A tradição marxista na formação em Serviço  
Social na Universidade Federal do Piauí1  
Marxist teory in social work education at the  
Federal University of Piauí  
Sofia Laurentino Barbosa Pereira*  
Resumo: Analisa-se a influência da tradição  
marxista na formação profissional no curso de  
graduação em Serviço Social da Universidade  
Federal do Piauí, nas quatro propostas  
curriculares implantadas na trajetória do curso,  
de 1976 a 2012. Trata-se de um estudo de  
caráter bibliográfico e documental, pautado no  
método dialético crítico, que analisa currículos,  
programas de disciplinas, relatórios, trabalhos  
de conclusão de curso, dissertações, teses etc. O  
estudo contribui com a literatura sobre os  
Abstract: The influence of the marxist teory on  
professional education in the undergraduate  
course in social work at the Federal University  
of Piauí is analyzed in the four curricular  
proposals implemented during the course's  
trajectory, from 1976 to 2012. This is a  
bibliographic and documentary study, based on  
the critical dialectical method, which analyzes  
curriculum, subject programs, reports,  
monographs, dissertations, theses etc. The study  
contributes to the literature on the foundations  
of social work and its interlocution with Marx's  
social teory, revealing the theoretical-  
methodological trends, directions and projects  
of profession and society built in the education  
in the historical course of the UFPI course.  
fundamentos do Serviço Social  
e
sua  
interlocução com o pensamento social de Marx,  
revelando as tendências teórico-metodológicas,  
as direções e os projetos de profissão e de  
sociedade construídos nos processos formativos  
no percurso histórico do curso da UFPI.  
Palavras-chaves: Serviço Social; Formação  
profissional; Tradição Marxista; Universidade  
Federal do Piauí.  
Keywords  
Social  
Work;  
Professional  
education; Marxist theory; Federal university of  
Piauí.  
1 O artigo apresenta resultados parciais da pesquisa realizada no estágio pós-doutoral no Programa de Estudos Pós-  
Graduados em Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), que se insere como  
subprojeto da pesquisa “Memória e História do Serviço Social no Piauí”, financiado pelo Conselho Nacional de  
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o qual se articula ao Programa de Extensão “Memória do  
Serviço Social no Piauí”, cadastrado na Pró-Reitoria de Extensão e Cultura da UFPI.  
*
Doutora em Políticas Públicas (UFPI). Professora do Departamento de Serviço Social e do Programa de Pós-  
Graduação em Políticas Públicas da Universidade Federal do Piauí. Bolsista de Produtividade em Pesquisa do  
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). ORCID: https://orcid.org/0000-0003-  
DOI: 10.34019/1980-8518.2024.v24.43626  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 23/02/2024  
Aprovado em: 10/06/2024  
A tradição marxista na formação em Serviço Social na Universidade Federal do Piauí  
Introdução  
O Serviço Social, no decorrer de sua trajetória, orientou-se por diferentes fundamentos  
teórico-metodológicos, na busca de explicar e intervir sobre a realidade, que expressam as  
direções adotadas pela profissão. Assim, o positivismo, o funcionalismo, a fenomenologia, o  
estruturalismo, a teoria marxiana e marxista, as tendências pós-modernas, dentre outras  
vertentes do conhecimento social das quais o Serviço Social dialoga ao longo de sua história,  
manifestam distintos projetos de profissão, de formação e de sociedade.  
A interlocução do Serviço Social com a tradição marxista ocorre a partir de meados de  
1960 na América Latina e, no Brasil, ganha força principalmente a partir de 1980, o que  
configura uma nova matriz teórica à profissão, tendo importantes contribuições para a categoria,  
no campo do ensino, da pesquisa, do exercício profissional, da organização política, da pós-  
graduação, da autoimagem da profissão, dentre outros. No âmbito da formação, foi com o  
espraiamento da perspectiva de intenção de ruptura que o currículo mínimo das escolas de  
Serviço Social no país, de 1982, passa a ser guiado pelos fundamentos teórico-metodológicos  
pautados no pensamento social de Marx.  
Esse processo resultou na construção do Projeto Ético-Político do Serviço Social  
brasileiro, que conquista hegemonia nos anos 1990 e consolida os rumos e direções imprimidos  
à profissão na década anterior. Haurido na tradição marxista, o novo projeto profissional se  
materializa no Código de Ética de 1993, na Lei de Regulamentação da profissão e nas Diretrizes  
Curriculares da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (Abepss) de  
1996, posicionando-se em defesa da liberdade, da emancipação humana, da justiça social, da  
equidade, da democracia, dos direitos humanos e dos interesses da classe trabalhadora,  
“vinculado ao processo de construção de uma nova ordem societária, sem dominação,  
exploração de classe, etnia e gênero” (Brasil, 2012, p. 24).  
213  
Desde então, tem se ampliado a literatura sobre os fundamentos históricos, teóricos e  
metodológicos do Serviço Social no Brasil, sobretudo a partir das contribuições do pensamento  
social de Marx. Todavia, são escassos os estudos voltados para a reconstrução histórica e a  
compreensão das tendências teórico-metodológicas na formação profissional nas distintas  
regiões, com destaque aqui para o Nordeste2 e, especificamente, o estado do Piauí3.  
2
Merecem destaque as pesquisas desenvolvidas na Universidade Federal de Pernambuco que vem contribuindo  
com a literatura acadêmica sobre o debate das particularidades dos fundamentos sócio-históricos do Serviço Social  
no Nordeste, cujos resultados podem ser verificados nas coletâneas: “A reconstrução histórica do Serviço Social  
no Nordeste” (Silveira Junior, 2021), “O serviço social na particularidade do Nordeste (1940-1980)” (Silveira  
Junior, 2022) e o “Serviço Social no Nordeste” (Mota; Vieira; Amaral, 2021). As publicações chamam a atenção  
sobre a necessidade de aprofundar investigações que desvelem as particularidades da profissão na região.  
3
São raros os estudos voltados para a reconstrução histórica do Serviço Social no Piauí de forma abrangente,  
Sofia Laurentino Barbosa Pereira  
De tal modo, o presente artigo pretende contribuir com o adensamento dessa discussão,  
ao analisar a influência da tradição marxista na formação acadêmico-profissional no curso de  
graduação em Serviço Social da Universidade Federal do Piauí (UFPI), nas quatro propostas  
curriculares implantadas na trajetória do curso, de 1976 a 2012.  
Trata-se de um estudo de caráter bibliográfico e documental, com abordagem  
qualitativa, que utilizou como dados de informação documentos institucionais de fonte diversa  
da UFPI, tais como: currículos, programas de disciplinas, relatórios, atas de reuniões, dentre  
outros. Foram levantados também documentos nacionais do Serviço Social e do Ministério da  
Educação, como currículos mínimos, resoluções, pareceres e legislações. Realizou-se ainda  
revisão da bibliografia histórico-profissional existente sobre o Serviço Social no Brasil e no  
Piauí, assim como das produções de Trabalhos de Conclusão de Curso de Serviço Social da  
UFPI, com ênfase nos estudos sobre o ensino e a formação profissional, além de dissertações,  
teses, relatórios de pesquisas e memoriais de docentes ativos(as) e aposentados(as) do referido  
curso.  
O estudo parte de uma concepção de história apreendida no método materialista  
dialético crítico, entendida não como mera cronologia, linear ou sucessão de acontecimentos  
passados, mas como movimento, processo dinâmico, dialético, permeado de contradições,  
produto das relações sociais, constituindo-se como “síntese de múltiplas determinações, isto é,  
unidade do diverso” (Marx, 2008, p. 258). Essa concepção, pautada no método de Marx,  
permeou todo o percurso investigativo, na busca em apreender o movimento histórico do real e  
atingir a essência dos fenômenos, suas contradições e sua transformação social e histórica.  
Espera-se contribuir com as análises acerca da reconstrução histórica do Serviço Social  
no Piauí, a partir de uma perspectiva de totalidade, que busca captar as mediações da profissão  
na sociedade, para apreender as particularidades em sua relação com o todo. Deste modo, visa  
colaborar com o acervo da profissão e com lacunas existentes, especialmente acerca do curso  
de Serviço Social da UFPI, que completará cinquenta anos de existência em 2026,  
permanecendo como o primeiro e único a ofertar esta formação em uma instituição de ensino  
superior pública em solo piauiense.  
214  
dentre os quais se evidenciam as publicações de Setubal (1987), Guimarães (1995, 2003), Ferreira, Silva e  
Guimarães (2021a; 2021b), além de (poucas) teses, dissertações e monografias de docentes e discentes do curso  
da UFPI.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 212-235, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
A tradição marxista na formação em Serviço Social na Universidade Federal do Piauí  
A trajetória da formação em Serviço Social na UFPI, os fundamentos teórico-  
metodológicos e a influência do marxismo  
Os registros da chegada da primeira assistente social no Piauí datam de 1947, contratada  
pela Legião Brasileira de Assistência, pela necessidade de um profissional “técnico que  
soubesse utilizar melhor os recursos humanos e materiais disponíveis” (Setubal, 1983, p. 127).  
Desde então, por quase três décadas, os(as) assistentes sociais que atuavam em solo piauiense  
eram formados(as) em outras regiões, até 1976, quando foi criado o primeiro curso de Serviço  
Social no Estado, na Universidade Federal do Piauí (UFPI), inaugurada poucos anos antes, em  
1968, no contexto da Ditadura Militar.  
Em 1977 foi implantado o primeiro currículo pleno do curso da UFPI, atrelando-se ao  
currículo mínimo de 1970, aprovado pelo Conselho Federal de Educação (CFE), pelo Parecer  
nº 242/70, que trazia como obrigatórias as disciplinas de: sociologia, psicologia, economia,  
direito e legislação social, política social, teoria do Serviço Social, ética profissional e Serviço  
Social de caso, grupo e comunidade (Brasil, 1970). Assim, embora a categoria no país, já  
avançasse nos questionamentos e críticas ao conservadorismo, a proposta curricular vigente  
nacionalmente ainda reforçava os postulados funcionalistas, articulados a uma perspectiva  
desenvolvimentista, que atendia aos interesses do Estado autocrático burguês.  
Compreende-se o currículo mínimo de 1970 no âmbito da perspectiva modernizadora  
do Serviço Social que, segundo Netto (2015), é a primeira expressão do processo de renovação  
da profissão no Brasil tendo, de um lado, um conteúdo reformista no seio da profissão, ao visar  
a sua laicização e validação teórica, com base na matriz estrutural-funcionalista, através da qual  
a profissão adquire um cariz moderno e tecnicista. De outro lado, tem um caráter conservador,  
uma vez que mantém a atuação profissional voltada a adequação do indivíduo a sociedade, na  
lógica da harmonia social e que, portanto, é funcional ao capitalismo e ao Estado ditatorial  
vigente.  
215  
O primeiro currículo pleno do curso de Serviço Social da UFPI acompanhou a lógica da  
proposta curricular nacional – como pode ser observado, por exemplo, na fragmentação dos  
conteúdos voltados para a tríade “caso, grupo e comunidade” – mas também possuía suas  
particularidades – com destaque a grande carga horária dos conteúdos de psicologia. Isso  
demonstra que a formação tinha influência norte-americana, sendo guiada por uma concepção  
psicanalista e centrada no indivíduo, pautando-se ainda em uma visão funcionalista da  
realidade. O objetivo da formação estabelecido no referido currículo revela essa perspectiva:  
“proporcionar ao aluno conhecimento técnico-científicos e ajudá-lo a desenvolver-se, para  
Sofia Laurentino Barbosa Pereira  
iniciar sua profissão de Assistente Social, de modo a atender os reclamos de uma civilização  
em mudança e contribuir na promoção do indivíduo, grupo e comunidade” (UFPI, 1976).  
Importante ressaltar que no período de implantação do primeiro currículo de Serviço  
Social da UFPI, no cenário nacional, a categoria vivenciava seu processo de renovação e  
iniciava o diálogo com a tradição marxista, o que expressava a busca pelo rompimento com o  
conservadorismo. Acompanhando esse movimento, na esfera da formação profissional,  
ampliava-se a discussão sobre a necessidade de reformulação curricular, que culminou na  
aprovação de um novo currículo pleno pelo CFE, em 1982. Nessa direção, o projeto formativo  
da UFPI ainda não acompanhava as discussões que aconteciam na profissão no Brasil. Dessa  
forma,  
[...] a escola de Serviço Social piauiense não adotava uma postura teórica  
pautada no materialismo histórico ou dialético. E nem mesmo introduz  
algumas disciplinas em seu currículo pleno, relacionadas a esse tema. [...]  
Percebe-se que o primeiro currículo pleno, quando na época implementado, já  
se encontra defasado, desatualizado e inadequado diante da realidade e do  
próprio movimento nacional de revisão do currículo mínimo vigente (Silva,  
2003, p. 39 apud Rosa; Silva; Nascimento, 2003, p. 1).  
Conjectura-se que isso ocorreu em decorrência da conjuntura ditatorial vivenciada,  
considerando que, mesmo não estando presente no documento curricular, há registros de  
docentes e discentes do curso de Serviço Social da UFPI engajados(as) na militância política  
da época e que tinham afinidade com a corrente marxista e, por isso, sofriam repressão dentro  
da universidade, como explicita o relato a seguir, de professora do referido curso que vivenciou  
esse momento histórico ainda enquanto estudante:  
216  
[...] Era época de clandestinidade dos marxistas, e as universidades eram  
cheias de “dedos duros”, de pessoas vigiando pra entregar pra ser preso [...]  
porque pelo caminho da clandestinidade, como estudante, eu fui recrutada por  
um partido marxista [...] então os meus primeiros textos foram escondidos dos  
professores e dos colegas, eram mimeografados, escondidos e enrolados em  
sacos plásticos, distribuídos na surdina, escondidos em telhados, porque se  
fossem descobertas qualquer leitura marxista, a gente poderia ser preso, como  
terrorista (Professora 3). (Silva, 2019, p. 41).  
O relato revela como os conteúdos da formação em Serviço Social passavam pelo crivo  
do regime autocrático burguês, assim como a censura e perseguição política sofrida por  
docentes e discentes na UFPI. Identificam-se, nesse momento, as primeiras aproximações com  
as abordagens marxistas, que se dão principalmente pelo viés posto pela militância política, tal  
qual acontecia no cenário nacional, como analisa Netto (2015), o que obscureceu as fronteiras  
entre a profissão e o militantismo e gerou um primeiro contato enviesado com o marxismo, pela  
dificuldade de acesso as obras originais do autor.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 212-235, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
A tradição marxista na formação em Serviço Social na Universidade Federal do Piauí  
Assim, embora predominasse uma perspectiva conservadora no primeiro currículo da  
UFPI, com seus fundamentos positivistas e funcionalistas, existiam segmentos progressistas e  
críticos no âmbito do processo formativo nesse período, que iniciavam o diálogo com o  
pensamento marxista. Isso se deu especialmente através da inserção no movimento estudantil e  
nas organizações da categoria, como a Associação Profissional de Assistentes Sociais do Piauí  
e o Sindicato de Assistentes Sociais do Estado, que se inseria em um processo mais amplo de  
mobilização e articulação da sociedade civil no Brasil e no Piauí, na luta pela redemocratização.  
Como resultado, Guimarães (1990a) ressalta que, na prática, parte do corpo docente do  
curso de Serviço Social da UFPI passou a conduzir mudanças nas suas disciplinas e trazendo  
para discutir conteúdos que perpassavam as questões vivenciadas pela profissão naquela  
conjuntura. A exemplo disso, ao analisar planos de disciplinas da época, sobretudo do início da  
década de 1980, é possível observar, ainda que de forma pontual, a adoção de conteúdos sobre  
a reconceituação da profissão, a disputa entre capital / trabalho, os movimentos populares, a  
questão social, dentre outros, assim como a presença de bibliografias de autores de tradição  
marxista, como Antonio Gramsci. Esse é um elemento importante que reitera a existência de  
disputas pela direção e pelos fundamentos teórico-metodológicos e ético-políticos da formação  
em Serviço Social na UFPI desde o seu primeiro currículo.  
Na década de 1980 ocorreu o processo de reformulação do projeto de formação de  
Serviço Social da UFPI que culminou na aprovação do segundo currículo pleno, em 1987. Este  
foi um período rico de historicidade, marcado pela reorganização da sociedade civil e por  
amplas lutas pela democratização do país e, no âmbito do Serviço Social, pela organização  
política da categoria, que avançava na construção de um projeto profissional crítico e articulado  
com as lutas da classe trabalhadora. No curso da UFPI, as transformações vivenciadas na  
realidade brasileira e piauiense atravessaram os debates acadêmicos e os muros da  
Universidade, passando a fazer parte do currículo construído:  
217  
A proposta de revisão curricular pressupõe a busca de superação de um  
modelo de formação profissional alienado das condições históricas da  
realidade brasileira, exigindo um esforço coletivo de análise estrutural e  
conjuntural dessa realidade, visando apreender sua dinâmica (UFPI, 1987, p.  
8).  
Buscou-se a construção de um projeto de formação sintonizado com as transformações  
vivenciadas na sociedade brasileira e com a categoria no país. No cenário nacional, havia sido  
aprovado um novo currículo mínimo para os cursos de Serviço Social em agosto de 1982,  
estabelecido no Parecer nº 412/1982 do CFE, fruto de um processo de revisão iniciado no final  
da década de 1970, sob coordenação da então Associação Brasileira de Escolas em Serviço  
Sofia Laurentino Barbosa Pereira  
Social (Abess), que envolveu diversos cursos de Serviço Social do país, assim como contou  
com a participação do movimento estudantil. O referido currículo buscava uma visão mais  
ampla da realidade, de forma a “capacitar o aluno para compreender e analisar de forma crítica  
a realidade histórico-estrutural e o contexto institucional, onde se processa a prática do Serviço  
Social, habilitando-o a propor e operar alternativas de ação” (Brasil, 1982).  
Com o novo currículo, o processo formativo da UFPI passava a romper com uma  
perspectiva mais tradicional e conservadora da profissão e adotava uma orientação crítica, que  
compreendia o Serviço Social inserido na realidade sócio-histórica, claramente influenciada  
pela corrente de pensamento marxista. A proposta curricular visava formar profissionais  
dotados de:  
Clara compreensão da estrutura e conjuntura sócio-econômica e política a  
nível local, regional e nacional; consistente base teórico-metodológica que  
possibilite posicionamento crítico sobre a inserção do Serviço Social nos  
processos históricos das realidades sociais concretas; comprometido com uma  
ação efetiva na realidade social concreta, considerando alternativas da prática  
interventiva do Serviço Social que se colocam tanto no campo das ações do  
Estado quanto junto aos movimentos sociais populares (UFPI, 1987).  
Assim, há avanços qualitativos em relação a proposta curricular anterior, na busca por  
formar profissionais críticos, capazes de intervir sobre demandas locais, regionais e nacionais,  
perpassando a compreensão da estrutura, a necessidade de embasamento teórico-metodológico  
e a dimensão investigativa da profissão. Fica explícito, portanto, no perfil profissional e nos  
objetivos, a direção política do projeto de formação da UFPI, articulado a um projeto de  
sociedade crítico ao capitalismo, em sintonia com o movimento realizado pelo Serviço Social  
no cenário nacional.  
218  
Sabe-se que a interlocução do Serviço Social com a tradição marxista acontece a partir  
da década de 1960, sendo apenas na década de 1980 que há referência efetiva a teoria social de  
Marx na literatura da profissão, no cenário da renovação da profissão no país, com ênfase na  
intenção de ruptura (Netto, 2015), sobretudo a partir da publicação da obra “Relações Sociais  
e Serviço Social no Brasil” (Iamamoto; Carvalho, 2007). No Piauí, essa aproximação e  
influência mais direta da teoria de Marx na formação se deu de forma tardia, sendo observada  
explicitamente a partir de 1987, com a revisão curricular. Esse é um elemento fundamental do  
novo currículo: a vertente marxista como fundamento teórico-metodológica na formação.  
Em pesquisa monográfica realizada por Silva (2019), foi questionado a docentes do  
curso da UFPI sobre como se deu o processo de transição do Serviço Social tradicional para um  
currículo mais crítico, sobretudo a partir da introdução da teoria social de Marx no processo de  
formação, sintetizados nos depoimentos a seguir:  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 212-235, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
A tradição marxista na formação em Serviço Social na Universidade Federal do Piauí  
Eu integrei a comissão de apoio a revisão curricular, aí nesse processo a gente  
já começou a introduzir disciplinas que tivesse a discussão desses  
fundamentos da teoria mais crítica. [...] Nós começamos a trabalhar não só os  
anteriores fundamentos, mas já introduzir sobretudo a partir de Marx, a  
influência marxista no Serviço Social [...] A gente queria formar um  
profissional investigativo, crítico, que tivesse um posicionamento político,  
mas que tivesse uma boa bagagem teórica e técnica também (Professora 2).  
(Silva, 2019, p. 39).  
O que mais se discutia naquele momento era exatamente a superação de uma  
matriz funcionalista que dominava a intervenção profissional, sobretudo, na  
perspectiva de culpabilizar os indivíduos pela sua condição de desigualdade  
social, pela sua condição de desemprego, pela sua condição de... enfim, de um  
modo geral, pela sua condição social (Professora 4). (Silva, 2019, p. 47-48).  
Dessa forma, o novo currículo implementado no curso da UFPI se assenta sob a vertente  
marxista, perpassando toda a lógica da formação, desde os objetivos do curso, o perfil  
profissional formado, a organização curricular, as disciplinas e os conteúdos ministrados. Em  
outro momento, é destacado sobre a importância das abordagens marxistas para a formação em  
Serviço Social na UFPI:  
A teoria marxista, a partir do que o Marx propôs por meio do método de  
análise da realidade, contempla a necessidade que a gente tem de compreender  
a realidade na sua totalidade, em relação aos determinantes sociais que são  
amplos. [...] A gente entendeu que o positivismo limitava muito do ponto de  
vista de você se reduzir apenas aos fatos sociais, sem fazer a articulação com  
o contexto. Através do marxismo não, você tem um olhar para esse contexto  
e perceber aquilo que está acontecendo, e quais as implicações que isso tem  
do ponto de vista da repercussão sobre a sociedade [...] na medida em que ele  
questiona a ordem social e estabelece outras perspectivas de análise dessa  
realidade social (Professora 2) (Silva, 2019, p. 42).  
219  
No currículo que eu estava, a gente teve uma formação muito centrada na  
teoria marxista, e inclusive, a gente estudava não apenas Marx como o teórico  
mais importante, o fundamentador da teoria, mas a gente estudava Gramsci.  
[...] Avaliando daqui pra lá, eu percebo que a gente tinha uma formação muito  
sólida e muito interessante dentro dessa perspectiva marxista (Professora 4).  
(Silva, 2019, p. 47).  
Com certeza, esse conjunto de conhecimentos que o aluno adquire que tem a  
ver com esse aporte da teoria social de Marx, vai servir de bases pra leitura  
crítica da realidade, então, a compreensão da mais-valia como elemento  
fundamental à exploração do trabalho excedente e trabalho não pago, quer  
dizer, a consciência desse modelo e uma série de outros conceitos que diz  
respeito a como funciona o sistema produtivo capitalista vai gerar a  
possibilidade de um profissional que compreenda como funciona o sistema  
econômico nacional (Professora 6) (Silva, 2019, p. 55).  
Assim, a formação em Serviço Social na UFPI, a partir do segundo currículo pleno,  
passa a ser direcionada pela tradição marxista, tendo ainda uma ampliação significativa de  
conteúdos de base teórica no âmbito das Ciências Sociais, sobretudo na discussão sobre o  
Sofia Laurentino Barbosa Pereira  
materialismo histórico e dialético, que estava presente nas ementas nas disciplinas de filosofia,  
teoria sociológica e teoria do Serviço Social. Além disso, as discussões sobre sociedade  
capitalista, questão social, classes sociais, movimentos populares, dentre outras categorias que  
dialogam com o pensamento social de Marx, estavam presentes em diversos momentos do  
referido currículo.  
Sob a vigência da proposta curricular, percebe-se de forma mais direta as discussões  
sobre a reconceituação e autores de importante tradição marxista presentes nos Trabalhos de  
Conclusão de Curso de Serviço Social. Esse processo estava em consonância com o vivenciado  
pela categoria no cenário nacional, em que a profissão avançava na produção acadêmica,  
sobretudo resultante das interpretações pautadas na teoria de Marx, o que contribuiu para a  
conquista da maioridade intelectual da profissão.  
A pesquisa assume, assim, um papel decisivo na conquista de um estatuto  
acadêmico que possibilita aliar formação com capacitação, condições  
indispensáveis tanto a uma intervenção profissional qualificada, quanto à  
ampliação do patrimônio intelectual e bibliográfico da profissão, que vem  
sendo produzido especialmente, mas não exclusivamente, no âmbito da pós-  
graduação stricto senso (Guerra, 2009, p. 702)  
A articulação com as Ciências Sociais e, sobretudo, com a tradição marxista foi  
fundamental para o avanço de uma cultura da pesquisa e da ciência no Serviço Social brasileiro.  
A conquista da hegemonia da teoria social de Marx na literatura especializada da profissão, em  
meados da década de 1980, repercutiu na ampliação da produção do conhecimento produzido  
pelo Serviço Social no país e na consolidação da sua maturidade intelectual, o que também pode  
ser observado no âmbito da formação na UFPI, especialmente a partir do segundo currículo.  
A proposta curricular também apresentava conteúdos voltados a discussão da matriz  
teórica funcionalista, de forma secundária, além de situar outras matrizes, mais  
superficialmente. A compreensão sobre essas vertentes teóricas que influenciaram e  
influenciam o modo de ser e de fazer do Serviço Social em sua história, sinaliza uma busca pelo  
pluralismo na formação no referido currículo, entretanto, é necessário problematizar até que  
ponto não se beira ao ecletismo.  
220  
Pluralismo, como bem analisa Coutinho (1991, p. 13), compreendido como:  
[...] a necessidade do debate de ideia. É através da troca de ideias, da discussão  
com o diferente, que podemos afinar nossas verdades, fazer com a teoria se  
aproxime o mais possível do real. Não há ciência que esgote o real, pois a  
ciência é sempre aproximativa. Então, é absolutamente necessário o debate de  
ideias, no sentido de esclarecer nossas posições em relação a aproximação a  
uma verdade cada vez mais abrangente.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 212-235, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
A tradição marxista na formação em Serviço Social na Universidade Federal do Piauí  
O ecletismo, ao contrário, seria conciliar pontos de vista inconciliáveis, posições  
incompatíveis, como ocorreu em diversos momentos da trajetória do Serviço Social em que, na  
busca incessante por uma teorização ou uma metodologia de ação, a profissão abraçou modelos  
teóricos incompatíveis entre si. Essa herança permanece sob o segundo currículo do curso de  
Serviço Social da UFPI que, mesmo com esforço em se aproximar da matriz marxista, ainda se  
organizava sob estruturas funcionalistas.  
Essa perspectiva é assinalada por Frazão (1993), a partir de pesquisa monográfica  
realizada com estudantes que cursavam o referido currículo:  
O currículo prioriza duas matrizes teóricas. Essas matrizes são trabalhadas no  
curso sendo, o funcionalismo, o momento “alienado” do serviço social; e o  
materialismo histórico e dialético, o momento de superação, de libertação. O  
materialismo histórico e dialético se coloca como a corrente teórica mais  
importante na formação profissional, é repassada como se fosse a única “luz”  
para o serviço social. O funcionalismo, apesar de garantido nas disciplinas,  
não ocupa lugar de destaque, é sempre colocado como se fosse a grande  
“vergonha” do serviço social, o responsável por prática desenvolvida sem um  
posicionamento crítico (Frazão, 1993, p. 62).  
Nessa direção, é inclusive citado alguns documentos, que a corrente de inspiração  
marxista era apresentada na formação em Serviço Social da UFPI como um “dogma”, enquanto  
o conteúdo sobre o funcionalismo não era devidamente apreendido em sua essência, gerando  
compreensão meramente polarizada e imediatista sobre as duas perspectivas teórico-  
metodológicas (UFPI, 1990a). Isso sinaliza uma concepção frágil e dicotômica das teorias,  
contraditória com o método histórico dialético, o que indica uma apreensão enviesada dos  
fundamentos teórico-metodológicos no projeto formativo.  
221  
Isso resultou no que Quiroga (1991) denomina como invasão da lógica positivista no  
pensamento de Marx na formação em Serviço Social na época. Essa problemática estava  
presente em diversos cursos de Serviço Social do Brasil que implementaram o currículo mínimo  
de 1982, o que resultou em uma apropriação do marxismo mais como uma metodologia, em  
detrimento do seu patamar de teoria social.  
Importante retomar a análise de Netto (2015), ao afirmar que a primeira aproximação  
do Serviço Social brasileiro com a tradição marxista se deu forma problemática, em um  
“marxismo sem Marx”, gerando uma apropriação secundária, enviesada e eclética da teoria.  
Esse cenário fornece pistas importantes para compreender algumas das limitações encontradas  
no segundo currículo do curso de Serviço Social da UFPI, no que diz respeito a incorporação,  
com certa fragilidade teórica, da vertente marxista, como pode ser observado na passagem a  
seguir de docente do referido curso na época:  
[...] num primeiro momento, a minha aproximação e a apropriação das  
Sofia Laurentino Barbosa Pereira  
diferentes matrizes teóricas ainda estavam muito ligadas às leituras de  
segundas, terceiras ou mais interpretações do pensamento dos principais  
autores que falavam dessas teorias; outras vezes, a apropriação do Marxismo,  
por exemplo, se dava a partir de leituras de marxistas que positivavam Marx  
e seu pensamento, bem analisado na obra de Quiroga (1991). A divulgação  
dos livros de Martinelli (1989), Iamamoto e Carvalho (1986), Iamamoto  
(1992, 1998) e Netto (1991,1992) foram fundamentais para o meu “despertar”  
para uma leitura mais aprofundada e crítica dos clássicos e dos principais  
representantes das diversas correntes teóricas que influenciavam o Serviço  
Social. E essa nova postura profissional, de ler os principais clássicos dessas  
correntes teóricas ganhou força quando da realização do meu mestrado  
(Guimarães, 2017, p. 24-25).  
Além da necessidade de leitura direta da obra marxiana, outro elemento problemático  
se dava pela insuficiente capacitação do corpo docente acerca de novos conteúdos postos com  
a revisão curricular. Isto, pois, o quadro docente da UFPI, naquele momento, advinha de uma  
formação tradicional que dispunha de parca discussão teórica e ausência de conteúdos voltados  
a tradição marxista. Ademais, naquela época, eram poucos os cursos de mestrado e doutorado  
em Serviço Social existentes no país e, no geral, eram concentrados em outros Estados e regiões,  
o que dificultava a formação pós-graduada por docentes da UFPI, de modo que no período da  
implantação do segundo currículo apenas dois professores(as) do quadro eram mestres e o  
restante apresentava somente o título da graduação.  
Essa dinâmica era observada em todo o país, em que “via de regra, os professores de  
Serviço Social, frente as exigências atuais do projeto de formação profissional, deparam-se com  
a séria dificuldade: ter que ensinar teoria sem a necessária formação teórica” (Carvalho, 1986,  
p. 29). Isto, pois, como defendia Netto (1991, p. 94), “o ensino dos conteúdos pertinentes à  
tradição marxista depende, em primeiríssimo lugar, da qualificação dos quadros docentes. Isto  
implica uma preparação de base geralmente longa e um sistemático e contínuo trabalho  
intelectual”, e isso ainda aparecia como um desafio a ser enfrentado pelo corpo docente de  
Serviço Social da UFPI. Enfrentava-se o difícil desafio de “aprender a desaprender”, como dizia  
o poeta Fernando Pessoa (1965).  
222  
Essa questão reverberou em outras fragilidades no segundo currículo da UFPI, como a  
fragmentação entre os conteúdos de “teoria, método e história” do Serviço Social, que foram  
criados na busca pela superação da tríade de Serviço Social de “caso, grupo e comunidade”.  
Essa problemática já era observada no currículo mínimo de 1982, conforme analisa Netto  
(1986), que critica o “corte” realizado entre teoria e metodologia, e o divórcio destas com a  
história, que expressam uma compartimentalização na formulação do projeto curricular. Para o  
autor, a própria fragmentação desses conteúdos revela, em sua essência, uma concepção  
funcionalista da realidade:  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 212-235, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
A tradição marxista na formação em Serviço Social na Universidade Federal do Piauí  
Se eu me volto a pensar o Serviço Social [...] de que nós vamos ter uma teoria,  
uma história e um método – está diretamente ligado a quê? À concepção  
positivista [...] estrutural-funcionalista; de supor que eu posso cortar um  
fenômeno da realidade, abstraí-lo, estudá-lo em si e depois remetê-lo à  
totalidade social (Netto, 1986, p. 54).  
O modo como esses conteúdos eram trabalhados no projeto formativo expressava uma  
concepção positivista da realidade, incompatível com a teoria social de Marx e que, portanto,  
tende ao ecletismo (Netto, 1986). Essas e outras questões analisadas pelo autor acerca das  
“ambiguidades” do currículo de 1982, resgatam “velhos dilemas” da categoria, como o debate  
acerca da existência de uma metodologia e uma teoria própria do Serviço Social, decorrentes  
da busca por um estatuto técnico-científico para a profissão, que são herança de uma visão  
positivista.  
Desse modo, muitas das dificuldades encontradas no segundo currículo do curso de  
Serviço Social da UFPI eram reflexo da proposta curricular nacional vigente, que trazia  
determinadas imprecisões teóricas e atualizava velhos dilemas da formação profissional, sob  
novas roupagens.  
Esses elementos provocaram uma tendência teoricista na formação profissional, que  
privilegiava a discussão teórica por si mesma, de forma fragmentada da compreensão da  
realidade concreta, refletindo no perfil dos(as) profissionais que eram formados(as) naquele  
momento que, muitas vezes, tinham uma visão “heroica” do Serviço Social, como destacado  
no trecho a seguir, retirado de relatório sobre o referido currículo do curso da UFPI:  
223  
[...] No geral, os discentes: consideram a profissão como o “poder de  
transformar” a sociedade; buscam receitas que deverão ser postas em prática,  
na realidade profissional; são muito críticos, mas sem uma: “consistente” base  
teórico-metodológica; “clara compreensão” da estrutura e conjuntura. [...] Em  
síntese, o perfil do profissional que se pretende formar termina sendo aquele  
dotado, sobretudo, da capacidade crítica. E isso, crítica, pela crítica  
(Guimarães, 1990b, p. 4-5).  
Essa concepção se coaduna com a perspectiva messiânica da profissão, assim  
denominada por Iamamoto (2015, p. 22), entendida como “uma visão heroica do Serviço Social  
que reforça unilateralmente a subjetividade dos sujeitos, a sua vontade política sem confrontá-  
la com as possibilidades e limites da realidade social”. Carvalho (1986) já sinalizava essas  
tendências em várias escolas de Serviço Social no país no processo de implementação do  
currículo mínimo de 1982, que traziam um estudo mecânico de conceitos e uma visão formalista  
e a-histórica do conhecimento, sem se articular efetivamente com a realidade ou com a  
intervenção profissional.  
Sofia Laurentino Barbosa Pereira  
Esses elementos também evidenciam a necessidade de maior articulação entre as  
dimensões teórico-metodológica e interventiva na formação profissional que, segundo  
entrevista com discentes formados(as) pelo referido currículo da UFPI, era necessário para a  
formação “sair do nível teórico e investir na instrumentalização” (UFPI, 1990b, p. 10).  
Apesar disso, são incontestáveis os avanços trazidos pelo segundo currículo pleno de  
1987 para a formação em Serviço Social na UFPI, sobretudo na busca pelo rompimento com o  
conservadorismo na profissão e pela aproximação com a tradição marxista. Conforme análise  
de Guimarães (2017), o referido projeto curricular perseguiu os anseios da “intenção de  
ruptura”, expressando, portanto, o movimento vivenciado pelo Serviço Social na realidade  
brasileira, refletindo ainda a dinâmica de efervescência social e política do país naquele  
momento. Intenção de ruptura, compreendida por Netto (2015), no cerne do processo de  
renovação do Serviço Social no Brasil, como uma perspectiva que:  
[...] possui como substrato nuclear uma crítica sistemática ao desempenho  
“tradicional” e aos seus suportes teóricos, metodológicos e ideológicos. Com  
efeito, ela manifesta a pretensão de romper quer com a herança teórico-  
metodológica do pensamento conservador (a tradição positivista), quer com  
os seus paradigmas de intervenção social (o reformismo conservador). [...] Na  
sua evolução e explicitação, ela recorre progressivamente à tradição marxista  
(Netto, 2015, p. 206).  
No entanto, como visto, o segundo currículo apresentava resquícios de continuidade  
com o anterior, revelando novos desafios e limites que precisariam ser enfrentados. Foi diante  
desse cenário que foi realizada uma nova revisão curricular, no sentido de materializar os  
avanços trazidos e superar as fragilidades, visando ainda dinamizar a formação em Serviço  
Social da UFPI para responder as novas exigências e necessidades postas à profissão.  
Nessa direção, em 1994 foi aprovado o terceiro currículo pleno do curso, implementado  
em um cenário de grandes transformações sociais, políticas e econômicas no país e na profissão.  
Na conjuntura nacional, vivenciavam-se os ventos democráticos após a aprovação da nova  
Carta Magna, que consagrava uma nova relação entre Estado e sociedade civil, sendo conhecida  
como “Constituição Cidadã”. O início da década de 1990 também foi marcada por importantes  
avanços para o Serviço Social, com a aprovação do Código de Ética de 1993 e da Lei de  
Regulamentação da profissão. Ao mesmo tempo, foi nesse contexto que se desenvolveu a  
contrarreforma do Estado que, sob o discurso de crise fiscal, coloca em pauta uma agenda  
neoliberal, atendendo a orientação dos organismos econômicos internacionais, a qual impacta  
as políticas sociais, o mundo do trabalho e provoca o agravamento da questão social. Essas  
questões da realidade atravessaram os debates da categoria e permearam a reformulação  
curricular do curso de Serviço Social da UFPI.  
224  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 212-235, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
A tradição marxista na formação em Serviço Social na Universidade Federal do Piauí  
O referido currículo tinha como objetivo geral: “formar profissionais com competência  
teórico-metodológica e técnica para compreender e intervir na realidade social brasileira e  
piauiense, atentos para as novas questões que se apresentem frente a esta realidade” (UFPI,  
1994, p. 11).  
O novo currículo passou a incluir conteúdos sobre o marxismo, o positivismo, o  
funcionalismo, a fenomenologia, o estruturalismo e as tendências teóricas pós-modernas. Essa  
mudança visava superar as limitações da proposta anterior, que estava centrada no materialismo  
dialético de Marx e abordava o positivismo apenas de forma superficial. Assim, a formação no  
curso de Serviço Social da UFPI avançava em direção ao pluralismo, mas permanecia com a  
centralidade das discussões inspiradas na abordagem marxista.  
Além disso, há incorporação de conteúdos voltados a compreensão e aos debates que  
ganham foco nos fins da década de 1980 no cerne das Ciências Humanas e Sociais, como a  
crise da modernidade e da razão, que gera a ampliação da discussão sobre as denominadas  
teorias pós-modernas, bem como seus impactos na produção do conhecimento e no Serviço  
Social, conforme explica Simionatto (2019):  
Os embates em torno da chamada “crise dos paradigmas” ou das “grandes  
narrativas” e o proclamado fim das ideologias e das utopias colocaram em  
xeque o projeto da modernidade e os sistemas globalizantes de explicação da  
vida social. A razão dialética, até então afirmada como um conhecimento que  
é também ferramenta de luta política e social e, portanto, de transformação  
revolucionária da sociedade, é desqualificada em favor das tendências pós-  
modernas e sua contraposição ao marxismo (Simionatto, 2019, p. 94).  
225  
O terceiro currículo do curso de Serviço Social incorpora esse debate, em consonância  
com o movimento vivenciado pela categoria no cenário nacional, no qual essas questões se  
apresentavam como parte das discussões da reformulação curricular no país na década de 1990.  
Cabe evidenciar que, enquanto era aprovado em 1994 o terceiro currículo pleno de  
Serviço Social na UFPI, em 1996 ocorria a reformulação de um novo currículo mínimo para as  
escolas de Serviço Social do país e a aprovação das Diretrizes Curriculares da Abepss. Além  
disso, nesse período, também eram definidas um conjunto de medidas pelo Governo Federal  
que iriam afetar a estrutura de todos os currículos dos cursos do Brasil, com a aprovação da Lei  
de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), o que também desencadeia um amplo processo de  
discussão sobre os rumos da formação profissional.  
Fruto de debates e construções coletivas da categoria, as Diretrizes Curriculares  
expressam um projeto de formação para o Serviço Social brasileiro que se alinha a um projeto  
societário em que a educação é concebida como direito social e dever do Estado, conformando  
o Projeto Ético-Político da profissão, ao lado do Código de Ética de 1993 e da Lei nº  
Sofia Laurentino Barbosa Pereira  
8.662/1993, direcionado por bases teórico-metodológicas críticas e perspectivas ético-políticas  
emancipatórias.  
Em 2007, o curso de graduação em Serviço Social da UFPI implementa o seu Projeto  
Pedagógico, alinhado à proposta nacional, que deu base para o quarto currículo. No ano de  
2012, o Projeto Pedagógico do Curso (PPC) sofre alguns ajustes, na reestruturação de conteúdos  
e disciplinas. O referido projeto se organiza a partir de três núcleos de fundamentação, em  
conformidade com as Diretrizes Curriculares: Núcleos de Fundamentos Teórico-Metodológicos  
da Vida Social, Núcleo de Fundamentos da Formação Sócio-Histórica da Sociedade Brasileira  
e Núcleo de Fundamentos do Trabalho Profissional. Esses núcleos congregam os conteúdos que  
precisam ser apreendidos no processo formativo, desdobrando-se em áreas de conhecimento,  
que traduzem o conjunto de componentes curriculares, de forma a romper com a visão  
formalista do currículo, antes reduzido a matérias e disciplinas, assim como ultrapassar o modo  
de apreensão fragmentada dos conteúdos e do conhecimento. Portanto, manifestam “níveis  
diferenciados de apreensão da realidade social e profissional, subsidiando a intervenção do  
Serviço Social” (Abess/Cedepss, 1996, p. 9).  
Assim, os núcleos representam um conjunto de conteúdos necessários para a formação  
profissional que se articulam como eixos estruturadores do projeto formativo, compreendidos  
como uma unidade, a partir de uma perspectiva de totalidade:  
226  
Compreender essa lógica de articulação dos núcleos de fundamentação é  
entender os fundamentos da profissão e o próprio método materialista-  
histórico e dialético que ancora essa concepção, pois parte do entendimento  
de que os conteúdos dos núcleos não estão desconectados de uma  
materialidade – o processo de produção e reprodução da vida social –, mas  
explicita as dimensões de universalidade, particularidade e singularidade na  
leitura e apreensão da realidade concreta. Essas dimensões são fundamentais  
para que, na formação, o aluno possa apreender os processos pelos quais o  
trabalho profissional se desenvolve, entendendo que essa leitura é condição  
necessária para se ultrapassar as demandas imediatas presentes no cotidiano  
profissional (Maroneze; Fortune, 2023, p. 141).  
A questão social ganha centralidade na formação profissional com as Diretrizes  
Curriculares, concebida como a base de fundação sócio-histórica da profissão. Dessa forma, a  
concepção de questão social trazida no projeto de formação da Abepss expressa o debate  
amadurecido pela categoria, sobretudo desde a década de 1980, que compreende, como sintetiza  
Netto (2001), a questão social como constitutiva da sociabilidade capitalista, expressão das  
relações de contradição e exploração entre capital e trabalho, portanto, uma compreensão à luz  
da teoria social de Marx.  
Em consonância com a proposta nacional, o Projeto Pedagógico do curso de Serviço  
Social da UFPI também dá centralidade ao tema. Na estrutura curricular, a discussão sobre a  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 212-235, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
A tradição marxista na formação em Serviço Social na Universidade Federal do Piauí  
questão social aparece de forma transversal, tanto como conteúdo ministrado em diversas  
disciplinas, como nos pressupostos balizadores da formação, nos objetivos do curso e nas  
competências e habilidades esperadas pelos(as) egressos(as). É introduzida uma disciplina com  
a nomenclatura “Questão Social”, com carga horária de 60 horas, com seguinte ementa:  
“Emergência, significados, desenvolvimento e configuração da questão social no Brasil,  
destacando as dimensões gerais da questão social na contemporaneidade” (UFPI, 2012, p. 59).  
Além disso, a discussão está presente tanto em ementas e bibliografias de outros componentes  
curriculares, como Fundamentos Históricos Teóricos e Metodológicos do Serviço Social,  
Oficina de Expressões e Vivências de Questão Social no Piauí, Processo de trabalho, Política  
Social e Seminário de Prática.  
Iamamoto (2015) ressalta que, com as Diretrizes Curriculares da Abepss, a formação  
passa a ter como foco, além da questão social, na discussão sobre o trabalho profissional, o que  
é um avanço importante comparado com as propostas curriculares anteriores, que traziam uma  
concepção limitada de “prática”, apreendida de forma segmentada e dicotômica da teoria. O  
debate sobre o trabalho vem adquirindo maior visibilidade na categoria desde meados de 1980,  
a partir do diálogo com a teoria social de Marx, que passa a compreender a profissão como  
especialização do trabalho coletivo, inscrita na divisão social e técnica do trabalho e inserida  
na relação contraditória das classes sociais.  
227  
Assim, Iamamoto (2015, p. 95) defende que “transitar do foco da prática ao trabalho  
não é uma mudança de nomenclatura, mas de concepção”, que tem como subsídio o pensamento  
de Marx. Implica apreender o trabalho como categoria central na produção e reprodução na  
vida social, chave para compreensão das relações econômicas e sociais, que atravessam o  
exercício profissional do(a) assistente social. Assim, é inegável que essa concepção é inspirada  
na tradição marxista.  
De tal modo, no cerne das mudanças postas pelas Diretrizes Curriculares da Abepss,  
está a centralidade do debate sobre o trabalho profissional, o que é verificado no PPC da UFPI,  
como destaca o trecho a seguir:  
A nova lógica curricular tem o trabalho como central na constituição do ser  
social. Neste horizonte é colocado para o processo de formação profissional o  
entendimento do processo de trabalho do assistente social no cerne do debate  
teórico-metodológico que possibilite uma apreensão crítica do ideário  
profissional (UFPI, 2012, p. 20).  
A importância da compreensão do Serviço Social enquanto trabalho e a centralidade  
dessa categoria na formação profissional é trazida no depoimento de uma docente do curso de  
Serviço Social da UFPI:  
Sofia Laurentino Barbosa Pereira  
[...] A categoria trabalho leva a gente pensar o próprio exercício profissional,  
como o trabalho, o que nos associa a categoria, a classe trabalhadora. Então,  
esse é um elemento fundamental para o nosso Projeto Ético-Político, que é a  
defesa dos interesses dessa classe trabalhadora, da qual nós nos incluímos. [...]  
A alienação é um elemento central também porque a gente compreende que o  
processo de alienação mesmo associado aos processos de trabalho. Ele  
também permite que a gente compreenda que nós estamos inseridos em  
processos que podem levar à alienação, se a gente não ultrapassar o  
imediatismo, o tarefismo, esse praticismo sem teoria. [...] Eu compreendo que  
essas categorias elas não são conceitos, são categorias que expressam a  
realidade como ela é, e compreender é fundamental (Professora 5). (Silva,  
2019, p. 51).  
O trecho anterior assinala para uma concepção de trabalho pautada na teoria crítica de  
Marx, que concebe o(a) assistente social enquanto trabalhador assalariado e, portanto, inserido  
nas contradições inerentes a classe trabalhadora. Esse é um marco fundamental que separa  
substantivamente o Projeto Pedagógico atual dos currículos anteriores do curso de Serviço  
Social da UFPI que, até então, tinham uma compreensão limitada do exercício profissional  
enquanto “prática” ou “intervenção”.  
Assim, essa concepção do Serviço Social enquanto trabalho, que fundamenta o projeto  
de formação profissional, possibilitou ainda um avanço no debate sobre as dimensões técnico-  
operativas, articuladas a teórico-metodológico e ético-política, inexistente nos currículos  
anteriores. No caso do terceiro currículo pleno há um avanço, entretanto, permanece o foco nos  
fundamentos teóricos do Serviço Social, que trabalhavam de forma fragmentada tanto a história  
da profissão quanto a dimensão interventiva.  
228  
As Diretrizes Curriculares colocam como princípios que fundamentam a formação  
profissional:  
Rigoroso trato teórico, histórico e metodológico da realidade social e do  
Serviço Social, que possibilite a compreensão dos problemas e desafios com  
os quais o profissional se defronta no universo da produção; e reprodução da  
vida social.  
Adoção de uma teoria social crítica que possibilite a apreensão da totalidade  
social em suas dimensões de universalidade, particularidade e singularidade  
(Abess/Cedepss, 1996, p. 6)  
Esses princípios delineiam um perfil profissional com capacitação teórico-  
metodológica, ético-política e técnico-operativa para a apreensão crítica do processo histórico  
como totalidade (Abess/Cedepss, 1996). Dessa forma, é nítido que o projeto formativo do  
Serviço Social é calcado em uma perspectiva histórico-crítica, orientada pela tradição marxista:  
As diretrizes da ABEPSS asseguram o pluralismo teórico, mas possuem uma  
clara orientação da formação profissional fundada na teoria social crítica de  
Marx e na tradição marxista, que orienta a compreensão da sociedade  
capitalista de modo crítico, que considera as expressões da questão social  
como objeto de intervenção do serviço social e o trabalho como categoria-  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 212-235, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
A tradição marxista na formação em Serviço Social na Universidade Federal do Piauí  
chave para compreender a relações econômicas e sociais (Boschetti, 2004, p.  
26).  
É possível verificar conteúdos específicos voltados para a compreensão do pensamento  
social de Marx e de abordagens marxistas em diversos componentes do Projeto Pedagógico,  
que citam diretamente, em suas ementas ou bibliografias, Marx ou marxismo, tais como:  
Introdução ao Serviço Social, Fundamentos Históricos Teóricos e Metodológicos do Serviço  
Social, Economia Política, Iniciação a Política, Pesquisa Social, Processo de Trabalho e  
Seminário Temático. As obras citadas de Marx nas bibliografias são: A ideologia Alemã;  
Contribuição à crítica da Economia Política; O Capital; e Manifesto do partido comunista.  
Além dessas, existem diversas disciplinas que trabalham em seus conteúdos autores da  
tradição marxista, sobretudo na literatura do Serviço Social crítico, pós-reconceituação. Dentre  
os mais citados no PCC estão: José Paulo Netto (11), Marilda Iamamoto (9), Carmelita Yazbek  
(5), Ana Elizabete Mota (5), Ivanete Boschetti (4), Elaine Behring (3) e Vicente Faleiros (3),  
que expressam um pouco da vasta produção teórica construída pelo Serviço Social brasileiro a  
partir da interlocução com o pensamento marxista.  
Há uma diversidade de autores e interpretes da abordagem marxista. Dentre os  
pensadores reconhecidos da tradição do marxismo clássico citados no Projeto Pedagógico estão  
Gramsci, Lenin e Lukács. Alguns outros autores de abordagem marxista que se destacam são:  
Louis Althusser, Eric Hobsbawm, Ernest Mandel e Karel Kosic. Todavia, são pouco citados,  
presentes sobretudo como bibliografia no componente curricular de Seminário Temático II, que  
tem como ementa o estudo marxismo. Esse fato não implica, entretanto, que esses autores não  
sejam incorporados nos planos de outras disciplinas, a depender das escolhas dos(as) docentes  
que as ministram.  
229  
Observa-se ainda um maior espraiamento de autores de abordagem marxista no país  
permeando a bibliografia de outros componentes curriculares, como Fundamentos Históricos  
Teóricos e Metodológicos do Serviço Social (FHTM), Questão Social, Política Social,  
Sociedade Civil e Movimentos Sociais. É o caso de Carlos Nelson Coutinho, Florestan  
Fernandes, Octavio Ianni e Francisco de Oliveira.  
Assim, a teoria social de Marx orienta o PPC de Serviço Social da UFPI, que se alinha  
a perspectiva hegemônica no Projeto Ético-Político da profissão, conforme é possível observar  
em todo o documento curricular, nos pressupostos formativos, nos objetivos do curso, nas  
ementas e bibliografias das disciplinas. Todavia, isso não significa que o mesmo não seja  
pautado no pluralismo, seguindo inclusive os direcionamentos das Diretrizes Curriculares, que  
apresentam como princípio que fundamenta a formação:  
Sofia Laurentino Barbosa Pereira  
Exercício do pluralismo como elemento próprio da natureza da vida  
acadêmica e profissional, impondo-se o necessário debate sobre as várias  
tendências teóricas, em luta pela direção social da formação profissional, que  
compõem a produção das ciências humanas e sociais (Abess/Cedepss, 1996,  
p. 7).  
Essa concepção se alinha ao princípio do Código de Ética de 1993, que defende a  
“garantia do pluralismo, através do respeito às correntes profissionais democráticas existentes  
e suas expressões teóricas, e compromisso com o constante aprimoramento intelectual” (Brasil,  
2012, p. 24). Pluralismo, como analisado anteriormente, compreendido como debate de ideias  
e concepções de mundo, “um modo de convivência entre correntes de pensamento, pois  
reconhece, aceita a existência de diferentes posições, opiniões e pensamento” (Yazbek, 2019,  
p. 51). Essa perspectiva também permeia o PPC da UFPI, que apresenta como princípio que  
fundamenta a formação: “pluralismo teórico como eixo na construção da direção social da  
formação profissional” (UFPI, 2012, p. 18).  
Nessa direção, as disciplinas de Seminário Temático discutem as distintas correntes  
teóricas que dialogam com o Serviço Social, como positivismo / funcionalismo, marxismo,  
fenomenologia, estruturalismo, dentre outras. Além dessas, os componentes curriculares de  
FHTM também têm em seu conteúdo a compreensão das distintas matrizes do pensamento  
social que orientam a profissão em sua trajetória, assim como os rebatimentos das teorias pós-  
modernas no Serviço Social na contemporaneidade. Na disciplina de Ética profissional, o  
pluralismo é apresentado como princípio do Código de Ética de 1993, o que exige a apreensão  
das diferentes orientações ético-políticas da profissão em sua trajetória e seus fundamentos  
teórico-metodológicos. Tem-se ainda o componente de Pesquisa Social que discute as matrizes  
teóricas e os métodos na pesquisa social, com foco no método em Marx.  
230  
Assim, os(as) discentes formados(as) no curso de Serviço Social da UFPI têm, ao longo  
do seu processo formativo, a possibilidade de conhecer e dialogar sobre as distintas matrizes  
teóricas das Ciências Sociais e compreender sobre sua influência na profissão e na realidade,  
tendo os fundamentos orientadores pela tradição marxista como hegemônico.  
Outro aspecto importante trazido pelas Diretrizes Curriculares é a centralidade da  
pesquisa na formação em Serviço Social, ao considerar as “dimensões investigativa e  
interventiva como princípios formativos e condição central da formação profissional, e da  
relação teoria e realidade”, assim como a “indissociabilidade nas dimensões de ensino, pesquisa  
e extensão” (Abess/Cedepss, 1996, p. 6). De tal modo, é ultrapassada a concepção da pesquisa  
apenas como disciplina, constituindo-se como um dos princípios e condição da formação  
profissional, possibilitando uma postura investigativa que deve ser transversal a todo o processo  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 212-235, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
A tradição marxista na formação em Serviço Social na Universidade Federal do Piauí  
formativo, de forma a garantir que “[...] o perfil do/da profissional contivesse a determinação  
dialética da busca da superação da aparência pela mediação da investigação em direção ao  
concreto pensado” (Pontes, 2023, p. 96).  
O Projeto Pedagógico de Serviço Social da UFPI está em consonância com essa  
perspectiva, ao estabelecer não apenas disciplinas de pesquisa social, monografia, oficinas,  
como também prevê a utilização de instrumentos avaliativos do processo de ensino-  
aprendizagem que estimulem a realização de pesquisas, trabalhos científicos etc. A dimensão  
investigativa também é fomentada na vivência do estágio supervisionado, na busca por articular  
pesquisa e trabalho profissional. Além disso, está previsto no projeto a inserção de estudantes  
em grupos e núcleos de pesquisa, em programas de iniciação científica, em eventos científicos,  
a produção de artigos para apresentação em congressos, dentre outros, que são contabilizados  
como carga horária para as atividades complementares. Cabe evidenciar que todo esse processo  
foi dinamizado pela qualificação do corpo docente que, na implementação do PPC, passou a  
ser formado integralmente por mestres(as) e doutores(as).  
As temáticas latentes no projeto de formação vão ganhando espaço nas pesquisas  
dos(as) discentes e docentes do curso, tais como: políticas sociais, seguridade social, proteção  
social, direitos sociais, cidadania, transformações no mundo do trabalho, expressões da questão  
social, processos de trabalhos do(a) assistente social, movimentos sociais, dentre outros. No  
geral, observa-se um alinhamento dos estudos com a tradição marxista, a partir da análise pelo  
método dialético crítico ou pelas bibliografias utilizadas, mas também há pesquisas que  
dialogam com outras tendências teóricas, embora sejam em número reduzido.  
231  
Considerações finais  
O artigo pretendeu contribuir com a literatura acerca do Serviço Social no Piauí, a partir  
de um olhar investigativo para os seus fundamentos, subsidiado por uma análise na dialética  
crítica. Compreender as particularidades e os significados sócio-históricos da profissão e da  
formação nos distintos estados e regiões é fundamental para retroalimentar os estudos de  
reconstrução histórica do Serviço Social no Brasil e para enfrentar os desafios postos na  
contemporaneidade, na medida em que “a história é a fonte de nossos problemas e a chave de  
suas soluções” (Iamamoto, 2015, p. 203).  
A análise da trajetória da formação no curso de Serviço Social da Universidade Federal  
do Piauí ao longo de quase cinco décadas revela, mais do que os registros curriculares, marcas  
temporais, que articulam interesses individuais e coletivos, visões de mundo, tendências  
Sofia Laurentino Barbosa Pereira  
teórico-metodológicas, projetos de profissão e de sociedade distintos, que só podem ser  
compreendidos a partir de sua inserção na realidade sócio-histórica do Brasil e do Piauí.  
Em seu surgimento, em 1976, permeava no curso de Serviço Social da UFPI um  
currículo guiado por uma perspectiva conservadora de profissão e de sociedade, permeado por  
fundamentos funcionalistas, que atendia a lógica da proposta curricular nacional vigente em  
1970 e aos interesses do Estado ditatorial. Apenas a partir de 1987 é possível verificar a  
influência da tradição marxista no projeto de formação, com a reformulação curricular na UFPI,  
alinhado ao currículo mínimo de 1982, que acompanhava os importantes acontecimentos  
históricos, sociais, políticos e econômicos vivenciados pelo Serviço Social e pela sociedade no  
país e no Estado na época. Assim, o segundo currículo pleno apresenta avanços fundamentais  
em relação ao anterior, com uma visão ampla e crítica sobre a profissão e a realidade, mas ainda  
trazia fragilidades teórico-metodológicas, que evidenciavam, dentre outros elementos, a  
necessidade de uma melhor compreensão acerca da teoria social de Marx, as quais o terceiro  
currículo, aprovado em 1994, buscou superar. Em 2007, com a aprovação do Projeto  
Pedagógico à luz das Diretrizes Curriculares da Abepss, o curso de Serviço Social da UFPI  
consolida uma direção social crítica na formação, tendo o pensamento marxista como  
fundamento teórico-metodológico hegemônico, mas dialogando com outras matrizes do  
conhecimento, em uma perspectiva pluralista.  
232  
O aprofundamento de estudos acerca dos fundamentos do Serviço Social e das  
contribuições da tradição marxista para a profissão é fundamental, sobretudo na realidade atual,  
em que o avanço do ultraneoliberalismo e neoconservadorismo tem colocado profundos  
desafios para a defesa do Projeto Ético-Político da profissão, que se coloca radicalmente oposto  
a essas perspectivas, vinculado a construção de uma nova ordem societária sem dominação,  
opressão e exploração. No que tange a política de educação, o crescimento da privatização, do  
ensino à distância, da precarização da formação e o sucateamento das universidades públicas  
reforçam a importância do fortalecimento de um projeto formativo pautado em princípios ético-  
políticos emancipatórios e fundamentos teórico-metodológicos críticos, tal qual apregoa as  
Diretrizes Curriculares da Abepss.  
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