Teoria social e método em Marx: materialismo,  
história e dialética  
Social theory and method in Marx: materialism, history and dialectics  
José Amilton de Almeida*  
Resumo: O objeto deste estudo são os  
fundamentos da teoria social marxiana, isto é,  
do assim chamado “materialismo histórico e  
dialético”. O objetivo é analisar alguns  
princípios e categorias fundamentais que  
perpassam o movimento teórico analítico  
marxiano, buscando elucidar a) o que é a  
dialética é qual a concepção de história expressa  
no materialismo de Marx? b) o que é o trabalho  
e qual a concepção de humanidade para a sua  
teoria social: a relação homem/natureza e  
sujeito/objeto? c) O que é e como opera a  
alienação (e a ideologia) na sociabilidade  
humana e de que modo poderia ela ser superada  
Abstract: The object of this study is the  
foundations of Marxian social theory, that is, of  
the so-called “historical and dialectical  
materialism”. The objective is to analyze some  
fundamental principles and categories that  
permeate the Marxian analytical theoretical  
movement, seeking to elucidate a) what is  
dialectics and what is the conception of history  
expressed in Marx's materialism? b) what is  
work and what is the conception of humanity for  
your social theory: the relationship between  
man/nature and subject/object? c) What is and  
how does alienation (and ideology) operate in  
human sociability and how could it be overcome  
from an emancipatory perspective? The  
methodology was based on bibliographical  
research and review, recovering syntheses,  
reflections and summaries that were  
systematized throughout doctoral research.  
Some of these fragments were carefully selected  
numa  
perspectiva  
emancipatória?  
A
metodologia se deu com base em pesquisa e  
revisão bibliográficas, recuperando sínteses,  
reflexões  
e
resumos que foram sendo  
sistematizados ao longo de uma pesquisa de  
doutorado. Alguns desses fragmentos foram  
cuidadosamente  
selecionados  
e,  
aqui,  
and, here, ordered to make  
a
modest  
ordenados para operar uma modesta  
contribuição com o estudo do método da teoria  
social marxista.  
contribution to the study of the method of  
Marxist social theory.  
Palavras-chaves: Materialismo histórico e  
dialético; Ser social; Trabalho; Trabalho  
alienado; Comunismo.  
Keywords:  
Historical  
and  
dialectical  
materialism; Being social; Work; Alienated  
work; Communism.  
*
Assistente Social, graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Mestre em Serviço Social pela  
Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e doutor em Serviço Social pela Universidade do Estado do Rio de  
Janeiro (UERJ). Professor da Faculdade de Serviço Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).  
DOI: 10.34019/1980-8518.2024.v24.43722  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 29/02/2024  
Aprovado em: 18/06/2024  
Teoria social e método em Marx: materialismo, história e dialética  
Introdução  
O objeto sobre o qual discorre o presente artigo são os fundamentos da teoria social  
marxiana, isto é, do método elaborado por Marx – e Engels –, que convencionou ser chamado  
de materialista histórico e dialético. Este novo modo de absorver cientificamente a realidade  
social, não apenas enriqueceu e influenciou como revolucionou teórico-metodologicamente a  
filosofia, a teoria política, a teoria econômica e as próprias ciências sociais, alçando-as a um  
novo patamar, e ofereceu um instrumento de análise concreta da realidade às classes exploradas,  
a fim de guiar prática e conscientemente sua emancipação.  
Nesse sentido, o objetivo, aqui expresso, é expor algumas características fundantes da  
teoria social marxiana, observando o caminho e as fontes primordiais através dos quais Marx  
transita do direito à filosofia, da filosofia à economia política, elabora à crítica da economia  
política com a qual desmistifica o modo de produção capitalista a partir de sua própria base  
econômica e científica, supera os maiores filósofos e economistas que o precederam, assim  
como seus contemporâneos e, desde uma juventude de aspiração democrata radical (Netto,  
2020), termina por preconizar o comunismo como forma necessária de emancipação da  
exploração humana.  
Com base em pesquisa bibliográfica e análise teórica, recorre-se a textos de Marx e de  
Engels, além de intérpretes marxistas como Leandro Konder, José Paulo Netto e Luckács, a fim  
de entender os fundamentos principais do materialismo histórico e dialético e como essa  
ciência contribui para a análise (e transformação) da sociedade na qual vigora a exploração  
de classes. Para isso, o manuscrito estrutura-se didaticamente a partir de três questões  
interligadas: a) o que é a dialética é qual a concepção de história expressa no materialismo  
marxista? b) o que é o trabalho e qual a concepção de humanidade para essa teoria social: a  
relação homem/natureza e sujeito/objeto? c) O que é e como opera a alienação (e a ideologia)  
na sociabilidade humana e de que modo poderia ela ser superada numa perspectiva  
emancipatória?  
19  
Ademais, espera-se que este texto possa ser mais uma contribuição para o debate acerca  
do núcleo de fundamentação teórico- metodológicos da vida social e da dimensão ético-política  
da formação profissional de assistentes sociais, oferecendo um estudo sobre os fundamentos da  
vida social tal qual é apreendida na teoria social marxiana – e marxista. Vamos a cada uma das  
três questões então levantadas.  
José Amilton de Almeida  
Dialética e concepção materialista da história em Marx: o longo processo de  
edificação de um método novo  
O material que ora temos em mão não é mais do que uma modesta aproximação a alguns  
elementos fundamentais da obra de Marx, buscando, sobretudo, os fundamentos da sua filosofia  
e da “revolução copernicana” que, em suas mãos, sofreu a dialética ao ser posta em pé e, com  
isso, ser trazida do universo idealista para o materialismo. As categorias, aqui debatidas,  
encontram-se em obras de Marx como Introdução (de Crítica da Filosofia do Direito de Hegel);  
Sobre a questão judaica; Manuscritos econômico-filosóficos; A miséria da filosofia (uma  
resposta à Filosofia da miséria de Phoudhon); O capital: crítica da economia política; A  
Sagrada família ou Crítica da crítica crítica – de autoria de Marx e Engels; e A ideologia alemã  
– também de autoria de ambos1, dentre outras.  
Conforme Netto (2011) chama a atenção, sem referência a Hegel, Marx é  
incompreensível. Hegel é um dos últimos grandes expoente da fase ascendente da burguesia de  
quem Marx herdou a concepção dialética2, que marca, do início ao fim, o conjunto de sua obra  
e compõe a ordenação medular do método analítico-critico que, então, desenvolveu.3 Ao longo  
de sua formação e produção intelectual, o autor se desloca do terreno do Direito para o da  
Filosofia, e da filosofia para o da economia política (Netto, 2020). Ele supera e conserva de  
cada qual seu núcleo racional, enriquecendo seu modo de abarcar a realidade e, com os  
fundamentos da crítica do Direito, da religião, da filosofia, da política e da economia política,  
constrói suas “pesquisas para análise concreta da sociedade moderna, aquela que se engendrou  
nas entranhas da ordem feudal e se estabeleceu na Europa Ocidental na transição do século  
XVIII ao XIX: a sociedade burguesa”4 (Netto, 2011, p. 17). As fontes principais que constituem  
20  
1 Importantes fragmentos dessas obras foram organizados por Netto (2012) no livro O leitor de Marx – uma das  
principais referências bibliográficas utilizadas na construção do presente estudo.  
2 Em Hegel, porém, Marx descobriu que a dialética estava de cabeça para baixo, pois o espirito era absoluto em  
relação ao objeto; o Estado era o demiurgo da sociedade civil; o sujeito, mesmo compondo unidade com seu objeto  
e história, aparecia como o movimento do próprio conceito em sua autodeterminação. Sua dialética era, por isso,  
idealista, apesar de constituir um “idealismo objetivo”, a despeito do “idealismo subjetivo” que habitava a filosofia  
e era repudiada por Marx. A dialética precisava, pois, ser posta em pé para desvelar o “invólucro místico” que  
envolvia a natureza humana, a qual possui no trabalho a condição primária do seu ser. Portanto, o trabalho constitui  
o “primeiro ato”, o “fato histórico” (Marx; Engels, 2009) preliminar da autoconstrução humana: assenta-se no fato  
de o ser humano produzir os próprios meios com que satisfazer suas necessidades, criar novas necessidades e,  
concomitantemente, desenvolver relações que se complexificam constantemente, transformando sua realidade  
social, seu próprio intercâmbio, e transformando a si mesmo como humano.  
3 O próprio Marx reconheceu ser “abertamente discípulo daquele grande pensador [Hegel]” e afirmou ter jogado,  
“várias vezes, com seus modos de expressão peculiares”. Para Marx (2006, p. 28-29), “a mistificação por que  
passa a dialética nas mãos de Hegel não o impediu de ser o primeiro a apresentar suas formas gerais do  
desenvolvimento, de maneira ampla e consciente”.  
4
Segundo Netto, esta pesquisa, de que resultarão as bases da sua teoria social ocuparão Marx de 1840 até sua  
morte, “e poderão localizar o seu ponto de arranque nos Manuscritos econômico-filosóficos de 1844 e a sua  
culminação dos materiais constitutivos d’ O capital”.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 18-41, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Teoria social e método em Marx: materialismo, história e dialética  
a matéria-prima do seu método foram elucidadas por Lenin (2003), num texto publicado em  
1913, sob o título: As três fontes e as três partes constitutivas do Marxismo. São elas: (1) a  
filosofia alemã; (2) a economia política inglesa; e (3) o socialismo francês. Daí resultaram (1)  
o materialismo como a filosofia do marxismo; (2) a crítica da economia política como a crítica  
da sociedade capitalista, burguesa; e o socialismo científico, que apreende a luta de classes  
como o motor da história e elucida o proletariado no seu papel revolucionário diante dela.  
Marx não apenas incorpora os principais expoentes dessas “três fontes” como os supera  
e avança. É “assim que ele trata a filosofia de Hegel, os economistas políticos ingleses  
(especialmente Smith e Ricardo) e os socialistas que o precederam (Owen, Fourier)” (Netto,  
2011, p. 18); e é assim também, que, “avançando criticamente a partir do conhecimento  
acumulado, Marx empreendeu a análise da sociedade burguesa, com o objetivo de descobrir a  
sua estrutura e a sua dinâmica” (Netto, 2011, p. 18-19). Essa empreitada configura “um  
processo longo de elaboração teórica, no curso da qual Marx foi progressivamente  
determinando o método adequado para o conhecimento veraz, verdadeiro, da realidade social”  
(Netto, 2011, p. 19). Em Marx, teoria significa “a reprodução ideal do movimento do objeto  
pelo sujeito que pesquisa: pela teoria o sujeito reproduz em seu pensamento a estrutura e a  
dinâmica do objeto que pesquisa” (Netto, 2011, p. 21).  
Se temos em vista a ciência como método para se chegar ao conhecimento de algo,  
significa esperar dela que seja capaz de, mediante procedimentos investigativos e analíticos e  
instrumentos adequados para tal, reproduzir o movimento concreto da realidade de modo a  
transpô-la para o âmbito do pensamento. “Se isto se consegue, ficará espelhada, no plano ideal,  
a vida da realidade pesquisada, o que pode dar a impressão de uma construção a priori” (Marx,  
2006, p. 28).  
21  
Já nos Manuscritos econômico-filosóficos, de 1844, Netto (2011, p. 29) lembra que,  
ainda que Marx não tenha penetrado profundamente na economia política, “isso não  
compromete a segurança do autor no manuseio da dialética, manuseio que se aprofunda na  
relação com Engels”. Em A sagrada família ou crítica da crítica crítica, publicada em 1845  
sob autoria de ambos, a dialética adquire um trato mais acabado. Nessa obra, recorda Netto  
(2011, p. 29): “em várias passagens, os dois jovens autores apontam a perspectiva teórica a  
partir da qual criticam filósofos como os quais, até pouco tempo antes, mantinham boas relações  
intelectuais” (Netto, 2011, p. 29). Formulações mais precisas de sua concepção teórica são  
desenvolvidas em A Ideologia alemã, escrita entre 1845/1846 por Marx e Engels (2009) e no  
interior da qual o materialismo contemplativo de Feuerbach é novamente tomado à crítica. Em  
As 11 teses sobre Feuerbach, na 11ª Tese Marx (2009) enfatiza o papel da filosofia materialista  
José Amilton de Almeida  
diante da história: a partir de então, será o de transformá-la e não simplesmente a interpretar e  
contemplar. O método filosófico consistirá, assim, em partir da vida real dos homens, das suas  
condições reais de vida, dos homens reais, ativos, de carne e osso. Desse modo, a filosofia  
materialista marx-engelsiana arranca do modo de produção humano, do desenvolvimento de  
suas forças produtivas, das relações sociais com as quais a consciência social se encontra  
entrelaçada e a partir das quais “os homens”, no papel de sujeitos, “fazem história”, mas não  
como querem e sim sob circunstâncias pré-existentes, que não são de sua escolha (Marx;  
Engels, 2009, Netto, 2011, 2012).  
Marx era herdeiro de esquerda da filosofia hegeliana e feuerbachiana: da primeira, ele  
herda a dialética; da segunda, o materialismo. Mas “tanto o materialismo feuerbachiana quanto  
a dialética idealista de Hegel passaram por ‘uma simbiose crítica, por um processo de síntese  
original, para servir de fundamento norteador às pesquisas marxiana’” (Frederico, 1995 apud  
Forti, 2010, p. 22).  
Etimologicamente, sabe-se que a palavra dialética vem do grego, sendo formada pelo  
“prefixo dia (que indica reciprocidade ou intercambio) e pelo vocábulo leigen ou pelo  
substantivo logos (o que significa que a palavra dialética tem a mesma origem que a palavra  
diálogo)” (Konder, 1988, p. 1). Ademais, “como nota Foulquié, que já havia chamado atenção  
para as ambiguidades do termo dialética, “o termo logos tanto significa ‘palavra’ ou ‘discurso’,  
como significa ‘razão’ (Konder, 1988, p. 1), e, conforme Konder (1988, p. 2), “essa cisão  
operada no interior do termo logos não podia deixar de influenciar o termo dialética”, pondo  
em destaque, com base na classificação feita por Nicola Abbagnano, o desdobramento da  
dialética em quatro conceitos distintos mais comumente utilizados: “1) método da divisão; 2)  
lógica do provável; 3) lógica; 4) síntese de opostos. Estes quatro conceitos [...] derivam,  
respectivamente, da doutrina de Platão, de Aristóteles, dos estoicos e de Hegel” (Konder, 1988,  
p. 2).  
22  
Seguindo seu desenvolvimento histórico-cronológico, Konder (1988, p. 3) observa que,  
depois da filosofia helenística e dos estoicos, “nos séculos que precederam o Renascimento, a  
dialética oscilava, sem encontrar um espaço próprio”, e ao citar um estudioso do tema, relata  
que “Eugene Garin escreveu a respeito do que se passava nessa época: ‘a dialética parece  
constantemente exposta à tentação de se confundir, às vezes com a lógica, outras vezes com a  
retórica’”. E assim, “até a passagem do século XVIII para o século XIX”, analisa Konder (1988,  
p. 3), “a ‘inteligência dialética não chega a inaugurar para a ‘dialética’ uma concepção diversa  
das três já mencionadas. [...]. A dialética continua marcada por critérios que se referem mais à  
forma do que ao conteúdo”. Hegel é o filósofo que iria romper este limbo. Com ele, “um novo  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 18-41, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Teoria social e método em Marx: materialismo, história e dialética  
conceito de dialética foi elaborado”:  
Com o pensador alemão, a questão da dialética não se limitava ao campo  
estrito da metodologia e nem cabia no âmbito das discussões sobre a teoria do  
conhecimento; ela pressupunha toda uma nova teoria do ser. Segundo Hegel,  
a realidade é intrinsecamente contraditória e existe em permanente  
transformação; e o modo de pensar que nos permite conhecê-la não pode  
deixar de ser, ele mesmo dinâmico. Nosso modo de ser consiste em plasmar o  
mundo à nossa feição. O modo de existir do mundo consiste, por sua vez, em  
mudar, sob o efeito da nossa intervenção. E nós nos transformamos, ao agir.  
Tudo, portanto, é instável [...]  
O novo conceito de dialética desenvolvido por Hegel é mais do que mera  
‘síntese de opostos proposta por Abbagnano para caracterizá-lo: é todo um  
complexo sistema, baseado numa original concepção do absoluto. O absoluto,  
na filosofia de Hegel, precisa incorporar todos os momentos significativos do  
movimento pelo qual se realiza, assimilando tanto a oposição como o  
negativo, superando-os numa síntese viva, para poder se estruturar,  
rigorosamente como ‘sistema científico: ‘a verdadeira figura em que a verdade  
existe’ – afirma Hegel – ‘só pode ser o sistema científico dela’. O sentido do  
movimento realizado – o ‘sistema’ – só pode ser compreendido do ângulo do  
resultado alcançado. Na Fenomenologia do Espírito, o saber absoluto’  
pressupõe – e simultaneamente elucida – a ‘experiência da consciência’ em  
todas as suas figuras, desde a ‘certeza sensível’ e da ‘percepção’ até o ponto  
de chegada proporcionado pelo ‘espírito’, que adquire a plena consciência de  
si mesmo, depois de superar as limitações do ‘discernimento’ (‘Vrstand’), da  
‘consciência de si’ e da ‘razão’ (‘Vernunft’) (Konder, 1988, p. 4- 5).  
Como registrou Netto (2020), “a relação de Marx com o pensamento hegeliano foi uma  
relação profunda e duradoura, concretizando o que o próprio Hegel denominava por  
superação”. Para Hegel, “superação (Aufhebung, que se traduz também por suprassunção)  
denota um processo que”, conforme o filosofo, “é ao mesmo tempo um negar e um conservar’”  
(Hegel, 2008, p. 96 apud Netto, 2020, p. 47). Netto (2020, p. 49) recorda, a partir daí, que  
“Marx simultaneamente negou e conservou de modo crítico (elevando-os a outro nível)  
elementos essenciais da elaboração hegeliana”, razão pela qual “a sua própria obra não se torna  
plenamente inteligível se não se considerar a relevância que ela ofereceu a incorporação crítica  
do contributo hegeliano”. Foi o próprio Marx que escreveu sobre A fenomenologia do espírito:  
23  
A grandeza da Phänomenologie de Hegel e do seu resultado final – da  
dialética, da negatividade como princípio motor gerador – é [...] que Hegel  
apreende a autogeração do homem como um processo [...], apreende a  
essência do trabalho e concebe o homem objetivo, verdadeiro, porque o  
homem real, como resultado do seu próprio trabalho (Marx apud Netto, 2020,  
p. 124).  
Um resumo do “idealismo objetivo” de Hegel, em oposição ao “idealismo subjetivo”, é  
oferecido por Netto (2020, p. 48, grifos do autor) em sua mais recente e rica obra Karl Marx:  
uma biografia:  
Num primeiro momento do seu longo labor filosófico, Hegel – em empreitada  
teórica parcialmente compartilhada com Schelling – criticou o idealismo  
José Amilton de Almeida  
subjetivo de Kant-Fitche e estabeleceu, no curso dessa crítica, o moderno  
idealismo objetivo. Foi no marco desse idealismo objetivo que ele,  
descobrindo e formulando no desenvolvimento ulterior de suas pesquisas um  
riquíssimo acervo categorial, ergueu um sistema filosófico compreensivo e  
inclusivo da história (da natureza e da sociedade). Essa história Hegel a (ex)  
pôs como um largo processo de (auto)desenvolvimento do Espírito, cuja  
efetividade se explicitava na sua demiúrgica atividade objetivada na natureza  
e na sociedade. Natureza e sociedade eram produtos da dinâmica constitutiva  
do Espírito e demonstravam a sua peculiaridade mais essencial: a de serem  
movimento perene, tensionada e movidas (bem como o próprio Espírito) por  
contradições internas, endógenas. Ambos, o Espírito e o mundo, aparecem,  
assim, em Hegel, como processualidade – e processualidade automobilizada,  
uma vez que seu dínamo reside na contraditoriedade imanente que lhes é  
própria. Tudo é processo, movimento, transformações quantitativas  
imparáveis que redundam em transformações qualitativas – do que não resulta  
um conjunto caótico ou aleatório, regido pelo arbítrio ou pelo acaso. Ao  
contrário: O Espírito, no seu processo evolutivo imanente, obedecendo às suas  
próprias leis, contradiz-se a si mesmo e nessa contradição se desdobra noutra  
efetividade, o mundo, que também é dinamizado e se transforma pelo seu  
próprio movimento contraditório e, ao fim e ao cabo, ambos se reconciliam e  
instauram-se numa unidade que reconstitui não a configuração original do  
Espírito nem do mundo, mas numa totalidade articulada então por um Espírito  
que se sabe e a si mesmo e se reconhece para si num mundo com inéditas  
qualidades, e ambos acabam por unir-se numa plena identidade. Todo esse  
processo perfaz a história, comandada por uma racionalidade [...] cujo centro  
reside sempre no Espírito.  
Netto (2020, p. 49) ressalta, porém, o problema já apontado por Engels da “contradição  
entre o método e o sistema de Hegel”. De acordo com o biografo de Marx, a leitura engelsiana  
também fazia jus a Hegel ao reconhecer que a construção filosófica deste “se operou mediante  
uma elaborada dialética que, embora idealista, tomou o ser, a realidade, como processualidade:  
ser é devir, movimento imanente, constante (auto)transformação; no entanto”, advertiu, “essa  
metodologia se consuma num sistema que encerra a história quando o Espírito se realiza no  
estágio final, o do Espírito absoluto” (Netto, 2020, p. 49). Vê-se que, conforme se refere Netto  
(2020, p. 49, grifos do autor): “trata-se mesmo de uma teoria do [...] fim da história” – o que  
evidencia, igualmente, como é profunda e longínqua a moderna raiz da “teoria pós-moderna”  
do fim da história. Desse modo, “a contradição hegeliana é inequívoca: se o método é  
revolucionário, o sistema é conservador” (Netto, 2020, p. 49, grifos do autor)5.  
24  
5 Atendo-se mais detalhadamente nesta contradição entre “o método e sistema hegeliano”, Cornu (1975, v. I, p.  
185 apud Netto, 2020, p. 49), resumiu: “A concepção hegeliana de desenvolvimento dialético da história  
implicava, de fato, um devir incessante, uma contínua transformação na qual não se pode tomar como limite e  
como fim uma história determinada. Com efeito, pelo progresso dialético, toda realidade de ordem econômica,  
política ou social, tende a perder o caráter de necessidade, ao mesmo histórica e lógica, que tem em determinado  
momento; torna-se, portanto, irracional e deve ceder lugar a uma nova realidade, destinada, por sua vez, a  
desaparecer um dia. Entretanto, contrariamente a essa concepção dialética, Hegel, inclinado cada vez mais ao  
conservadorismo, tendia a atribuir às instituições de seu tempo – especialmente à religião cristã e ao Estado  
prussiano – um valor absoluto e a deter nelas o curso da história”.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 18-41, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Teoria social e método em Marx: materialismo, história e dialética  
Com efeito, Netto (2020, p. 49) constata que, “dadas as inclinações do último Hegel” –  
que embora na juventude tivesse se entusiasmado com a revolução francesa, sem, contudo,  
nunca se aproximar de suas tendências radicais, ao cabo terminou por se mostrar politicamente  
inclinado à monarquia e impressionado com os domínios napoleónicos – “compreende-se [...]  
que as inferências políticas extraídas do seu sistema filosófico se mostrassem compatíveis com  
o regime prussiano”. Assim como compreende-se, também, porque do filosofo alemão ter visto  
no Estado e na sociedade civil burguesa a mais desenvolvida e derradeira forma de (auto)  
realização do Espírito: o Espírito absoluto. Hegel se empenhou em “apreender e expressar o  
verdadeiro não como substância, mas também, na mesma medida, como sujeito’”, no entanto,  
para Marx,  
o autor da Fenomenologia do espírito não se deu plenamente conta de como  
era concreta a atividade desse sujeito. ‘O único trabalho que Hegel conheceu  
e reconhece’ – escreve Marx – é o trabalho espiritual abstrato [...] ‘A essência  
humana, o ser humano, equivale para Hegel, à consciência de si’. Essa crítica,  
formulada nos Manuscritos de 1844, e retomada na Sagrada Família: ‘Hegel  
transforma o homem em homem da consciência em si, em vez de reconhecer  
na consciência de si a consciência de si do homem, quer dizer, de um homem  
real, que vive num mundo real, objetivo, e é condicionado por ele’ (Konder,  
1988, p. 5).  
Não obstante ter assumido “o conceito hegeliano de dialética [...], Marx foi levado a  
modifica-lo, tornando-o ainda mais complexo do que já era no pensamento de Hegel” (Konder,  
1988, p. 5). Sob o escopo marxiano, a dialética hegeliana seria submetida à crítica da filosofia  
materialista e, com ela, sofre uma inversão, já que, em Hegel, a dialética estava de cabeça para  
baixo. É assim que Marx chega ao trabalho como o centro da autocriação humana. A esta  
“angulação filosófico-antropológica” agrega-se a angulação “econômico-política e histórico-  
social” (Netto, 2020) com as quais Marx abarca a sociedade burguesa em sua estrutura,  
movimento e contradições econômicas, políticas e ideológicas. Não obstante, apreende o  
antagonismo entre capital e trabalho, elucida a luta de classes como expressão desse  
antagonismo e alça o trabalhador à condição de sujeito revolucionário, isto é, antítese do capital,  
capaz de libertar a humanidade. Por isso, para Netto (2020), a teoria marxiana é uma “teoria  
social revolucionária”6.  
25  
Leiamos, a seguir – numa passagem um tanto quanto longa, porém imprescindível –, a  
interpretação dialética e materialista da luta de classes e, nela, o destaque do papel ativo do  
proletariado para Marx, mostrando-se o porquê de sua teoria social ser autenticamente  
6
Notavelmente, “a perspectiva de Marx implicava não só uma reavaliação do papel do trabalho material na  
autocriação e na autotransformação humana, como também exigia a reavaliação do papel dos trabalhadores como  
força material capaz de, nas condições atuais, dar prosseguimento à autotransformação histórica da humanidade”  
(Konder, 1988, p. 6).  
José Amilton de Almeida  
revolucionária. Aqui, sua dialética e materialismo como unidade teórico-metodológica se  
mostra inteira e cristalinamente:  
Proletariado e riqueza são antíteses. E nessa condição formam um todo.  
Ambos são formas do mundo da propriedade privada. Do que aqui se trata é a  
posição determinada que um ou outro ocupam na antítese. Não basta  
esclarecê-los como os dois lados – ou extremos – de um todo.  
A propriedade privada na condição de propriedade privada enquanto riqueza,  
é obrigada a manter sua própria existência e com ela a existência de sua  
antítese, o proletariado. Esse é o lado positivo da antítese, a propriedade  
privada que se satisfaz a si mesma.  
O proletariado na condição de proletariado, de outra parte, é obrigado a  
suprassumir a si mesmo e com isso à sua antítese condicionante, aquela que o  
transforma em proletariado: a propriedade privada. Esse é o lado negativo da  
antítese [...], a propriedade privada que dissolve e se dissolve.  
A classe possuinte e a classe do proletariado representam a mesma  
autoalienação humana. Mas a primeira das classes se sente bem e aprovada  
nessa autoalienação, sabe que a alienação é seu próprio poder e nela possui a  
aparência de uma existência humana; a segunda, por sua vez, sente-se  
aniquilada nessa alienação, vislumbra nela sua impotência e a realidade de  
uma existência desumana. Ela é, para fazer uso de uma expressão de Hegel,  
no interior da objeção, a revolta contra essa objeção, uma revolta que se vê  
impulsionada necessariamente pela contradição entre sua natureza humana e  
sua situação de vida, que é a negação, franca e aberta, resoluta e ampla dessa  
mesma natureza.  
Dentro dessa antítese o proprietário privado é, portanto, partido conservador,  
e o proletariado o partido destruidor. Daquela parte a ação que visa manter a  
antítese, dessa a ação de seu aniquilamento.  
Em seu movimento econômico-político, a propriedade privada se impulsiona  
a si mesma, em todo caso, à sua própria dissolução; contudo, apenas através  
de um movimento independente dela, inconsciente, contrário a sua vontade,  
condicionado pela própria natureza da coisa: apenas enquanto engendra o  
proletariado enquanto proletariado, enquanto engendra a miséria consciente  
de sua miséria espiritual e física, enquanto engendra a desumanização  
consciente – e portanto suprassunsora – de sua própria desumanização. O  
proletariado executa a sentença que a propriedade privada pronuncia sobre si  
mesma ao engendrar o proletariado, do mesmo modo que executa a sentença  
que o trabalho assalariado pronuncia sobre si mesmo ao engendrar a riqueza  
alheia e a miséria própria. Se o proletariado vence, nem por isso se converte,  
de modo nenhum, no lado absoluto da sociedade, pois ele vence de fato apenas  
quando suprassume a si mesmo e à sua antítese. Aí sim tanto o proletariado  
quanto sua antítese condicionante, a propriedade privada, terão desaparecido  
(Marx apud Netto, 2020, p. 137-138).  
26  
Ao compreender a sociedade burguesa em seu desenvolvimento histórico, enquanto uma  
totalidade movida por contradições e antagonismos de classes, o papel da filosofia materialista  
dialética passa a ser, na elaboração marxiana, o de intervir objetivamente no mundo. Nessa  
perspectiva, a filosofia – assegura Marx – ‘não pode se realizar sem a superação do proletariado;  
e o proletariado não pode se superar sem a realização da filosofia’” (Marx apud Konder, 1988,  
p. 6). Por isso, na Crítica da filosofia do direito de Hegel, Marx (2010, p.151) ressaltou: ainda  
que “a arma da crítica não” possa “substituir a crítica da arma”; ainda que “o poder material”  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 18-41, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Teoria social e método em Marx: materialismo, história e dialética  
tenha de ser “derrubado pelo poder material”, “a teoria também se torna força material quando  
se apodera das massas”. Na teoria social marxiana, o proletariado deve apoderar-se da teoria e  
a teoria apoderar-se do proletariado7.  
Ocorre que, em Hegel, conforme já enunciamos, “ela [a dialética estava] de cabeça para  
baixo”. Por isso, para Marx (2006, p. 10), era “preciso colocá-la sobre seus próprios pés para  
descobrir-lhe o núcleo racional, sob o invólucro místico” e, para tal, o caminho que vem sendo  
delineado – que tem no processo de autoconstrução do ser social mediante sua atividade  
sensível a centralidade ontológica – leva ao conceito de práxis, que significa “a atividade prática  
vital, material, que é o trabalho” (Konder, 1988, p. 10-11, grifos do autor). Compete-nos, assim,  
mirar mais de perto do que se trata o trabalho e qual a concepção de humanidade adjacente à  
teoria social marxiana.  
O trabalho e a concepção de humanidade na teoria social marxiana: relação  
homem/natureza e sujeito/objeto  
Partindo da perspectiva antropológico-filosófica que Marx assume na sua elaboração  
teórica, o trabalho é o “primeiro ato”, isto é, “o fato histórico” através do qual “os homens”  
afastam as barreiras naturais e passam a se distinguir dos outros animais humanizando-se.  
Através do trabalho o ser humano cria a si próprio, transforma a natureza, autoconstrói-se e  
autotransforma-se no processo.  
27  
O trabalho é sempre uma relação social: a relação de indivíduos direta ou indiretamente  
associados, e essa associação é uma condição imanente da produção e reprodução, material e  
espiritual, da vida humana. O trabalho põe um elemento inédito na natureza pré-existente: o ser  
social, o que desenvolve, no seu salto ontológico ao afastar as barreiras naturais, uma espécie  
de “segunda natureza”, ou seja, uma natureza modificada e socializada, na definição de Luckács  
(2018), uma “causalidade posta”.  
É o trabalho que, na analogia marxiana (Marx, 2006, p. 211, grifos nossos), distingue a  
atividade de uma aranha da de um tecelão e diferencia o “pior arquiteto da melhor abelha”. O  
processo de trabalho, como tal, isto é, o movimento entre homem e natureza que resulta num  
produto novo, transformado, que satisfaz necessidades humanas e que, não obstante, “já existia  
antes na imaginação do trabalhador”, articula-se por meio de três componentes fundamentais:  
7
Konder afirma que, “antes de Marx, os encontros da dialética com o pensamento político de ‘esquerda’ eram  
fortuitos, ocasionais. Marx modificou esse quadro, porque tratou de entrelaçar, de um modo sistemático, uma  
concepção materialista da história (o reconhecimento do processo material que cria as condições nas quais  
amadurece e se organiza as forças capazes de promover a mudança) como uma concepção dialética da revolução  
(o reconhecimento da importância da intervenção ativa dos homens no mundo, fazendo política, fazendo história)”  
(Konder, 1988, p. 8, grifos nossos).  
José Amilton de Almeida  
“1) a atividade adequada a um fim, isto é o próprio trabalho; 2) a matéria a que se aplica o  
trabalho, o objeto de trabalho; e 3) os meios de trabalho, o instrumental de trabalho” (Marx,  
2006, p. 212). O modo específico através do qual esses três elementos são apropriados no curso  
do desenvolvimento das forças produtivas e das relações sociais determina as diferentes épocas  
históricas (Marx, 2008).  
Para Marx, a despeito do idealismo – que parte da ideia de homem e não do homem  
materialmente existente – e do materialismo contemplativo – que compreende apenas a  
atividade teórico como realmente humana –, “a raiz para o homem é o próprio homem” (Marx,  
2010, p. 151). Sendo assim, a essência da natureza humana é a própria humanidade, que é  
constituída e constitutiva também da natureza (orgânica e inorgânica) com a qual o ser social  
se exterioriza, se objetiva e se subjetiva ao produzir e consumir seu próprio produto social. Não  
obstante, esse ser não elimina a natureza existente em si ou fora de si como condição de si  
mesmo. A relação não é dicotômica, forma, isto sim, uma unidade entre natureza humanizada  
e humano naturalizado. Longe de uma cisão, Luckács (1979. p. 17 apud Forti, 2010, p. 27)  
argumenta que “o ser social – em conjunto em cada um de seus processos singulares – pressupõe  
o ser da natureza inorgânica e orgânica”, além de enfatizar que “não se pode considerar o ser  
social como independente do ser da natureza, como antítese que se excluem, o que é feito por  
grande fato da filosofia burguesa quando se refere aos chamados ‘domínios do espírito’”. Ele  
adverte que “a ontologia do ser social excluí a transposição simplista, materialista vulgar, das  
leis naturais para a sociedade, como era moda, por exemplo, na época do ‘darwinismo  
social’[...]”. Para o filósofo húngaro, “esse desenvolvimento [...] é um processo dialético, que  
começa com um salto, com o pôr teleológico do trabalho, não podendo ter nenhuma analogia  
na natureza” (Lukács, 1979, p. 17 apud Forti, 2010, p. 27).  
28  
O “pôr teleológico do trabalho” significa que “o primeiro ato histórico pelo qual  
podemos distinguir os homens dos animais não é o de pensarem, mas o de começarem a  
produzir os seus meios de vida”, o que faz brotar “uma nova realidade humanizada” a partir da  
qual “temos a práxis, cuja forma privilegiada é o trabalho” (Barroco, 2001 apud Forti, 2010 p.  
28). Na verdade, a categoria trabalho, em Marx, não põe uma relação sequencial ou hierárquica  
entre atividade e pensamento, entre aquilo que vem antes e aquilo que vem depois, são, antes,  
concomitantes, momentos de uma unidade, de uma totalidade que se move mediante  
contradições. Marx e Engels (2009, p. 43-44) descobriram “que os homens também têm  
‘consciência’, mas advertiram, a têm, “logo de início, não como consciência ‘pura’. O espírito  
tem consigo de antemão a maldição de estar ‘preso’ à matéria, a qual nos surge aqui na forma  
de camadas de ar em movimento, de sons, numa palavra, da linguagem [Sprache]”. Aliás, a  
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Teoria social e método em Marx: materialismo, história e dialética  
própria “linguagem é tão antiga quanto a consciência – a linguagem é a consciência real prática  
que existe também para outros homens e que, portanto, só assim também existe para mim”, e  
conforme os autores, “a linguagem só nasce, como a consciência, da necessidade [Bedürfinis],  
da necessidade orgânica [Notdurft], do intercâmbio com outros homens” (Marx; Engels, 2009,  
p. 44, grifos nossos). Na filosofia materialista de Marx e Engels, o homem é apreendido em  
toda sua significação como “um ser da natureza ativo” (Netto, 2020, p. 146), pois sua atividade  
é uma “atividade ativa”, por isso, “toda sua vida é essencialmente prática” (Netto, 2020, p. 148).  
São três as premissas básicas, os incrementos primordiais que propiciam a formação do gênero  
humano, dos quais a ciência materialista não pode se furtar: inicialmente,  
[1] Devemos começar por constatar o primeiro pressuposto de toda existência  
humana, e, também portanto, de toda a história, a saber, o pressuposto de que  
os homens têm de estar em condições de viver para fazer história. Mas, para  
viver, precisa-se, antes de tudo, de comida, bebida, moradia, vestimentas e  
algumas coisas mais. O primeiro ato histórico é, pois, a produção dos meios  
para satisfação dessas necessidades, a produção da própria vida material, e  
este é, sem dúvida, um ato histórico, uma condição fundamental de toda a  
história, que ainda hoje, assim como a milênios tem de ser cumprida ainda  
diariamente [...] simplesmente para manter o homem vivo. A primeira coisa a  
fazer em qualquer concepção histórica é, portanto, observar esse fato  
fundamental em toda a sua significação e todo o seu alcance [...]. [2] O  
segundo ponto é que a satisfação dessa primeira necessidade, a ação de  
satisfazê-la e o instrumento de satisfação já adquiridos conduzem a novas  
necessidades [...]. [3]. A terceira condição que já de início intervém no  
desenvolvimento histórico é que os homens, que renovam diariamente a  
própria vida, começam a criar outros homens, a procriar – a relação entre  
homem e mulher, entre pais e filhos, a família. Essa família [...] deve, portanto,  
ser tratada e desenvolvida segundo os dados empíricos já existente e não  
segundo o conceito de família [...] (Marx; Engels, 2009, p. 40-42, grifos  
nossos).  
29  
Com efeito, “estes três aspectos da atividade social”, salientam Marx e Engels (2009, p.  
42, grifos nossos), “não devem ser considerados como três estágios distintos, mas sim apenas  
como três aspectos ou [...] como ‘três momentos’ que coexistem desde os primeiros dias da  
história e desde os primeiros homens, e que ainda hoje se fazem valer na história”: o trabalho,  
portanto, “é a condição eterna da vida humana”, acrescentará Marx (2006, p. 218) em O capital:  
crítica da economia política. É através do trabalho que o homem se distingue dos outros animais  
e assenta sua natureza social diante dos seres naturais, orgânicos e inorgânicos externos8. Nos  
Manuscritos econômico-filosóficos, a diferença entre o homem – o zoom politikon (Marx, 2008,  
8 Por isso, ressaltam Marx e Engels (2009, p. 24-25): “podemos distinguir os homens dos animais pela consciência,  
pela religião – por tudo o que se quiser. Mas eles começam a distinguir-se dos animais assim que começam a  
produzir os seus meios de subsistência (lebensmittel), passo esse que é requerido pela sua organização corpórea.  
Ao produzirem os seus meios de subsistência, os homens produzem indiretamente a sua própria vida material [...].  
Aquilo que os indivíduos são depende, portanto, das condições materiais da sua produção”.  
José Amilton de Almeida  
p.237) e a natureza já havia sido posta nitidamente. Ali, escreveu Marx:  
O animal é exatamente um com a sua atividade vital. Não se diferencia dela.  
É ela. O homem faz a sua própria atividade vital objeto da sua vontade e da  
sua consciência. Não é uma determinidade com a qual ele se confunda  
imediatamente. A atividade vital consciente diferencia imediatamente o  
homem da atividade vital animal. Decerto, o animal também produz. Constrói  
para si um ninho, habitações, como as abelhas, castores, formigas etc.  
Contudo, produz apenas o que necessita imediatamente para si ou para sua  
cria; produz unilateralmente, enquanto o homem produz universalmente;  
produz apenas sob a dominação da necessidade física imediata, enquanto o  
homem produz mesmo livre da necessidade física e só produz verdadeiramente  
na liberdade da mesma. [...] o animal dá forma apenas segundo a medida e a  
necessidade da species a que pertence, enquanto o homem sabe produzir a  
medida de cada species e sabe explicar em toda a parte a medida inerente ao  
objeto; por isso, o homem dá forma também segundo as leis da beleza (Marx,  
2015, p. 312-313 apud Netto, 2020, p. 107-108, grifos do autor).  
Netto (2020, p. 108) salienta, contudo, que, “a atividade vital específica do homem –  
que o distingue da vida animal –, não suprime a sua naturalidade. Para Marx”, explica ainda,  
“o homem (tal como o animal) vive da natureza”, pelo menos em dois sentidos: “tanto no  
sentido em que ela é 1) um meio de vida imediato, como na medida em que ela é 2) o  
objeto/matéria e o instrumento da sua atividade vital” (Netto, 2020, p. 108). Com efeito, “a  
produção humana, que tem na natureza o objeto/matéria e o instrumento da sua atividade vital,  
torna a natureza o corpo inorgânico do homem, provando sua universalidade e a genericidade  
do seu ser” (Netto, 2020, p. 109 grifos do autor) 9. Para Marx, tal “homem”,  
30  
só na elaboração do mundo objetivo [...] se prova realmente como ser  
genérico. Esta produção é a sua vida genérica operativa. Por ela, a natureza  
aparece como obra sua e realidade sua. O objeto do trabalho é, portanto, a  
objetivação da vida genérica do homem, na medida em que ele se duplica não  
só intelectualmente, como na consciência, mas também operativamente,  
realmente, e contempla-se por isso num mundo criado por ele (Marx, 2015, p.  
313 apud Netto, 2020, p. 109, grifos do autor).  
Netto (2020, p. 110) explica que “aí está porque para Marx, o homem, na sua  
genericidade e consciência, é um ser objetivo”, pondo em relevo o fato de que no terceiro  
manuscrito (que compõe os Manuscritos econômico-filosóficos) Marx tenha expressamente se  
referido ao homem como o “‘homem real, corpóreo, de pé sobre a terra bem redonda e firme,  
expirando e inspirando todas as forças da natureza’” (Netto, 2020, p. 110). Marx argumenta que  
o ser objetivo opera objetivamente e não operaria objetivamente se o objeto  
não residisse na sua determinação essencial. [...] O seu produto objetivo  
apenas confirma a sua atividade objetiva, a sua atividade como a atividade de  
um ser natural objetivo. [...] Que o homem é um ser objetivo [...] significa que  
ele tem objetos sensíveis, reais por objeto de sua essência, da sua  
9
Netto (2020, p. 109) recorda que “procede de Feuerbach a ideia do homem como ser genérico e consciente” e  
que “Marx coincide com Feuerbach em determinar a genericidade e a consciência como especificidades humanas,  
mas “a diferença essencial” se dá em razão do “caráter ativo (produtivo) que [Marx] atribui ao homem”.  
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Teoria social e método em Marx: materialismo, história e dialética  
exteriorização de vida ou que só pode exteriorizar a sua vida em objetos  
sensíveis reais (Marx, 2015, p. 375 apud Netto, 2020, p. 110, grifos do autor).  
Assim sendo, para a ciência materialista da história, é necessário  
sobretudo [...] evitar fixar de novo a ‘sociedade’ como abstração face ao  
indivíduo. O indivíduo é o ser social. A sua exteriorização de vida – mesmo  
que ela não apareça na forma imediata de exteriorização de uma vida, levada  
a cabo simultaneamente como outros – é, por isso, uma exteriorização e uma  
confirmação da vida social. [...] O homem – por muito que seja, portanto, um  
indivíduo particular e, precisamente a sua particularidade faz dele um  
indivíduo e uma comunidade [gemeinwesen] individual real – é tanto a  
totalidade ideal, a existência subjetiva para si da sociedade sentida e pensada  
como também existe na realidade, quer como instituição e fruição real da  
existência social quer como uma totalidade de exteriorização humana de vida  
(Marx, 2015, p. 348 apud Netto, 2020, p. 111 grifos do autor).  
Assim, tendo em vista o desenvolvimento social, diga-se, da produção humana, Marx e  
Engels chegam à seguinte conclusão: dado determinado desenvolvimento da produção e das  
relações sociais da humanidade, daí resulta: a) “as relações de diferentes nações entre si  
dependem do grau em que cada uma dela desenvolveu as suas forças produtivas, a divisão do  
trabalho e o intercâmbio interno”; b) “[...] a própria estrutura interna dessa nação depende da  
fase de desenvolvimento da sua produção e do seu intercâmbio interno e externo” (idem, p. 25);  
c) “até onde chega o desenvolvimento produtivo de uma nação é indicado, com maior clareza,  
pelo grau atingido pela divisão do trabalho”; d) cada nova força produtiva, na medida em que  
não é uma simples extensão quantitativa das forças produtivas até aí já existentes (p. ex., o  
arroteamento de terrenos), tem como consequência, uma nova constituição da divisão do  
trabalho” (Marx; Engels, 2009, p. 25).  
31  
Uma vez que os homens engendraram (1) instrumentos e objetos humanos para a  
satisfação das suas necessidades, com isso, (2) gerando novas necessidades e (3) (novas)  
relações e (novos) complexos sociais (família, moral, religião, Estado, filosofia etc.), 4)  
desdobra-se uma dupla relação: “a produção da vida, tanto da própria quanto da alheia, na  
procriação, surge agora imediatamente [...], por um lado como relação natural, por outro, como  
relação social [...]” (Marx; Engels, 2009, p. 42-43). Em Contribuição à crítica economia  
política, de 1859, Marx deixa evidente as conclusões teórico-metodológicas a que havia  
chegado, assim como em “Crítica da filosofia do Direito de Hegel”, livro cuja Introdução  
apareceu no Anais Franco-alemães publicada em Paris, em 1844”, no qual ele escreveu:  
Minhas investigações me conduziram ao seguinte resultado, as relações  
jurídicas, bem como as formas do Estado, não podem ser explicadas por si  
mesmas, nem pela chamada evolução geral do espírito humano; essas relações  
têm, ao contrário, as suas raízes nas condições materiais de existência, em suas  
totalidades, condições estas que Hegel, a exemplo dos ingleses e dos franceses  
do século 18, compreendia sob o nome de sociedade civil (Marx, 2008, p. 45)  
José Amilton de Almeida  
A outra conclusão, advinda dos estudos da economia política, é que “a anatomia  
da sociedade burguesa deve ser procurada na Economia Política” (Marx, 2008, p. 45), e, daí,  
Marx (2008, p. 46) explicita ter chegado ao seguinte resultado geral “e que, uma vez obtido”,  
serviu lhe “de guia para” seus “estudos”. Tal resultado  
pode ser formulado, resumidamente, assim: na produção social da própria  
existência, os homens entram em relações determinadas, necessárias,  
independentes de sua vontade, essas relações de produção correspondem a um  
grau determinado de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. A  
totalidade dessas relações de produção constitui a estrutura econômica da  
sociedade, a base real sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e  
política e à qual correspondem a formas sociais determinadas de consciência.  
O modo de produção da vida material condiciona o processo de vida social,  
política e intelectual. Não é a consciência dos homens que determina o seu  
ser; ao contrário, é o seu ser social que determina sua consciência. Em uma  
certa etapa do seu desenvolvimento, as forças produtivas materiais da  
sociedade entram em contradição com as relações de produção existentes, ou,  
o que não é mais do que sua expressão jurídica, com as relações de  
propriedade no seio das quais elas haviam se desenvolvido até então. De  
formas evolutivas das forças produtivas que eram, essas relações convertem-  
se em entraves. Abre-se, então, uma época de revolução social. A  
transformação que se produziu na base econômica transforma mais ou menos  
lenta ou rapidamente toda a colossal superestrutura. Quando se consideram  
tais transformações, convém distinguir sempre a transformação material das  
condições econômicas de produção – que podem ser verificadas fielmente  
com ajuda das ciências físicas e naturais – e as formas jurídicas, politicas,  
religiosas, artísticas ou filosóficas, em resumo, as formas ideológicas sob as  
quais os homens adquirem consciência desse conflito e o levam até o fim.  
32  
Nessa perspectiva, “do mesmo modo que não juga o indivíduo pela ideia que de  
si mesmo faz, tampouco se pode jugar uma tal época de transformações pela consciência que  
ela tem de si mesma” (Marx, 2008, p. 46)10. Para o autor, “é preciso, ao contrário, explicar essa  
consciência pelas contradições da vida material, pelo conflito que existe entre as forças  
produtivas sociais e as relações de produção”. Eis porque, para ele, “a humanidade não se  
propõe senão a problemas que ela pode resolver, pois, aprofundando a análise, ver-se-á sempre  
que o próprio problema só se apresenta quando as condições materiais para resolvê-lo existem  
ou estão em vias de existir” (Marx, 2008, p. 46)11. Na perspectiva de Marx e Engels, ao ter em  
10 Analogamente, Marx (2006, p. 128) chama a atenção, também, para este mesmo fato em O capital (Capítulo  
III), quando discute O dinheiro e a circulação das mercadorias, sarcasticamente afirmando que “o nome de uma  
coisa é extrínseco as suas propriedades”, e que, assim, “nada sei de um homem por saber apenas que se chama  
Jacó”.  
11  
Marx registra ainda, em perspectiva histórica: “em grandes traços, podem ser os modos de produção asiático,  
antigo, feudal e burguês moderno designados como outras tantas épocas progressivas de formação da sociedade  
econômica. As relações de produção burguesas são a última forma antagônica do processo de produção social,  
antagônica não no sentido de um antagonismo individual, mas de um antagonismo que nasce das condições de  
existência socais dos indivíduos; as forças produtivas que se desenvolvem no seio da sociedade burguesa criam,  
ao mesmo tempo, as condições materiais para resolver esse antagonismo. Com essa formação social termina, pois,  
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Teoria social e método em Marx: materialismo, história e dialética  
vista a relação do Estado com a sociedade,  
A estrutura social e o Estado decorrem constantemente do processo de vida de  
determinados indivíduos; mas desses indivíduos, não como eles poderão  
parecer na sua própria representação ou na de outros, mas como eles são  
realmente, como atuam [tätig], portanto, em determinados limites, premissas,  
e condições materiais que não dependem da sua vontade. (Marx; Engels, 2009,  
p. 30).  
Não obstante, a concepção materialista do ser social consiste em reconhecer que  
a produção das ideias, das representações, da consciência está em princípio  
diretamente entrelaçada com a atividade material e o intercâmbio material dos  
homens, linguagem da vida real. [...]. O mesmo se aplica à produção espiritual  
como ela se apresenta na linguagem da política, das leis, da moral, da religião,  
da metafísica etc., de um povo. [...]. O ser dos homens é o seu processo de  
vida real. A consciência nunca pode ser outra coisa senão o ser consciente, e  
o ser dos homens é o seu processo real de vida. Se em toda ideologia os  
homens e suas relações aparecem de cabeça para baixo como numa câmera  
escura, é porque esse fenômeno deriva do seu processo histórico de vida da  
mesma maneira que a inversão dos objetos na retina deriva do seu processo  
diretamente físico de vida (Marx; Engels, 2009, p. 31 grifos dos autores).  
As relações desse mundo invertido chegam à consciência humana como ideologia:  
ideias aparentemente autônomas e desconexas em relação à produção e aos intercâmbios  
materiais. Longe de esgotar a discussão sobre Ideologia, pois ela abrange um campo temático  
próprio de pesquisa (ver, por exemplo, Chauí: O que é ideologia?), do material bibliográfico  
que ora temos em mãos para este estudo, dentre os muitos significados de ideologia como  
conjunto de ideias, podemos dizer que ela expressa uma extensão da alienação no âmbito da  
consciência operando uma inversão na relação entre consciência e ser social.  
33  
A ideologia age como se fosse uma forma de consciência autônoma, extramundana ou  
extraeconômica, e se expressa em vários campos. Na teologia, por exemplo, o homem pensa  
ser ele cria de Deus quando é Deus cria sua; na política, na Filosofia e no Direito: o Estado  
aparece determinando a sociedade, no papel de Espírito universal e absoluto e demiurgo da  
sociedade civil, quando, na verdade, ele, o Estado, é que é fruto da sociedade (civil, de classes).  
A teoria aparece autônoma à prática, e na relação sujeito/objeto, de duas a uma: ou o sujeito se  
sobrepõe ao objeto – numa percepção idealista – ou o objeto se sobrepõe ao sujeito – numa  
percepção empirista ou positivista, ambos se sobrepondo, assim, unilateralmente. Já na  
economia política: o indivíduo burguês, particular e historicamente determinado, aparece como  
universal, a-histórico, como se fosse a essência da humanidade, como se constituísse a causa e  
o princípio do desenvolvimento social humano quando, de fato, este indivíduo é a consequência  
e o resultado do mesmo desenvolvimento (Marx, 2008).  
a pré-história da humanidade” (Marx, 2008, p. 46).  
José Amilton de Almeida  
Na inversão da consciência operada sob o poder da ideologia, categorias como dinheiro,  
mercado, capital, tornam-se a essência das relações humanas e não uma forma particular e  
alienada desta; o indivíduo proprietário privado, cindido da comunidade, e egoísta, aparece  
como sendo a premissa e o pressuposto quando, na verdade, este indivíduo não é mais que um  
produto histórico; as ideias e interesses particulares dessa classe, a burguesia, aparecem como  
se expressassem o interesse da humanidade e de todas as classes sociais; além de eternizar-se,  
na ideologia liberal, a sociedade burguesa, quando, ao contrário, ela não é mais do que uma  
forma específica do desenvolvimento social, historicamente demarcada, com seu modo de  
produção e composição de classes específico e transitório, com suas contradições e lutas de  
classes, com sua economia, sociedade civil e Estado.  
Diante disso, Marx e Engels aludem que na filosofia materialista por eles empreendida,  
em completa oposição à filosofia alemã [idealista e contemplativa], a qual desce do céu à  
terra, aqui sobe-se da terra ao céu” (Marx; Engels, 2009, p. 31, grifos nossos). Isso significa  
que no materialismo  
Não se parte daquilo que os homens dizem, imaginam ou se representam, e  
também não dos homens narrados, pensados, imaginados, representados, para  
daí se chagar ao homem de carne e osso; parte-se dos homens realmente  
ativos, e com base no seu processo real de vida apresenta-se também o  
desenvolvimento dos reflexos [Reflexe] e os ecos ideológicos desse processo  
de vida.  
34  
Portanto, “são os homens que desenvolvem a sua produção material e o seu intercâmbio  
material que, ao mudarem essa realidade, mudam também o seu pensamento e os produtos do  
seu pensamento”, logo, “não é a consciência que determina a vida, é a vida que determina a  
consciência” (Marx; Engels, 2009, p. 32, grifos nossos). Conforme enfatizam, no método  
filosófico-cientifico materialista parte-se “dos pressupostos reais e nem por um momento os  
abandona”, e, “assim que esse processo de vida ativo é apresentado, a história deixa de ser uma  
coleção de fatos mortos – como é para os empiristas, eles próprios ainda abstratos –, ou uma  
ação imaginada de sujeitos imaginados, como para os idealistas”, de tal modo que, com base  
numa concepção teórica que do real parte e nunca o abandona, abre-se a possibilidade para o  
conhecimento concreto do objeto do ser social, isto é, da base material de sua vida e consciência,  
da sua realidade social, finalmente, a produção de um “saber real”, de uma “ciência real” . “Lá  
onde a especulação cessa, na vida real, começa, portanto, a ciência real, positiva, a descrição  
[Drastenllung] da atividade prática, do processo de desenvolvimento prático dos homens”. Com  
isso, “terminam as frases sobre a consciência, o saber real tem de as substituir (Marx; Engels,  
2009, p. 32).  
Mas como é possível a relação entre homem e natureza, entre ser social e consciência,  
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Teoria social e método em Marx: materialismo, história e dialética  
matéria e espírito, atividade e pensamentos aparecerem assim cindidos à própria consciência, e  
operar uma relação invertida na ideologia? Sua base objetiva não pode ser a própria  
consciência; é, isto sim, a “divisão social do trabalho e a propriedade privada”. Marx e Engels  
(2009, p. 47, grifos nossos), aludiram que “divisão de trabalho e propriedade privada são  
expressões idênticas – numa enuncia-se em relação à atividade o mesmo que na outra enuncia  
relativamente ao produto da atividade”. A divisão do trabalho é o alicerce a partir do qual se  
produz a separação não apenas entre trabalho manual e espiritual, trabalho agrícola e industrial,  
campo e cidade, como da conformação do Estado e a cisão entre indivíduo cidadão, da  
conformação das classes sociais e da luta de classes:  
Com a divisão do trabalho está dada, ao mesmo tempo, a contradição entre o  
interesse de cada um dos indivíduos e o interesse comunitário  
[gemeinschaftlichen] de todos os indivíduos que mantêm intercâmbio uns com  
os outros. [...]. E é precisamente dessa contradição do interesse particular e do  
interesse comunitário que o interesse comunitário assume uma organização  
[Gestaltung] autônoma com o Estado, separado dos interesses reais dos  
indivíduos e do todo, e ao mesmo tempo como comunidade ilusória, mas  
sempre sobre a base real [realen basis] dos laços existentes em todos os  
conglomerados de famílias e tribais – como de carne e sangue, de língua, de  
divisão de trabalho numa escala maior, e demais interesses – e, especialmente  
[...] das classes desde logo condicionadas pela divisão do trabalho e que se  
diferenciam de todas essas massas de homens, e das quais uma domina todas  
as outras. (Marx; Engels, 2009, p. 47).  
35  
Daí “resulta que todas as lutas no seio do Estado, a luta entre a democracia, a aristocracia  
e a monarquia, a luta pelo direito do voto etc. etc., não são mais do que as formas ilusórias em  
que são travadas as lutas reais das diferentes classes entre si” (Marx; Engels, 2009, p. 47); e as  
ideias que aparecem como naturais a todas as classes como ideias universais, são as ideias  
dominantes neste modo de produção e em suas relações sociais, mais precisamente, a  
dominação das ideias das classes dominantes que estão na condição de proprietárias dos meios  
de produção – de produção material propriamente ditos e na produção de ideias – e da  
acumulação do produto (riqueza) social produzido pelo trabalho/trabalhador. Marx e Engels  
(2009, p. 67) aludiram:  
As ideias das classes dominantes são, em todas as épocas, as ideias  
dominantes, ou seja, a classe que é o poder material dominante da sociedade  
é, ao mesmo tempo, o seu poder espiritual dominante. A classe que tem a sua  
disposição os meios para produção material dispõe assim, ao mesmo tempo,  
dos meios para a produção espiritual, pelo que lhe estão assim, ao mesmo  
tempo, submetidos em média as ideias daqueles a quem faltam os meios para  
a produção espiritual.  
O poder político é, também, uma manifestação da contradição do interesse particular e  
do interesse da comunidade, de maneira que esta contradição se objetiva concentrando no  
Estado o poder político de uma classe social particular, mas aparece como se representasse o  
José Amilton de Almeida  
poder de toda a comunidade, ou “o interesse geral”, nos termos de Rousseau. Em outras  
palavras, o Estado é expressão do poder organizado da classe dominante e opera de modo  
teológico, mistificador, para com a sociedade, pois nele está politicamente alienado o interesse  
coletivo da comunidade, e de cada indivíduo, em detrimento dos interesses particulares de uma  
classe, que se pretende universal e aparece como tal.  
Particularmente no Estado burguês, um produto da sociedade (civil) burguesa – Hegel  
imaginava o oposto: que a sociedade (civil) é que era produto do Estado – opera uma  
contradição, um antagonismo inconciliável, entre os ideais liberais do cidadão, gênero, e o  
indivíduo, particular (burguês ou vivendo sob relações burguesas subordinadamente, como o  
proletariado). Aí impera uma oposição entre o interesse coletivo e o interesse restrito das classes  
economicamente dominantes e politicamente no poder. Por isso, essas classes no poder se  
mantêm conservadoras, elas se conservam não apenas através do monopólio sobre os meios de  
produção social da humanidade e universalização de suas próprias ideias, mas,  
concomitantemente, através do poder político, isto é, do monopólio do uso da força – e a  
organização sistemática desta força, militar, financeira, administrativa e burocraticamente –  
através do Estado e suas instituições inerentes. Mas, sabendo-se que o Estado é um instrumento  
de dominação de classe – até mesmo na fase monopolista quando ele se amplia e amplia o  
próprio horizonte da sociedade civil –, poderia a classe trabalhadora se furtar ao Estado em seu  
processo emancipatório? A resposta é não. Para Marx, assim como para Engels,  
36  
Todas as classes que aspiram ao domínio, como é o caso do proletariado,  
condiciona a superação de toda a velha sociedade e da dominação em geral,  
têm primeiro de conquistar o poder político, para por sua vez representarem o  
seu interesse como o interesse geral, coisa que no primeiro momento são  
obrigadas a fazer. Precisamente porque os indivíduos procuram apenas o seu  
interesse particular, que para eles não coincide com o interesse comunitário –  
a verdade é que o geral é a forma ilusória da existência da comunidade –, este  
é feito valer como um interesse que lhes é ‘alienado’ e ‘independente’ deles,  
como um interesse geral que é também ele, por sua vez, peculiar e particular,  
ou eles próprios têm de se mover nesta discórdia, como na democracia (Marx;  
Engels, 2009, p. 48).  
Vê-se que, como um pensador cientificamente crítico e eticamente comunista, o fio que  
percorre a elaboração marxiana é a preocupação com a verdadeira libertação humana dos  
grilhões do capital, com o fim das opressões e da exploração do homem pelo homem. A  
pergunta, sempre adjacente que pode ser deduzida de seus escritos, dentre muitas outras é:  
como poderia o ser humano tornar-se verdadeiramente livre e desalienado? A resposta mais  
simples, seria: o comunismo. Mas, devido a degeneração deliberada de que a expressão tem  
sido vítima, para expressar o teor científico do comunismo exige que façamos algumas devidas  
mediações.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 18-41, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Teoria social e método em Marx: materialismo, história e dialética  
O caminho da alienação humana e o caminho da sua superação: o comunismo na  
perspectiva filosófico-antropológica emancipatória de Marx  
A ciência materialista foi criada no processo de objetivação-subjetivação da luta de  
classes da sociedade burguesa. Sendo produto das relações sociais deste mundo de exploração  
e miséria, é também “a arma da crítica” produzida para facilitar o caminho revolucionariamente  
humano; além de tornar evidente que a exploração tem de ser combatida realmente, não  
idealmente única e simplesmente.  
Marx chega à crítica da economia política como desmistificação da sociedade burguesa  
na sua mais elementar relação cotidiana, na qual a alienação é constitutiva de um universo no  
qual as relações sociais aparecem como relação entre coisas, um fenômeno difundido através  
do que Marx (2006, p. 92), em O capital (Livro I, capítulo 1), denominou de “o fetichismo da  
mercadoria: seu segredo” – e que, neste breve artigo, não temos tempo de desenvolver. Na  
sociedade burguesa, como em toda sociedade de classes, o indivíduo está cindido, separado,  
desapossado, isto é, alienado do seu produto social, da atividade da qual o produto resulta e do  
gênero humano. Se a alienação consiste na cisão do criador da sua criatura e no domínio desta  
sobre aquele, o caminho para a desalienação consiste em (re)unir o gênero ao indivíduo, cindido  
e explorado, isto é, devolver ao ser social o produto de sua sociabilidade, a sua criação para a  
qual ele se porta como se fosse criatura. Netto (2020, p. 125) lembra que Marx já apontara que  
“a superação da autoalienação faz o mesmo caminho que a autoalineação”. Mas por qual via se  
consolida a alienação do ser humano na sua relação prática com a natureza, e na relação com o  
próprio ser humano, isto é, em sua constituição como ser social? Quem nos oferece um  
esquemático resumo é Lápine, que, apoiado em Marx, pontua cinco momentos fundamentais  
desse processo:  
37  
1) Inicialmente, num estágio bárbaro, selvagem, não há alienação, o trabalho e  
seus produtos servem apenas para atender às necessidades do homem em  
meios de subsistência; então, todo o trabalho acumulado pertence ao próprio  
produtor (diz Marx: ‘Capital e trabalho primeiro ainda unidos’);  
2) Etapa em que surge a troca direta: o produtor dispõe da troca de um excedente  
que ele produz, mas tem necessidade de bens produzidos por outrem [...].  
Desenvolve-se a troca e a divisão do trabalho, o produto alienado do seu  
produtor e as relações sociais tornam-se também um ato genérico exterior  
alienado; [...]  
3) Etapa na qual, ademais da alienação do produto [...] opera a alienação na  
atividade de trabalho, marcada pelo surgimento do equivalente cujo papel não  
para de crescer e substituir tudo: o dinheiro. Então, mais desenvolvida ainda a  
divisão do trabalho, a troca e o trabalho tornam-se meros meios para o ganho  
(o que então Marx chama de trabalho lucrativo) e a alienação passa a envolver  
as forças essenciais do homem;  
José Amilton de Almeida  
4) Os efeitos das etapas anteriores determinam, para Lápine a acumulação do  
trabalho de outrem, ou seja, do capital no sentido próprio do termo e sua  
oposição ao trabalho direto. [...] a oposição entre o trabalho e o capital aparece  
aqui sob a forma de oposição entre o trabalho agrícola e a renda da terra, mas  
a essência dessa oposição é mascarada por uma série de circunstâncias;  
5) Na última etapa, tais circunstâncias são suprimidas, nas palavras de Marx,  
‘quando o desenvolvimento necessário do trabalho’ põe ‘a indústria liberta e  
constituída como tal para si própria e o capital liberto, [...] quando o capital  
tornado liberto torna-se capital ‘puro’, se coloca factualmente no controle da  
produção da riqueza social. Só então é possível apreender o trabalho como a  
essência subjetiva da propriedade privada como exclusão da propriedade e o  
capital como o trabalho objetivo como exclusão do trabalho só então [...] a  
propriedade privada se põe na sua relação enérgica que impele à resolução; só  
então se chega ao ponto de comutação que abre a via à ‘resolução’, que não é  
outra coisa senão a superação da propriedade privada e da alienação (Lápine,  
1983, p. 327-333 apud Netto, 2020, p. 121- 122).  
A crítica da alienação religiosa leva Marx e Engels à crítica da alienação política e a  
estabelecerem analogias metodológicas entre ambas. Eles escreveram que “a tarefa imediata da  
filosofia, que está a serviço da história, é, depois de desmascarar a forma sagrada da alienação  
humana, desmascarar a auto-alienação nas suas formas não sagradas” (Marx, Engels, 2009, p.  
146). Assim, “a crítica do céu transforma-se na crítica da terra, [...] a crítica da religião, na  
crítica do Direito, a crítica da teologia, na crítica da política (Marx; Engels, 2009, p. 146). Ao  
comparar a vida na sociedade burguesa a uma vida emancipada longe dela, diga-se, comunista,  
observaram:  
38  
[na primeira] assim que o trabalho começa a ser distribuído, cada homem tem  
um círculo de atividade determinado e exclusivo que lhe é imposto e do qual  
não pode sair; será caçador, pescador; ou crítico, e terá de continuar a sê-lo  
senão quiser perder os meios de subsistência – ao passo que na [segunda]  
sociedade comunista, na qual cada homem não tem um círculo exclusivo de  
atividade, mas pode se formar [ausbilden] em todos os ramos que preferir, a  
sociedade regula a produção geral e, precisamente desse modo torna possível  
que eu faça hoje uma coisa e amanhã outra, que cace de manhã, pesca de tarde,  
crie gado à tardinha, critique depois da ceia, tal como me aprouver, sem ter de  
me tornar caçador, pescador, pastor ou crítico (Marx; Engels, 2009, p. 49).  
Em Crítica à filosofia do direito de Hegel – Introdução, ao expor a necessidade de um  
outro estatuto para a filosofia na qual essa intervenha na história muito além de especulá-la,  
Marx (2010) identifica no proletariado a força capaz de levar a cabo tal emancipação, havendo  
que produzir uma relação orgânica entre a filosofia e proletariado. Nessa obra, ele registra que  
a possibilidade positiva para a emancipação alemã – o que vale para a emancipação do homem  
em geral – estava no proletariado, isto é,  
na formação de uma classe com grilhões radicais, de uma classe da sociedade  
civil que não seja uma classe da sociedade civil, de um estamento que seja a  
dissolução de todos os estamentos, de uma esfera que possua um caráter  
universal mediante seus sofrimentos universais e que não reivindique nenhum  
direito particular porque contra ela não se comete uma injustiça em particular,  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 18-41, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Teoria social e método em Marx: materialismo, história e dialética  
mas a injustiça por excelência, que já não possa exigir um título histórico, mas  
apenas o título humano, que não se encontre numa posição unilateral às  
consequências, numa posição abrangente aos pressupostos do sistema político  
alemão, uma esfera, por fim, que não pode se emancipar sem emancipar todas  
as outras esferas da sociedade e, com isso, sem emancipar essas esferas – uma  
esfera que é, numa palavra, a perda total da humanidade e que, portanto, só  
pode ganhar a si mesma por um ganho total do homem. Tal dissolução da  
sociedade, como um estamento particular, é o proletariado. (Marx, 2010, p.  
156, grifos nossos)12.  
Para Marx, a verdadeira natureza do homem é a sua natureza antropológica, donde  
conclui que para o socialista,  
Toda a chamada história do mundo não é senão geração do homem pelo  
trabalho humano, senão o devir na natureza para o homem, assim ele tem,  
portanto, a prova irrefutável, intuível, do seu nascimento através de si próprio,  
do seu processo de surgimento. [...] O ateísmo, como renegação dessa  
inessencialidade [da alienação do homem], não tem mais qualquer sentido,  
pois o ateísmo é uma negação do deus e põe por esta negação a existência do  
homem; mas o socialismo como socialismo não necessita mais de uma tal  
mediação; ele começa pela consciência teórica e praticamente sensível do  
homem e da Natureza como [consciência] da essência. Ele é autoconsciência  
positiva do homem já não mediada pela supressão da religião, tal como a vida  
real é realidade positiva do homem já não mediada pela propriedade privada,  
o comunismo. O comunismo é a posição como negação da negação, por isso,  
o momento real, necessário para o próximo desenvolvimento histórico, da  
emancipação e recuperação humanas (Marx, 2012, p. 121).  
Com esta passagem – com a qual convém encerrar este artigo – fica evidente a unidade  
entre ciência e ética no método de Marx. Ele distancia-se de um vulgar posicionamento neutro  
diante da ciência e desenvolve a crítica da sociedade burguesa com vista na sua superação. Com  
isso, edifica uma teoria social revolucionária, na qual, mais do que desvestir os mitos e  
fundamentos ideológicos da sociedade burguesa e desnudar sua estrutura e movimento, aponta  
aos oprimidos uma ciência própria e uma teoria concreta para superarem a opressão. A teoria  
revolucionária marxiana segue sendo, mais do que necessária, imprescindível para o  
movimento de luta da classe trabalhadora. Nesse sentido, ela tem muito ainda a contribuir para  
ajudar a guiar e enriquecer a práxis de movimentos sociais, quaisquer que sejam e onde quer  
que estejam: operários, proletários, camponeses, sem-terra, sem-teto, movimento negro,  
indígena, feminista, Lgbtqiapn+ etc.  
39  
12 Em perspectiva emancipatória, Marx (2012, p. 15-16) defende que “a supressão da propriedade privada é [...] a  
completa emancipação de todos os sentidos e qualidades humanas; mas ela é esta emancipação precisamente pelo  
fato destes sentidos e qualidades se terem tornado humanos, tanto objetiva quanto subjetivamente” e, assim, a  
“necessidade ou fruição perderam [...] a sua natureza egoísta e a Natureza perdeu a sua mera utilidade na medida  
em que a utilização se tornou uma utilização humana”.  
José Amilton de Almeida  
Considerações finais  
Mediante os fundamentos antropológicos, econômico-filosóficos e histórico-sociais  
rapidamente esboçados nestas páginas, Marx desenvolve o método comumente denominado  
“materialismo histórico e dialético” com o qual a sociedade burguesa é tomada concreta e  
criticamente na sua leitura13. Perpassando pela crítica religiosa à crítica do Direito e do Estado,  
pela crítica da filosofia à crítica da economia política, o modo de ser socialmente burguês é  
desvelado, seu movimento e estrutura são racionalmente apreendidos, as classes fundamentais  
(capitalistas, proprietários de terras e proletários), evidenciadas, e o método através do qual este  
modo de ser opera mostra-se, então, determinado pelo modo de produção, isto é, a partir da  
produção material da vida de indivíduos socialmente determinados, produzindo em sociedade,  
adquirindo relações sociais com base da divisão social do trabalho e desenvolvendo suas forças  
produtivas, autoproduzindo-se e reproduzindo-se material e espiritualmente, ao mesmo tempo  
objetiva e subjetivamente.  
A relação que produz meios humanos para satisfação de necessidades humanas forma a  
base – e concomitantemente as ideias se entrelaçam a esta base – para a produção de ideias. Se  
essas ideias não são um reflexo instantâneo do mundo real e sim uma refração projetada na  
consciência, isto é, projeção da realidade tal como esta chega distorcida ou invertida na mente  
humana, neste caso, o papel da ciência e da teoria é corrigir a distorção, desinverter o mundo e  
colocá-lo “sobre os seus próprios pés”.  
40  
Isso quer dizer que a crítica da economia política, que assenta seus pés numa percepção  
materialista e dialética de economia, percebe que, na sociedade burguesa, a relação entre sujeito  
e objeto está invertida. Pois o trabalho, que é a essência do ser, está subordinado, alienado,  
enquanto o capital, um produto das relações sociais do ser, o subordina. Sob tais condições, nas  
quais todos os membros da sociedade estão alienados, o proletariado é prejudicado enquanto a  
classe capitalista se beneficia da alienação: o que uma perde é imediatamente o que a outra  
ganha.  
A força dinâmica, que objetiva a negação da sociedade burguesa é o proletariado – leia-  
13 Escapou-nos uma exposição mais precisa do “método da economia política” discutida por Marx em Introdução  
(à contribuição à crítica da economia política), no qual ele resume seu método. Escusamo-nos conscientemente  
de tal tarefa, pois a riqueza e densidade do conteúdo ali expressos, merecem um capítulo próprio no estudo dos  
fundamentos da teoria social e do método marxista. Pela mesma razão escapou-nos, também, uma exposição das  
relações capitalista de produção, suas contradições inerentes, a exploração e extração de mais-valia, a lei geral de  
acumulação, a desigualdades, o pauperismo e a “questão social”. Não pudemos abordar as bases de expropriação  
dos produtores diretos, nem a formação do capital com suas crises e a apropriação capitalista da renda fundiária,  
a mercadoria, o dinheiro e o fetiche da mercadoria ou outras categorias econômicas do modo de produção  
capitalista, nas quais o método marxiano se efetiva inteiramente e subjaz à análise do objeto; funde-se ao objeto  
indistinguivelmente. Teoria é método torna-se um só elemento: a crítica da economia política.  
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Teoria social e método em Marx: materialismo, história e dialética  
se classe trabalhadora –, porque, ao mesmo tempo, a negação entre capital e trabalho se  
personifica na luta entre classe capitalista e classe proletária: uma, respectivamente,  
proprietária, dominante e exploradora, outra, expropriada, dominada material e  
ideologicamente, e explorada economicamente. No modo de produção capitalista, a realização  
do capital é, ao mesmo tempo, a desrealização do trabalhador, e esta antítese tende a se  
generalizar com aumento do desenvolvimento das forças produtivas ante as relações sociais  
inerentes ao modo de produção, com isso, abrir possibilidade para sua superação (Marx, 2012).  
O horizonte da teoria social marxiana, não obstante buscar um conhecimento realista e  
concreto do mundo, o faz com o objetivo de transformá-lo e instrumentaliza-se para tal com  
vista à “supressão positiva da propriedade privada”. O propósito de longo alcance – que, sem  
dúvida, emite a harmonia da teoria social com o sentido ético-político das preocupações  
marxianas de aspiração proletária – é a liberdade substantiva, a emancipação humana,  
expressamente assumindo o comunismo como forma social necessária para tal, e, sob esse  
pressuposto adjacente, sustenta-se toda a crítica de Marx da sociedade moderna e ergue-se sua  
teoria social. Teoria esta cuja medula é um método materialista e dialético de apreender a  
história, de ultrapassar a aparência e penetrar a essência do objeto estudado.  
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