João Paulo Galhardo Brun; Luiza Miranda Furtuoso
um ser que se relaciona com o gênero como se relaciona com o seu próprio
ser, ou consigo mesmo enquanto ser genérico. Sem dúvida o animal também
produz. Ele constrói um ninho, habitações, como a abelha, o castor, a formiga,
etc., só que unicamente produz o que necessita imediatamente para si ou para
os seus descendentes; produz unilateralmente, enquanto o homem produz de
modo universal, o animal só produz sob a coação da necessidade física
imediata, enquanto o homem produz também livre da necessidade física e só
produz verdadeiramente quando está livre dessa necessidade; o animal produz
somente a si mesmo, enquanto o homem reproduz toda a natureza; o produto
do animal pertence imediatamente ao seu corpo físico, enquanto o homem se
enfrenta livremente com o seu produto. O animal forma-se somente de acordo
com a medida e a necessidade da espécie a que pertence, enquanto o homem
sabe produzir segundo a medida de toda espécie, e sabe aplicar em todos os
casos a medida inerente ao objeto; o homem forma, portanto, de acordo com
as leis da beleza (Marx, 2010a, p. 113, grifos do autor, tradução nossa).
Contudo:
Na medida em que estranha o homem 1) da natureza, 2) de si mesmo, de sua
função ativa, de sua atividade vital, o trabalho estranhado também estranha o
homem do gênero, uma vez que, para o homem, a vida genérica se converte
em meio para a vida individual. Em primeiro lugar, estranha a vida genérica e
a vida individual e, em segundo lugar, converte a segunda, em sua abstração,
em um fim da primeira, também esta em sua forma abstrata e estranhada
(Marx, 2010a, p. 112, grifos do autor, tradução nossa).
Logo, é possível concluir que a única forma do sujeito se efetivar como um ser genérico
é exercendo sua atividade vital como atividade autorrealizadora, alcançando conscientemente
o desenvolvimento atingido pelo gênero humano. Dessa forma, evidencia-se a importância do
caráter econômico, concreto, material nas reivindicações da revolução proletária, já que é pelo
modo de produção que se engendra tais subjetividades estranhadas. Com isso, a noção de
emancipação humana ganha nova complexidade, na medida em que:
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Só quando o homem singular apreende a sua própria vida como um processo
que faz parte desse desenvolvimento do gênero, só quando ele, por essa via,
experimenta e busca realizar a sua própria conduta de vida, os
autocomprometimentos daí decorrentes, como pertencentes a esse contexto
dinâmico, só então ele terá alcançado uma ligação real e não mais muda com
a sua própria generidade. Só quando tiver a intenção de almejar ao menos
seriamente uma generidade desse tipo em sua própria vida o homem
conseguirá apropriar-se de sua própria elevação acima de seu ser-homem
meramente particular - pelo menos como obrigação perante si mesmo
(Lukács, 2013, p. 601).
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O resgate do problema da emancipação humana: atualidade e desafios
Resta agora saber se, quase 200 anos após esses escritos de Marx, a luta por
emancipação humana ganhou espaço nas reivindicações e no horizonte da classe trabalhadora,
ou se, ao contrário, a emancipação política tornou-se hegemônica no debate sobre a busca pela
Revista Libertas, Juiz de Fora, v. 23, n. 2, p. 375-388, jul./dez. 2023. ISSN 1980-8518