Para uma crítica à “Sociedade de consumo” e  
ao fim da transcendência da alienação em  
Jean Baudrillard  
Towards a critique of “The consumer society” and the end of the  
transcendence of alienation in Jean Baudrillard  
Dariane Cordeiro de Araújo*  
Marlon Garcia da Silva**  
Resumo: O artigo analisa criticamente a obra  
“A sociedade de consumo”, de Jean Baudrillard,  
polemizando contra as teses do autor sobre a  
natureza, as raízes e imbricações do consumo no  
capitalismo da segunda metade do século XX.  
Nesse âmbito, busca retomar teses e argumentos  
Abstract: The article critically analyzes Jean  
Baudrillard's work "The Consumer Society",  
polemicizing against the author's theses on the  
nature and the roots and imbrications of  
consumption in capitalism in the second half of  
the 20th century. In this context, it seeks to  
return to classic theses and arguments of  
marxism, sustaining the impropriety of the  
detachment between the forms of consumption  
and the forms of activity, of production, and  
sociability that matrix and preponderate the  
interactions between partial complexes of the  
economic totality. Thus, Marx's analysis of the  
commodity fetish is unintelligible without  
consideration of commodity production and its  
capitalist specificity, nor can the category of  
alienation and the consideration of its  
conditions of possibility of supersumption be  
sufficiently considered, if they are detached  
from their internal, active, practical-sensible  
and social forms.  
clássicos do marxismo, sustentando  
a
impropriedade das cisões entre as formas do  
consumo e as formas da atividade, da produção  
e
da  
sociabilidade  
matrizadoras  
e
preponderantes das interações entre complexos  
parciais da totalidade econômica. Assim, a  
análise de Marx do fetiche da mercadoria é  
ininteligível sem a consideração da produção  
mercantil e da sua especificidade capitalista,  
tampouco a categoria da alienação e a  
consideração das suas condições de  
possibilidade de suprassunção podem ser  
consideradas suficientemente, se forem  
desvinculadas de suas formas internas, ativas,  
prático-sensíveis e sociais.  
Palavras-chaves: Marxismo; Capitalismo;  
Keywords: Marxism; Capitalism; The  
Sociedade  
Alienação.  
de  
Consumo;  
Mercadoria;  
Consumer Society; Commodity; Alienation.  
*
Bacharel em Serviço Social pela Universidade Federal de Ouro Preto. Pesquisadora bolsista no projeto  
“Qualificação da formação e do exercício profissional de assistentes sociais da região dos Inconfidentes: a arte  
como ferramenta de trabalho nas Proteções Sociais Básica e Especial da Política de Assistência Social”, vinculado  
ao Curso de Serviço Social da Universidade Federal de Ouro Preto. ORCID: https://orcid.org/0009-0005-3796-  
**  
Doutor pela Universidade Federal de Santa Catarina. Professor do Curso de Serviço Social da Universidade  
DOI: 10.34019/1980-8518.2024.v24.43503  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 07/02/2024  
Aprovado em: 17/06/2024  
Dariane Cordeiro de Araújo; Marlon Garcia da Silva  
Introdução  
O presente artigo tem em consideração teses filosóficas sensíveis e críticas aos  
fenômenos do fetichismo da mercadoria, da reificação das relações sociais, da alienação e do  
estranhamento, tendo em vista as relações de consumo no capitalismo, especialmente, desde a  
segunda metade do século XX.  
É razoável ponderar que, tanto em termos práticos quanto teóricos, ou seja, tanto no  
evolver crescentemente contraditório do capitalismo, quanto também nas reflexões científicas  
e filosóficas correspondentes, esses fenômenos se tornam mais abrangentes, extensivos e  
intensivos. Considere-se, por exemplo, sua exponenciação na vida urbana no capitalismo  
monopolista no evolver do século XX, bem como, por outro lado, textos filosóficos em grande  
medida voltados a esses fenômenos, desde o seminal História e Consciência de Classe até o  
conjunto de textos críticos redigidos por autores situados no âmbito da chamada Escola de  
Frankfurt.  
O presente artigo reconhece essas elaborações críticas, e traz, polemicamente, em sua  
fundamentação teórica, teses marxistas pouco repercussivas ou mesmo conhecidas na filosofia  
acadêmica e no pensamento filosófico e científico contemporâneos. Nos referimos aqui a teses  
estabelecidas pelo filósofo húngaro marxista György Lukács em sua obra tardia, em especial, a  
ideias e argumentos defendidos pelo autor em Para uma Ontologia do Ser Social1. Nesse  
âmbito, recorre-se também à letra e algumas obras de Karl Marx, para fins de subsídio tanto à  
leitura da teoria e das categorias lukcscianas, quanto para a armação da estrutura crítica geral  
do artigo. Nesta arquitetura, consideramos e analisamos criticamente as elaborações, teses e  
argumentos do inteligente e instigante livro “A Sociedade de Consumo”, de Jean Baudrillard,  
publicado pela primeira vez no ano de 1970.  
710  
O tema proposto consiste no desenvolvimento de um debate crítico tendo em vista o que  
sugerimos como destituição ontológica procedida no texto de Baudrillard. Neste sentido, o  
senso de realidade e a perspicácia do autor francês no tratamento crítico de fenômenos  
contemporâneos como fetichismo e reificação, quando o mesmo busca apreender novas  
determinações e formas de expressão desses fenômenos nas relações de consumo na segunda  
metade do século XX, mostram-se, não obstante certos méritos inequívocos, a nosso ver,  
1 A polêmica obra “Para uma ontologia do ser social”, inacabada e póstuma, na qual o filósofo húngaro marxista  
György Lukács trabalhou de meados dos anos 1960 até o início de 1970, sustenta, em termos inéditos, a existência  
de uma ontologia histórico-materialista e dialética do ser social na obra de Karl Marx, uma ontologia que não  
coincide com metafísica, com absolutos e com invariáveis, na qual a substância é tomada como o que persiste na  
mudança, e as categorias não são meros enunciados sobre “algo que é ou se torna, mas sim partes moventes e  
movidas da própria matéria”, “formas de ser, determinações da existência”, de modo que o seu objeto é “o ser e  
suas transformações” (Lukács, 2014).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 2, p. 709-733, jul./dez. 2024. ISSN 1980-8518  
Para uma crítica à “Sociedade de consumo” e ao fim da transcendência da alienação em Jean Baudrillard  
parciais, limitados e insuficientes, uma vez que o autor cinde e corta as ilações substantivas  
entre os fenômenos e os processos do consumo com suas determinações mais fundamentais, de  
base, da produção e reprodução do capital e da sociabilidade burguesa como totalidade  
orgânica. É nesse sentido que podemos pensar, em termos iniciais, a referida destituição  
ontológica.  
Buscaremos procedimentos capazes de favorecer e facultar o desvelamento das  
determinações objetivas e subjetivas que se encontram nas bases, nos fundamentos, nas relações  
sociais historicamente travadas, por vias que sugerem, a nosso ver, não só a necessidade do  
estudo de caráter ontológico, no sentido aqui aludido, mas também, articuladamente, da crítica  
ao sistema econômico vigente, capitalista, alicerçado nos imperativos de expropriação da  
riqueza social, socialmente produzida e, por conseguinte, movente e movido nas relações de  
poder e dominação que atravessam as lutas de classes sociais antagônicas.  
O artigo está dividido em quatro tópicos, que correspondem ao desdobramento  
científico da abordagem materialista, histórica e dialética, do objeto delimitado, no âmbito do  
qual são desenvolvidas provocações acerca das formas de ser e de consciência, desde as  
relações do trabalho, da produção e da reprodução social da vida material e subjetiva, suas  
categorias, dinâmicas e regularidades, indissociáveis do contexto histórico e da ordem burguesa  
tomada como totalidade social.  
711  
Nesses movimentos, a análise da obra de Jean Baudrillard permite o desenvolvimento  
preambular de uma crítica que pretende ir além do exame estrito da própria obra. Quer dizer,  
busca-se entender a problemática por trás do pensamento do autor acerca do consumo e das  
relações nele implicadas, um pensamento, a propósito, representativo de tendências importantes  
da chamada teoria social crítica contemporânea.  
Nessas vias, considera-se também, como aludido nestas linhas, certo distanciamento  
que a obra estabelece de um pensamento, por assim dizer, mais radical, no sentido marxiano de  
“ir à raiz” dos fenômenos sociais, aos fundamentos sócio-materiais da produção, sem o que,  
sugerimos, não se pode compreender com clareza, no limite, as relações de consumo, suas  
determinações, desdobramentos e formas de expressão, bem como, não se pode compreender  
tampouco as relações de distribuição e de circulação de mercadorias no capitalismo em geral e  
no período considerado.  
Estas preocupações de base e inquirições pretendem, pois, estender a reflexão a um nível  
de argumentação capaz de situar os fenômenos prático-sensíveis e subjetivos do fetichismo e  
da reificação num quadro analítico mais abrangente, de totalidade social, no qual não sejam  
subestimadas, menos ainda excluídas, as relações sócio-materiais da base produtiva e  
Dariane Cordeiro de Araújo; Marlon Garcia da Silva  
reprodutiva do capitalismo e da sociedade burguesa nas suas conformações complexas,  
especialmente, desde a segunda metade do século XX.  
Sacralização da mercadoria e alienação na sociedade de consumo  
Neste tópico dedicado à análise das teses de Jean Baudrillard no livro “A sociedade de  
consumo”, convém iniciar situando que o autor francês dedica grande parte de suas obras ao  
desvelamento das dinâmicas sociais estabelecidas em face de um contexto histórico moderno  
e, especialmente, contemporâneo, tendo em vista os desdobramentos extensivos e intensivos da  
mundialização do capital e dos fenômenos expressos através da hipertrofia do consumo e da  
chamada cultura de massa.  
Escrevendo num período que consiste entre os anos de 1968 até o início do século XXI,  
Baudrillard desenvolveu uma forte crítica ao consumo e às relações sociais voltadas à lógica da  
mercantilização geral dos produtos humanos, da cultura e da arte, ao passo em que direciona  
importantes provocações acerca dos fenômenos alienantes da virtualidade dos signos, da  
culturalização, da ambiência moderna voltada à fomentação do consumo e, sobretudo, ao que  
ele estabelece como a perda da essência humana em prol da funcionalidade objetificada  
enquanto aspecto central da sociedade moderna.  
Tendo em vista o interesse das presentes reflexões em fomentar um debate que perpassa  
problemas do que estamos sugerindo como destituição ontológica, no sentido brevemente  
aludido nas linhas introdutórias acima, passa-se aqui a uma breve exposição de ideias vertebrais  
do livro “A Sociedade de Consumo” (1970), uma vez que o minucioso estudo feito por  
Baudrillard assume uma firme proposta de crítica à sociedade contemporânea, com vistas a  
desvelar o fenômeno do espelhamento do gênero humano respaldado no feitiço da mercadoria,  
contribuindo de forma considerável para se pensar e discutir a matéria delimitada.  
O livro é dividido em três partes, quais sejam, a primeira, “A liturgia formal do objeto”,  
seguida da “Teoria do consumo”, e de uma terceira parte, “Mass media’, sexo e lazeres”, além  
da conclusão, intitulada “Da alienação contemporânea ao fim do pacto com o diabo”, em que o  
autor, em sintonia com preocupações de certas correntes de pensamento em voga na segunda  
metade do século XX, discorre acerca do caráter mistificador da mercadoria, bem como, do  
aspecto fantasmagórico e oculto que ronda as relações humanas alienadas à lógica do consumo,  
além de abordar noções psicossociais que determinariam o desejo de consumir e, por  
conseguinte, atuariam na esfera social enquanto árbitro das relações sociais.  
712  
A noção de alienação trabalhada por Jean Baudrillard é de suma importância para suas  
teses principais, assim como para as reflexões do presente artigo, visto que possibilita um  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 2, p. 709-733, jul./dez. 2024. ISSN 1980-8518  
Para uma crítica à “Sociedade de consumo” e ao fim da transcendência da alienação em Jean Baudrillard  
diálogo e uma crítica ontológica, de caráter histórico-materialista, como esperamos clarificar  
no andamento crítico da análise ora desenvolvida.  
No início da obra “A sociedade de Consumo”, o autor introduz a crítica à sociedade  
moderna atrelada ao fenômeno da “profusão” do consumo, e o caracteriza enquanto parte  
central e elementar do modo ativo das relações humanas no capitalismo avançado, sendo essas  
as relações estabelecidas entre membros da sociedade, bem como, relações entre o homem e a  
mercadoria. Assim, a cultura, a arte, e as formas subjetivas em geral, são imbricadas em uma  
lógica asfixiante, implícita e alienante, de um sistema societal voltado à produção sistemática e  
ambivalente do consumo, retroagindo, outrossim, seu modo operante e ativo sobre as formas  
de consciência e sobre a subjetividade, tudo imbricado e impulsionado pela publicidade (o  
chamado “mass media”, e os “fait divers”)2.  
Tal contexto supõe a “sacralização da mercadoria”, tida enquanto mito, que vai além  
das formas figurativas e distantes da religião, isto é, um mito observado e abstraído da realidade,  
que se põe para além da cultura espontânea, e é absorvida no imaginário coletivo como principal  
alicerce da sociedade moderna.  
A análise de Baudrillard acerca da mistificação por trás do objeto, revela uma sociedade  
em vertigem, bem como, desprovida de razões e métodos para subverter a realidade duramente  
imposta pelo sistema integrado à produção de lucro e à manipulação psicossocial de sujeitos  
que conhecem apenas a realidade fantástica da amálgama de objetos que os cercam. Nesse  
sentido, o autor considera que “a prática dos signos é sempre ambivalente” e “tem como função  
esconjurar”, num “duplo sentido”, qual seja, “fazer surgir”, emergir, “para captar por signos (as  
forças do real, a felicidade, etc.) e evocar algo para recalcar”, de modo que “o pensamento  
mágico nos mitos procura conjurar a mudança na história” (Baudrillard, 1970, p. 23).  
Desse modo, a panóplia3, o drugstore4, e as fileiras de mercadorias presentes no mundo  
moderno, correspondem a  
713  
uma corrente de produtos que se fortalecem enquanto feitiço, enquanto  
representação fantástica que contém em si, no nível mais profundo de  
abstração, a exteriorização do gênero humano no ato de espelhamento que  
2 “Fait Divers” consiste em um termo jornalístico que corresponde a notícias que contém informações de gênero  
extraordinário. Jean Baudrillard entende a importância na atuação das fait divers para o mass media, uma vez que,  
esta categoria é tida enquanto molde para a interpretação lúdica fantasiosa que os veículos de informação usam,  
no intuito de manipular as massas.  
3 Apalavra “Panóplia”, que originalmente era utilizada para designar o conjunto da armadura de um soldado grego,  
contemporaneamente, designa um agrupamento de coisas de mesma categoria, remetendo à abundância e  
afluência. Baudrillard usa o termo para designar a coleção profusa de mercadorias que se organizam e amontoam-  
se de forma estratégica para instigar o consumo.  
4
O “drugstore” é um centro comercial que, para Baudrillard, reúne em si a síntese simples da profusão da  
mercadoria, com o cálculo lógico e estratégico de objetos, ou seja, um ambiente estrategicamente criado e  
aperfeiçoado para contemplar a abundância de mercadorias e a afluência do consumo.  
Dariane Cordeiro de Araújo; Marlon Garcia da Silva  
ultrapassa a identidade própria do sujeito, e encarna em um mundo  
materializado através dos signos, mistificações e da sacralização da  
mercadoria (Araújo, 2023, p. 14).  
Em “A liturgia formal do objeto” (Baudrillard, 1970, p. 23), o autor desenvolve uma  
forte crítica ao consumo enquanto regulador das relações sociais, e afirma que a produção  
humana se torna tão escrava do consumo de forma a criar, no imaginário moderno, a  
representação do significado do objeto, pautada em uma fantasia inesgotável, imbricada a uma  
logicidade danosa das representações simbólicas na ordem societária vigente, ao passo em que  
é manipulada e impulsionada pela criação de shopping centers, lojas e vitrines decorativas que  
compreendem parte de uma ambiência pensada ou manipulada para a produção do consumo;  
simbolizando, ao menos, a insultuosa evidência de que o desejo humano pelo consumo se esvai  
para além da necessidade: é pautado na demasia e na naturalização de signos.  
Em aproximações à relação entre produção e consumo, pode-se entender que o autor  
considera que o domínio ideológico das representações fantásticas da mercadoria não quer  
dizer, necessariamente, que as relações sociais não se conformem sob o imperativo categórico,  
econômico e político de uma dinâmica específica de produção social. Entretanto, pode-se  
entender também que Baudrillard estabelece, inexoravelmente, que a sociabilidade é integrada  
a uma ordem meticulosa e alicerçada nas bases do consumo, que se expande e prepondera para  
além da ordem de produção, uma vez que, a ordem do consumo e da sociabilidade é movente-  
movida pelos princípios e imperativos dos signos, do pensamento mágico e sensível.  
714  
No item “O estatuto miraculoso do consumo” (Baudrillard, 1970, p. 23), o autor expõe  
o “mito dos melanésios”, propondo uma analogia entre os sujeitos que integram a sociabilidade  
profilática do sistema vigente e os indígenas melanésios: no mito exposto pelo autor, os  
indígenas, apontados como “primitivos”, passavam grande parte do tempo a observar os aviões  
que sobrevoavam suas casas e sempre pousavam distantes, onde os brancos estavam. Nessa  
situação, os indígenas decidiram montar um simulacro de pista de pouso, na esperança de que  
o avião enfim pousasse em sua ilha. Baudrillard procura, através deste e de outros mitos ao  
longo do livro (Baudrillard, 1970, p. 22), evidenciar que existe um estatuto categórico que  
obedece ao amálgama de mercadorias do mundo contemporâneo, e que consiste na criação de  
um simulacro da vida moderna, que instiga a esperança do consumidor, correspondendo à uma  
“ludicidade mágica que governa o imperativo do consumo pautado na mentalidade primitiva e  
automatizada” (Araújo, 2023, p. 16), ou seja, uma ludicidade responsiva à fantasia miraculosa  
do consumo, que infere o desejo pelo objeto, baseando-se decisivamente na crença irracional  
na superioridade de um amálgama de signos, ilusoriamente antecipando a felicidade e satisfação  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 2, p. 709-733, jul./dez. 2024. ISSN 1980-8518  
Para uma crítica à “Sociedade de consumo” e ao fim da transcendência da alienação em Jean Baudrillard  
de possuir um objeto baseado em uma significação subjetiva, colocando em evidência a relação  
de fruição com a possibilidade do objeto, uma satisfação virtual e abstrata.  
O objetivo desta analogia consiste na afirmação de que o consumidor e o  
indígena se amparam, não na apropriação da coisa em si, mas na captação  
fantástica e imagética de que, segundo a lógica milagrosa, o desejo do  
consumo possa antepor e proporcionar uma satisfação de potência superior à  
da realização concreta em si (Araújo, 2023, p. 16-17).  
Assim, uma vez que opera no imaginário coletivo uma liturgia cega e fantasmagórica  
da profusão de objetos, é imprescindível constatar que o prazer real, diferenciado da lógica  
mercantil, não está presente na realidade concreta da sociabilidade vigente. Esse prazer, assim  
como tantas outras categorias humanas (felicidade, liberdade, lazer, igualdade), consiste  
unicamente no espelhamento de suas representações abstratas, condicionadas ao mito do prazer  
através do consumo. A liberdade, falsa sensação de individualização que é embutida no  
imaginário coletivo e que assume o papel mistificado de “liberdade de escolha”, não se dá  
concretamente, pois que não há escolha autêntica, uma vez que o sistema, de antemão,  
condiciona e impõe vontades, sentimentos e ideias, etc., de caráter abstrato-mistificador.  
No que concerne ao tema da produção humana e socialmente voltada à profusão da  
mercadoria, Baudrillard postula que o processo de racionalização das forças produtivas, no  
capitalismo, favorece o mito de que a sociedade percorre constantemente processos de caráter  
revolucionário, mas na realidade, também isso constitui-se, para o autor, apenas como um  
simulacro, uma vez que condiciona um processo geral muito maior atrelado a um sistema de  
valores determinados que nunca se revolucionou efetivamente.  
715  
O que poderia ser uma revolução humana, social, na era da ambiência e dominância dos  
objetos, seria apenas algo esvaziado de conteúdo real e concreto, portanto, longe de ser  
concebido enquanto possibilidade real. O Estado mantém, nesse sistema, o papel de árbitro das  
relações sociais, que nada faz além de conservar as desigualdades e vender a falsa sensação de  
igualdade.  
Baudrillard entende que a sociedade não é constituída de tendências naturais  
harmoniosas, defendendo que existe um sistema de castas entendido dentro de uma separação  
entre grupos que se organizam e manipulam as necessidades sociais.  
Desse modo, não se pode analisar a relação do indivíduo empírico-imediatamente ao  
objeto, ao contrário, deve-se entender que existe um sistema de necessidades condicionadas,  
que não necessariamente dependem do indivíduo para serem concebidas, onde o sistema  
ambivalente de signos se torna tão central que ultrapassa e manipula as reais necessidades dos  
indivíduos, aglutinando o processo de produção da consciência individual enquanto dependente  
Dariane Cordeiro de Araújo; Marlon Garcia da Silva  
da relação de reflexos exteriores da significação dos signos atrelados à arbitrariedade de um  
sistema condicionado de consumo, sugerindo a existência de um sentido semiológico e  
intercambiável entre as formas condicionadas à realidade, e a abstração da consciência  
individual.  
Baudrillard, durante toda a exposição e desenvolvimento das teses e argumentos do  
livro, exprime a noção de que a prática do consumo no grande quadro social contemporâneo  
consiste nas novas formas de consciência moldadas através da profusão da mercadoria,  
imbricadas no desenvolvimento de uma consciência coletiva voltada à abstração do objeto e  
das demais relações sociais que se seguem.  
Existe, em Baudrillard, uma forte alusão à evolução da humanidade de forma  
progressiva e material que obedece ao imperativo dos objetos e das significações  
psicologizantes que rodeiam o espectro cultural-histórico. A relação entre a finitude de objetos  
(o fim da vida útil de um produto), e o espelhamento social neste curto ciclo, presume a ideia  
de que, subjetivamente, a sociedade moderna vive em ciclos curtos nas suas relações sociais,  
afetivas e de trabalho, pautados, essencialmente no tempo dos objetos.  
O autor sustenta um fluxo de pensamento voltado a entender criticamente a lógica da  
sociedade de consumo como autossustentável, uma vez que esta depende dos marcadores de  
miséria e fome para que o milagre do objeto e que a simulacro da realidade objetiva continue  
impelindo, no ciclo que corresponde ao movimento material da sociedade moderna, a  
fetichização do objeto.  
716  
Assim, e, à medida em que a pobreza e a desigualdade reúnem, enquanto problema  
residual de tal movimento, a integralização do sistema, correspondendo à fomentação de um  
sistema cultural e político moderno que reafirma a ideia de “forças produtivas”, tais estruturas  
sociais seriam, em tese, capazes de manter, junto à noção do simulacro do objeto, o que o autor  
denomina como “sistema industrial de pobreza”.  
A noção dos direitos ao trabalho e à propriedade residem essencialmente a esta lógica:  
“não há direito ao espaço senão a partir do momento em que já não existe espaço para todos”  
(Baudrillard, 1970, p. 57). Assim, o autor afirma que os direitos humanos são falsos, e que  
correspondem à narrativa ilusória do mito da abundância; quando cita o “direito ao ar puro”  
demonstra, através do exemplo, que transformar algo que naturalmente já existe em direito é o  
mesmo que desnaturaliza-lo, mercantilizando bem naturais, que passam agora a integrar a  
categoria de bem útil e indispensável, porém raro, fazendo parte de uma divisão de consumo  
que acomoda uma redistribuição social desigual. Baudrillard pensa que constitui um traço  
básico do capitalismo: a passagem de bens naturais a bens de consumo, a necessidade de  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 2, p. 709-733, jul./dez. 2024. ISSN 1980-8518  
Para uma crítica à “Sociedade de consumo” e ao fim da transcendência da alienação em Jean Baudrillard  
transformar o que é o direito natural do homem a um direito adquirido em meio a concessões  
previamente julgadas, ou seja, a fomentação da desnaturalização do real e natural, e uma  
naturalização de ideário místico e falso (Araújo, 2023, p. 24).  
É importante frisar o trato que Baudrillard invoca ao conceito do “fetichismo”, dado o  
contexto e sua linha própria de pensamento; é necessário se atentar ao fato de que o feitiço da  
mercadoria, que se constitui enquanto principal ideologia que sustenta teoricamente a sociedade  
da abundância, advém da relação de dependência das estruturas sociais ao objeto, e não rondam  
o espectro das relações sociais do trabalho em si, embora, na visão do autor, a divisão social do  
trabalho e a propriedade privada estejam essencialmente interligadas na lógica sufocante do  
consumo. O feitiço aqui reside na relação das formas de consciência imbricadas ao sistema  
cultural, histórico e político da ambivalência dos signos do consumo, enquanto fenômeno  
psicológico fomentado a partir dessa lógica, assim, estes são os pontos principais da crítica que  
o autor desenvolve durante toda a obra.  
Tendo isso em vista, Jean Baudrillard problematiza a passividade da sociedade moderna  
referentes às questões voltadas ao sistema social opressor, uma vez esta reside na conformidade  
jocosa com o sistema, e, numa análise quase que psicológica, o autor discorre acerca de uma  
conversão de sentimentos que, em forma de permuta, são perpassados por vários sintomas  
psicossomáticos, (a náusea, a melancolia, o estranhamento etc) e se assemelham com a lógica  
do consumo, ou seja: multiplicam-se, confundem-se em si mesmas e distanciam-se cada vez  
mais do real objeto de angústia. Todos esses processos caminham no sentido da desconstrução  
e dissociação da ambivalência do desejo, uma vez que a somatização negativa do desejo  
desemboca em reações negativas (violência e fadiga), ao passo em que a desconstrução positiva  
de tais males constitui a vazão às necessidades e satisfações mitológicas.  
717  
Baudrillard assume que a relação incessante de elementos opostos e contraditórios não  
é explicada pela antropologia necessitante de maior análise dos fenômenos aqui tratados,  
perpassando pelo entendimento do consumo enquanto processo global de conversão, de  
transferência e inversão simbólica de uma carência projetada na abundância de objetos, bem  
como, a necessidade de uma análise que leve em consideração a generalização da teoria do  
objeto parcial aos processos de somatização, sendo assim, examinando a intercorrência entre  
vivência de um indivíduo na esfera material e subjetiva, que o leva, dentre todas as vias, a  
tornar-se também um mero objeto desta lógica violenta a que se respalda a sociedade moderna  
de consumo.  
É possível aferir, acompanhando as teses do autor, que a humanidade, acometida por  
um estado geral de angústia e melancolia, segue o ímpeto do consumo através de gatilhos  
Dariane Cordeiro de Araújo; Marlon Garcia da Silva  
disparados nos âmbitos psicológico e imaginativo, uma vez que se atribui aos signos a  
significação das relações sociais que são alicerçadas nessa dinâmica das trocas abstratas,  
mercantis. Para Baudrillard, existe e persiste na humanidade uma interpretação ilusória e  
inquebrável, relacionada ao espelhamento da sociedade em formas fantásticas e inalcançáveis.  
Tendo isso em vista, no tópico de desfecho do livro, a “Conclusão”, intitulada “Da  
alienação contemporânea ao fim do pacto com o Diabo” (p. 199), Jean Baudrillard procura  
explorar a relação entre o indivíduo e a sua representação fantasmagórica e imagética, resultado  
das dinâmicas imbricadas na lógica mistificadora do objeto. A dicotomia e a inversão entre o  
real e o abstrato evidenciam as problemáticas que rondam o inquebrável vínculo entre o mundo  
externo e o sujeito particular.  
Convém aqui mencionar, em termos breves, que o autor, em sua argumentação, faz uma  
incursão e uma analogia com o filme “O estudante de Praga” (1913), dirigido pelo dinamarquês  
Stellan Rye, e codirigido por Paul Wegener, cuja história mostra a vida de um estudante que,  
tendo poucos recursos materiais-financeiros, faz um pacto com o Diabo: vende sua própria  
imagem em troca de muito dinheiro. Todavia, desde então, o estudante se depara com a sua  
própria imagem, seu espectro fantasmagórico, usurpando o seu ser no mundo, numa situação  
cada vez mais inversora e insuportável, que leva o estudante a iniciativas para matar a  
duplicação fantasmagórica de si. Na cena final, atirando na imagem, quem morre é o próprio  
estudante.  
718  
Tal nível de abstração é de extrema importância para concluir a articulação dos  
conceitos que o autor constrói na argumentação que atravessa o livro. É nesta parte final que  
Baudrillard, fazendo uma analogia com o filme citado, procura destrinchar a alienação enquanto  
a evidência de que o indivíduo, sob o imperativo do consumo no mundo contemporâneo, tem a  
representação e a significação de si mesmo externalizada, alienada, objetificada e perdida.  
Uma vez que a profusão do consumo mantém o movimento das dinâmicas sociais  
fantásticas, Baudrillard compreende que tudo que se perde em termos de vida social e concreta  
se mantém intacto na esfera privada e abstrata da existência humana.  
A humanidade, subordinada a viver sob os inúmeros imperativos condicionantes do  
sistema de consumo, é intrinsecamente condicionada a viver, portanto, sob a impossibilidade  
de afirmar, mas também de negar, a essência real e concreta de si própria. Esta que se perde, se  
autonomiza, ganha vida própria, voltando-se contra e assombrando os próprios seres humanos.  
Em decorrência, é muito importante citar o item “Fim da transcendência” (Baudrillard,  
1970, p. 134), em que o autor francês reitera a concepção de que o fator que determina as  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 2, p. 709-733, jul./dez. 2024. ISSN 1980-8518  
Para uma crítica à “Sociedade de consumo” e ao fim da transcendência da alienação em Jean Baudrillard  
relações sociais e que ronda o espectro da cotidianidade é pautado, necessariamente, num  
conjunto de representações e significações subjetivas, sígnicas e abstratas.  
Jean Baudrillard afere que a sistematização da profusão do consumo, sob o signo da  
mercadoria, demonstra que a era da alienação é tão ofuscante e hiperbólica que todos os  
aspectos da cotidianidade e das relações sociais são subjugados à lógica da representação  
imagética da vida humana através do imperativo dos signos.  
A alienação, à vista disso, protagoniza um momento desviante do que seria a essência  
humana, onde, alicerçada nas formas espelhadas e fantasmagóricas dos signos, tem-se a noção  
de que a alienação generaliza a vida humana a tal ponto que não exista mais alma, nem luta,  
nem a possibilidade de superação desse estado de coisas.  
Dá-se apenas a emissão e a recepção de signos, abolindo-se o ser individual  
no interior dessa combinatória e no cálculo de signos… O homem do consumo  
nunca encontra-se perante as próprias necessidades, como também se vê  
jamais diante do produto de seu trabalho, também nunca se defronta com a  
própria imagem: é a imagem do signos que o ordena. Acabou-se a  
transcendência, a finalidade, o objetivo: a característica de tal sociedade é a  
ausência de reflexão e de perspectiva sobre si própria (Baudrillard, 1970. p.  
206).  
O autor considera, pois, que no capitalismo contemporâneo, na sociedade de consumo,  
caracterizada como uma “sociedade pós-industrial”, de “abundância”, “profusão” e “panóplia”  
das mercadorias, o próprio “duplo” de si dos produtores, se multiplica infinitamente sob formas  
sígnicas, tornando muito mais abrangente, complexo e ativo o problema e a vigência da  
alienação, interditando qualquer possibilidade de reversão dessa situação, nos circuitos  
fechados da imersão humana na imanência do consumo.  
719  
A categoria da alienação em Marx  
Nesta sessão, o estudo tem por objetivo tratar de forma preambular, breve,  
aproximativa, reflexões de Karl Marx em torno das categorias “alienação” e “estranhamento”,  
bem como das análises que o autor faz sobre a mercadoria, e sobre as formas de consciência  
humana implicadas nessas bases sócio-materiais e relações, especialmente, na sociabilidade  
burguesa.  
Convém começar com uma breve incursão por um texto bastante recuado das  
elaborações do autor, os chamados “Manuscritos Econômicos e Filosóficos”, de 1844, mais  
especificamente, por algumas referências ao tópico “Trabalho estranhado e propriedade  
Dariane Cordeiro de Araújo; Marlon Garcia da Silva  
privada” (Marx, 2008, p. 79), onde Marx inaugura o desvelamento de temas que serão  
desenvolvidos com mais determinações em suas obras posteriores5.  
Pode-se considerar que o fato de Marx, nos processos formativos de um pensamento  
original, ter sido influenciado inicialmente por elaborações filosóficas, especialmente aquelas  
formuladas por Hegel, para só depois mergulhar a fundo em elaborações de caráter, por assim  
dizer, mais especializado e científico, notadamente, nas suas incursões pelo campo da crítica da  
economia política, converge para o surgimento de um tipo específico de teoria social,  
caracteristicamente abrangente, ou seja, interessado em situar não apenas o “como” dos objetos  
investigados, no caso, a sociedade capitalista e suas categorias, mas também o seu “que” e o  
seu “de onde para onde”.  
Essas considerações são importantes para antecipar referências a possíveis críticas que  
tendem a datar e descartar como anacrônica uma teoria social pretensamente superada, que, no  
entanto, é bastante cuidadosa, por exemplo, em investigar as formas determinativas originárias,  
bem como certas regularidades e continuidades que persistem nas mudanças histórico-sociais,  
isso quando se tem em vista formações e formas de sociedades diversas, e também quando se  
consideram as próprias metamorfoses internas à ordem do capital e do capitalismo, cujas leis  
gerais e essenciais têm se mostrado persistentes nas mudanças, por assim dizer, de caráter  
histórico-fenomênico.  
720  
A nosso ver, uma leitura isenta de preconceitos ideológicos gnosio-epistêmicos, de  
juízos extrínsecos ou formados a priori, da obra de Marx, desde os seus textos de juventude,  
põe em evidência a referida capacidade abarcadora e os tipos diversos de vias que o pensamento  
do autor percorre e perscruta na decifração da realidade social com a qual se defronta.  
Avesso a pontos de partida absolutos, nos “Manuscritos econômico-filosóficos”, o autor  
consolida e desenvolve aquisições precedentes obtidas de confrontos com as filosofias de  
matriz idealista e de matriz materialista, em diversos de seus expoentes, especialmente os  
modernos, e crava que em suas análises o ponto de partida é um “fato político-econômico  
atual”, constatado por vias empíricas, qual seja, a relação de externalidade hostil” “entre  
produtor e produtodo trabalho, nas relações da propriedade privada capitalista (Silva, 2018,  
p. 43). O termo alemão que expressa essa relação é Entfremdung, por vezes traduzido em  
5
Como é sabido, textos importantes de Marx, como “Manuscritos econômico-filosóficos” e a íntegra de “A  
ideologia Alemã”, entre outros, só vieram a público no início dos anos 1930. Desde então, as posições diante da  
leitura desses textos repercutiram sobre tipos diversos de marxismo que se desdobraram no século XX. Assumimos  
aqui a posição que compreende que esses textos têm muito a contribuir com a abrangência e a potência do alcance  
da teoria social de Marx, atravessada por reflexões e elaborações de caráter filosófico, científico e político.  
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Para uma crítica à “Sociedade de consumo” e ao fim da transcendência da alienação em Jean Baudrillard  
português por estranhamento, tendência mais contemporânea que parece, a nosso ver, mais  
apropriada e precisa.  
Essa relação da externalidade hostil compreende uma forma mais fundamental, interna  
e ativa, onde a atuação transformadora da atividade humana, sensível, consciente e social,  
traduz o processo e as resultantes pelos quais o emprego, a externação e a transferência das  
energias corporais, físicas e mentais, dos produtores, se objetivam como perda, materializadas  
nos objetos produzidos, nas relações da propriedade privada capitalista, nas quais esses  
produtos da riqueza socialmente objetivada é propriedade privada, nos termos de Marx, de  
outrém, do capitalista. Essa exteriorização ou externação e objetivação de forças vitais dos  
produtores e do trabalho como transferência e perda caracterizam, para o autor dos Manuscritos  
de 1844, o trabalho alienado, a forma ativa e as determinações mais fundamentais da alienação  
[Entäusserung], imbricadas ao fenômeno do estranhamento, na formação, pois, de um par  
categorial inextrincável.  
Para os propósitos da argumentação que interessa ressaltar aqui, essas elaborações em  
torno da alienação e do estranhamento, que constituem o centro nervoso desses Manuscritos,  
deixam claro o amálgama entre forma de atividade e de ser e formas de consciência. Chama a  
atenção o tipo enérgico de elaboração teórica do autor, a força e a energia de arrancar de  
expressões materiais prático-sensíveis e cotidianas, de caráter marcadamente fenomênico, para  
a escavação de determinações e articulações mais mediadas e ocultas sob a aparência, para  
alcançar, por esses movimentos, generalizações caracteristicamente filosóficas (Silva, 2018, p.  
33), tais como o enunciado de acordo com o qual “na forma da atividade reside o caráter de  
uma species” (Marx, 2008, p. 84).  
721  
Note-se ainda que esta generalização é desdobrada, nesses mesmos Manuscritos, em  
duas direções: em comparações da forma da atividade no âmbito das formas de ser da natureza  
em geral, tendo em vista e consideração, especialmente, a natureza orgânica e os animais  
superiores, e na direção, ainda e principalmente, das formas concretas da atividade, da  
sociabilidade, dos sentidos, sentimentos e formas de consciência sociais, do seu engendramento  
prático-sensível às suas formas mais mediadas e abstratas.  
Não é difícil perceber que esse tipo de elaboração é avesso, ressalte-se, por princípio, a  
quaisquer procedimentos teóricos que, de alguma forma, cindem os planos da objetividade  
social, tomada como unidade contraditória de materialidade e processualidade, e da  
subjetividade social, e isso por uma razão relativamente simples: as formas da subjetividade  
são, elas próprias, constituídas e desdobradas, desde suas raízes, no chão das relações de  
Dariane Cordeiro de Araújo; Marlon Garcia da Silva  
produção e reprodução da vida social, afirmadas, pois, como predicados constitutivos e  
entificadores da própria forma de ser, em circunstâncias históricas determinadas.  
É claro que, em termos mais concretos, a consciência pode imaginar ser algo distinto do  
ser consciente, seja em formações e formas de sociedade mais recuadas, de parcas forças  
produtivas próprias, seja em formações e formas de sociedades mais complexas, como a  
capitalista, burguesa, na qual também, conforme a argumentação em curso, os produtos  
dominam os produtores, na forma de riqueza social materializada em mercadoria, dinheiro,  
capital.  
Na argumentação bastante sumária aqui procedida, tendo em vista fins mais estritos de  
estabelecer elaborações e posições instigantes e, nosso ver, instrutivas, de Marx sobre a  
categoria da “alienação”, posições distintas daquela estabelecida, por exemplo, por Jean  
Baudrillard, talvez seja suficiente ressaltar uma forma principal pela qual as forças e formas da  
atividade social são usurpadas, objetivadas, materializadas, nas aludidas relações de alienação  
e estranhamento, abarcadoras da prática sensível e das formas da consciência: nos referimos  
aqui a elaborações germinais do autor sobre o dinheiro, analisado e decifrado em termos  
afloratórios a partir de suas expressões fenomênicas no advento e consolidação da modernidade  
burguesa.  
Neste sentido, pode-se indicar, por exemplo, o poder inversor do dinheiro que,  
“enquanto conceito existente e atuante do valor, confunde e troca todas as coisas, ele é então a  
confusão e a troca universal de todas as coisas, portanto, o mundo invertido, a confusão e a  
troca de todas as qualidades naturais e humanas” (Marx, 2008, p. 38).  
722  
Ocorre que, para o autor, a natureza, o poder e a função social do dinheiro se coadunam  
com “a propriedade privada material, imediatamente sensível”, quer dizer, é a “expressão  
material-sensível da vida humana estranhada”, na forma da atividade e da sociabilidade. Neste  
ponto, Marx considera que o movimento da propriedade privada, “a produção e o consumo”,  
“é a manifestação sensível do movimento de toda a produção até aqui, isto é, realização ou  
efetividade do homem”, de modo que “Religião, família, Estado, direito, moral, ciência, arte  
etc. são apenas formas particulares da produção e caem sob sua lei geral” (Marx, 2008, p. 106).  
Destacamos linhas acima a força que os princípios assumidos por esse tipo de  
construção teórica desempenham na apreensão razoável de ordens determinativas, de  
articulações, interações e relações de reciprocidade entre os complexos sociais gerais, no âmbito  
dos quais o complexo socio-material da economia e, nele, o complexo da produção,  
desempenham, na conformação de elos tônicos e sobredeterminantes das formas, modos e  
direção de uma totalidade social determinada.  
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Para uma crítica à “Sociedade de consumo” e ao fim da transcendência da alienação em Jean Baudrillard  
Com isso, queremos sugerir, em termos iniciais, um quadro de referência alternativo ao  
estabelecido por Baudrillard em a Sociedade de consumo, um quadro obtido a partir do que,  
polemicamente, estamos sugerindo como sendo uma elaboração de caráter ontológico  
materialista, histórico e dialético, enquanto tal, interessante de ser visitado, pensado e discutido.  
A nosso ver, o estudo introdutório apresentado nas linhas acima pode ser articulado com  
elaborações e aquisições da obra posterior de Karl Marx, como os chamados “Grundrisse”  
(1857), e também, especialmente, “O Capital - Volume I” (1867), especificamente o primeiro  
capítulo, intitulado “A Mercadoria”, com o que se pode avançar no debate proposto.  
Duplo caráter da mercadoria e fetichismo  
Tendo em vista os limites e o escopo do presente artigo, passaremos, suprimindo  
mediações, a considerar algumas elaborações principais avançadas em escritos de maturidade  
de Marx, notadamente, aquelas que se apresentam na obra magna do autor, “O Capital”.  
Em relação aos interesses delimitados nas presentes reflexões, a apresentação dos nexos  
que compõem o entendimento da forma mercadoria e das formas de valor é de extrema  
importância, uma vez que é através dessa análise basilar que se torna possível compreender a  
relação fantasmagórica que ronda o espectro da mercadoria, sua profusão, a mistificação que  
ronda as formas de valor, no que diz respeito à abstração da real forma da mercadoria,  
desembocando no que o autor classifica como “fetichismo”. Assim, a investigação da forma  
mercadoria e suas determinações perpassa, primeiramente, pela análise de sua forma elementar,  
a fim de levar luz acerca do entendimento da realidade da profusão desses objetos enquanto  
determinadas por um processo histórico, social e ativo, bem como, desvelar o véu místico que  
cobre a verdade sobre esse processo.  
723  
É importante reiterar que o autor considera as propriedades físicas da mercadoria  
enquanto seu valor de uso, categoria sensível e material que incorpora sua evidente função útil  
enquanto objeto externo de uso humano, não só para satisfazer as necessidades materiais, mas  
também as psíquicas, intelectuais etc.  
Isso dito, Marx reitera que, por outro lado, a forma do valor abstrato da mercadoria  
reside na condição socialmente determinada pela realidade que se apresenta aos indivíduos em  
um contexto específico de tempo e espaço e do desenvolvimento da atividade produtiva  
socialmente necessária, de modo que o valor é advindo da relação de troca entre mercadorias.  
O valor abstrato (sensível-suprassensível) embutido e corporificado na mercadoria é  
nada mais que o valor de troca, abstraídas as diferenças específicas entre valores de usos  
distintos, concretos, bem como abstraída a própria dimensão concreta de trabalhos distintos,  
Dariane Cordeiro de Araújo; Marlon Garcia da Silva  
reduzidos a dispêndio de energias corporais no tempo, e sua coagulação dos produtos do  
trabalho.  
Assim, a constituição e a profusão da mercadoria compreendem também, em suas  
formas originárias e fundamentais, a função de suporte material e sensível do amálgama de  
objetos que carregam e expressam o valor de troca.  
É na qualidade de razão quantitativa, que o valor de troca supõe a troca simultânea de  
um valor de uso com outro valor de uso de diferente característica e função (1 tonelada de ferro  
= 1 braça de linho), o que, em análises mais desenvolvidas, permite a compreensão de que o  
trabalho empregado em diferentes mercadorias e feito por diferentes indivíduos, no cálculo  
geral do valor, é, também, igualado e mediado apenas pela grandeza do valor: o tempo.  
Em geral, o tempo de trabalho humano socialmente necessário em certas circunstâncias  
é o determinante da grandeza do valor do produto, evidenciando que o tempo do processo de  
produção de um determinado produto é equivalente, em valor, com o processo de um produto  
distinto desde que ambos demandem o mesmo tempo em suas produções. Assim, a mercadoria,  
enquanto valor, é uma forma complexa que compreende em si o tempo de trabalho socialmente  
necessário e o trabalho fundido e cristalizado na materialização do objeto, ou seja, o dispêndio  
de energia vital e corporal do trabalhador. Sobre essa dinâmica de igualização abstrata dos  
produtos do trabalho, e, consequentemente, dos próprios trabalhos e da atividade humana, Marx  
exprime:  
724  
Se abstrairmos seu valor de uso, observamos também os componentes e  
formas corpóreos que fazem dele um valor de uso. O produto não é mais uma  
mesa, uma casa, um fio, ou qualquer outra coisa útil, Todas as suas qualidades  
sensíveis foram apagadas. E também já não é mais o produto do carpinteiro,  
do pedreiro, do fiandeiro ou de qualquer outro trabalho produtivo  
determinado. Com o caráter útil dos produtos do trabalho desaparece o caráter  
útil dos trabalhos neles representados, e, portanto, também as diferentes  
formas concretas desses trabalhos, que não mais se distinguem uns dos outros,  
sendo todos reduzidos a trabalho humano igual, a trabalho humano abstrato.  
(Marx, 1957. p. 98).  
É importante ressaltar que Marx discorre acerca do valor, não enquanto conceito criado  
para método de análise, mas compreendendo-o enquanto categoria, antes de tudo, existente em  
si, na realidade, enquanto aspecto velado de uma relação social pautada na troca de mercadorias  
que, por sua vez, obedecem a uma lógica quantitativa, de indiferença e equivalência.  
Logo, o valor, enquanto resultado das determinações das dinâmicas estabelecidas na  
sociabilidade, é materializado e expresso na relação mercadológica que reside no dispêndio da  
força de trabalho humano para a criação da forma sensível da mercantil abstrata. O valor tem,  
assim, caráter histórico-social.  
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Para uma crítica à “Sociedade de consumo” e ao fim da transcendência da alienação em Jean Baudrillard  
Em suma, é necessário enfatizar: a mercadoria é uma unidade contraditória de valor de  
uso, corpo físico material e sensível, e, valor, fenômeno abstrato que se expressa através da  
troca e que, enquanto determinado socialmente pelas relações sociais que são estabelecidas,  
carrega em si o trabalho humano como base fundamental, uma vez que este é caracterizado  
como substância comum entre todas as mercadorias, na equação do valor.  
A análise da forma sensível-suprassensível da mercadoria, permite, em uma visão  
crítica, a compreensão da esfera dicotômica que ronda o objeto: para além de seu valor útil,  
corporificado e material, a mercadoria exprime em si a dinâmica abstrata e “metafísica” pautada  
e desenvolvida através de determinações histórico-sociais que se fundamentam na substância  
principal e intransferível do trabalho.  
Assim, ter em vista o exame que Marx afere à elementaridade da mercadoria, que a  
desvela como complexo social, até o desdobramento em formas de valor, permite, entre outras  
coisas, entender que as relações da atividade enquanto transferência e dispêndio de forças e  
energias corporais, na sociedade capitalista, obedecem ao imperativo de relações sociais  
reificadas, posto que estas giram em torno da produção de valores econômicos abstratos, em  
detrimento das relações sociais, humanas, concretas.  
O desvelamento da forma mercadoria comporta o entendimento de que o produto do  
trabalho não só atende às necessidades materiais concretas de dada organização social, e  
tampouco existe somente enquanto forma natural da atividade humana, mas que, ademais, o  
caráter fantasmagórico e oculto da mercadoria, revelado pelo estudo de crítica de economia  
política empreendido pelo autor, fornece as bases para a compreensão das formas de relações  
sociais, subjetivas e objetivas, necessariamente ligadas a dinâmicas sociais desenvolvidas na  
sociabilidade do capital.  
725  
Logo, a objetivação da atividade laboral, a equivalência atribuída aos trabalhos  
distintos, específicos, obedecendo à razão quantitativa e temporal no movimento de troca,  
explicita a necessidade ímpar de desvelar os nexos que se estabelecem no tocante às relações  
humanas com o objeto de uso, bem como, com a própria atividade produtiva.  
Pode-se considerar que é da maior importância se ater ao fato de que, levando em conta  
uma ordem societária que se sobrepõe através de determinações sociais do trabalho, a atividade  
produtiva é necessariamente atrelada às objetivações típicas do modo de produção. Estando  
subordinada em razão do caráter duplo da mercadoria, e, por conseguinte, o caráter duplo da  
própria atividade, é importante perceber que as relações estabelecidas nesta sociabilidade  
obedecem aos imperativos das mercadorias: são relações entre coisas.  
Dariane Cordeiro de Araújo; Marlon Garcia da Silva  
O fetichismo, em Marx, consiste no processo que se dá a partir da reificação de relações  
sociais entre produtores de mercadoria. Assim, o autor é perspicaz ao analisar que o espírito  
oculto da mercadoria reverbera o objeto enquanto forma fantasmagórica das próprias relações  
sociais, como um espelho que reflete a relação mercadológica que os produtos estabelecem na  
grande cadeia de objetos, uma vez que estes relacionam-se entre si pelos processos de  
valorização.  
Tendo isso em vista, é importante reiterar que a análise do fetichismo enquanto  
movimento real que indica a abstração e a objetificação das relações sociais, evidencia a  
compreensão do processo de produção e reprodução objetivado nas amarras dos movimentos  
do valor e do capital enquanto totalidade, desvelando a condição fetichizada das relações  
humanas em seus desdobramentos gerais e específicos, no seio de uma sociabilidade que  
mantém as relações humanas pautadas na realidade do valor abstrato e na troca.  
É imprescindível citar que tal processo não se caracteriza como um elemento  
psicológico ou do imaginário cultural coletivo. O processo fetichizado das relações sociais, em  
Marx, pressupõe a existência da ocultação das formas concretas da consciência ao estabelecer  
a vigência do valor enquanto mediador das relações entre os produtores.  
Logo, há, inegavelmente, a evidência de que o movimento típico da realidade material,  
histórica e dialética do capital permite a compreensão ontológica das relações sociais em  
essência, ao apreender e expor o seu inverso: a visão crítico-científica que norteia a  
contraposição entre a soberania do valor e a genericidade humana, e que entende, acima de  
tudo, que as categorias do trabalho e da produção social consistem em formas principais para  
desvelar o movimento real que determina a mistificação que ronda o espectro do objeto que  
subordina e rege a vida do sujeito, do produto que domina e orienta o ser, e o destino do  
produtor.  
726  
Inversão ontológica das relações de preponderância entre produção e consumo  
Tendo em vista o interesse em desdobrar o debate na direção de uma crítica ontológica  
à teoria do consumo, é oportuno fazer uma breve referência também a parte do exame que Marx  
dedica nos seus estudos econômicos de 1857, vindos a público e conhecidos sob a denominação  
de Grundrisse, onde o autor, tecendo uma afiada crítica à economia política, reitera o fato de  
que a atividade produtiva é, antes de mais nada, o ponto de partida para a efetivação real do  
consumo.  
Aqui, um argumento principal pode ser indicado tendo em vista o reconhecimento de  
que a mera articulação entre complexos parciais da totalidade econômica não ultrapassaria a  
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Para uma crítica à “Sociedade de consumo” e ao fim da transcendência da alienação em Jean Baudrillard  
dimensão de arranjos estacionários, de modo que é imprescindível apreender na articulação  
interna do ser social o complexo de peso tônico, preponderante, capaz de imprimir, numa  
unidade dialética, contraditória, as direções tendenciais do desenvolvimento econômico. Este  
complexo sobreordenador é, para Marx, inequivocamente, o complexo da produção,  
preponderante, nas interações dialéticas, sobre os complexos da distribuição, da troca, da  
circulação e do consumo, numa totalidade econômica orgânica, determinada.  
Assim, o complexo do consumo, enquanto necessidade básica e vital humana, traz em  
si, dialeticamente, o momento da produção, implicando no fato de que, enquanto relação de  
reciprocidade e de preponderância, a produção figura o momento predominante do consumo,  
uma vez que é a partir da atividade produtiva que se desdobram implicações materiais e  
subjetivas que correspondem à materialização de uma extensão do gênero humano dispendida  
e materializada no objeto, na conformação da unidade contraditória entre valor-de-uso e valor.  
Nas palavras de Marx:  
O importante aqui é apenas destacar que, se produção e consumo são  
considerados como atividade de um sujeito ou de muitos indivíduos, ambos  
aparecem em todo caso como momentos de um processo no qual a produção  
é o ponto de partida efetivo, e por isso, também, o momento predominante. O  
próprio consumo, como carência vital, como necessidade, é um momento  
interno da atividade produtiva. Mas esta última é o ponto de partida da  
realização e, por essa razão, também seu momento predominante, o ato em  
que todo processo transcorre novamente (Marx, 1857. p. 68).  
727  
Logo, entender esses processos permite, entre outras coisas, a fomentação de uma  
análise crítica das formas da atividade produtiva e da produção enquanto cadeia objetivamente  
movida pelos imperativos de valorização do valor, no capitalismo.  
As teses de Baudrillard, no intuito de desenvolver a crítica do consumo na sociedade  
moderna, especialmente nas relações do capitalismo contemporâneo, desenvolve, a nosso ver,  
insuficientemente, os nexos e mediações dos processos humanos ativos e sociais frente ao  
consumo, à mistificação da mercadoria, num sistema econômico voltado aos imperativos do  
lucro.  
O que indicamos aqui, afloratoriamente, como inversão ontológica, pode ser localizado  
no não aprofundamento da análise no desvelamento dos complexos categoriais centrais da  
produção e complexidade também das formas de consciência, estas indexadas a uma totalidade  
que se respalda na subordinação da atividade produtiva em torno das relações objetivadas da  
propriedade privada, e obedecendo uma dinâmica mercadológica, de modo que exprime, ainda  
que implicitamente, o sintoma sistemático da modernidade, que consiste no esquecimento de  
Dariane Cordeiro de Araújo; Marlon Garcia da Silva  
importantes categorias marxistas no desvelamento das formas das relações sociais  
contemporâneas.  
A posição do autor francês, ao conjecturar a análise de uma suposta sociedade “pós-  
industrial” (Baudrillard, 1970, p. 43), e ao anunciar a impossibilidade de um “fim da  
transcendência”, leia-se, da superação da alienação (Baudrillard, 1970, p. 205), implica na  
desistência de uma crítica que propõe análises respaldadas em movimentos mais mediados,  
mais profundos e mais abrangentes, correspondentes às relações humanas de produção e  
reprodução material e social, objetiva e subjetiva, na ordem do capital em sentido lato.  
Pensando na significação dos signos e das representações abstratas como bases  
fundamentais que norteiam seu pensamento, Baudrillard projeta, como visto acima, a noção de  
um feitiço mistificado e oculto da mercadoria, atrelado a um processo psicologizante e  
subjetivamente definido através de estruturas ideológicas da consciência humana, estas,  
necessariamente indexadas e experimentadas como consequência de relações sociais que  
pressupõem a problemática do consumo e do desejo de consumir, concebidos como centrais e  
determinantes das relações gerais da vida humana, no enredamento, inclusive, das relações de  
produção.  
A destituição que estamos indicando reside justamente na inversão das ordens  
determinativas das relações de preponderância entre os complexos categoriais centrais que  
rondam o espectro do ser social nos campos objetivo e subjetivo, nomeadamente, a inversão  
nas ordens de determinação e peso tônico entre produção e consumo.  
728  
A nosso ver, o autor da “Sociedade de consumo”, em suas posições críticas a um sistema  
que fomenta a hipertrofia, real e objetiva, da esfera do consumo, se distancia, e perde de vista  
a possibilidade de buscar e visualizar as reais formas das relações, interações e reciprocidades  
entre de produção e consumo.  
A análise que Baudrillard faz das dinâmicas e modos do consumo, a despeito da  
apreensão crítica de aspectos da manipulação no capitalismo tardio, não dá conta do ciclo que  
se realinha e se reproduz através da objetivação da consciência humana ao figurar o ciclo da  
produção enquanto parte naturalmente indivisível deste, onde o consumo, é, como podemos  
concluir, uma categoria que se situa no interior do momento da produção.  
De modo que o autor analisa a categoria do consumo sem se ater suficientemente à  
materialidade dialética das relações sociais de produção, bem como, sem considerar os  
complexos determinantes do trabalho e da genericidade humana, e sobre essas bases, as formas  
de consciência, da alienação e do estranhamento. O que entendemos que se caracteriza como  
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Para uma crítica à “Sociedade de consumo” e ao fim da transcendência da alienação em Jean Baudrillard  
inversão de categorias e complexos categoriais ontológicos, quer dizer, inscritos na  
materialidade da forma de ser.  
É importante e mesmo necessário ponderar que as contribuições críticas de Baudrillard  
representam uma relevante crítica às formas do consumo sistemático e típico do quadro social  
e capitalista contemporâneo. Nesse viés, entende-se que o simulacro da realidade e a  
mistificação do objeto enquanto representação abstrata e psicologizante culturalmente  
desenvolvida, caracteriza pontos interessantes que, no entanto, vão para além da representação  
imagética da mercadoria, isto é, são categorias que perpassam a totalidade, fundamentadas  
sobre bases sólidas da realidade material, que só podem ser reveladas através do estudo das  
formas do valor, da forma-mercadoria e seu caráter social e histórico, da objetivação do  
trabalho, da alienação e das relações de preponderância na retroação do consumo no ciclo de  
produção.  
No item “Fim da transcendência” (Baudrillard, 1970, p. 206), Baudrillard, ao  
compreender que a combinação fantástica dos signos e o processo generalizado e hipertrófico  
do consumo determina a relação do indivíduo com o mundo que o cerca, defende a posição de  
que, na dinâmica metabólica e cíclica da sociedade moderna, o processo generalizado do  
consumo nega a existência de uma realidade concreta da consciência humana voltada à  
potencialidade objetiva e subjetiva do ser, de modo que, não resta a possibilidade do vislumbre  
de uma restituição da consciência e da práxis humana para além do imperativo categórico dos  
signos e do consumo. Nesse sentido, a vida humana é fatalmente alicerçada nos fundamentos  
da sociedade de consumo. Nas palavras do autor:  
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No modo específico do consumo, já não existe transcendência, nem sequer a  
transcendência feiticista da mercadoria: reina a imanência à ordem dos signos.  
Assim como não existe separação ontológica, mas relação lógica entre o  
significante e o significado (Baudrillard, 1970, p. 206).  
À vista disso, é preciso ponderar o fato de que Baudrillard, enquanto importante teórico  
contemporâneo, compreende os nexos causais e os processos societários que rondam o espectro  
da produção e do trabalho tendo em vista o contexto histórico em que se insere, nomeadamente,  
a chamada afluência econômica de parte da sociedade europeia ocidental nas décadas  
imediatamente seguintes à Segunda Guerra Mundial. Não obstante, ao considerar a dinâmica  
hiperbólica do consumo enquanto matrizadora das relações sociais, bem como, entendendo o  
consumo, nesta sociabilidade, enquanto categoria que se respalda na questão lúdica, imagética,  
absoluta e imutável, reflete a noção de que a estrutura da sociedade moderna, pautada na  
destituição do indivíduo nas formas de ser e nas formas de consciência, tem, impreterivelmente,  
nessas relações do consumo, sua tônica predominante.  
Dariane Cordeiro de Araújo; Marlon Garcia da Silva  
Trazendo à luz a ideia de alienação assumida por Baudrillard, é possível aferir que o  
autor entende o espelhamento do gênero humano enquanto consequência múltipla da imanência  
dos signos e das representações, que aparecem no espectro do consciente e do inconsciente,  
bem como, consequência das formas imagéticas que se sobrepõem à realidade material.  
Logo, é necessário reiterar o fato dado de que, em “A Sociedade de Consumo”,  
precisamente, no item “Fim da transcendência”, Baudrillard evoca a noção de que o processo  
alienante típico do movimento da ambivalência mística da mercadoria, é impossível de ser  
superado.  
Considerações finais  
Destarte, faz-se necessário concatenar os exames aqui expostos para conferir peso  
teórico ao tema proposto. Sendo assim, é imprescindível aferir que a carga teórica marxista é  
rica no tocante ao exame da realidade material, concreta e prática da sociabilidade burguesa, e  
compreende a relação intrínseca da alienação e as formas da atividade e da sociabilidade  
humana, uma vez que, enquanto categoria que transcorre como consequência direta da relação  
de transferência imbricada na expropriação das forças, processos e resultados do trabalho,  
contém em si os desdobramentos da dinâmica material, concreta e reveladora da estrutura  
totalizante da sociabilidade do capital, incluídas as formas da consciência, bem como, as formas  
do consumo.  
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É nesse cenário que se destaca a importante contribuição do pensamento marxista  
persistente no interesse de desvelar categorias sociais que se relacionam com as formas de  
consciência e com a atividade produtiva em seu aspecto genérico e ontológico. É de extrema  
importância a reunião e articulação dos conceitos apresentados no que diz respeito à dissolução  
da obra de Baudrillard, principalmente no evolver de tensões preliminares a respeito de uma  
discussão mais aprofundada acerca da noção semiológica moderna que envolve, não somente a  
relação superficial com a tradição marxista, mas permeia um campo contextual ocidental de  
capitalismo tardio e ideologicamente direcionado à priorização de estudos das representações  
fenomênicas  
Na análise aferida da obra madura de Karl Marx, “O Capital - Volume I”, precisamente,  
em suas contribuições acerca do duplo caráter da mercadoria e o processo fetichizado que  
decorre das determinações imbricadas na dinâmica da valorização dos objetos, que, por sua vez,  
reverbera nas relações sociais entre os produtores, é possível traçar o elemento básico da  
análise, que configura extrema importância para o presente artigo: o caráter fantasmagórico que  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 2, p. 709-733, jul./dez. 2024. ISSN 1980-8518  
Para uma crítica à “Sociedade de consumo” e ao fim da transcendência da alienação em Jean Baudrillard  
o objeto espelha no processo de valorização, se dá através de sua imbricação na sociabilidade  
fetichizada e alienante, sob as determinações do modo de produção capitalista.  
É evidente, através da breve exposição desses conceitos, a ratificação de que o exame  
da mercadoria possibilita a compreensão de que o movimento real do processo fetichizado  
sugere a criação de uma consciência geral, que se fundamenta na ocultação das formas reais  
das relações sociais, justapostas às noções fenomênicas e de abstração da realidade, resultando  
em uma gama de ilusões acerca do processo produtivo. Outrossim, o processo de produção,  
pautado no caráter místico da mercadoria, implica no espelhamento do real valor do objeto,  
fruto do dispêndio de força vital e de trabalho humano. Dessa forma, levando em consideração  
que o aspecto social da mercadoria reflete as formas das relações sociais, a dinâmica fetichizada  
dessas determinações são, necessariamente, elencadas na expressão da forma-mercadoria, e  
resultam na ocultação da verdadeira forma do valor, bem como, na abstração da realidade  
histórica, social e material das dinâmicas sociais.  
Nos manuscritos de 1857, “Grundrisse”, Karl Marx situa historicamente a atividade  
produtiva socialmente necessária, não só enquanto ferramenta e meio para a criação de objetos,  
mas que fomenta e mantém ativo o ciclo infindável do consumo, das esferas de distribuição e  
de circulação, enquanto parte mediadora e inter-relacionada, contudo, e, simultaneamente,  
determinante, que sobreordena e direciona com peso tônico as dinâmicas imbricadas nessa  
totalidade, bem como, culmina nas formas e dimensões do complexo categorial da economia  
como totalidade orgânica, evidenciando sua preponderância ontológica no tocante às dimensões  
tomadas por este último, na sociabilidade capitalista.  
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Tendo em vista o aspecto ontológico da produção e reprodução da vida material  
humana, cujas formas matriciais encontram-se no trabalho, categoria intrínseca à espécie  
humana, que dispara a forma específica de ser, de produção e reprodução objetiva e subjetiva,  
é possível aferir a noção de que existe nos predicados da humanidade a potencialidade de  
modificar o ambiente ao redor, natural e social, de modo a estruturar formas e modos complexos  
de produção, de cooperação, de divisão social do trabalho, que podem se estender para além de  
uma ordem organizada nos moldes da sociabilidade burguesa.  
É nesse cenário que se faz necessário reiterar a legitimidade das vertentes marxistas não  
desistentes, em termos de princípios e de telos, de compreender as possibilidades humanas de  
orientar forças produtivas socialmente constituídas na direção de organização de relações e  
dinâmicas sociais estruturadas em moldes diversos, trazendo à luz a potencialidade ontológica  
humana, nas determinações múltiplas de diferentes instâncias e complexos categoriais, como a  
política, a ciência, a arte, a filosofia etc.  
Dariane Cordeiro de Araújo; Marlon Garcia da Silva  
À vista disso, é possível aferir a contraposição à crítica de Jean Baudrillard acerca da  
impossibilidade de superação frente à realidade sufocante de um mundo governado pelo  
imperativo categórico dos signos do consumo, uma vez que, de acordo com o autor francês, a  
profusão da mercadoria coordena e determina a produção material da vida pautando-se na  
alienação enquanto representação fantástica da ocultação, e do espelhamento humano, o que  
denota, entre outras coisas, a destituição de uma consciência humana pautada na vida, na  
atividade e sociabilidade reais.  
Assim, salienta-se que o processo pungente do consumo na sociedade moderna, em  
Baudrillard, não vislumbra a possibilidade de superação dessa situação de menoridade  
subordinada, administrada e funcionalizada em prol da mercantilização geral, uma vez que a  
humanidade se encontra destituída de potencialidades na esfera da produção objetiva e subjetiva  
da vida.  
Se a produção material da vida se constitui como a extensão da espécie humana  
genericamente no mundo material e inorgânico e orgânico, e desdobra formas de relações  
sociais e pautadas na atividade produtiva, logo, é necessário cravar como fato, que as dinâmicas  
que se seguem nesse processo não são fechadas nem se esgotam, antes, são abertas, posto que  
são próprias de um ser que se autoconstitui.  
Tendo isso em vista, é razoável assumir que não há modo de produção ou organização  
societária que seja eterno, e que seja capaz de destituir a humanidade de seu aspecto genérico e  
vital, matrizado na força e nas potencialidades do trabalho social.  
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É nesse sentido que o estudo crítico e ontológico da teoria do consumo pode constituir  
um estímulo e reforço da importância de estudos, nesse diapasão, de bases marxistas, e  
favorecer e fomentar o tensionamento das bases fundantes do modo de produção vigente,  
essencialmente, no que diz respeito à compreensão dos nexos e dos processos que se estendem  
para além da crítica à sacralização da mercadoria e desembocam na evidência flagrante de que  
há, para além da abstração, uma sociedade estruturada materialmente nos moldes da exploração  
do trabalho, da acumulação de capital, e regada pelo direcionamento ideológico do projeto  
político liberal burguês, estabelecendo, desta forma, por princípio e por evidências prático-  
sensíveis, razoáveis, a possibilidade de superação desta ordem societária.  
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