Mortes Violentas Intencionais dos/as negros/as brasileiros/as: ensaios sobre seus determinantes
Além disso, é necessário destacar que há, mesmo no interior das corporações civis e
militares mortes de negros/as, porque 67,7% de todo o quantitativo de policiais assassinados
foi constituído por negros/as, majoritariamente, entre 30 e 55 anos, executantes de relações de
trabalho precarizadas: apenas 6% de policiais militares negros/as são efetivos/as, esse número
cai entre os/as civis para 3,35%, segundo o perfil nacional de instituições de segurança pública
(Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2021). Neste caso, é cabível presumir que o agente
policial negro/a não apenas contribui com o tipo de ocorrência que mais mata negros/as, pois
ele também convive com o risco relativo de se tornar mais uma estatística das MVI’s dos/as
negros/as, tanto dentro quanto fora do serviço, porque há a presença do risco eminente. Essa
realidade traduz, concretamente, a busca incessante da preservação do domínio demográfico do
poder a partir da diminuição quantitativa dos/as negros/as, porque o decaimento demográfico
de um segmento racial é a garantia da permanência do outro no poder, a frente das estruturas
regulatórias e de organização social, bem como, na ocupação de posições sociais de prestígio e
de vantagem.
É uma situação racial condimentada pelas relações capitalistas e racistas que criaram
na sociedade de classes barreiras raciais invisíveis que segregam e que limitam experiências
mútuas de correlação entre diferentes segmentos raciais, devido à conjuntura de clandestinidade
compulsoriamente vivida pelos/as negros/as e mantida pela impetuosidade da violência policial
sobre eles/as. Tendo em vista que a
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cor/raça da vítima é uma das variáveis determinantes da violência policial, e
o biótipo “negro” é o alvo predileto e, ao que tudo indica, de fácil identificação
pela polícia. Fica evidente que os negros e seus descendentes no Brasil são
assassinados pela polícia três vezes mais que os brancos, ou seja, se no plano
biológico, o da mistura racial, não é fácil saber quem é negro no Brasil, no
plano das relações raciais, ou sociológico, a identificação parece ser simples
e, na maioria das vezes, fatal para os negros. (OLIVEIRA, 2016, p. 50).
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Hoje, o apartheid moderno, infelizmente, é visto na relação entre a favela e seu
entorno, em que tais comunidades – historicamente ocupadas, em sua maioria, por negros/as,
que passaram a migrar para as periferias das cidades em habitações precárias após à Abolição
da escravidão brasileira – são palco de técnicas de policiamento extremistas, herdadas dos
períodos ditatoriais nacionais, e neste complexo panorama de relações entre favela e asfalto,
formado por relações desiguais e conflitantes entre moradores e policiais, que os tipos
experimentais de “segurança” ganham forma: uma segurança tipicamente letal e genocida
proposta pelo Estado e pelas instituições policiais para proteger as elites brancas e racistas de
negros/as e pobres. Em poucas palavras: um modelo de segurança voltado a eliminar a pobreza
e a raça majoritária a ela associada (OLIVEIRA, 2016).
Revista Libertas, Juiz de Fora, v. 23, n.1, p. 122-140, jan./jun. 2023. ISSN 1980-8518