DOI 10.34019/1980-8518.2023.v23.41397  
Entrevista: Esther Luíza de Souza Lemos*  
Entrevistadora: Carina Berta Moljo**  
Carina: Querida Esther, antes de mais nada, queríamos te agradecer por aceitar o  
convite da Revista Libertas para a nossa seção de entrevistas.  
Sem dúvida você é uma das jovens intelectuais e militantes do Serviço Social brasileiro  
que vem trabalhando de forma comprometida e crítica buscando a unidade do Serviço Social  
crítico, especialmente deste lado do continente.  
Como e quando começa a aproximação com o Serviço Social internacional?  
Esther: Agradeço imensamente o convite da Revista Libertas nesta seção que, de forma  
mais direta, registra a movimentação e o movimento de nossa categoria no tempo presente. A  
pergunta me fez voltar à memória do percurso vivido desde minha graduação e a escolha pela  
profissão realizada em 1989. Na minha experiência profissional, posso dizer que o marco  
central de aproximação com a temática foi a inserção na pós-graduação de nossa área, primeiro  
no mestrado da PUC-SP e depois no doutorado na UFRJ. O intercâmbio em nosso país realizado  
com colegas da Argentina, Uruguai, Colômbia, Costa Rica, Angola, Cabo Verde bem como o  
doutorado sanduiche realizado em Portugal, além da participação em eventos internacionais,  
permitiu interação e diálogo sobre as contradições da realidade, além do estudo conjunto.  
Durante o doutorado na UFRJ, em 2004 criamos o Grupo de Estudos da América Latina –  
GEAL, um grupo formado por doutorandxs de diferentes países morando no Rio de Janeiro,  
instigados por analisar e intervir a partir de Nuestra America. Foi uma experiência que abriu  
minha cabeça, olhos e ouvidos para sentir junto e entender, teórica e politicamente, nossa  
particularidade sócio-histórica e necessidade de superação das opressões, dominação e  
* Assistente social, com mestrado em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, doutorado  
em Serviço Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e pós-doutorado pela Universidade de Brasília. É  
professora efetiva da UNIOESTE. Tem como área de investigação os fundamentos do Serviço Social e o trabalho  
da/o assistente social particularmente na política de assistência social no âmbito da Seguridade Social brasileira.  
Participou como conselheira do Conselho Federal de Serviço Social - CFESS, na gestão 2011-2014 e na gestão  
2014-2017. Foi presidente da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social - ABEPSS (2019-  
2020). Atuou na Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da UNIOESTE - Campus de  
Toledo nos períodos de 2017-2019 e 2020-2023. Atualmente atua na Coordenação de Relações Internacionais da  
ABEPSS gestão 2023-2024.  
**  
Professora titular da Faculdade de Serviço Social - UFJF. Doutora em Serviço Social; bolsista produtividade  
CNPQ. Membro do Grupo de Pesquisa: Serviço Social, Movimentos Socais e Políticas Públicas - UFJF.  
Revista Libertas, Juiz de Fora, v.23, n.1, p. 252-257, jan./ jun. 2023. ISSN 1980-8518  
Coordenação de Relações Internacionais da ABEPSS gestão 2023 - 2024.  
exploração.  
Posteriormente quando participei como conselheira do CFESS, na gestão 2011-2014 na  
presidência de Sâmya Rodrigues Ramos e na gestão 2014-2017 na presidência de Maurílio  
Castro de Matos, assumi a coordenação da comissão de relações internacionais. Nesta instância  
organizativa de nossa categoria no país, a partir das deliberações dos Encontros Nacionais do  
Conjunto CFESS/CRESS, fórum máximo de deliberação da agenda político-profissional, tive  
a oportunidade de contribuir na execução das ações coletiva e democraticamente aprovadas.  
Entre estas destaco a organização do Workshop sobre a Definição de Serviço Social, realizado  
em 2012 na cidade do Rio de Janeiro.  
Representando o CFESS no Comitê Latinoamericano e Caribenho de Organizações  
Profissionais de Trabalho Social/Serviço Social – COLACATS, exerci a função de sua  
coordenação no período de 2014 a 2017, contribuindo para expansão da organização e  
representação política da categoria no nosso continente e nas instâncias mundiais.  
Carina: Considerando a sua participação em diferentes órgãos internacionais, como  
você vê hoje o Serviço Social internacional? Quais as perspectivas teóricas e políticas?  
Esther: A realidade mundial tem exigido uma dinamicidade maior no campo da  
organização política da categoria. Se por um lado as desigualdades de toda ordem têm se  
acirrado como fruto da crescente concentração e centralização da riqueza, tanto no interior dos  
países quanto entre países, por outro lado, nos últimos 10 anos tem ocorrido a expansão do  
número de organizações profissionais nacionais vinculados à Federação Internacional de  
Trabalhadores(as) Sociais – FITS, aglutinando a participação nas respectivas regiões do mundo.  
Em 2011 este número era aproximadamente 90 países, de acordo com site  
www.ifsw.org/regions/. Atualmente 138 países integram a FITS, sendo: 34 na África, 31 na  
Ásia e Pacífico, 50 na Europa, 21 na América Latina e 02 na América do Norte.  
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A profissão não é homogênea nem tampouco sua organização política. Os processos de  
democratização dos estados nacionais têm refletido em âmbito nacional e mundial, enfrentando  
o histórico conservadorismo e eurocentrismo presentes nos organismos internacionais. As  
disputas de projetos societários presentes na sociedade também se expressam de forma teórica  
e política nas organizações. Sendo espaços de cooperação internacional e de construção de  
consensos, as organizações têm protagonizado incidência nos organismos internacionais e  
também no interior das organizações nacionais para construir unidade em pautas comuns e  
principalmente para fortalecer a regulamentação da profissão num contexto crescente de  
desregulamentação e violações de direitos. Neste sentido, o fortalecimento da direção e  
concepção ético-política que orienta o Serviço Social brasileiro tem sido fonte de formação e  
Revista Libertas, Juiz de Fora, v.23, n.1, p. 252-257, jan./ jun. 2023. ISSN 1980-8518  
Entrevista com Esther Luíza de Souza Lemos  
contribuído para a sustentação teórica e política nos processos de tomada de decisão da luta  
neste âmbito.  
Duas dimensões podem expressar com mais precisão as perspectivas presentes no  
âmbito internacional: as propostas da agenda política das diferentes candidaturas para eleições  
à presidência da FITS e os diferentes conteúdos teórico-metodológicos dos trabalhos  
apresentados nos Congressos Mundiais. O que posso testemunhar é a luta das tendências  
progressistas, democráticas e críticas da e na profissão no âmbito internacional, necessitando  
persistente e permanente investimento no enfrentamento da grande onda neoconservadora.  
Carina: Você já participou de gestões do CFESS e da ABEPSS e atualmente está na  
coordenação de Relações Internacionais da ABEPSS, você poderia sinalizar os períodos chaves  
para a articulação do Serviço Social na América Latina?  
Esther: O divisor de águas da rearticulação internacional do Serviço Social numa  
perspectiva crítica naAmérica Latina e Caribe foi sem dúvidas o Movimento de Reconceituação  
(1965 – 1975), entre suas heranças, permitiu a consciência da necessidade de reversão da  
direção ético-política das organizações existentes e criação de novas onde estas eram  
inexistentes. É preciso considerar que este não foi um processo homogêneo, desdobrando-se  
em cada realidade nacional em diferentes graus de institucionalidade, auto sustentação e  
autonomia político-organizativa. A observação revela que o protagonismo das e dos assistentes  
sociais em coletivos nacionais organizados, com crescente consciência político-participativa,  
permitiu avançar em pautas comuns no âmbito das relações internacionais.  
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A partir da década de 1990, destaco dois processos que tem sido fecundos no  
fortalecimento político-organizativo numa perspectiva crítica: a criação do Comitê Mercosul  
de Organizações Profissionais de Trabalho Social/Serviço Social em 1995 com a participação  
da Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai e, posteriormente, a decisão de sua ampliação  
criando em 2013 o Comitê Latinoamericano e Caribenho de Organizações Profissionais de  
Trabalho Social/Serviço Social – COLACATS inicialmente com 12 países. Atualmente, além  
dos 5 países fundadores do Comitê Mercosul, o COLACATS é integrado pela Colômbia, Costa  
Rica, Cuba, México, Nicarágua, Peru, Porto Rico, República Dominicana, Uruguai, El  
Salvador, Granada e Panamá, agregando 17 países. Não é preciso estar filiado à FITS para  
participar do COLACATS, porém um dos objetivos do COLACATS tem sido incidir política e  
coletivamente nesta instância.  
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A distinção, e ao mesmo tempo, a unidade entre trabalho e formação profissional tem  
orientado a ação coletiva nos respectivos Comitês, propondo reuniões, ações e pronunciamentos  
conjuntos com a Associação Latinoamericana e Caribenha de Ensino e Pesquisa em Serviço  
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Coordenação de Relações Internacionais da ABEPSS gestão 2023 - 2024.  
Social – ALAEITS, refundada em 2006 com protagonismo da ABEPSS.  
Carina: Quais os resultados desta articulação?  
Esther: Além da participação de pesquisadorxs e profissionais brasileirxs em eventos  
internacionais, rede de pesquisas e pesquisadorxs, produções e intercâmbios, demarcaria alguns  
resultados concretos desta articulação que passa pelo protagonismo brasileiro no âmbito das  
relações internacionais, priorizando a articulação latino-americana e caribenha para então e  
conjuntamente incidir no âmbito mundial:  
1. Aprovação dos Princípios éticos y políticos para las Organizaciones Profesionales de Trabajo Social  
del Mercosur em 2000 na cidade de Montevideo, Uruguai, e posteriormente incorporação destes  
princípios  
no  
Estatuto  
do  
COLACATS  
em  
2013.  
Disponível  
em  
2. Realização da 19ª Conferência Mundial de Serviço Social no Brasil, de 16 a 19 de agosto de 2008  
em Salvador – BA, contendo a participação de 2.691 assistentes sociais de 42 diferentes países dos  
cinco continentes, desde sua criação foi a segunda vez realizada na América Latina. Informação  
3. Realização do Workshop sobre a Definição de Serviço Social realizado dias 08 e 09 de março de  
2012 na UERJ, Rio de Janeiro. Além do Brasil participaram as seguintes representações: Argentina,  
Chile, República Dominicana, Paraguai, Porto Rico e Uruguai, além da ALAEITS, ABEPSS,  
ENESSO bem como das instâncias mundiais da FITS e AIETS. Mais informações disponíveis em  
255  
4. Incorporação no Estatuto do COLACATS da Definição de Serviço Social aprovada no workshop  
de 2012 realizado no Rio de Janeiro, como referência para adesão dos países. Mais informações  
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5. Participação da profa. Marilda Iamamoto como conferencista da Conferência Mundial realizada  
em Melbourne, Austrália, em 2014 e apresentação da candidatura de Rodolfo Martinez (Uruguai)  
para  
presidência  
da  
FITS.  
Informações  
disponíveis  
em  
6. Realização do Seminário Nacional Serviço Social, Relações Fronteiriças e Fluxos Migratórios  
Internacionais, dias 6 e 7 de julho de 2016 na cidade de Belém – PA. Vídeos na íntegra e matéria  
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7. Premiação da profa. Marilda Iamamoto ao prêmio Katherine A. Kendall ofertado pela AIETS, em  
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2018  
na  
cidade  
de  
Dublin,  
Irlanda.  
Mais  
informações  
disponíveis  
em:  
8. Eleição de Silvana Martinez (Argentina) como presidente da FITS na Assembleia de 2018 realizada  
em Dublin, com apoio do Brasil, realizando mandato de 2018 a 2022. Outra representação latino-  
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Entrevista com Esther Luíza de Souza Lemos  
americana na gestão mundial foi a eleição de Victor Ivan Garcia-Toro (Porto Rico), atualmente na  
tesouraria da FITS. Desde 2020, a representação do Brasil passou a assumir a vice-presidência a  
FITS para América Latina e Caribe com a assistente social Tania Maria de Godoy Diniz, com  
mandato  
até  
2024.  
Mais  
informações  
disponíveis  
em  
9. Realização do Seminário Diálogos Internacionais “Arelação AIETS e ABEPSS”, no dia 13 de julho  
de 2022, com a presença das diretorias das duas entidades na UFPE, a realização de duas mesas  
com transmissão online por meio da TV ABEPSS. Informações disponíveis em  
10. Realização do Seminário Latinoamericano e Caribenho Povos Indígenas e Direitos Humanos  
realizado dias 14 e 15 de julho de 2022, em Brasília – DF, com a participação da FITS – América  
Latina  
e
Caribe  
e
ALAEITS. Vídeos na íntegra  
e
matéria disponível em  
11. Realização da Conferência Mundial de Serviço Social de 2024, dias 04 a 07 de abril, na cidade do  
Panamá – Panamá. Será a terceira vez que a América Latina e o Caribe receberão uma Conferência  
Mundial sendo espaço relevante de visibilidade e intercâmbio para a região. Mais informações  
256  
Carina: Quais os desafios que teremos pela frente?  
Esther: Temos muitos desafios pela frente, entre eles, destaco o fortalecimento conjunto  
das conquistas na regulamentação da profissão enfrentando a intensificação do processo de  
precarização das condições de trabalho e formação profissional, o enfrentamento da barreira da  
língua e a ampliação de financiamentos para pesquisas, participação e realização de eventos  
internacionais, intercâmbio, missões, mobilidade acadêmica, bem como, incidência nas  
agências de cooperação internacionais. Outro desafio importante, neste contexto regressivo e  
considerando nosso processo de colonização, é a construção de estratégias coletivas de atuação  
junto aos povos originários, entendendo a necessidade de se aprofundar no universo cultural,  
político e econômico dos povos indígenas, de forma que, possamos assumir em nossos espaços  
profissionais o compromisso com o enfrentamento contra extermínios, violações e expropriação  
de seus direitos. Nesse sentido, é fundamental incorporar a luta dos povos indígenas como uma  
das pautas centrais dos coletivos do Serviço Social em toda a América Latine e Caribe.  
Carina: Qual o papel que vem desenvolvendo a ABEPSS para consolidação desta  
articulação?  
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Esther: A ABEPSS vem desenvolvendo um papel de intensa cooperação e articulação  
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Coordenação de Relações Internacionais da ABEPSS gestão 2023 - 2024.  
com o conjunto CFESS/CRESS na agenda das relações internacionais, realizando e  
participando de eventos conjuntos, de comissões e fomentando a pesquisa que coloca o Serviço  
Social como objeto de estudo. Particularmente na atual gestão foi criada uma Comissão  
Temporária de Trabalho – CTT para propor a política de relações internacionais da entidade a  
ser aprovada pelaAssembleia Geral até 2024. Este documento objetiva contribuir com diretrizes  
estratégicas subsidiando ações futuras e registrando o acúmulo construído pela categoria.  
Outra dimensão atual de avanços no âmbito das relações internacionais da ABEPSS foi  
a eleição de Ramiro Dulchich (Brasil), na Assembleia de Montevideo realizada em 24 de  
novembro de 2022, para coordenação dos países que integram o Cone Sul na ALAEITS. No  
âmbito Associação Internacional de Escolas de Serviço Social – AIETS, a diretriz estratégica  
da ABEPSS tem sido o fortalecimento da articulação latino-americana e a partir desta, sua  
presença no âmbito mundial. O contexto de crise do capital agravado pela pós-pandemia tem  
colocado a necessidade de coletivização do debate das relações internacionais, particularmente  
na formação profissional em Serviço Social, buscando estratégias coletivas e orgânicas à  
entidade.  
Neste sentido, a atual gestão da ABEPSS, por meio da CTT, planejou realizar  
mapeamento sobre a política de relações internacionais das universidades públicas no país com  
o objetivo de identificar intercâmbios internacionais de pesquisas, pesquisadores, de redes de  
pesquisadores, estudantes e docentes da área, envolvendo graduação e pós-graduação, bem  
como, promover estudo e debate sobre o reconhecimento de diplomas e livre trânsito de  
profissionais com vistas a fomentar a cooperação internacional. A partir do conhecimento desta  
dimensão na área, objetiva-se propor e apresentar para deliberação da Assembleia Geral de  
2024, o documento que expresse a política de relações internacionais da ABEPSS. Estamos em  
processo e trabalhando para que o mesmo seja participativo e democrático, representando a  
diversidade de regiões do país, de naturezas institucionais e de protagonistas.  
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Carina: Gostaria de deixar alguma mensagem final  
Esther: Que as novas gerações avancem no fortalecimento do processo político-  
organizativo da classe trabalhadora e nesta, na particularidade de nossa profissão desde Nuestra  
America! A luta é feminista, antirracista, antilgbtqia+fóbica, anticapitalista e internacionalista!  
Como nos lembra Trotsky, “A vida é bela. Que as futuras gerações a livrem de todo mal, de  
toda opressão, e possam desfrutá-la em toda sua plenitude”. Sigamos balançando nossas  
bandeiras em punho na certeza de que nossa bússola e nosso norte, é o Sul!  
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