações de
produção. Mais que isso, potencialmente, derruba a ideologia inapta a destacar as
descontinuidades históricas do desenvolvimento da cidade, as quais ocultam a real
especificidade da realidade urbana, estruturada para a reprodução das relações de produção,
como se passará a destacar.
Antes de tudo, porém, deve-se reiterar que, quando do começo da industrialização, a
cidade já tinha uma realidade vinculadora. Por motivos de delimitação temática, não será
possível proceder à reconstrução, como faz Lefebvre, dos diferentes tipos de cidade ao longo
da história. Interessa, contudo, reforçar, que a sociedade urbana emerge dos embates com as
formas de cidade que a precederam.
366
Destarte, foi a partir da generalização da industrialização que um processo de
urbanização intenso e distinto pôde ser levado a cabo. Com ele, pois, forma-se a cidade
industrial, que conduzirá à sociedade urbana. Já em 1845, Engels, ao descrever o processo
inglês de urbanização, isso revelava:
Há sessenta ou oitenta anos, a Inglaterra era um país como todos os outros,
com pequenas cidades, indústrias diminutas e elementares e uma população
rural dispersa, mas relativamente importante; agora é um país ímpar, com uma
capital de 2,5 milhões de habitantes, imensas cidades industriais, uma
indústria que fornece produtos para o mundo todo e que fabrica quase tudo
com a ajuda das máquinas mais complexas (Engels, 2008, p. 58).
Ato contínuo, Lefebvre destaca, que no curso do processo de industrialização e de
urbanização, ocorreu o que chama de implosão-explosão,
[..] ou seja, a enorme concentração (de pessoas, de atividades, de riquezas, de
coisas e de objetos, de instrumentos, de meios e de pensamento) na realidade
urbana, e a imensa explosão, a projeção de fragmentos múltiplos e disjuntos
(periferia, subúrbios, residências secundárias, satélites etc.) (Lefebvre, 1999,
p. 26).
Nesse cenário, o crescimento da produção industrial cria, assim, a sua própria realidade.
Por outras palavras, a indústria remaneja a cidade antiga de acordo com suas necessidades. A
Libertas, Juiz de Fora, v. 25, n. 1, p. 363-387, jan./jun. 2025. ISSN 1980-8518