Juliano Zancanelo Rezende; Maria Lúcia Duriguetto
medida de proteção contra a repressão policial. Mas apesar das dificuldades de atuação política
nesse cenário de perseguição e repressão, a militância comunista permanecia ativa em
comunidades rurais e em bairros de diversas cidades pelo país. Na demonstração da presença
da militância comunista nos anos seguintes, lembramos da criação da Fundação Leão XIII, no
Rio de Janeiro, em 1947, por iniciativa da hierarquia católica, que objetivava enfrentar o que
consideravam como uma “esquerdização” das camadas subalternas, influenciadas pelos
comunistas. Inclusive, as ações dessa instituição socioassistencial eram norteadas pela
compreensão de que “era necessário subir o morro, antes que dele descessem os comunistas"
(O Estado de S. Paulo, 10/4/1960, p. 38, col. 4, supl. especial, apud Pinheiro, 2014, p. 145).
Portanto, o que se processou até o final do governo Dutra foi a inviabilidade de
radicalização política pelas forças democráticas e populares, o que se estendeu durante os
próximos governos até o final da década de 1950. Por mais que a década de 1950 contasse com
um significativo reaparecimento político do movimento operário10 em um cenário de repressão
e controle pelo Estado11, somente a partir de 1958 que as lutas sociais ganharam um novo fôlego
político diante a retomada expressiva dos movimentos sociais populares que canalizaram suas
ações principalmente em torno da educação popular.
De acordo com Skidmore (1982), no meio rural, principalmente na região nordeste do
país, viu-se uma nova eclosão das Ligas Camponesas e do sindicalismo rural sob o estímulo da
União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil (ULTAB), que havia sido criada no
ano de 1954 — e que, posteriormente, foi decisiva para a fundação da Confederação Nacional
dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), em 1963, como nos elucida Netto (2014). Sob
significativa direção dos comunistas, os movimentos de camponeses potencializaram suas
444
D
o
S
S
I
10 “Levantamentos de militantes da época dão conta de 173 greves em todo o país, já em 1951, e 264, em 1952.
Em destaque nesses anos, as lutas dos têxteis. Em Pernambuco e na Paraíba, em 1952; no Rio de Janeiro da virada
de 1952 para 1953; e em São Paulo em 1953 (em meio a uma greve que atingiu também metalúrgicos, gráficos,
marceneiros e pedreiros...), os têxteis, numericamente ainda a maior categoria do operariado industrial,
enfrentaram o patronato, as decisões contrárias da Justiça do Trabalho e a repressão violenta das autoridades
policiais. Entre esses movimentos, o de maior repercussão da conjuntura foi a chamada greve dos 300 mil em São
Paulo” (Mattos, 2009, p.87).
11
ê
Numa clara demonstração de anticomunismo, o governo de Juscelino Kubischek ordenou o fechamento de
organizações sindicais e populares sob influência dos comunistas: o Sindicato dos Trabalhadores Portuários, da
Liga de Emancipação Nacional, da “Federação de Mulheres, as Associações Femininas (originadas, em grande
parte, dos CPDs), a União dos Portuários, a Associação de Defesa dos Direitos do Homem e várias outras
entidades” (Imprensa Popular, 23/5/1957, p. 6 apud Pinheiro, 2014, p.57), como diversas sedes da União dos
Trabalhadores Favelados, no Rio de Janeiro, conforme Costa (2015). Segundo Pinheiro (2014, p. 55-57), em 1957,
a Escola do Povo, anteriormente fundada como Universidade do Povo pela ambiência dos CPDs e que resistiu à
onda repressiva do governo Dutra, foi fechada e alguns meses depois seu fechamento foi referendado por decreto
presidencial: “Em maio, o Procurador da República propôs a ação de dissolução da Escola do Povo, que no final
de fevereiro já havia sido arbitrariamente invadida e fechada pela polícia. O pretexto da ação centrou-se nas
ligações mantidas entre a Escola do Povo e o PCB, além de que seus professores estariam fichados no DOPS como
perigosos militantes comunistas. [...] Nos seus onze anos de existência, a Escola do Povo ofereceu diversos cursos
gratuitos a cerca de 10 mil pessoas, conforme seus fichários apreendidos pela polícia no ano de 1957”.
Revista Libertas, Juiz de Fora, v. 23, n. 2, p. 436-452, jul./dez. 2023. ISSN 1980-8518