Patricia da Silva Coutinho
comuns, a moral, a ambição, a justiça e o progresso.
Os grupos ascendentes naturalmente se apressam a proclamar um justo
equilíbrio de poder e uma verdadeira harmonia de interesses, pois preferem
que seu domínio seja ininterrupto e pacífico. Por isso, os homens de grandes
negócios condenam os pequenos líderes trabalhistas como “perturbadores
da paz” e os consideram empecilhos aos interesses universais da colaboração
entre o capital e o trabalho. Da mesma forma, as nações privilegiadas
condenam as mais fracas em nome do internacionalismo, defendendo com
noções morais o que já foi conquistado pela força contra os que nada têm, e
que pretendendo mais tarde a ascensão ou a igualdade, só podem esperar uma
modificação do status quo pela força. A noção de que a mudança social se
processa por uma troca tolerante, pelas concessões e por uma rede de vetos de
um interesse equilibrado pelos vetos de outros supõe que tudo isso ocorre
dentro de uma estrutura mais ou menos estável, que não se modifica, que todas
as questões estão sujeitas a concessões, e são, portanto, naturalmente
harmoniosas, ou podem vir a ser. Aqueles que lucram pela estrutura geral do
status quo podem sustentar, com mais facilidade do que os descontentes,
opiniões como a mecânica da mudança social. (Mills, 1981, p. 297, grifo
nosso).
O autor declara que o poder do Congresso centraliza o controle da legislação, e que está
sujeito a modificações decisivas da administração. Neste sentido, alerta que outra forma de
exercício do poder através dos “políticos profissionais” é realizada dentro e entre as repartições
“mais ou menos burocráticas” da administração.
Cada vez mais, o político profissional procura conjugar-se com o
administrador que chefia um departamento, uma comissão ou uma repartição,
a fim de exercer o poder com ele, contra outros administradores e políticos,
frequentemente através de processos radicais. A distinção tradicional entre
“legislação” como elaboração de política, e “administração”, como sua
realização, desapareceu de ambos os lados. A participação que o político tem
na orientação do Estado moderno se faz menos pelo seu voto contra ou a favor
de uma lei do que pela sua participação num grupo que esteja em condições
de influenciar os postos de comando da administração executiva, ou pela não-
investigação de áreas sensíveis e do interesse de certos grupos. É como
membro desses grupos selecionados que o político profissional, representando
interesses variados, por vezes se torna importante para as decisões de
consequências nacionais. (Mills, 1981, p. 306-307).
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O “poder” estaria então subordinado à pequenos grupos dentro da burocracia do Estado
capitalista, e seus processos se realizariam mediante a relação e interação destes grupos, em que
o congresso é rendido por um sistema de “compensações e concessões”. “A imagem do poder
e da decisão é a imagem de uma sociedade equilibrada onde nenhum grupo é bastante forte para
avançar senão um pouco de cada vez, contrabalançado por outras forças e na qual, portanto,
não há unidade, e muito menos coordenação, entre os altos círculos” (Mills, 1981, p. 315).
Deste modo, o sociólogo relata a ideia de um “sistema de poder”, que infere a existência de
uma “sociedade equilibrada”, pois para Mills, os grandes interesses frequentemente “competem
menos entre si, no esforço de promover seus vários interesses, do que coincidem em muitos
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Revista Libertas, Juiz de Fora, v. 23, n. 2, p. 329-353, jul./dez. 2023. ISSN 1980-8518