Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas  
das relações raciais e da superexploração  
Who built the "Caes do Porto"? The marks of race relations and  
overexploitation  
Gustavo Gonçalves Fagundes*  
Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca**  
Resumo: O centenário porto construído no Rio  
de Janeiro é obra de engenharia que nos alcança  
no presente. Neste artigo, objetivamos  
demonstrar quem eram, como viviam e em que  
condições laboravam os produtores diretos de  
tamanha empreitada. Para o entendimento  
aprofundado deste processo naqueles canteiros  
de obras, sobrelevam-se as socialmente  
generalizadas marcas das corroídas relações  
raciais no pós-abolição, bem como está  
caracterizada a superexploração da força de  
trabalho engajada em tamanha construção.  
História e Teoria Social devem responder: quem  
construiu o “caes do porto”?  
Abstract: The centenary port built in Rio de  
Janeiro is a work of engineering that reaches us  
today. In this article, we aim to demonstrate who  
they were, how they lived and under what  
conditions the direct producers of such an  
undertaking worked. For an in-depth  
understanding of this process at those  
construction sites, the socially generalized  
marks of corroded racial relations in the post-  
abolition period are highlighted, as well as the  
overexploitation of the workforce engaged in  
such construction. History and Social Theory  
must answer: who built the “caes do porto”?  
Palavras-chaves:  
Porto;  
Racismo;  
Keywords: Port; Racism; Overexploitation.  
Superexploração.  
Introdução  
As páginas a seguir trazem entendimento do racismo enquanto uma tecnologia de  
dominação e da compreensão da sua reprodução a partir das relações de trabalho que  
prevaleceram no processo de destruição/construção do Porto do Rio de Janeiro, ente 1904 e  
1914. Em alusão ao que o atual Ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil, Silvio  
* Doutorando e mestre em Serviço Social pela UFRJ. Assistente social pela UFF. ORCID: https://orcid.org/0000-  
**  
Doutor em História pela UFF. Professor Visitante Adjunto de História do Atlântico no PPGH/DFCH-UESC.  
Nota: Agradecemos as indicações do professor Luiz Cláudio Moisés Ribeiro (UFES) que motivaram a associação  
da reflexão teórica com a pesquisa empírica, acabando por redundar na elaboração em coautoria deste artigo.  
DOI: 10.34019/1980-8518.2024.v24.42315  
Esta obra está licenciada sob os termos  
Recebido em: 24/09/2023  
Aprovado em: 12/04/2024  
Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
de Almeida (2019), afirma sobre sua obra, o texto aqui apresentado não se restringe às  
discussões de raça ou da opressão racial, mas sim do conjunto da teoria social. O que no caso  
da presente abordagem diz respeito ao mundo do trabalho, a conformação da classe trabalhadora  
e sua composição racial, os processos produtivos que era engajada, bem como seus métodos de  
organização e mobilização em um determinado período histórico. Essa demarcação se faz  
necessária para evitar estreitar ou isolar o estudo das condições de vida e trabalho da população  
negra, como se o mesmo não compreendesse de forma global as relações de trabalho sob o  
desenvolvimento capitalista.  
A perspectiva que integra as categorias de raça e classe é fruto do entendimento das  
determinações sócio-históricas que estruturaram a sociedade brasileira, a qual impõe um caráter  
sistêmico ao racismo. Dessa forma, entendemos que a abordagem não se apoia em meros atos  
isolados, mas sim num processo histórico que criou subalternidades e favorecimentos entre os  
diferentes grupos raciais. Portanto, tal qual o autor supracitado, partimos da concepção  
estrutural do racismo. Logo, as relações do caso aqui examinado também estão inseridas na  
corrosão social produzida pela opressão racial, mas também no capitalismo dependente que se  
construía no Brasil.  
Depois de três décadas de frustrações com os chamados “melhoramentos portuários” no  
Rio de Janeiro, da reprodução em escalas aperfeiçoadas, mas ainda muito limitadas, da operação  
portuária baseada em trapiches e das elaborações frustradas de diferentes concessionários em  
seus projetos para o porto do Rio de Janeiro, é exemplar a forma como o Estado Nacional  
brasileiro tomou a iniciativa de transformá-lo radicalmente. Os historiadores convencionaram  
(Benchimol, 1990; Lamarão, 1991, Velasco e Cruz, 1998) creditar a “reforma do porto” ao  
governo federal e, secundariamente, à empresa que a executou a empreiteira inglesa C. H.  
Walker & C. a maior parte dos serviços, mas pouco ou nada foi esclarecido sobre aqueles  
sujeitos que venderam suas forças vitais e capacidades criativas para consecução da maior obra  
pública em um século de Brasil independente. De fato, desde o arcabouço legal preparatório até  
a fiscalização das obras no campo, é possível asseverar que aquela obra pública era expressão  
de uma radical transformação urbana e operacional há muito ansiada tanto pelas classes  
dominantes acampadas no Estado Nacional, quanto pelos trabalhadores que penavam na  
operação portuária então estabelecida (Albuquerque, 1983).  
283  
Trazemos o necessário debate de esmiuçar as relações raciais contidas em tal  
empreitada. Com intuito de reconhecer a composição racial daqueles trabalhadores, a  
importância e o risco dos/nos ofícios desempenhados naqueles canteiros de obras, mas  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
especialmente as implicações do racismo na transição do mundo do trabalho no início do século  
XX, cuja observação é possível através da investigação sobre a construção do porto.  
Assim, importa apontar o destino dos brasileiros responsáveis pela produção da riqueza  
nacional no período que sucede a conquista da abolição. Nos apoiaremos nas contribuições de  
Clóvis Moura (1988; 2014; 2021) para expor a construção de mecanismos de barragem social  
contra os trabalhadores negros após o processo abolicionista, um movimento organizado pelo  
Estado Nacional enquanto mediação opressora e com firme impacto na transição da escravidão  
em direção ao assalariamento. Sua dimensão englobou aspectos jurídicos-políticos e todo um  
arcabouço ideológico. Em Florestan Fernandes (2008), temos uma abordagem sobre a  
integração do negro na sociedade de classes, o que traz a consolidação da estrutura social e  
econômica capaz de impor à população negra uma localização inferiorizada em relação aos  
brancos.  
Esse percurso histórico de transição do regime de trabalho é corroído por elementos que  
até hoje estão introjetados no imaginário social. Nesse sentido, as obras do porto do Rio de  
Janeiro ganham centralidade, visto que ali podemos perceber não só a estrita relação de venda  
da força de trabalho como também as potencialidades de organização e mobilização no pós-  
abolição. No caso em tela, fica claro um nível de consciência sobre sua condição de classe que  
se desdobra a partir do acúmulo da experiência de classe dos trabalhadores negros, consciência  
esta, em grande medida, legatária das experiências vividas por esses sujeitos na sociedade  
escravista.  
284  
Registrada a responsabilidade e iniciativa do governo federal, bem como a execução C.  
H. Walker & C., outras empresas e agentes privados, não é justo esquecer os produtores diretos  
da infraestrutura que permaneceu com grande relevância operacional para o país durante seis  
décadas e que nos alcança, materialmente, até os dias de hoje entre a Praça Mauá e o Canal  
do Mangue. Para tanto, é possível integrar o entendimento sobre a construção/constituição  
material do porto e a formação/composição da classe trabalhadora na capital da República.  
Partimos da premissa de que o projetado, reprojetado e, finalmente, executado no porto  
do Rio de Janeiro (1903-1914) não foi uma mera reforma. Ao contrário, era um esforço  
coordenado de destruição/construção da principal repartição fiscal do país e uma das mais  
importantes infraestruturas ao alcance e serviço dos capitais que aqui se acumulavam  
(Mantuano, 2022). A disruptiva transformação da natureza, constituição material e  
equipamento do porto o emancipou do alcance limitado do capital comercial, simbolizado nos  
trapiches que continuaram existindo sem a centralidade de outrora para operação portuária do  
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Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
Rio de Janeiro. Construiu-se um porto de escala e cariz industrial, se impôs uma materialidade  
que viabilizava a operação portuária hegemonicamente capitalista na capital da República e este  
processo foi condicionado e tomado pelo capital financeiro a associação entre o banco que há  
muito era financiador externo da dívida pública brasileira, N. M. Rothschild & Sons, e dos  
empreiteiros da maior parte das obras, C. H. Walker & C., ambos britânicos.  
O esforço para construção do porto do Rio de Janeiro foi gestado e parido coadunando  
com a ortodoxia econômica vigente, ratificando a subordinação brasileira ao imperialismo  
capitalista (Singer, 2006), pelas vias dos acordos com os grandes capitais, da articulação com  
as representações nacionais das classes dominantes, dos contratos junto aos financiadores e  
executores empresariais das obras. Aprofundou-se, em suma, o essencial da República  
Oligárquica: a dependência econômica, as desigualdades sociais e a própria questão racial  
(Oliveira, 2006).  
Embora significasse uma mudança material de magnitude inigualável e de repercussões  
larguíssimas, a radical transformação do porto do Rio de Janeiro não surgiu de um novo status  
quo, assim como não deu azo a mudança deste, antes, o reforçou. Neste artigo buscamos  
evidenciar como a superexploração do trabalho dos indivíduos, majoritariamente brasileiros e  
negros, que guardavam para si apenas suas forças vitais e conhecimentos como serventes,  
pedreiros e mestres de obras, especialmente, mas também como canteiros, metalúrgicos,  
marceneiros, marítimos, carregadores etc.. Entendê-los como agentes é fundamental para o  
conhecimento das relações laborais de indisfarçável clivagem nacional e racial que  
viabilizaram a realização das demolições e obras que construíram um dos maiores portos do  
mundo.  
285  
Em suma, não é possível conhecer a História Urbano-Portuária do Rio de Janeiro sem  
responder a seguinte questão: quem fez as dragagens? Quem participou dos aterramentos?  
Quem erigiu aqueles armazéns? Quem construiu o “caes do porto” do Rio de Janeiro?  
Sobre Superexploração e Dependência no entrelaço das relações raciais  
Os trabalhadores que protagonizaram as obras do porto do Rio de Janeiro e a própria  
dinâmica econômica que originou tal empreitada não surgiram com o alvorecer do século XX.  
É preciso nos debruçarmos sobre a dimensão particular da formação brasileira em seus  
meandros socioeconômicos, inclusive para que possamos compreender o racismo enquanto  
parte estrutural e estruturante do processo em tela.  
Partimos do que Ruy Mauro Marini aponta ser o caráter dependente do capitalismo  
brasileiro:  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
O que deveria ser dito é que, ainda quando se trate realmente de um  
desenvolvimento insuficiente das relações capitalistas, essa noção se refere a  
aspectos de uma realidade que, por sua estrutura global e seu funcionamento,  
não poderá desenvolver-se jamais da mesma forma como se desenvolvem as  
economias capitalistas chamadas avançadas. É por isso que, mais do que um  
pré-capitalismo, o que se tem é um capitalismo sui generis, que só adquire  
sentido se o contemplamos na perspectiva do sistema em seu conjunto, tanto  
em nível nacional, quanto, e principalmente, em nível internacional (Marini,  
2005, p. 138).  
A constatação de estarmos submetidos a um capitalismo dependente nos permite  
adentrar tendências que dão legalidade teórica ao que se desdobra na sociedade brasileira. Por  
apresentar uma integração subordinada ao mercado mundial capitalista, assim como o conjunto  
da América Latina, temos a implicação de um intercâmbio desigual de mercadorias.  
Ressaltamos que esse processo coaduna com a vigência da escravidão em pleno século  
XIX, momento em que homens negros e mulheres negras trabalhavam de forma compulsória  
para seus senhores. Período histórico apontado como segunda escravidão, entre 1790 e 1888,  
(Tomich, 2011) ou escravismo tardio, que corresponde ao interregno de 1850 e 1888, (Moura,  
2014), recortes temporais que contribuem na interpretação dos acontecimentos da escravidão  
durante seu apogeu produtivo e de corpos escravizados, plena vinculação com o  
desenvolvimento capitalista até os acontecimentos jurídicos-políticos que acompanharam sua  
desagregação.  
286  
O processo de subjugação das economias dependentes em relação as centrais propiciava  
uma perda de valor nas trocas mercantis entre as primeiras em favor das últimas. Marini  
compreende essa dinâmica e desenvolve a categoria da superexploração da força de trabalho  
como um mecanismo de compensação a essa sucção de valor das nações dependentes, o que se  
configura em uma sui generis compleição da relação capital e trabalho.  
Nas palavras do autor:  
[...] a participação da América Latina no mercado mundial contribuirá para  
que o eixo de acumulação na economia industrial se desloque da produção de  
mais-valia absoluta para a de mais-valia relativa, ou seja, que a acumulação  
passe a depender mais do aumento da capacidade produtiva do trabalho do  
que simplesmente da exploração do trabalhador. No entanto,  
o
desenvolvimento da produção latino-americana, que permite à região  
coadjuvar com essa mudança qualitativa nos países centrais, dar-se-á  
fundamentalmente com base em maior exploração do trabalhador (Marini,  
2005, p. 144, grifo nosso).  
Ao nos aprofundarmos de forma mais detida na referida elaboração teórica, percebemos  
que a reflexão trata das economias das nações latino-americanas e a constituição dos pilares da  
dependência. Visto que “a criação da grande indústria moderna seria fortemente obstaculizada  
se não houvesse contato com os países dependentes, e tido que se realizar sobre uma base  
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estritamente nacional” (p. 142) e aponta que “é a partir desse momento que as relações da  
América Latina com os centros capitalistas europeus se inserem em uma estrutura definida: a  
divisão internacional do trabalho” (p. 141). Ressaltamos ainda que compõem a elaboração a  
preocupação em diferenciar situação colonial de dependência, onde “ainda que se dê uma  
continuidade entre ambas, não são homogêneas” (p. 141).  
A superexploração não se resume a uma condição laboral degradante, ela é um  
mecanismo de compensação frente a inserção subordinada dos países da América Latina no  
mercado mundial e consequente intercâmbio desigual de mercadorias. Uma desigualdade que  
resulta na cessão de valor por parte da nação desfavorecida (dependente) em favor das nações  
beneficiadas. Logo, “o mero fato de que umas produzam bens que as outras não produzem, ou  
não o fazem com a mesma facilidade, permite que as primeiras eludam a Lei do Valor” (Marini,  
2005, p. 152), fenômeno que compõe um dos pilares do que vem a ser a dependência. Essa  
transferência valor implica deterioração da acumulação de capital da classe brasileira e frente a  
inserção subordinada ao mercado mundial, compunha os termos de troca do Brasil enquanto  
nação já na virada do século XIX para o XX.  
Frisamos a incompatibilidade da superexploração com regimes escravistas, justamente  
pela previsão de compra e venda da força de trabalho como também do seu vigor enquanto  
mecanismo de compensação, que reside na contrapartida para que os países dependentes  
reponham a massa de valor perdida na transferência de valor. Dessa forma:  
287  
Aforça de trabalho, na superexploração, além de estar submetida à exploração  
capitalista nas determinações mais gerais da Lei do Valor, está também,  
submetida às determinações específicas desta, sob as quais é agudizada sua  
tendência negativamente determinada, que atua de modo sistemático e  
estrutural sob as condições dependentes, provocando desgaste prematuro da  
força de trabalho e/ou a reposição de seu desgaste de tal maneira em que a  
substância viva do valor não é restaurada em condições normais (isto é, nas  
condições sociais dadas), ocorrendo o rebaixamento do seu valor (Luce, 2018,  
p. 155)  
Compreendemos, a luz da clássica elaboração de Marini e da atualização elaborada por  
Mathias Seibel Luce (2018), a vigência de quatro manifestações específicas da superexploração  
da força de trabalho: a) pagamento da força de trabalho abaixo do seu valor; b) o prolongamento  
da jornada de trabalho além dos limites normais; c) o aumento da intensidade além dos limites  
normais; d) o hiato entre o elemento histórico moral do valor da força de trabalho e a  
remuneração do trabalhador. É a partir dessa particular expressão das relações de produção  
capitalista a que estão submetidos o conjunto dos trabalhadores brasileiros.  
Adrian Sotelo Valencia (2023) orienta que Marini formula a superexploração da força  
de trabalho em um alto nível de abstração e que de nenhuma maneira abre mão dos elementos  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
sociológicos e políticos, como a luta de classes, Estado e poder. “Esses componentes, ao passo  
que interagem como mediações, no plano concreto, a sobredeterminam, seja no sentido  
de aumentá-la ou moderá-la” (p. 20). Isso implica que a superexploração, como qualquer  
fenômeno social, pode ser analisada - inclusive é a forma adotada nos termos realizados por  
Marini - em um determinado nível de abstração teórico-metodológico e isso não impede a  
constituição de mediações para captar seu movimento real e com isso vislumbrar suas  
particularidades. Dessa forma, na compreensão da superexploração, não se deve esquecer a  
“forma como se entrelaça com o Estado e com a dinâmica da luta de classes que a modula, seja  
no sentido de elevá-la ou no sentido de revertê-la em favor dos interesses da classe  
trabalhadora” (p. 26). Nesse sentido, consideramos que o racismo é um determinante  
fundamental na conformação das classes, nas suas experiências, fazer-se e isso se revela em  
elemento chave para o entendimento da superexploração.  
Isso traz a discussão acerca da determinação de um valor normal para a força de  
trabalho. Adiantamos o entendimento de que tal valor se constitui por aspectos históricos e  
conjunturais. Assim, a vigência do racismo enquanto estrutural na formação econômica e social  
brasileira se constitui em um elemento para compor o valor da força de trabalho. Almeida  
(2019, p. 35) afirma que o racismo carrega em si um caráter sistêmico, já que não pode ser  
resumido a meros atos isolados ou expressões discriminatórias, mas “de um processo que  
condições de subalternidade e de privilégio que se distribuem entre grupos raciais se  
reproduzem nos âmbitos da política, da economia e das relações cotidianas”. Por isso, o racismo  
deve ser entendido como estrutural, “decorrência da própria estrutura socia, ou seja, do modo  
‘normal’ com que se constituem relações políticas, econômicas, jurídicas e até familiares” (p.  
50).  
288  
Clóvis Moura (2021), ao trazer indicações sobre como o trabalhador negro transita de  
um bom escravo na percepção senhorial para um mau cidadão na concepção da classe  
dominante, nos oferece pistas contundentes, principalmente pela combinação do Estado  
enquanto mediação opressora. Responsável por moldar e organizar o mercado de trabalho e a  
vigência de um arcabouço ideológico que corroeu o imaginário social o que eximindo com  
maior profundidade na obra de Weber Lopes Goés (2018) com teorias racialistas sobre as  
capacidades e habilidades intelectuais dos trabalhadores negros.  
Não será, atualmente, mau cidadão aquele negro livre que procura, através da  
sua conscientização, levantar o problema da situação racial do Brasil e  
encontrar soluções, globais ou parciais, para ela? Ou será bom cidadão negro  
aquele que aceita o status quo e procura ser apenas divertimento, objeto para  
o branco (como já fora no tempo da escravidão), espécie de mercadoria que  
se vende nos momentos em que a indústria turística procura se desenvolver no  
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país e, com esta atitude de subalternização, regride socialmente até uma franja  
próxima à do antigo escravo?  
Não será, porém, bom cidadão o negro que não aceita a discriminação racial,  
o seu confinamento nas favelas, mocambos e alagados, as restrições que são  
feitas à sua cor no mercado de trabalho e em muitas instituições, e procura, de  
uma forma ou de outra, encontrar saída para o impasse atráves da sua  
participação em movimentos projetivos?  
É visto ainda como mau cidadão negro aquele que vive nas favelas, nos  
cortiços, nos mocambos nordestinos e se situa nas mais baixas camadas  
sociais, como operário não qualificado, doméstica, mendigo, biscateiro,  
criminoso ou alcoólatra. É exatamente aquele segmento descendente do  
escravo, hoje apenas negro livre, porém que não foi, ainda, incorporado, na  
sua grande maioria, a não formalmente, à sociedade civil, como cidadão. O  
negro doente. Avitaminado. Deformado por doenças carenciais. Preterido no  
trabalho. Vivendo nos terreiros de umbanda e candomblé. Fazendo uso da  
medicina popular para curar moléstias que atingem, com maior índice de  
incidência, as áres ecológicas para onde foi inexoravelmente jogado (Moura,  
2021, p. 29).  
Esse imbróglio se desdobra no período de transição do regime de trabalho no Brasil,  
quando a escravidão definha com a dinâmica da luta dos escravizados e o movimento  
abolicionista e com a posterior ascensão do mundo do trabalho assalariado. Ou seja, as obras  
portuárias no Rio de Janeiro são compreendidas ainda nesse recorte temporal.  
Corroboramos com a concepção defendida por Silvio Almeida sobre o racismo não ser  
uma herança direta ou mero resto da escravidão, “até mesmo porque não há oposição entre  
modernidade/capitalismo e escravidão” (Almeida, 2019, p. 183). Logo, o racismo é parte  
constitutiva das estruturas do capitalismo.  
289  
Fagundes (2022) aponta o exército industrial de reserva como mecanismo central na  
relação entre superexploração e racismo estrutural, justamente por buscar na crítica da  
economia política as categorias para as implicações negativas na elaboração do valor da força  
de trabalho.  
A existência do exército industrial de reserva compreende o controle do valor da força  
de trabalho, visto que “produzir uma população excedente relativa, isto é, excedente em relação  
à necessidade média de valorização do capital, é uma condição vital da indústria moderna”  
(Marx, 2017, p. 709), o que a “grosso modo, os movimentos gerais do salário são regulados  
exclusivamente pela expansão e contração do exército industrial de reserva” (Marx, 2017, p.  
712). Tal definição avança em seus contornos ao se constatar, nos termos de Ruy Mauro Marini,  
a existência de um avolumado número de trabalhadores ausentes dos postos de trabalho como  
pressuposto fundamental para vigência da superexploração. E é na transição do regime de  
trabalho escravizado para o trabalho assalariado que primeiro conseguimos observar a  
racialização do processo de constituição de um exército industrial de reserva racializado no  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
Brasil. Ou seja, um avolumado e racializado exército industrial de reserva se constitui a partir  
da igualdade jurídica das relações legais de trabalho.  
Florestan Fernandes, ao abordar a integração do negro na sociedade de classes, nos  
auxilia na observação desse fenômeno.  
Onde a produção se encontrava em níveis baixos, os quadros da ordem  
tradicionalista se mantinham intocáveis: como os antigos libertos, os ex-  
escravos tinham de optar, na quase totalidade, entre a reabsorção no sistema  
de produção, em condições substancialmente análogas às anteriores, e a  
degradação de sua situação econômica, incorporando-se à massa de  
desocupados e de semi-ocupados da economia de subsistência do lugar ou  
outra região. Onde a produção atingia níveis altos, refletindo se no padrão de  
crescimento econômico e de organização do trabalho, existiam reais  
possibilidade de criar um autêntico mercado de trabalho: aí, os ex-escravos  
tinham de concorrer com os chamados “trabalhadores nacionais”. [...] Em  
consequência, ao contrário do que se poderia supor, em vez de favorecer, as  
alternativas da nova situação econômica brasileira solapavam, comprometiam  
ou arruinavam, inexoravelmente, a posição do negro nas relações de produção  
e como agente de trabalho (Fernandes, 2008, p. 31-32).  
Clóvis Moura (2021) afirma que “uma sistemática de peneiramento contra o ex-escravo,  
após a Abolição, permeou as oportunidades de integração na sociedade capitalista emergente”  
(p. 31). Essa realidade imprimiu uma dimensão ideológica da representação dos homens negros  
e mulheres negras enquanto sujeitos responsáveis por sua própria condição, retirando de cena  
os aspectos jurídicos-políticos (nos termos moureanos) que justificam tal situação.  
290  
“No caso específico do negro brasileiro, que além de ter vndo da situação  
inicial de escravo, pertence a uma etnia que possui uma determinada marca,  
segundo os padrões brancos, o problema se agrava e surge, em consequência,  
uma série de barragens e razões justificatórias, capazes de impedir a sua  
ascenão social massiva. Desta forma, os valores etnocêntricos das classes  
dominantes representam uma redoma ideológica que tem como função  
impedir a mobilidade vertical dos seus estratos inferiores” (Moura, 2021, p.  
37).  
No curso do centenário da abolição o autor adensou os debates sobre o tema da situação  
da população negra após a liberdade do cativeiro. Aponta que um acúmulo de combinações  
determinou a imposição dos trabalhadores negros enquanto superpopulação relativa logo nas  
primeiras décadas do século XX. Seja a trajetória histórica do trabalho compulsório, o que  
impedia o acúmulo de bens materiais, ou mesmo o vendaval de teorias racialistas que corroía o  
imaginário social em sentido de inferiorizar essa parcela da população.  
Temos ainda, sob a dinâmica das relações capitalistas, a criação de estereótipos sobre o  
indivíduo não-branco:  
Indolentes, cachaceiros, não-persistentes para o trabalho e, em contrapartida,  
por extensão, apresenta-se o trabalhador branco como o modelo perseverante,  
honesto, de hábitos morigerados e tendências a poupança e à estabilidade no  
emprego. Elege-se o modelo branco como sendo o do trabalhador ideal  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 282-318, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
(Moura, 1988, p. 69).  
As obras no porto do Rio de Janeiro estão inseridas nesse contexto, os trabalhadores –  
brancos e negros, nacionais e estrangeiros protagonistas dessa empreitada. Omitir as relações  
raciais desse episódio é incorrer em equívocos teóricos e também políticos. Aqueles sujeitos  
organizaram entidades de classe, lutaram por melhores condições de trabalho e colocaram no  
debate público uma série de elementos que devem ser recuperados para ilustrar as experiências  
que conformam a classe trabalhadora em nosso país.  
A Força de Trabalho nas obras portuárias  
No dia em que a Muralha da China ficou pronta,  
para onde foram os pedreiros?  
(Brecht, 1935)  
Na construção do porto do Rio de Janeiro participaram milhares de trabalhadores,  
contramestres, operários, peões, pedreiros e serventes de obras que arriscavam as suas vidas  
pela mera reprodução de sua existência e, indeliberadamente, acabaram contribuindo para  
aquilo que era tido como um grande feito.  
Pensamos como Marcel Van der Linden: aqueles trabalhadores foram levados aos  
canteiros de obras premidos contra a miséria, por sua sobrevivência e de suas famílias (Linden,  
2013). Já Marcelo Badaró Mattos (2008) demonstra como a alongada experiência da escravidão  
e o convívio entre escravizados, ex-escravizados e livres especialmente nos ambientes de  
trabalho rebaixaram os padrões de vida e trabalho possíveis aos sujeitos que construíam a  
classe trabalhadora no Rio de Janeiro do pós-abolição.  
291  
O espaço radicalmente transformado era, antes, constituído de rica diversidade social e  
pobreza material generalizada, ali residia e/ou trabalhava o homem simples (Mantuano; Oliveira  
Junior; Honorato, 2016). É necessário pontuar que essa diversidade não pode ser simplificada.  
As questões das divisões nacionais e raciais não constituíam apenas um dado a ser levado em  
conta pelas autoridades para quantificar e classificar os sujeitos no mundo do trabalho. A  
própria visão dos trabalhadores estava balizada por sua existência enquanto brasileiro,  
português, espanhol, carioca, baiano, branco ou negro. Em determinada medida, estas  
identidades funcionavam como uma solda de partes que eram unidas a quente no mundo  
trabalho, mas também criavam obstáculos ao processo de tomada de consciência da classe.  
Estes obstáculos evidentemente não eram intransponíveis, mas é claro constituíam-se em uma  
clivagem da classe trabalhadora que foi conscientemente produzida pelas classes dominantes  
(Chalhoub, 2001).  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
Trata-se de entender a experiência de classe como oriunda dos conflitos na desagregação  
da escravidão, principalmente no contexto singular das relações de trabalho no cenário urbano.  
A construção do porto do Rio de Janeiro foi central não só pela sua magnitude para a engenharia  
da época, mas também no que concerne ao fazer-se da classe trabalhadora, dado o contexto das  
relações raciais.  
Gracyelle Costa Ferreira (2020), em sua tese de doutorado, se debruça sobre os  
trabalhadores negros na origem da política social no Brasil. Habitualmente, são três os  
segmentos de trabalhadores entendidos como protagonistas desse processo: ferroviários,  
portuários e marítimos. Entretanto, afirma também que pouco se aborda sobre as relações  
étnico-raciais às quais esses sujeitos estavam inseridos e bem pouco sobre a tradição de lutas e  
mobilizações que esses sujeitos encamparam. Em específico sobre os trabalhadores que  
transitavam ou mesmo laboravam diretamente no porto, Ferreira aponta que em finais dos  
oitocentos já era observada uma concentração elevada de trabalhadores negros na Região  
Portuária, seja nos processos de trabalho, ou na organização coletiva para preservação dos seus  
interesses de classe.  
Essa constatação não tem o intuito de imputar à parcela negra do proletariado brasileiro  
uma característica inata de relação com o movimento organizado de trabalhadores e suas  
mobilizações. O que se busca é situar esse conjunto como também pertencente à classe  
trabalhadora do país, não apenas a partir da sua localização na estrutura produtiva, como  
também no seu pertencimento a esse coletivo de indivíduos. A autora demonstra com riqueza  
analítica como o constante abastecimento do exército industrial de reserva pela crescente  
imigração acabava acarretando como consequência da exploração da miséria e brutal entrega  
à sobrevivência dos sujeitos desterritorializados um rebaixamento das perspectivas dos  
trabalhadores brasileiros, especialmente os negros.  
292  
A situação demonstra como os empregadores se valeram da abundância da  
mão de obra estrangeira pouco qualificada. Sim, porque ao contrário do que  
comumente se diz, muitos dos que vieram para o Brasil não tinham profissão  
definida ou trato para o trabalho urbano, seja ele fabril ou de outro cariz. Daí  
muitos deles recorrerem ao trabalho no porto. Ou seja, a tentativa de expulsão  
dos trabalhadores negros de postos ocupados durante a escravidão não pode  
ser ainda hoje considerada do ponto de vista da “incapacidade técnica” desses  
sujeitos, mas de um projeto de Estado articulado por concepções deterministas  
sobre raça e nação. Esse projeto ao mesmo tempo foi parte da formação de um  
mercado que se pretendia assalariado de trabalho no Brasil. O aumento da  
oferta de trabalhadores com os imigrantes da Europa, associado à tentativa de  
extermínio da população negra modulou esse projeto racializado de civilidade  
capitalista no país. Um projeto que visou minar dos livres e libertos negros as  
condições para assalariamento e inserção em atividades de prestígio ou com  
maiores condições para mobilidade econômica (Ferreira, 2020, p. 108-109).  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 282-318, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
Por outro lado, é preciso ter em mente que portugueses pobres foram ostensivamente  
emigrados para o Rio de Janeiro e, aqui, brutalmente explorados muitas vezes, inclusive por  
seus patrícios. A disputa pelo mercado de trabalho, realidade tão rara se considerarmos o  
conjunto do país, explica por que, no período de afirmação nacional, os ódios e rancores se  
voltaram contra eles, concorrentes mais presentes ante aos nacionais pelas vagas nas obras do  
porto, especialmente aquelas mais bem remuneradas, que exigiam alguma habilidade e  
ofereciam melhores condições salariais e laborais (Menezes, 1996).  
Gladys Sabina Ribeiro demonstra como a intensa exploração do trabalho imigrante,  
nomeadamente português, determinou até mesmo como aqueles lusitanos eram apelidados:  
“burros sem rabo” (Ribeiro, 2017, p. 232). Ribeiro faz importante debate sobre a ideologia do  
trabalho que nos interessa na medida em que estava fundada nas noções de disciplina, dedicação  
e competência no âmbito profissional, e estas eram requeridas constantemente em obras tão  
grandes e complexas como as do porto. As condições árduas da luta pela sobrevivência –  
salários baixos, abundância da força de trabalho habitação escassa e em condições precárias –  
serviam para incutir nos membros da classe trabalhadora que eles tinham de competir uns com  
os outros no intuito de garantir a reprodução material de suas existências.  
No entanto, havia uma dimensão de solidariedade que brotava na contramão das  
disputas raciais e entre nacionais, especialmente quando o embate contra o capital se travava  
de maneira aberta (Fausto, 1977).  
293  
É nesse quadro sociolaboral e de construção da classe trabalhadora no Rio de Janeiro  
que massas de operários da construção civil, naval, da indústria de transformação e dos  
transportes foram mobilizados, direta ou indiretamente, para construção da maior obra pública  
ordenada pelo Estado Nacional brasileiro.  
Estes sujeitos estavam divididos em oito frentes de trabalho para destruição/construção  
do porto: nas oficinas na Ponta da Areia, em Niterói; na Baía de Guanabara, engajados nos  
trabalhos de dragagem e descarte do material dragado para além da barra; na construção do  
cais; nos aterramentos; na destruição e construção das infraestruturas urbanas e portuárias; na  
construção do Canal do Mangue; na pedreira do morro do Senado; e na pedreira do morro da  
Saúde. Importante notar que C. H. Walker & C. não desempenhou todos estes trabalhos, sendo  
responsáveis pelos que envolviam a dragagem e construção do canal, do cais, dos aterramentos  
e de parte dos armazéns internos ao cais. A própria Comissão Fiscal e Administrativa das Obras  
do Porto do Rio de Janeiro1 doravante, CFAOPRJ realizou diretamente, bem como através  
1 A Comissão Fiscal e Administrativa das Obras do Porto do Rio de Janeiro foi criada pelo governo federal para  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
da contratação de terceiros, obras, serviços e fornecimentos fundamentais para o projeto.  
Também é importante que se diga que, naquele momento, obras conexas, complementares e/ou  
subordinadas a destruição/construção do porto foram realizadas tanto pelo governo federal,  
quanto pela municipalidade do Distrito Federal (Benchimol, 1990, p. 316-317), ampliando a  
oferta de trabalho na construção civil.  
A destruição/construção do porto do Rio de Janeiro envolveu uma ampla gama de  
ofícios atribuídos aos trabalhadores e profissões atribuídas aos agentes que ordenavam as  
atividades laborais, em distintas especialidades e níveis de formação. A partir de onze relatórios  
anuais do Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas (1904-1908) e do seu sucessor, o  
Ministério da Viação e Obras Públicas (1909-1914), perscrutamos a constância à citação de  
categorias de trabalhadores engajadas nas obras. Identificamos exatas 30 categorias na seção  
“Porto do Rio de Janeiro” dos referidos relatórios. Estas exprimiam com exatidão o fazer dos  
produtores diretos, mas também dos agentes que projetavam, formulavam, fiscalizavam e  
administravam aquelas obras. Para tanto, excluímos a designação desses sujeitos por expressões  
genéricas e abrangentes como “trabalhadores das obras”, “empregados” ou, simplesmente,  
“operários”.  
A unidade escolhida como critério para quantificação foi a ocorrência por relatório(s)  
em que dada categoria aprecia ao menos uma vez. De forma que vedamos a distorção dos dados  
a partir de uma amostra nas informações oferecidas pela fonte, pois se contássemos o número  
de vezes em que cada categoria foi citada reunindo todos os relatórios, os pedreiros e os  
engenheiros poderiam parecer super-representados.  
294  
administrar, fiscalizar e conservar a construção do porto do Rio de Janeiro, bem como executar e contratar obras  
acessórias (Decreto 4.969, 18 de setembro de 1903). A comissão estava sob a direta ascendência do Ministério da  
Indústria, Viação e Obras Públicas e tinha autonomia sobre a gestão das rendas que a Caixa Especial do Porto tinha  
por direito auferir.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 282-318, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
Imagem 1: Nuvem de Palavras Representativa das Categorias de Trabalhadores e Profissionais nas Obras  
Portuárias do Rio de Janeiro (1904-1914).  
Fonte: Elaboração própria com base em BRASIL. Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas. Proposta e  
Relatório. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1905-1909; BRASIL. Ministério da Viação e Obras Públicas.  
Proposta e Relatório. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1910-1915.  
295  
O resultado desta elaboração é o que se vê na Imagem 1. Pedreiros e engenheiros foram  
citados em todos os relatórios, sendo que apenas os serventes de obras2, operários em metais e  
canteiros foram citados em mais da metade destes relatórios, e por isso aparecem coloridos.  
Todos as demais categorias foram citadas em, ao menos, um e até cinco relatórios, quanto maior  
o tamanho da fonte na imagem, em mais relatórios dada categoria foi citada. A variedade das  
categorias demonstra a sofisticação das obras e acabamentos. A historiografia pontua, devida e  
tradicionalmente, a ostensiva importância dos engenheiros nas obras públicas. No entanto, o  
que podemos ver é que trabalhadores como pedreiros, serventes de obras, canteiros e  
metalúrgicos são, sistematicamente, nublados em seu fazer laboral. Foram estes produtores  
diretos que destruíram/construíram o porto do Rio de Janeiro, no alvorecer do século XX.  
Optamos por focar nos operários da construção civil, indústrias e ofícios conexos por  
constituírem a maior parte dos contratados diretamente por C. H. Walker & C., outras empresas  
dedicadas à construção do porto e pela própria CFAOPRJ. A constituição de um mercado de  
trabalho já era uma realidade em construção na cidade do Rio de Janeiro. No início do recorte  
2 Esta categoria é a reunião das expressões análogas “servente de obras” e “servente de pedreiro”.  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
cronológico desta investigação, os operários da construção civil acumulavam-se, acima da  
média, residindo nas quatro freguesias portuárias por fator óbvio: a proximidade do principal  
mercado de trabalho em seu labor as obras do porto e as reformas urbanas. Evidentemente  
que essa situação pode ter sido atenuada após uma década de obras decorridas, mas certamente  
era um fato de peso no arranque daquele processo.  
Segundo o Recenseamento do Rio de Janeiro (1906), 7833 “operários em edificações”  
uma fração importante da força de trabalho naquelas obras residiam nas freguesias  
portuárias no princípio do processo de destruição/construção do porto, o que significava  
relevantes 24.6% frente ao total destes na cidade. Dentre as 25 freguesias urbanas e suburbanas  
da cidade, a Gamboa se destacava como a quarta maior concentração destes operários, Santa  
Rita era a sexta, Santana a décima primeira e São Cristóvão a décima segunda.  
Tabela 1: Operários em Edificações no Rio de Janeiro (1906).  
Operários da  
Brasileiros  
%
Estrangeiros  
%
TOTAL  
Construção Civil  
Rio de Janeiro  
Gamboa  
Santa Rita  
Santana  
São Cristóvão  
14810  
1490  
639  
448  
985  
46.6%  
37.2%  
30.8%  
26.1%  
59.2%  
16990  
1491  
1436  
1273  
681  
53.4%  
62.8%  
69.2%  
73.9%  
40.8%  
31800  
2371  
2075  
1721  
1666  
Fonte: RIO DE JANEIRO (cidade). Recenseamento do Rio de Janeiro (Districto Federal, 1906). Rio de Janeiro:  
296  
Officina de Estatística, 1907.  
Não chega a constituir um dado impressionante, mas 7826 destes operários em  
edificações nas freguesias portuárias eram homens, apenas 7 eram mulheres. Também não  
surpreende o grau de instrução naquelas freguesias. Dentre os homens com mais de 20 anos,  
eram analfabetos: 26.6% em Santa Rita, 33.6% em Santana, 35.6% na Gamboa, 26.5% em São  
Cristóvão. Um dado que impressiona é a proporção de estrangeiros dentre os operários em  
edificações nas freguesias portuárias. Conforme é possível observar na Tabela 1, estes  
operários eram majoritariamente estrangeiros sobretudo, portugueses e espanhóis na cidade  
e, especialmente, nas freguesias portuárias mais adensadas, em 1906. Não à toa, aquelas obras  
atraíam muitos estrangeiros.  
É fato que o governo não impôs padrões rígidos para as condições de trabalho e salariais  
dos operários contratados por C. H. Walker & C., muito menos o fazia através da execução via  
CFAOPRJ. No entanto, isto não deve levar a crer que a composição dos produtores diretos  
daquela obra era, majoritariamente, branca e europeia. Conhecedores da composição nacional  
dos residentes nas imediações das obras, o governo resolveu fazer uma única exigência quanto  
a contratação do pessoal técnico, administrativo e operário: no “Contracto Entre o Governo  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 282-318, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
Federal e C. H. Walker & Comp., Limited, com sede em Londres, para a execução das obras  
de melhoramento do porto do Rio de Janeiro” (Brasil, 1904, p. 538), segundo a cláusula LIII,  
dois terços dos contratados pelos empreiteiros ingleses deveriam ser brasileiros (Brasil, 1904,  
p. 550), mas não há nenhuma evidência quanto a fiscalização desse compromisso.  
Infelizmente, não nos é possível trabalhar com dados provenientes de informações  
censitárias a respeito da composição racial dos operários em edificações nas freguesias  
portuárias. Por força de designação abertamente eugenista, os censos de 1906 e 1920  
simplesmente não inquiriram os entrevistados sobre sua raça ou cor. Segundo Anjos (2013, p.  
110):  
Assim, mesmo no Censo de 1920, no qual o quesito racial não foi pesquisado,  
em seu texto de introdução é assinalado que o Brasil atingiria a pureza étnica  
através da miscigenação e da imigração europeia [...] o censo, uma publicação  
garantida pelo estado, endossava uma visão de sociedade e nação  
peculiarmente racista como “científica”.  
Consideramos como abertamente aceita pela historiografia a hipótese de que, no começo do  
século XX, as freguesias portuárias do Rio de Janeiro constituíam território marcadamente  
negro. Nas palavras de Roberto Moura (1995, p. 64):  
Achando progressivamente vagas no trabalho regular oferecido pela indústria,  
pela construção e pelo comércio, mas sempre em desvantagem com o  
concorrente branco, nacional ou estrangeiro, a presença do negro no Rio de  
Janeiro se tornaria tradicional no cais do porto. A maioria, entretanto, seria  
expelida para ocupações acessórias ou claramente marginais às órbitas oficiais  
do trabalho, aparecendo secundariamente, e sendo mobilizada em maior  
número em situações especiais, como nas obras da cidade, sempre servindo  
como um exército proletário de segunda linha que, manipulado pelos  
empresários, facilitaria a manutenção do baixo preço pela mão-de-obra.  
297  
A proporção de pessoas negras nas freguesias de Santa Rita, Santana, Gamboa e São  
Cristóvão é, mais recente e rigorosamente, vista como acima da média no computo geral da  
cidade, no início do século XX. No entanto, não deve ser exagerada, até para que entendamos  
plenamente a realidade social que os sujeitos negros encaravam (Honorato, 2016).  
De toda forma, associando as características socioprofissionais de operários da  
construção civil a sua elevada concentração habitacional nas freguesias portuárias, sendo estas  
com expressiva presença negra, presumivelmente, podemos indiciar em termos gerais aquilo  
que as amostras oferecidas por outras fontes comprovam pontualmente.  
Retornemos, então, ao ponto de reflexão sobre a magnitude daquelas obras e da força  
de trabalho que suscitavam. Obtivemos escassas referências quanto ao número de trabalhadores  
nas oficinas e canteiros das obras do porto, e é claro que as evidências são raras devido a relação  
capital-trabalho, a sofisticação, tamanho e relevância da própria construção do porto. A forma  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
contratual mais recorrente naquelas obras era a contratação de indivíduos ou turmas por jornada  
ou tarefa, os tão conhecidos “jornaleiros”. Exceção feita às oficinas de C. H. Walker & C., na  
Ponta da Areia, e um pequeno grupo de contratados de forma fixa pela CFAOPRJ como  
ajudantes de ordens e serviços de urgência (Brasil, 1904, dec. 5031), a maioria absoluta dos  
trabalhadores contratados para atuar nas diferentes frentes daquelas obras tinham vínculo frágil  
e efêmero, experiência penosa e remuneração incompatível com os elevados níveis de  
produtividade e o quão arriscado era seu trabalho (Benchimol, 1990, p. 231).  
Na cerimônia de início obras do porto, em 29 de março de 1904, cerca de 1.500  
operários compareceram à Praça Municipal e em embarcações nas imediações daquela orla,  
onde viram passar o presidente da República, representantes da C. H. Walker & C. e demais  
representações que participaram de cerimônia e banquete nos escritórios do edifício da  
Companhia Docas Nacionais. No entanto, apenas duas pequenas comissões foram recebidas  
pelas autoridades no interior do recinto. Mesmo assim, estavam sob a direta responsabilidade  
de engenheiros que os “ciceroneavam” e, assim, hipocritamente, eram tratados:  
Como uma nota muito feliz dessa deslumbrante festa, a mais bela a que temos  
assistido, damos abaixo a descripção do almoço aos operários, que, para dizer  
a verdade, eram os legítimos donos da extraordinária festa. [...]  
Os operários do canal eram representados por uma commissão de 25 homens,  
acompanhada dos Drs. Lucas Bicalho e Alfredo Niemeyer, engenheiros das  
obras que ali estão sendo feitas, e os da dragagem representados por uma  
commissão de 35 operarios, acompanhados do respectivo engenheiro,  
Adolpho Magalhães. [...]  
298  
Todos os trabalhadores traziam à lapela do casaco o distinctivo da empresa -  
um laço de fita azul e branco (O Malho, 02/04/1904, p. 19, grifos nossos).  
Perseveremos em temos quantitativos: um ano após o início das obras, por ocasião do  
movimento grevista que os atingiu, Joseph Walker responsável pela empreiteira inglesa no  
Brasil – declarava ter sob seu comando e trabalhando normalmente “dois mil e tantos operários”  
(A Notícia, 09/05/1905, p. 2); provocada por ofício de Francisco Bicalho, em 1908, C. H.  
Walker & C. declarava manter 1100 operários, diariamente, distribuídos da seguinte forma  
naquele momento: 150 nas oficinas da Ponta da Areia; 100 na plataforma de lançamento da Ilha  
de Santa Bárbara; 120 nas dragagens; 470 nas pedreiras, aterramentos e cais; e 260 na  
construção dos armazéns (Brasil, 1908). Essas três evidências históricas demonstram que  
Walker dispunha, ao mínimo, de mil a dois mil homens para as obras que executava.  
Entretanto, o quantitativo nos canteiros de Walker não basta. Fica patente que, embora  
aquele empreiteiro inglês tenha recebido o primeiro e mais abrangente contrato, não realizou  
exclusivamente, nem foi a única empresa a atuar na construção do porto. Do Balanço Contábil  
da CFAOPRJ, após dois anos e três meses de atividade, ao final de 1905, extraímos que aquela  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 282-318, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
repartição havia contratado enquanto “pessoal jornaleiro” e “pessoal provisório” cerca de 1200  
trabalhadores avulsos, contratados de forma rotativa e em volumes variáveis diretamente pelo  
poder público (Brasil, 1905).  
O orçamento da estrutura funcional da comissão previa 106 servidores como “pessoal  
do quadro” para administração e fiscalização das obras. Para efeito de comparação, todo o  
Ministério de Indústria, Viação e Obras Públicas, excetuando as empresas sob seu controle,  
contava com 207 servidores no ano anterior (Brasil, 1904), o que nos leva a crer que tamanho  
aparato de orçamento e pessoal era minimamente compatível com as projetadas funções que  
cabiam à comissão e demandavam centenas, senão mais de um milhar, de trabalhadores  
concomitante e diretamente contratados.  
Posto isso, não é exagero assegurar que, na maior parte de nosso recorte cronológico,  
as obras do porto do Rio de Janeiro dispuseram de trabalhadores na ordem dos milhares em  
diferentes frentes, comandadas por agentes de Estado e empresas privadas, direta ou  
indiretamente. A contratação de 1200 trabalhadores pela CFAOPRJ, ao longo de 27 meses,  
antecedendo, portanto, o início formal das obras, demonstra que as atividades preparatórias  
concernentes aos projetos e planos para destruição/construção do porto já podiam servir para  
estipulação da forma e composição das relações laborais dominantes nos futuros canteiros de  
obras. Também é indício do volume de braços requerido para as frentes de trabalho  
complementares às dos empreiteiros ingleses e promovidas diretamente ou contratadas junto a  
outros empreiteiros e fornecedores pela comissão.  
299  
Ante o já exposto sobre a superexploração da força de trabalho, façamos uma inflexão  
sobre a vigência da categoria no período aqui analisado. Segundo Luce, a superexploração pode  
ser encontrada quando a submissão do trabalho ante ao capital é agravada pelo cariz dependente  
de economias nacionais funcionalizadas em patamares rebaixados pelo centro do capitalismo  
mundial. Sistema este pensado nos termos de uma totalidade internamente desigual e em que  
as classes dominantes estrangeiras e nacionais, consorciadas no caso brasileiro submetem  
certos povos (pela força ou através de constrangimentos vários) ao jugo imperialista, com graus  
diferenciados de dominação e mediação, mas, via de regra, visando mantê-los dependentes e  
limitados no avanço das suas forças produtivas:  
Aforça de trabalho, na superexploração, além de estar submetida a exploração  
capitalista nas determinações mais gerais da Lei do Valor, está também,  
submetida às determinações específicas desta, sob as quais é agudizada sua  
tendência negativamente determinada, que atua de modo sistemático e  
estrutural sob as economias dependentes, provocando o desgaste prematuro  
da força de trabalho e/ou a reposição de seu desgaste de tal maneira em que a  
substância viva do valor não é restaurada em condições normais (isto é, nas  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
condições sociais dadas), ocorrendo o rebaixamento do seu valor (Luce, 2018,  
p. 155).  
Não é demais lembrar que o caso em tela é sobre a destruição/construção de um porto  
pago pelo fundo público com financiamento e seus altos encargos por um banco inglês que  
condicionou o empréstimo para realização da obra à contratação de uma empreiteira inglesa,  
sua cliente há muito tempo.  
Francisco de Oliveira nos lembra que essas manifestações não se esgotavam no  
ambiente de trabalho, ou apenas em seus desdobramentos necessariamente, mas se disseminam  
por toda as dimensões da vida dos trabalhadores. O sociólogo lembra do fenômeno das favelas  
e a autoconstrução, que demandava mais trabalho em tempo que deveria ser de descanso, como  
opção recorrente de habitação para classe trabalhadora (Oliveira, 2006, p. 39). Em artigo  
recente, Pereira (2023) historiciza a questão da ocupação do morro da Providência pelos  
trabalhadores com as piores condições de trabalho e vida residentes nas proximidades dos seus  
locais de trabalho, exatamente nas freguesias portuárias.  
Vejamos, então, como as obras do porto do Rio de Janeiro reproduziram as  
desigualdades sociais então estabelecidas, ao ponto da gravidade característica da categoria de  
superexploração do trabalho. Voltemos ao orçamento da estrutura funcional e ao Balanço  
Contábil da CFAOPRJ para depreender como as desigualdades estavam radicalmente expressas  
no funcionamento daquele órgão. A estrutura funcional decretada quando da constituição da  
comissão empenhava-se em pagar 696:440$000 em salários anuais para o “pessoal do quadro”.  
Para efeito de comparação, os servidores de todo MIVOP, excetuando as empresas sob seu  
controle, receberam 358:626$930 em 1903 (Brasil, 1904). A comissão não era apenas grande,  
seu corpo técnico deveria ser muito bem remunerado. Ao presidente da comissão, ao diretor  
técnico e ao diretor gerente estavam previstos, entre “ordenados” e “gratificações”, rendimentos  
base de 24:000$000 anuais; já aos serventes da secretaria, tesouraria, contabilidade e  
demolições estavam previstos salários de 1:440$000 anuais (Brasil, 1903).  
300  
Do Balanço Contábil da CFAOPRJ, após dois anos e três meses de atividade, ao final  
de 1905, a CFAOPRJ havia pagado 1.334:854$804 em salários do “pessoal do quadro”;  
enquanto o “pessoal jornaleiro” e o “pessoal provisório” receberam 3.705:064$086, o que nos  
faz concluir grave desproporcionalidade, pois haviam apenas 106 sujeitos no “pessoal do  
quadro”, já os jornaleiros e provisórios eram na ordem de mais de mil trabalhadores. Esses  
valores totalizavam o número realmente impressionante de 5.039:918$890 pagos em salários  
ao longo de 27 meses, um valor mensal médio de 186:663$662. Estas cifras eram inimagináveis  
para qualquer empresa privada de grande porte naquele momento. Estes valores significavam  
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Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
17.3% do despendido pela comissão. Os valores pagos em salários eram a segunda maior  
rubrica de despesas em seu balanço, destacando-se os valores recebidos por C. H. Walker & C.,  
que já alçavam 7.100:404$416 (Brasil, 1905).  
A primeira constatação a se fazer é que os salários nas obras do porto, nas avenidas, no  
canal do Mangue e nas demais reformas urbanas eram, via de regra, vistos como mais elevados  
que nos demais canteiros de obras da cidade. Segundo o semanário Os Annaes, com  
aproximadamente um ano de obras e serviços transcorridos, os empreiteiros ingleses  
reclamavam dos salários que pagavam aos operários (Os Annaes, 18/05/1905, p. 297). A base  
da argumentação de Walker residia na diferença de câmbio que, apreciado naquele momento  
face ao momento do ato de primeira contratação dos trabalhadores, valorizava os salários  
mesmo que mantidos em termos nominais.  
Com a inflação relativamente controlada nos primeiros anos das obras, os operários  
contratados por Walker, em 1904, tiveram módico ganho salarial mesmo sem reajuste nominal.  
O contrato entre o governo federal e os empreiteiros ingleses vigia recentemente e, nele, haviam  
algumas poucas restrições para admissões, manutenções e demissões de operários. No entanto,  
a associação entre a grande quantidade de trabalhadores necessários para consecução de suas  
atividades, a profusão de obras pela cidade e a própria organização de classe constrangiam  
momentaneamente o intento dos capitalistas ingleses, que era o seguinte: “Já tentaram reduzir  
os salários dos operarios, que não gozam de reducção nas suas despezas de moradia, de  
vestuario, e reagiram por meio de uma greve” (Os Annaes, 18/05/1905, p. 297-298).  
Os operários que a reportagem se refere eram canteiros trabalhadores que talhavam,  
moldavam e preparavam as pedras de cantaria para o cais nas oficinas da Ponta da Areia, em  
Niterói. Durante o primeiro ano de trabalho receberam de 6$000 a 8$000 pelo seu “jornal”, o  
que fazia variar o seu salário anual entre 1:200$000 e 2:400$000, dependendo das  
oportunidades de serviço e da negociação com o patrão. Walker, então, decidiu mudar a forma  
de cálculo do assalariamento desses operários, passando a oferecer um rendimento por  
produtividade: 7$000 por metro de pedras trabalhadas. Os operários exigiam 18$000 pela  
mesma tarefa, valor proporcionalmente compatível com o que já eram remunerados  
anteriormente naquelas oficinas. Ou seja, segundo a comissão de canteiros grevistas, na prática,  
os empreiteiros ingleses pleiteavam um rebaixamento em seus salários. O argumento do patrão  
era simples e perverso: a nova forma de remuneração e o valor proposto por tarefa era o que se  
praticava mais correntemente nas cidades do Rio de Janeiro e de Niterói. Em meio a esta queda  
de braço salarial, a Associação de Classe dos Operários em Pedreiras foi ao socorro dos  
301  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
grevistas e comunicou aos jornais que o “movimento paredista” naquelas oficinas havia se  
generalizado, contanto com mais de 300 operários mobilizados (Jornal do Brasil, 1905, p. 4).  
Para pôr os valores discutidos em perspectiva, perscrutemos o assalariamento mais geral  
de duas categorias profissionais que integravam grande parte da força de trabalho em que se  
baseou o processo que investigamos. Eulália Lobo nos apresenta o assalariamento nominal e  
anual de serventes de obras e pedreiros, entre 1900 e 1914, os quais compõe o Gráfico 1.  
As linhas no gráfico demonstram duas tendências distintas: os serventes de obras não  
parecem ter sido valorizados em termos nominais, mesmo com a grande oferta de trabalho  
acarretada pelas reformas urbanas e construção do porto; já os pedreiros, viveram uma  
valorização não só nominal, mas também real devido ao fato de que, em todo período, a  
inflação estava sob relativo controle e os preços variavam pouco, se mantendo abaixo do grande  
ascenso inflacionário nos últimos anos do século anterior até o momento de maior atividade  
construtora nos canteiros do porto e da expansão do mercado de trabalho na construção civil. É  
fato que a própria comissão pagava ligeiramente melhor que a média salarial, daí depreendemos  
que os salários praticados por Walker e outros empreiteiros menores eram os de “mercado”. Os  
salários dos pedreiros se enfraqueceram de acordo com que as obras terminavam e,  
especialmente, com o encerramento da CFAOPRJ. Segundo os levantamentos de Lobo, o  
salário nominal, médio e anual dos pedreiros decresceu em 47.8%, entre 1908 e 1914.  
No ano em que foi entregue o último armazém é possível notar uma excrescência: os  
serventes de obras receberam mais que os pedreiros, tendo o acréscimo relevante em seu salário  
nominal na série. Muito provavelmente, isso se deu porque, naquele momento, os trabalhos de  
reparos e manutenção de obras novas deveriam ser reforçados.  
302  
Gráfico 1: Salários Nominais Médios e Anuais de Serventes de Obras e Pedreiros no Rio de Janeiro (1900-1914)  
2500000  
2:244$219  
2000000  
1500000  
1000000  
500000  
0
1:169$997  
1900 1901 1902 1903 1904 1905 1906 1907 1908 1909 1910 1911 1912 1913 1914  
Servente de Obra  
Pedreiro  
Fonte: LOBO, Eulália. Historia do Rio de Janeiro: do Capital Comercial ao Capital Industrial e Financeiro.  
Rio de Janeiro: IBMEC, 1978, p. 804-805.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 282-318, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
O subemprego e ocupações de menor qualificação estavam na ordem do dia, o que tinha  
o significado de rebaixamento nas condições de vida. Portanto, “a competição individual no  
mercado de trabalho em termos de emergência de novos segmentos profissionais que se  
formam, em extratos interiorizados, aguça o preconceito de cor ou de “raça” (Moura, 2021, p.  
77). A digressão sobre a diferenciação salarial nos ajuda a ilustrar a dinâmica do mundo do  
trabalho no principal empreendimento do país, que se realizou em sua capital. O autor,  
inclusive, aponta que a ebulição de preconceitos raciais não se restringe aos negros, visto que  
eclodem sempre “que grupos profissionais, populacionais ou minorias nacionais procuram  
vender a sua força de trabalho por preço mais barato do que aquele pelo qual era comprado  
antes”, uma opressão que deve ser compreendida como “consequência e não causa da disputa  
do mercado de trabalho” (Moura, 2021).  
O fato é que houve notórios avanços nos projetos, nos planos, nas técnicas e tecnologias  
empregadas na destruição/construção do porto. A incorporação de conhecimento à engenharia  
nacional que a este processo foi inerente garantiu, em grande medida, grande parte dos ganhos  
de produtividade não só obtidos pontualmente, mas incorporados ao ramo da construção civil  
com essa experiência. A promessa de que a criação daquele porto era um resultado promissor  
para o fortalecimento da economia nacional era fortalecida com os avanços galgados com a  
própria obra. No entanto, tudo isto não foi o suficiente para que o assalariamento dos serventes  
melhorasse expressivamente e, ao final das contas, depois de algum ganho, as perdas no  
assalariamento dos pedreiros foram severas. A primeira manifestação da superexploração –  
pagamento da força de trabalho abaixo do seu valor está, aqui, evidenciada.  
303  
Este fato era agravado pelo desrespeito em forma de atraso salarial perpetrado por C. H.  
Walker & C. Foi possível levantar informações na seção Queixas do Povo do Jornal do Brasil  
que se referem a, no mínimo, quatro ocorrências (09/11/1905; 29/09/1909; 22/12/1909;  
29/12/1909) em que trabalhadores de distintas frentes de trabalho expressavam seu  
descontentamento por essa razão. O natal de 1909 foi perturbador para os empregados por  
Walker. Através de pedidos de publicação no jornal, apelavam pelo pagamento do seu salário  
de novembro, vencido há semanas, antes dos festejos de fim de ano (Jornal do Brasil, 1909, p.  
11). Ademais, esses sujeitos habitavam uma cidade em franco processo de monopolização e  
especulação imobiliária. Weid (2017) pontua que uma passagem de bonde das linhas da Rio  
Light poderia variar, de acordo com o trajeto e com a classe do assento, entre 100 e 500 réis. Já  
Carvalho demonstra como o peso da habitação se acentuou sugando os parcos rendimentos dos  
trabalhadores, especialmente a partir da administração municipal de Pereira Passos (Carvalho,  
1995).  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
A situação de fragilidade social e a pobreza patente dos trabalhadores das obras do porto  
provocaram uma resposta dos empreiteiros ingleses com o intuito de dirimir as consequências  
de tal situação social que afligiam seus canteiros, especialmente para manutenção de sua  
vitalidade física e capacidade de trabalho, mas também cumprindo o papel de combater os  
comportamentos ou práticas consideradas recrimináveis. Para tanto, associado a clérigos  
metodistas, Joseph Walker viabilizou financeiramente a fundação do Instituto Central do Povo  
(Brito, 2019).  
A segunda manifestação da superexploração o prolongamento da jornada de trabalho  
além dos limites normais fica muito evidente na supracitada greve dos operários canteiros das  
oficinas de Walker na Ponta Areia. Um dos grandes receios do governo federal era que as obras  
se alongassem e extrapolassem em muito os orçamentos determinados o que era muito comum  
em obras públicas naquele tempo e acabou se confirmando para o caso , especialmente por  
que os recursos financeiros para consecução das obras foram obtidos através de empréstimos  
tomados no exterior e por que o porto do Rio de Janeiro ainda era a principal aduana da  
República (Mantuano, 2022). De forma que a fiscalização do governo se propunha a incidir não  
só sobre ação dos empreiteiros ingleses, mas também diretamente sobre os funcionários de  
escritório e operários contratados por Walker. Pela cláusula XXII do contrato entre as partes, a  
CFAOPRJ tinha a prerrogativa de ordenar a dispensa de qualquer trabalhador, a qualquer  
momento. A causa de atrasos que mais atemorizava o governo e a empresa eram justamente as  
greves operárias, isso fica expresso no contrato pela cláusula LIII: caso as paralisações  
paredistas ocorressem, haveria suspensão automática dos prazos de parte a parte (Brasil, 1904,  
p. 538-553).  
304  
Como já vimos, em maio de 1905, trabalhadores brasileiros e estrangeiros, brancos e  
negros, cruzaram os braços contra as condições salariais e a imprevisibilidade da jornada de  
trabalho impostas pelos empreiteiros ingleses. Esses trabalhadores tiveram a oportunidade de  
forma mais desimpedida por serem contratados em regime perene e terem posição,  
relativamente aos jornaleiros, de maior força ante ao empregador. Assim noticiava um periódico  
carioca:  
Fomos os primeiros a noticiar a greve do pessoal de canteiros da Ponta da  
Areia, em Nicheroy, pessoal este pertencente às obras do porto. Deu origem a  
essa manifestação paredista o facto do sr. Walker, empreiteiro daquelle serviço  
não se sujeitar a exigencia que seus operarios lhe fizeram do augmento de  
salario e delimitação de horas de trabalho (A Notícia, 29/05/1905, p. 1, grifos  
nossos).  
O movimento grevista foi relatado pelo ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas  
como um estorvo para obras desprovido de legitimidade, da seguinte forma: “O serviço da  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 282-318, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
dragagem prosseguiu com regularidade durante o anno, tendo sido apenas interrompido, por  
alguns dias, no mez de junho, devido á coacção exercida por grevistas sobre o pessoal das  
dragas e batelões de transporte” (Brasil, 1906, p. 570).  
Imagem 2: Operários na Inauguração de um Armazém (1908).  
305  
Fonte: RIO DE JANEIRO (cidade). Série Fotografias. Coleção Augusto Malta. Operários em Inauguração de  
Armazém. Rio de Janeiro: Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, 1908 [circa].  
A fundação do Centro Internacional dos Pintores, em 1902; da Associação de Classe  
União dos Pedreiros, em 19033; da Sociedade de Carpinteiros e Artes Correlativas, em 1903;  
da Associação de Classe dos Operários em Pedreiras, em 19054; a interação e a participação  
destas na fundação da Federação das Associações de Classe, em 1905, (Batalha, 2009;  
Goldmacher, 2009) demonstram que o momento de radicais transformações vivido no Rio de  
Janeiro demandava uma resposta organizativa a altura por parte da classe trabalhadora, e isto  
fazia parte do seu próprio processo de formação.  
Na pose produzida por Augusto Malta5, dezenas de trabalhadores se aglomeram frente  
a um dos armazéns quando da sua inauguração. A Imagem 2 foi selecionada por privilegiar os  
3
Organização de caráter beneficente e de luta por melhoria nas condições salariais e de trabalho, especialmente  
na reivindicação por “colocação” de sócios em postos de trabalho e pelo disciplinamento das oito horas de trabalho  
diárias (Batalha, 2009, p. 183).  
4 Meses antes da renhida greve dos canteiros da oficina de C. H. Walker & C. na Ponta da Areia.  
5 Augusto Malta foi o primeiro fotógrafo da administração municipal do Rio de Janeiro, contratado pelo prefeito  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
reais construtores do porto, nela fica patente o elemento humano que dava vida àquelas obras e  
as relações raciais inerentes ali inerentes. Pouco importava ao autor os materiais para/de  
construção acumulados no pé da imagem, um telheiro improvisado à esquerda, ou o veículo  
sobre o qual os trabalhadores se acumulavam para deixar flagrar-se. Nesta imagem, Malta  
decidiu reunir os trabalhadores das obras do porto num plano geral em que o humano ganha  
relevância por seu acúmulo em volume apreciável cerca de cem pessoas e, muito  
provavelmente em contrapartida deste intento, os operários devem ter visto a oportunidade de  
exibir a bandeira da União dos Pedreiros, como é possível constatar no alto e à esquerda de  
quem visualiza a foto. Aproximada e detalhada, a fotografia demonstra uma maioria de negros  
posados para imagem produzida por Malta, o que reforça sua participação não só na esfera  
produtiva do empreendimento, mas também, supomos, na construção dos instrumentos de luta  
da classe trabalhadora ali conformada.  
A criação de organizações das categorias da classe trabalhadora era medida de proteção  
necessária ante ao quadro que expunha os trabalhadores a condições tais de intensidade no  
trabalho que lhes eram ofensivas a sua própria integridade física e elevavam o risco de vida  
naqueles canteiros de obras.  
A terceira manifestação da superexploração o aumento da intensidade do trabalho  
além dos limites normais pode ser vislumbrada a partir de informações tão simples quanto o  
registro factual de que a temperatura máxima registrada na cidade, em 1908, chegou a 37 graus  
celsius na sombra; e a umidade relativa do ar média, entre 1904 e 1911, era de 77% (Rio de  
Janeiro, 1914, p. 33-47). É possível especular que em canteiros de obras, oficinas e pedreiras a  
sensação térmica era ainda mais penosa para o exercício de atividades que necessitavam de  
intenso desempenho, com agilidade e grande força física. O quadro se mostra ainda mais grave  
quando nos deparamos com a informação que centenas deles residiam alojados em barracões  
em pleno canteiro de obras, na Ilha das Moças (Jornal do Brasil, 1906, p. 3).  
306  
O levantamento de informações em outras seções do Jornal do Brasil Desastre e  
Morte; Desastre; Suicídio; Santa Casa, Posto de Assistência Municipal, Afogados e Aggressões  
colaboram com o entendimento da dura, precária, tensa, arriscada e insalubre realidade dos  
trabalhadores das obras do porto. Nestas colunas do jornal que, reiteradamente, abria suas  
Francisco Pereira Passos para fotografar as reformas e obras de urbanização do Rio de Janeiro, iniciadas em 1903.  
Fotógrafo da municipalidade por mais de trinta anos (1903-1937), Malta atuava comprometido com projetos que  
privilegiavam o urbano em suas lentes, informando com suas imagens aquilo que os poderes federal e municipal  
queriam difundir a partir de sua visualização. As suas fotografias colaboravam com a imagem que estes poderes  
gostariam de construir da emergente metrópole brasileira - a segunda maior cidade do Hemisfério Sul -, procurando  
eternizar um Rio de Janeiro idealizado e em constante processo de “melhoramento” (Silva 2018). As imagens  
captadas por Malta, são pertencentes ao acervo do Arquivo Geral da da Cidade do Rio de Janeiro.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 282-318, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
páginas para denúncias a respeito daquelas obras, conseguimos identificar 59 casos de  
infortúnio, negligência e violência nas frentes de trabalho da destruição/construção do porto do  
Rio de Janeiro. A maioria dos casos (39) não tinham o local da ocorrência especificado,  
simplesmente sendo noticiado como acontecido nas “obras do porto”, mas alguns casos eram  
relatados em aparelhos flutuantes (5), caixões (4), andaimes (3), oficinas (3), pedreiras (3),  
embarcações (1) e trilhos (1). O gráfico a seguir demonstra a distribuição entre as motivações  
para as ocorrências relatadas nos 59 casos levantados, em que se pode aduzir as condições  
objetivas em que desempenhavam os trabalhos necessários para consecução das tão relevantes  
obras portuárias.  
Gráfico 2: Motivações para as Notícias Trágicas e/ou Violentas nas Obras do Porto (1904-1914).  
1
1
4
12  
23  
18  
Queda em Grande Altura no Sólido  
307  
Desabamento, Esmagamento, Choque, Atropelamento ou Impacto com Ferimento  
Queda na Água e/ou Afogamento  
Brigas e Agressões  
Mal súbito  
Suicídio  
Fonte: Elaboração própria com base em: Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, [vários números], 1904-1914.  
Estes 59 casos envolviam 71 homens diretamente atuantes nas obras do porto, dos quais  
67 podem ser apontados como operários ou trabalhadores. A maioria dos homens era  
categorizada genericamente (66), mas em alguns poucos casos (5) foram reconhecidos como  
pedreiros, pintor, guarda-freio e engenheiro. Destas 71 pessoas, a maioria não tinha  
nacionalidade expressa (36), mas 22 eram portugueses, 6 “nacionais” ou brasileiros, 5  
espanhóis e 2 italianos, o que confirma a relevante presença de estrangeiros naquelas obras. A  
média das idades declaradas era relativamente elevada, de 37 anos. No entanto, apenas 14  
desses sujeitos tiveram a cor suscitada: 8 pretos, 5 pardos e 1 branco. Estas informações nos  
impõem, novamente, a evidência da existência de negros naquelas obras portuárias e, ainda  
mais, nos obriga a ressaltar a prática da distinção racial quando havia a necessidade de assinalar  
eventos com consequências infelizes ou funestas.  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
Dos 71 sujeitos que constam nas notícias deste levantamento, 42 tiveram o registro do  
seu falecimento na própria nota do jornal. Conforme o caso de um trabalhador português que  
faleceu instantaneamente por uma queda em grande altura no sólido:  
DESASTRE E MORTE NAS OBRAS DO PORTO  
Trabalhador nas obras do porto, na ilha das Moças, Jose Francisco Joaquim,  
de nacionalidade portuguesa, 33 anos de edade, casado e morador à praia  
Formosa, foi hontem victima de um desastre que lhe resultou a morte. Estava  
elle em um dos grandes andaimes ali existentes, quando caiu de grande altura,  
morrendo instantaneamente. Pelo dr. Azevedo Amaral, médico das obras, foi  
constatada a morte do infeliz trabalhador, cujo cadáver foi transportado para  
a casa de sua residência (Jornal do Brasil, 07/05/1905, p. 6).  
O relatório apresentado por Lauro Muller sobre aquele ano lamentava a morte de um  
dos funcionários do quadro da CFAOPRJ, após ser “victima de uma queda”. Entretanto,  
colocava o óbito noticiado pelo Jornal do Brasil em meio ao quantitativo de “acidentes”  
ocorridos nas obras da C. H. Walker & C. naquele ano, mesmo sem registrar a consequência  
funesta de, ao menos, um destes:  
Os acidentes havidos nos trabalhos da empresa, durante o anno findo, foram  
em numero de quatro, sendo dous no aparelho n. 1 e dois no aparelho n. 2, e  
motivados por quedas de operários dentro ou fora da enseccadeira.  
A Commissão teve igualmente de registrar a dolorosa perda de um de seus  
auxiliares, o tenente Dr. Aristides Ferreira Bandeira, victima de uma queda na  
noite de 30 de novembro, de cujas concequencias veio a falecer a 3 de  
dezembro (Brasil, 1906, p. 577).  
308  
Para entendermos o caráter diverso da periculosidade a que estavam expostos os  
trabalhadores, optamos por reproduzir a chocante morte do brasileiro e pardo Antônio Mendes:  
“[...] na occasião em que trabalhava como guarda-freio em um comboio de aterro, cahiu no leito  
da linha de modo tão desastrado que foi colhido pelas rodas dos "wagons" ficando cortado ao  
meio” (Jornal do Brasil, 10/02/1909, p. 5, grifo nosso). As quedas na água aconteciam devido  
aos operários serem atingidos, arremessados ou terem se desequilibrado de flutuantes e  
embarcações, como se pode ver na Imagem 3. Na maior parte das vezes também redundavam  
em falecimentos, como no caso do português José Reis que se desequilibrou de uma chata e  
acabou por perecer afogado, mesmo com os esforços de seus companheiros para salvá-lo (Jornal  
do Brasil, 23/12/1907, p. 5).  
O trabalho de menores de idade na destruição/construção do porto do Rio de Janeiro é  
outra dimensão da realidade que as notícias nos revelam. O Correio da Manhã noticiou que as  
crianças brasileiras José Firmino e Durão foram às vias de fato, após acalorada discussão,  
enquanto laboravam na Ilha das Moças. Após luta corporal, “Durão desvencilhando a mão  
direita puxou de uma faca e cravou-a nas costellas, do lado esquerdo, de Firmino. Este baqueou  
exangue, e o aggressor evadiu-se” (Correio da Manhã, 08/08/1906, p. 3). No entanto, as brigas  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 282-318, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
e agressões mais comuns eram entre trabalhadores e seus chefes imediatos, como no caso de  
Ignácio que agrediu o encarregado José Augusto da Fonseca com uma pá (Jornal do Brasil,  
07/06/1908, p. 5).  
Trabalhar nas obras do porto era arriscado. Havia um certo reconhecimento das  
autoridades públicas a esse respeito. Em Niterói, o delegado de polícia Nascimento Silva  
resolveu interpelar Joseph Walker no sentido de “acautelar” a vida dos operários nas oficinas  
da Ponta Areia face aos “constantes desastres” lá ocorridos (Jornal do Brasil, 10/10/1906, p. 3).  
Imagem 3: Posição de uma Ensecadeira Quando Locada (1904-1911[?]) Recorte.  
309  
Fonte: RIO DE JANEIRO (estado). Coleção Fotográfica de Emygdio Ribeiro. Álbum das Obras do Porto do Rio  
de Janeiro (1913). Posição de uma enseccadeira quando locada. Localização: 025. Rio de Janeiro: Arquivo  
Público do Estado do Rio de Janeiro, 1904-1911[?].  
Emygdio Ribeiro6 procurava registrar a grandiosidade dos flutuantes enquanto  
componentes infraestruturais das obras no trabalho de construção do cais, mas, conforme é  
6
Emygdio Ribeiro era engenheiro de ofício, funcionário público na carreira pela Prefeitura do Distrito Federal  
desde a década de 1890, sendo cedido ao Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas, passou a exibir suas  
habilidades técnicas de fotógrafo em Niterói, por suas relações políticas, e isso passou a ser instrumentalizado em  
seu ofício de origem (Turazzi 2012). O compromisso das imagens produzidas por Ribeiro era com a engenharia, a  
posição técnico-política dos engenheiros no contexto republicano e os frutos de suas atividades. Esse compromisso  
pôde ser acentuado devido ao fato de que, em meio ao trabalho de fotógrafo da CFAOPRJ, ele se aposentou das  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
possível se constatar na Imagem 3, acabou flagrando as arriscadas posições em que os  
trabalhadores eram aglomerados e se deslocavam, na muralha e na própria ensecadeira. Além  
da precariedade de certos veículos e materiais empregados nas técnicas construtivas, é possível  
ver além do que o engenheiro-fotográfo gostaria de eternizar: os sujeitos brancos, em posição  
e vestimentas de autoridade ou mesmo os caracteristicamente operários, olham diretamente  
para câmera e posam para fotografia; já o trabalhador negro em uma embarcação mais próxima  
da ensecadeira sequer posiciona seu rosto de frente para câmera no momento da produção da  
imagem.  
A postura deste trabalhador negro é, minimamente, manifestação de quem não sabe ou  
não se importa com o registro fotográfico. Talvez o fizesse por ter questões mais graves para  
se preocupar. Para se ter uma ideia, apenas em 1908, o consultório médico das CFAOPRJ  
realizou 2695 curativos, 160 consultas e 50 visitas à domicílio (Brasil, 1909, p. 327).  
Hoje, é difundido que o trabalho em câmaras comprimidas acarreta diversos riscos à  
saúde de quem labora em tais condições, ainda mais se 1- a exigência física for grande; 2- se a  
calibragem da compressão for desmedidamente alta; 3- se as jornadas forem demasiadamente  
longas; 4- se não houver nenhuma proteção individual, especialmente a auricular, devido ao  
grande ruído das máquinas de ar comprimido; 5- se não houver a necessária descompressão em  
câmara específica e repouso (Hachich et al, 2008, p. 402). Toda extensão dos 3355 metros  
lineares de cais foi realizada pela técnica de caixão perdido a ar comprimido, dentro de onde os  
trabalhadores nivelavam, limpavam e terminavam de dessecar o leito submarino para que este  
recebesse os volumes de pedra e o concreto componentes da fundação.  
310  
Em nenhuma das fontes compulsadas percebe-se qualquer procedimento ou  
preocupação para preservação da saúde dos trabalhadores, não há qualquer menção ao pós-  
trabalho nos caixões mantidos a ar comprimido. Ao contrário, as jornadas escorchantes e  
imprevisíveis, as tarefas cada vez mais exigentes e arriscadas, e a premência de entregar a obra  
nos prazos contratados corroboram com a avaliação no sentido contrário.  
O ambiente de trabalho nas obras do porto pode ser caracterizado como insalubre por  
suas condições materiais, sendo agravadas pelas condições ambientais dos locais em que  
estavam instaladas. Um indício disto é a notícia que dá conta do falecimento de um trabalhador  
preto que não teve a identidade reconhecida e foi encontrado morto, às portas de um barracão  
das obras do porto. O homem aparentava ter 70 anos de idade, estava vestido e foi encontrado  
suas atividades na Prefeitura do Distrito Federal e, assim, pôde dedicar sua larga experiência como engenheiro e  
grande habilidade como fotógrafo exclusivamente às obras do porto do Rio de Janeiro.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 282-318, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
caído no chão, às 14 horas. Ao Jornal do Brasil, o inspetor daquela circunscrição especulava a  
causa da morte: “[...] não aparentava ferimentos nem contusões, parecendo tratar-se de um caso  
de insolação” (Jornal do Brasil, 11/12/1905, p. 2).  
As mortes nas obras do porto tornaram-se assunto corriqueiro e, como tudo que corria  
pelas ruas da cidade, acabaram tendo lugar na crônica de João do Rio.  
Imagem 4: Trecho de “Os Humildes”, Crônica de João do Rio (1909).  
311  
Fonte: RIO, João do. Cinematographo (Chronicas Cariocas). Porto: Lello & Irmão, 1909, p. 197.  
O nível rebaixado das condições em que determinado grupo social e/ou racial vende sua  
força trabalho, o que se configura em disputa no mercado contra outros agrupamentos nacionais  
e/ou raciais (minoritários ou não) é um aspecto já mencionado por Moura como parte da  
equação que redunda na difusão do preconceito de racial. Sendo este uma consequência e não  
a causa da disputa no mercado de trabalho. Portanto, agudizar os conflitos no mundo do  
trabalho, ainda que por ocupações laborais degradantes, possibilita uma pressão negativa no  
valor da força de trabalho. Logo, patrões e empresários dos diversos ramos se favoreciam com  
a opressão racial por poder remunerar de forma mais barata, exigir jornadas mais longas e mais  
intensas dos agrupamentos já oprimidos, o que aqui apontamos ser o caso dos trabalhadores  
negros.  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
Imagem 5: Trabalhadores em Frente as Campânulas no Interior de uma Ensecadeira Flutuante (1904-1911[?]).  
312  
Fonte: MINAS GERAIS (estado). Coleção Nelson Coelho de Senna. Operários no Interior de um Flutuante  
Usado na Construção do Cais do Porto da Cidade do Rio de Janeiro. Localização: NCS-137(42). Belo  
Horizonte: Arquivo Público Mineiro, 1904-1911[?].  
O descaso com as vestimentas, a inexistência de qualquer proteção individual, as  
arriscadas formas de trânsito e a própria constituição material precária das embarcações,  
flutuantes e canteiros de obras onde os trabalhadores laboravam, corroboram com a avaliação  
de que naqueles canteiros grassava a superexploração do trabalho. A Imagem 5 não foi  
selecionada para compor o Álbum das Obras do Porto do Rio de Janeiro (1913) (Turazzi,  
2012), mas é parte de uma coleção de cópias encontradas no acervo do deputado mineiro Nelson  
Coelho de Senna. A fotografia excluída do álbum que deveria ser eternizado mostra aquilo que  
sustentamos: trabalhadores negros posam ao lado da campânula que coroava o mecanismo a ar  
comprimido, alguns deles seguram ferramentas de trabalho; ao seu lado, todo de branco, de  
chapéu e sapatos, provavelmente um engenheiro da empreiteira executora ou da fiscalização  
governamental. Este avanço técnico era fundamental para realização da obra conforme  
projetada, mas contrasta com a precariedade das condições materiais de trabalho e,  
fundamentalmente, as condições pessoais em que os trabalhadores se apresentam na imagem.  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 282-318, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
A vulnerabilidade social destes trabalhadores era instrumentalizada para forma como se  
davam as relações de trabalho nas obras portuárias. É importante pontuar que as relações  
laborais eram tensas e problemáticas em todo processo de destruição/construção do porto, não  
apenas nas partes sob o comando de C. H. Walker & C. A própria condução pelos engenheiros  
da CFAOPRJ era questionada, como se vê na seguinte notícia:  
Os operários das Obras do Porto, destacados na secção da Avenida do Mangue,  
queixam-se de que lhes são infligidos máos tratos por um engenheiro das  
respectivas obras, sem que dêem motivos para tal procedimento. Dizem os  
reclamantes que quando não se submettem às desarazoadas ordens do  
engenheiro, são espancados e demitidos (Jornal do Brasil, 20/12/1909, p. 7,  
grifos nossos).  
Os episódios de abuso nas relações laborais se tornaram mais recorrentes e graves após  
alguns anos de obras decorridas. Quanto mais se avança no recorte cronológico, mais é possível  
se deparar com casos de conflitos comuns do cotidiano da construção civil que passaram a  
redundar em suspensões e demissões. Em 1909, Benedicto Medina foi levado ao extremo após  
desmoralização aberta e suspensão aplicada pelo seu superior por chegar ao trabalho  
embriagado. Ao chegar em casa, o trabalhador ingeriu grande quantidade de ácido fênico e foi  
encontrado morto por seus vizinhos (Jornal do Brasil, 17/07/1909, p. 6).  
A realidade é que os casos acima relatados demonstram um progressivo distanciamento  
dos produtores diretos dos resultados de seu trabalho. Conforme os primeiros metros de cais  
eram consolidados, tomava forma o porto do Rio de Janeiro e os operários que o construíram  
passaram a ser, gradativamente, afastados. Quanto menor era a demanda por trabalho naquelas  
obras, mais rígidos e abusivos eram os encarregados, bem como menores eram os salários.  
Munidos dessas informações, é possível avaliar a quarta manifestação da  
superexploração da força de trabalho: o distanciamento histórico moral do valor da força de  
trabalho daquilo que, efetivamente, os trabalhadores tinham acesso. É evidente que o  
funcionamento do porto construído por aqueles operários permitiria o Rio de Janeiro continuar  
a receber um sem-número de mercadorias a serem consumidas na cidade e/ou integrarem a  
produção e circulação de outros bens e serviços produzidos e instalados na capital. A promessa  
era que ao novo porto se garantiria capacidades superiores com aquela obra, ao ponto de  
(re)atrair o comércio e pessoas em novo, diversificado, adequado e revigorado fluxo. Os  
contornos da greve dos operários na Ponta da Areia demonstram que, ao menos uma parte deles,  
tinham consciência da envergadura do que participavam.  
313  
Prometeu-se àqueles operários não apenas o seu parco salário, mas que eles seriam “os  
legítimos donos da extraordinária festa” – nas palavras da reportagem de O Malho e que  
Gustavo Gonçalves Fagundes; Thiago Vinicius Mantuano da Fonseca  
aquela obra pública retornaria em melhores condições para vida de todos. Certamente que as  
coisas que passaram a frequentar aquele cais mudaram o senso comum na dimensão do  
consumo, inclusive na classe trabalhadora, introduzindo novos gostos e necessidades gerais.  
Deixamos um questionamento aos leitores: é possível asseverar que aqueles trabalhadores os  
“legítimos donos” – participaram dos louros obtidos com a construção do porto aquela  
“extraordinária festa”?  
Considerações finais  
Acreditamos que a reflexão contida nessas páginas possa avançar no destrinchar da  
história social do trabalho no Brasil, principalmente por dar rosto e voz aos trabalhadores que  
construíram a riqueza nacional. A ênfase dada aos trabalhadores negros ocorre justamente por  
estes serem, de forma recorrente, omitidos da trajetória de conformação da classe trabalhadora  
em nosso país. A opção por utilizar o porto do Rio tem relação direta com a relevância desse  
empreendimento, o detalhar documental, das imagens e dados nos ajudam a definir a presença  
marcante dos trabalhadores negros nessa iniciativa.  
Ressaltamos, tal qual exposto anteriormente, a participação efetiva desses sujeitos,  
homens e mulheres, no fazer-se da classe trabalhadora no Brasil. Um traço que se realiza não  
somente na venda da força de trabalho no pós-abolição ou no trabalho e presença massiva no  
aparato produtivo, mas principalmente pela experiência de classe acumulada e desenvolvida  
nas trajetórias de lutas e resistências. As greves e organizações operárias vinculadas às obras  
do porto não surgiram por mera espontaneidade ou uma iluminação mágica, a herança de classe  
foi responsável direta por impulsionar aqueles trabalhadores na defesa de melhores condições  
de vida e trabalho. Temos, assim, a constatação da população negra como protagonista dos  
enfrentamentos de classe.  
314  
Obviamente, os trabalhadores do porto não se restringiam aos negros. E essa diversidade  
de sujeitos é mencionada para abordar a complexidade da conformação da classe trabalhadora  
brasileira. Apontar este fato está longe de ser uma intenção de reduzir a potencialidade da sua  
participação ou retirar de cena a opressão racial. Pelo contrário, auxilia na demonstração de  
como a relação entre nacionais (brancos, negros e descendentes diversos) e estrangeiros  
(portugueses em sua maioria) foi corroída pelo racismo. O que se origina como disputa por  
espaço no mercado de trabalho, algo presente na sociabilidade capitalista, uma busca por  
melhores possibilidades para vender sua força de trabalho, passa a ser introjetada pela opressão  
racial. Uma ideologia de dominação que não fica isolada nos atos individuais, mas que se reflete  
Libertas, Juiz de Fora, v. 24, n. 1, p. 282-318, jan./jun. 2024. ISSN 1980-8518  
Quem construiu o "Caes do Porto"? As marcas das relações raciais e da superexploração  
em mecanismos de barragem social e em última instância no rebaixamento das condições de  
vida e trabalho.  
Buscamos aqui analisar a obra do porto e as relações entre seus trabalhadores em toda  
sua complexidade enquanto um laboratório do que viria se tornar o conjunto das relações  
laborais e raciais no Brasil. Conforme apontado na presente reflexão, um empreendimento  
dessa magnitude não ficou alheio à dinâmica de nossa formação econômica e social. Portanto,  
percebemos ali as marcas da dependência e de seu traço mais marcante: a superexploração da  
força de trabalho. E que dada a vigência estrutural do racismo em nossa sociedade, é por isso  
agudizada em um sentido negativo.  
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