DOI 10.34019/1980-8518.2021.v21.35253
Revista Libertas, Juiz de Fora, v. 21, n.2, p. 383-407, jul. / dez. 2021 ISSN 1980-8518
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Contrarreforma da educação superior:
aproximações ao balão de ensaio do período
pandêmico
Higher education counter-reform:
approaches to the trial balloon of the pandemic period
Eblin Joseph Farage*
Resumo: O presente artigo busca refletir sobre as
transformações em curso na educação superior
pública, considerando o projeto do capital para a
educação em articulação com as contrarreformas em
curso e as bases da extrema direita no Brasil. A partir
do materialismo histórico e dialético, faz revisão
bibliográfica e breve análise de documentos dos
organismos internacionais para a educação, o projeto
de reforma administrativa do governo federal (PEC
32/2020), a construção das bases conservadoras
ideológicas fundamentalista, miliciana e
militarizada que se expressam nas intervenções
nas Universidades federais. Contextualiza os
projetos em curso do PROMOVER Andifes e a
proposta do Reuni Digital do MEC como
experimentos para intensificar o balão de ensaio que
se tornou o período pandêmico, conformando as
bases para a contrarreforma da educação pública
superior.
Palavras-chave: contrarreformas; Universidade
pública; ensino remoto emergencial; pandemia.
Abstract: This article seeks to reflect on the ongoing
transformations in public higher education,
considering the capital project for education in
conjunction with the ongoing counter-reforms and
the bases of the far right in Brazil. Based on
historical and dialectical materialism, it makes a
bibliographical review and a brief analysis of
documents from international educational
organizations, the federal government's
administrative reform project (PEC 32/2020), the
construction of conservative ideological bases -
fundamentalist, militia and militarized - that express
themselves in the interventions at Federal
Universities, it contextualizes the ongoing
PROMOVER Andifes projects and the MEC's
Digital Reunion proposal, as experiments to
intensify the trial balloon that became the pandemic
period, shaping the bases for the counter-reform of
higher public education.
Keywords: counter-reforms; public university;
emergency remote teaching; pandemic.
Recebido em: 11/08/2021
Aprovado em: 29/09/2021
* Graduada em Serviço Social pela Universidade Federal Fluminense (1998), mestre pelo Programa de Pós
Graduação em Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (2006) e doutora em Serviço Social pelo
Programa de Pós Graduação da UERJ (2012). Professora Associada da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Pesquisadora nas áreas de Questão Urbana - com ênfase na temática de favelas e espaços populares-, Movimentos
Sociais Urbanos, Educação Superior e Educação Popular. Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre
Favelas e Espaços Populares - NEPFE.
Eblin Joseph Farage
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Seção
Introdução:
A pandemia do novo coronavírus (Sars-cov) responsável pela disseminação da Covid-
19 aprofundou e contribui para explicitar a crise orgânica do capital vivenciada, com
intensidades distintas, tanto nos países de capitalistas centrais como nos países de capitalismo
tardio, como o Brasil. A crise capitalista, com marco central na década de 1970 e suas cíclicas
crises, em especial a partir do início do século XXI, evidencia a lógica da produção capitalista,
pois, como afirmou Marx (2001, p. 728), “com a acumulação do capital, desenvolve-se o modo
de produção especificamente capitalista, e, com o modo de produção especificamente
capitalista, a acumulação do capital”, ou seja, ao mesmo tempo em que concentra e acumula
riqueza amplia o pauperismo.
É no movimento de acumulação e centralização capitalista, com vista a cada vez mais
ampliar as formas de expropriação da força de trabalho e ao mesmo tempo conjugar formas
distintas de exploração e usurpação, que vai sendo imposta uma sociabilidade em que “o
trabalhador existe para as necessidades de expansão dos valores existentes, em vez de a riqueza
material existir para as necessidades de desenvolvimento do trabalhador” (MARX, 2001, p.
724). Esse fundamento do desenvolvimento capitalista, amplamente estudado, teorizado e
refletido em suas múltiplas dimensões e combinações, evidencia-se no momento em que a crise
sanitária, imposta pela pandemia, explicita a atualidade das contradições capitalistas e a
inviabilidade de conciliar interesses demandados por classes sociais antagônicas.
A crise econômica em simbiose com a crise política, social, cultural, ambiental e do
mundo do trabalho desvela-se, de forma cristalina, no momento em que segmentos da burguesia
internacional e nacional, evidenciando a busca dos lucros em detrimento da vida humana,
agravam a situação pandêmica pela omissão ou pela prioridade política ao lucro em dissonância
com as necessidades da população pauperizada do mundo e as orientações sanitárias.
Na particularidade de países de capitalismo dependente, como o Brasil, com histórico
escravocrata e patriarcal, os efeitos da crise estrutural internacional são avassaladores. A
simbiose entre as diferentes dimensões da crise alia-se aos ciclos próprios da particularidade
brasileira, que passa pelos processos de ditaduras (governo de Getúlio Vargas, em especial de
1937-1945, e período da ditadura empresarial-militar de 1964-1985), pelo desenvolvimentismo
(de 1940 até 1964), pela redemocratização (marcadamente a partir do início dos anos 1980),
pelo projeto democrático popular (durante os governos do Partido dos Trabalhadores entre 2003
e 2016), até a ascensão da extrema direita. Ciclos marcados pelos eixos estruturantes do
colonialismo branco, heteronormativo, sexista e patriarcal do Brasil que se combinam ou são
incorporados pela dinâmica da sociabilidade capitalista e do desenvolvimento do projeto do
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capital em todas as dimensões da vida. Assim, a marca estruturante da política brasileira foi, e
ainda é, o projeto do capital, pautado em uma perspectiva de subserviência ao capital
internacional, de forma a manter o Brasil como um país de capitalismo tardio e dependente.
Segundo Fernandes, o “padrão de hegemonia burguesa anima uma racionalidade extremamente
conservadora, na qual prevalece o intento de proteger a ordem, a propriedade individual, a
iniciativa privada, a livre empresa e a associação dependente” (1975, p. 108).
Essa racionalidade burguesa espraia-se em todas as dimensões da vida e atinge, de forma
estruturante, a organização do Estado e as políticas públicas e sociais. Mesmo que tensionada
pelas disputas entre as classes e suas frações, o direcionamento da sociabilidade política, social,
econômica e cultural prevalece a partir dos interesses da hegemonia burguesa, da reverberação
do projeto internacional do capital no Brasil e de sua assimilação por suas frações nacionais.
Assim, marcas esporádicas de conquistas para a classe trabalhadora, são geralmente limitadas,
focalizadas, fragmentadas e paliativas, não se constituindo como conquistas estruturantes.
Nesses marcos buscamos, nesse artigo, trazer elementos reflexivos sobre os processos
simbióticos do projeto do capital para a educação superior pública, expressos nas determinações
dos organismos internacionais e na absorção das frações burguesas nacionais do projeto
mercantilizante da educação, que tem no ensino mediado por tecnologia um de seus eixos
estruturantes; na ascensão da extrema direita impondo retrocessos para a educação, como
evidenciado no projeto Escola sem Partido, na educação domiciliar (homeschooling), nas
intervenções do governo federal nas Universidades Federais e no projeto de contrarreforma
administrativa (PEC 32/2020) e seus possíveis impactos na educação superior pública, que se
caracterizam como elementos de uma profunda contrarreforma da educação superior que está
tendo no período pandêmico o seu balão de ensaio.
A contrarreforma administrativa e os impactos na educação superior
pública:
O projeto de contrarreforma administrativa proposto pelo governo federal em 03 de
setembro de 2020, qualificado no Congresso Nacional como o Projeto de Emenda
Constitucional 32 (PEC 32/2020), tem como eixo estruturante a refuncionalização do Estado
brasileiro em curso desde o início da implementação do projeto neoliberal no país na década de
1990. Em passos largos e de forma aligeirada, o projeto de reconfiguração do Estado, pautado
de forma mais enfática a partir do governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) com a
criação do então Ministério de Administração Federal e Reforma do Estado (MARE), buscou
incialmente, sob a justificativa de adotar um modelo administrativo gerencial em substituição
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ao modelo burocrático implantado com a redemocratização, a adaptação da estrutura estatal ao
modelo de desenvolvimento demandado pelo capitalismo.
O Plano Diretor de Reforma do Estado de 1995, gerenciado pelo então ministro da
administração Luiz Carlos Bresser Pereira, foi aprovado pelo Congresso Nacional em 21 de
setembro de 1995, tendo como eixos estruturantes uma nova forma de administração pública a
partir: i) do redimensionamento das ações diretas sobre a responsabilidade do Estado divididas
em “atividades exclusivas” e “serviços não exclusivos” (MARE, 1995); ii) da imposição de
uma nova lógica gerencial do funcionalismo público através da diferenciação entre as carreiras
típicas de Estado e os demais servidores públicos e iii) da mercantilização de determinadas
áreas, consideradas serviços e que deveriam estar ao dispor do mercado (como previdência e
educação) e não exclusivas do Estado (rumo à privatização de setores).
Os eixos estruturantes da reforma do Estado, que atingiriam em curto espaço de tempo
o conjunto das políticas públicas, entre elas a educação superior, tinham por referência as
diretrizes do Consenso de Washington de 1989, que propugnaram ao mundo, como alternativa
para tentar superar a crise do capital, um conjunto de regras econômicas pautadas no receituário
neoliberal, que podem ser assim resumidas: i) disciplina fiscal; ii) reorientação dos gastos
públicos; iii) reforma tributária; iv) liberalização financeira; v) taxas de câmbio unificadas; vi)
taxas de câmbio competitivas; vii) liberalização do comércio; viii) abertura para o
financiamento externo direto; ix) privatização e x) desregulamentação.
As diretrizes do projeto neoliberal expressos no Consenso de
Washington e no Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado, também
são identificadas nos documentos dos organismos internacionais como Banco
Mundial (BM), Fundo Monetário Internacional (FMI), Organização Mundial
do Comércio (OMC) e Organização para as Nações Unidas (UNESCO). As
diretrizes da educação superior para a América Latina estão explicitadas em
documentos como La enseñanza superior: las lecciones derivadas de la
experiência, produzido pelo Banco Mundial em 1994; o Relatório sobre o
Desenvolvimento Mundial O Estado num mundo em transformação, do
Banco Mundial de 1997; a Declaração Mundial sobre Educação Superior no
Século XXI: Visão e Ação, derivada da Conferência Mundial de Educação da
UNESCO de 1998; o Documento Serviços de Educação, lançado pela OMC
em 1998; o documento da UNESCO intitulado Educação superior: reforma,
mudança e internacionalização, produzido em 2003 e o documento Um ajuste
justo análise da eficiência e da equidade do gasto público no Brasil,
organizado pelo Banco Mundial em 2017, vale destacar, à pedido do governo
federal ainda em 2016.
Assim, podemos afirmar que as orientações do Banco Mundial induziram importantes
mudanças na educação superior brasileira através de profundas alterações na sua estrutura
jurídica e grandes incentivos ao crescimento do setor privado. Ressalte-se a direção privatista
e comprometida com as diretrizes do Banco Mundial, de documentos e projetos/programas
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como: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB, 1996), o Fundo de Financiamento
Estudantil (FIES, 1999), o Plano Nacional de Educação (PNE, 2001), o Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Superior (SINAES, 2004), o Programa Universidade para Todos
(PROUNI, 2005), o Projeto Universidade Aberta do Brasil (UAB, 2005), o Programa de Apoio
a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI, 2007), o Plano
Nacional de Educação (PNE, 2014), o Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação
(MLCT&I, 2016), a proposta do Future-se: institutos e universidades empreendedoras e
inovadoras (2019), e etc. (MELIM e MORAES, 2021, p. 204)
No que tange à educação superior os documentos são explícitos em indicar: o
empresariamento da educação; a mercadorização da educação; a ampliação do setor de
educação privada com incentivo estatal; o aligeiramento da Educação (redução dos currículos);
a certificação em larga escala (EAD, ensino privado...); as parcerias público-privadas; a
terceirização das atividades meio; e a educação como “serviço”, conforme expresso pela OMC.
Recentemente, junta-se a essas diretrizes o impulso para a refuncionalização do Estado
brasileiro explicitado nos documentos: Gestão de pessoas e folha de pagamentos no setor
público brasileiro - o que os dados dizem? Sumário Executivo e volume 2, produzidos pelo
Banco Mundial em 2019, e PEC 32/2020, dando a dimensão da intensidade do projeto do capital
no âmbito das políticas públicas e de seus impactos para a educação superior pública.
No Brasil a materialização das diretrizes do capital se deu com diferentes intensidades
nos distintos governos, ora mais diretas, ora mais diluídas, mas sempre com uma linha de
continuidade da política neoliberal que impactou a refuncionalização do Estado brasileiro e
incidiu sobre a política de educação. Estão no bojo dessa análise as distintas e contínuas
contrarreformas da previdência (iniciadas no governo Fernando Henrique Cardoso e também
realizadas nos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff), sinalizadas no Plano
Diretor de Reforma do Estado que considerava a reforma do Estado um “instrumento
indispensável para consolidar a estabilização e assegurar o crescimento sustentado da
economia” (BRASIL, 1995, p. 9). Estabilização que, segundo o documento, passava pela
reconstrução da “administração pública em bases modernas e racionais” (BRASIL, 1995, p.
10).
É importante destacar que a completa refuncionalização do Estado brasileiro não foi
possível na década de 1990 porque existiu uma forte insurgência de movimentos, entidades e
organizações políticas que, se opondo à política neoliberal, fizeram enfrentamentos para que o
governo não efetivasse as diretrizes do Plano Diretor. Ao mesmo tempo, a aposta nos governos
democráticos-populares do Partido dos Trabalhadores, em ascensão a partir de 2003, fragilizou
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a resistência e dividiu as entidades organizativas da classe trabalhadora, possibilitando o avanço
do projeto de refuncionalização do Estado, que passou par contrarreformas clássicas e não
clássicas. Além das contrarreformas clássicas, como foi o caso da previdência em 2003, no
primeiro governo Lula, passamos por contrarreformas não clássicas, como a criação da
Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal (FUNPRESP), no
governo de Dilma e a criação da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH).
Nos governos de Fernando Collor de Melo (1990-1992), Itamar Franco (1992-1995) e
Fernando Henrique Cardoso (1995-1998 e 1999-2002), a refuncionalização avançou de forma
clássica, com a privatização direta (venda de patrimônio público), a terceirização de serviços
públicos e a retirada de direitos do funcionalismo, em especial a partir da hierarquização entre
as categorias do serviço público. nos governos de conciliação de classe do PT, tanto com
Lula (2003-2006 e 2007-2010) como com Dilma (2011-2014 e 2015-2016), a refuncionalização
passou, de maneira mais intensa, por formas não clássicas, da qual são exemplos os fundos de
pensão e de previdência complementar, a criação de empresas públicas não estatais como a
EBSERH, a ampliação da terceirização no interior dos equipamentos públicos, a incorporação
das organizações sociais na gestão das políticas públicas e a desvalorização dos servidores
públicos pela não atualização dos planos de carreira e pela corrosão salarial diante da ausência
de reajustes reais.
Na educação superior a criação das fundações de direito privado, como única forma de
receber recursos extras do governo e como facilitadora das parcerias público-privadas, passa a
ser uma regra para as instituições de ensino públicas. Assim como a extinção de cargos do
funcionalismo que fez com que todo o setor de limpeza e segurança e parte dos servidores
técnico-administrativos passassem a ser terceirizados, em especial nas instituições federais de
ensino.
Mas passados mais de 25 anos do primeiro projeto sistematizado de refuncionalização
do Estado brasileiro, é possível identificar que nem tudo foi perda, uma vez que pontos centrais
como o fim da estabilidade e a cobrança de serviços públicos não se concretizaram. Elementos
que parecem estar no centro das recentes propostas de reconfiguração do Estado, como expresso
na PEC 32/2020 e nos documentos do Banco Mundial.
Em 2019, no documento que trata da gestão de pessoal no Brasil, o BM anunciava que
as despesas do governo brasileiro eram excessivas com o funcionalismo, chegando a “cerca de
10% do PIB com o pagamento de salários e vencimentos de servidores públicos ativos” (Banco
Mundial, 2019, p. 5) e a 15% se considerados os aposentados. Na mesma página o documento
afirma que “a relação entre o número de funcionários públicos e a população no Brasil (5,6%)
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é mais alta do que a média latino-americana (4,4%), mas inferior a países da OCDE (9,5%), por
exemplo” (ibdem). Como um dos objetivos é reduzir os concursos públicos e, assim, pouco a
pouco, ir diminuindo o funcionalismo público, o BM afirma que “é desnecessário a criação de
concursos para suprir uma demanda que poderia ser satisfeita com a realocação de servidores”
(BM, 2019, p. 6). Esses mesmos elementos aparecem como estruturantes da PEC 32/2020,
quando a proposta, a partir da criação de uma diferenciação entre as formas de acesso ao serviço
público, restringe a estabilidade apenas a alguns servidores.
Os servidores são considerados um ‘peso’ para o governo nas análises do BM e as
alternativas são diretas, pôr fim ao concurso público, reduzir salários e acabar com a
estabilidade e as carreiras.
O ingresso no serviço público ocorre apenas mediante concurso público para
o primeiro vel da carreira, com aquisição de estabilidade após a conclusão
de um período de estágio probatório. A principal característica dessa estrutura
de carreiras é a sua rigidez, que acaba por produzir um sistema muito regulado,
fragmentado e pouco orientado a resultados. (BM, 2019, p. 8)
A absorção dessas orientações é explícita na PEC 32/2020. O artigo 39A indica as quatro
modalidades de vínculo do setor público: i) por prazo determinado; ii) por prazo indeterminado;
iii) carreiras típicas de Estado; e iv) liderança e assessoramento, em sua maioria sem previsão
de estabilidade. Além do fim da estabilidade para maior parte do funcionalismo, exceção apenas
para os cargos típicos de Estado, outro elemento central para tentar esfacelar a organização
coletiva do funcionalismo público está explícito no parágrafo 2 do artigo 39A, que indica a
possibilidade de contratação por tempo determinado de trabalhadores para os casos de
“paralisação de atividades essenciais” (BRASIL, 2020, p.5). A combinação de fim da
estabilidade, diferenciação entre o funcionalismo com redução salarial e a ‘ameaça’ de
substituição em caso de paralisação de atividades, certamente serão incisivos na organização
sindical, em especial se consideramos que o avanço definitivo do processo de reorganização do
Estado brasileiro foi, em parte, barrado pelos movimentos organizados dos trabalhadores.
No caso da educação superior esses são elementos centrais de desestruturação por
dentro. Professores e técnicos-administrativos sem estabilidade, sob a tutela de chefias
imediatas, que segundo a PEC32 passam a ter a possibilidade de ser nomeados pelo poder
executivo sem a exigência de que sejam funcionários públicos e sob vínculos precários.
Condição que pode significar a plena desvalorização da carreira docente e da Universidade
pública referenciada no tripé ensino-pesquisa-extensão como previsto no artigo 207 da
Constituição Federal de 1988.
Segundo o Banco Mundial esse é o momento oportuno para a reforma administrativa no
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Brasil.
oportunidade para reformas que tenham impacto fiscal e de eficiência,
como resultado do elevado número de aposentadorias previstas para os
próximos anos. Projeções do Banco Mundial indicam que até 2022 cerca de
26% dos servidores terão se aposentado. Aliado ao alto número de servidores
sob abono permanência, isso possibilita a implementação de uma reforma
administrativa e de recursos humanos que gere ganhos de produtividade e que
tenha grande impacto fiscal. (BM, 2019, p. 09)
Políticas que reduzam o salário de entrada no serviço público têm potencial
de economia fiscal aliada a ganhos de eficiência na estrutura das carreiras.
Estima-se que reduzindo todos os salários iniciais a, no máximo, R$ 5.000,00
e aumentando o tempo necessário para se chegar ao fim de carreira, obtém-se
uma economia acumulada até 2030 de R$ 104 bilhões. Como alternativa,
reduzir os atuais salários iniciais em 10% geraria uma economia acumulada
de R$ 26,35 bilhões. (BM, 2019, p. 10)
A análise sobre a ‘oportunidade que a conjuntura propicia foi absolutamente absorvida
pelas frações nacionais da burguesia e seus representantes no governo. Como explicitado na
carta assinada pelo Ministro da Economia Paulo Guedes, que acompanha a proposta de PEC/32,
os estudos do BM são a base para a proposta de emenda a constituição.
Quanto ao segundo eixo considerado para a elaboração da medida, a
necessidade de aproximação do serviço público brasileiro à realidade do país,
estudo do Banco Mundial (Um Ajuste Justo: Análise da eficiência e equidade
do gasto público no Brasil), publicado em 2017, evidenciava que o gasto
público é engessado em categorias como folha de pagamento e previdência
social, deixando pouco espaço para despesas discricionárias e de
investimento. Mais recentemente, em outubro de 2019, novo estudo do mesmo
Banco (Gestão de Pessoas e Folha de Pagamentos no Setor Público Brasileiro:
o que os dados dizem), ao analisar dados sobre a folha de pagamentos do
Governo Federal e de seis Governos Estaduais, corroborou a existência de
uma série de distorções nos gastos com pessoal. (BRASIL, 2020, p. 17)
As investidas, de cunho econômico, do projeto do capital sob o conjunto dos serviços
públicos e em especial sobre a educação superior articulam-se com as investidas no campo
cultural e de valores, que a partir da ascensão da extrema direita no Brasil ganharam novos
contornos. Em um processo de sinonímia a pauta econômica articula-se com a pauta social e
cultural, compondo uma agenda de retrocessos para a civilidade que foi conquistada tão
duramente pela classe trabalhadora.
A educação pública superior além de ser impactada com as contrarreformas que
desestruturam as carreiras, reduzem salários e verbas para a educação pública, ainda sofre com
projetos conservadores que buscam destituir a educação de sua forma crítica e dialógica por
meio de uma simbiose entre pautas econômicas e culturais, as quais se retroalimentam em uma
perspectiva subalternizante e alienadora que estrutura o apassivamento de amplos segmentos
da classe trabalhadora.
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Seção
A ascensão da extrema-direita e o impulso ao conservadorismo e seus
rebatimentos nas Universidades públicas
Ao contrário do que propaga o presidente da república Jair Bolsonaro e a denominada
ala ideológica do governo, que inclui todos os ministros da educação deste período: Ricardo
Vélez Rodríguez (de janeiro a abril de 2019), Abraham Weintraub (de abril de 2019 até julho
de 2020), Carlos Roberto Decotelli (nomeado em 20 de junho não chegou a tomar posse por
denúncias sobre seu currículo) e Milton Ribeiro (desde julho de 2020), as Universidades
públicas estão longe de ser espaço de ‘comunistas’. A própria nomeação dos ministros
demonstra um certo grau de adesão de uma parte da comunidade acadêmica ao projeto
conservador, que os dois primeiros ministros foram docentes de instituições públicas de
ensino superior.
A adesão ao projeto conservador e as disputas entre projetos antagônicos de educação
marcam a constituição da educação pública superior brasileira, merecendo destaque, de um lado
o projeto do capital com aderência em parte da comunidade acadêmica que se pauta na educação
mercadoria e reivindica a parceria público-privada, a venda de serviços, a educação à distância
e a formação aligeirada. De outro lado, o projeto contra-hegemônico protagonizado por aqueles
que defendem uma educação pública, gratuita, laica, estatal e socialmente referenciada, que se
expressa na Proposta do ANDES-SN
1
para a Universidade Brasileira (ANDES-SN, 2013).
Assim, considerando que “a universidade é um importante patrimônio social e se
caracteriza pela universalidade na produção de conhecimento e pela transmissão da experiência
cultural e científica da sociedade, constituindo-se em uma instituição de interesse público”
(ANDES-SN, 2013, p. 17), o movimento docente, reunido no ANDES-SN, ao longo dos seus
40 anos de existência, construiu não a resistência ao desmonte da educação pública como
um projeto de Universidade que tem como referência a construção de bases para uma outra
sociabilidade.
Porém é necessário reconhecer que a luta em defesa de uma sociedade mais democrática
e da Universidade pública socialmente referenciada nas demandas da classe trabalhadora, não
eliminaram os traços autoritários, racistas e machistas que estruturaram a sociedade brasileira.
Seus resquícios são ainda visíveis e de alguma forma estão sendo novamente impulsionados a
1
O ANDES-SN é o Sindicato Nacional dos Docentes do Ensino Superior, fundado como associação docente em
1981, tornou-se Sindicato Nacional após a CF/88 quando o funcionalismo público conquistou o direito de se
organizar em sindicatos. Hoje o Sindicato representa os e as docentes das instituições públicas de ensino federal,
estadual e municipal e fez e faz parte das principais lutas democráticas do país. Em 2021 completou 40 anos de
existência com cerca de 80 mil docentes sindicalizados, se constituindo como um dos maiores sindicatos do ensino
superior da América Latina.
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partir da eleição de Jair Bolsonaro à presidência da república. O conservadorismo estruturante
da sociedade capitalista, a partir de 2018, demonstrou que estava escamoteado. Suas bases
autoritárias e fundamentalistas ganham novas roupagens a partir dos anos 2000, formando um
pilar de sustentação do projeto capitalista contemporâneo à política neoliberal, ao
fundamentalismo religioso e à militarização da sociedade (seja através das forças oficiais ou
das milícias
2
).
A política desenvolvida por Bolsonaro, se por um lado não produziu consenso entre os
estudiosos no que tange a sua caracterização, se como extrema-direita, neofascismo,
protofascismo, bonapartismo ou fascismo, por outro, produziu o consenso de que sua política,
em todas as dimensões da sociabilidade, é absolutamente regressiva e persuasiva. também
consenso que seu espraiamento no âmbito da sociedade tomou dimensões ideológicas
absolutamente preocupantes.
Para Löwy (2020, online):
O neofascismo não é a repetição do fascismo dos anos 1930: é um fenômeno
novo, com características do século XXI. Por exemplo, não toma a forma de
uma ditadura policial, respeita algumas formas democráticas: eleições,
pluralismo partidário, liberdade de imprensa, existência de um Parlamento,
etc. Naturalmente, trata, na medida do possível, de limitar ao máximo estas
liberdades democráticas, com medidas autoritárias e repressivas. Tampouco
se apoia em tropas de choque armadas, como o eram as SA alemãs ou
o fascio italiano.
Tomando novas formas e se espraiando pelas diferentes dimensões da vida, passamos a
vivenciar um conjunto de retrocessos que passam pela negação da ciência e desvalorização da
produção do conhecimento que impactam diretamente as Universidades públicas. Segundo
Löwy (2020, online) “outra característica própria ao neofascismo brasileiro é que, apesar de sua
retórica ultranacionalista e patrioteira, ele é completamente subordinado ao imperialismo
americano, do ponto de vista econômico, diplomático, político e militar”, o que se expressa,
entre outras tantas ações, na proposta do governo Bolsonaro para as Universidades brasileiras,
denominado FUTURE-SE.
O Programa Institutos e Universidades Empreendedoras e Inovadoras FUTURE-SE
foi apresentado no dia 16 de julho de 2019 para reitores das Universidades e Institutos Federais
e lançado, oficialmente, no dia 17 de julho em solenidade na sede Instituto Nacional de Estudos
e Pesquisas Anísio Teixeira (INEP), em Brasília. Mesmo sobre forte reação da comunidade
2
As milícias são grupos armados formados por ex-agentes das forças armadas, polícias, bombeiros e civis que
disputam o domínio de territórios periféricos, em especial no estado do Rio de Janeiro. Nos territórios periféricos,
em ‘troca’ de segurança’ para os moradores cobram propina e estabelecem regras para o convívio no território,
rivalizando com os grupos armados das facções que dominam o tráfico de drogas do varejo. Sua constituição
ultrapassou os territórios periféricos e ganhou espaço na política estadual e nacional.
Contrarreforma da educação superior: aproximações ao balão de ensaio do período pandêmico
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acadêmica e após passar por algumas alterações, o então ministro da Educação Wentrauib, um
ano após o lançamento oficial do programa, protocolou o projeto na Câmera Federal que passou
a tramitar em junho de 2020 como Projeto de Lei 3076/2020. O projeto, uma profunda proposta
de contrarreforma do ensino superior, traz todos os elementos indicados como necessários para
o processo de refuncionalização do Estado brasileiro defendido pelos organismos internacionais
para a área da educação, como já sinalizado neste artigo. O PL 3076/2020 tem por objetivo:
I - incentivar fontes privadas adicionais de financiamento para projetos e
programas de interesse de universidades e institutos federais; II - promover e
incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa, a capacitação científica e
tecnológica e a inovação, observadas as políticas nacionais de ciência,
tecnologia e inovação, e as prioridades temáticas definidas pelo Ministério da
Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações; III - fomentar a cultura
empreendedora em projetos e programas destinados ao ensino superior; IV -
estimular a internacionalização de universidades e institutos federais; e V -
aumentar as taxas de conclusão e os índices de empregabilidade dos egressos
de universidades e institutos federais. (BRASIL, 2020, p. 1)
Apesar de estar parado no Congresso Nacional, seus objetivos avançam pelo projeto de
Reforma Administrativa (PEC 32/2020), de forma ainda mais agravada, na medida em que além
dos princípios privatizantes e reestruturantes, prevê de forma explícita uma ingerência
conservadora nas áreas da educação e saúde, com a possibilidade de nomeação de militares da
ativa para atuação nessas áreas, segundo o parágrafo do artigo 142. Ou seja, ao executivo
será facultado nomear cargos e funções de assessoramento e chefias que podem ser militares da
ativa e estes também podem assumir, na forma estabelecida pela PEC 32, cargos na saúde e no
magistério, inclusive para a designada substituição temporária.
As imbricações do que Löwy (2020) denomina de neofascismo do governo Bolsonaro,
que aparenta democracia, vai se espraiando pelos caminhos da legalidade, através de tentativa
de contrarreformas em diversas áreas. O mesmo acontece com os projetos que tramitam no
Congresso Nacional sobre a educação domiciliar, o chamado homeschooling. Uma demanda
antiga da bancada evangélica, que poderia ter perdido força após o período da pandemia e o
contato real com as dificuldades de uma educação domiciliar, voltam a tramitar. O Projeto de
Lei 3262/2019, que descriminaliza a educação domiciliar livrando os pais de sofrerem sansão
legal por não enviar os filhos à escola, foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e
de Cidadania da Câmara em 06 de junho de 2021, devendo ir a plenário. Além desse PL,
também tramita na Câmara o PL 2401/2019, de autoria do Poder Executivo, apensado ao PL
4179/2012, que busca regulamentar a educação domiciliar no Brasil, com normas e diretrizes.
Esse tema tem sido considerado prioritário pelo executivo, uma vez que dialoga com sua base
fundamentalista e ideológica. Como afirmou a deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL-
Eblin Joseph Farage
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RS), “querem o direito de ensinar para os filhos que a terra é plana.
3
.
Outro projeto que perdeu a força de tramitação no Congresso Nacional foram os PL que
tratam do Escola sem Partido. Desde 2014 tramitam na Câmara mais de 23 projetos, que foram
sendo apensados, sendo o primeiro o PL 7180/2014 é o último o PL 80/2021
4
. Os inúmeros
projetos de lei buscam regulamentar a não utilização e até mesmo a criminalização do que o
Movimento Escola sem Partido (MESP) denomina ideologia de gênero na educação. Entre os
projetos apensados ao PL7180/2014 também existem propostas contrárias à chamada ideologia
de gênero, como é o caso do PL 6005/2016 do então deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), que
propõe o “Escola Livre”. O MESP foi fundado em 2003 pelo advogado Miguel Nagib,
responsável pela elaboração teórica que fundamenta a maior parte dos PL que tramitam hoje no
Congresso Nacional. Uma versão reformulada do projeto inicial de 2014 foi apresentada pela
deputada Bia Kicis (PSL-DF) em 2019 com o objetivo de facilitar a tramitação. Ao final de
2018 a bancada que apoiava os projetos Escola sem Partido não teve força política para colocar
em votação e ficou na expectativa de que com a composição do novo Congresso Nacional, que
assumiria em janeiro de 2019, fosse possível retomar o debate a partir do desarquivamento dos
projetos e de sua votação.
Independente de sua não aprovação na Câmara e de alteração na Lei de Diretrizes e
Bases da Educação de 1996, o movimento gerado em todo o país, com a tentativa de mudanças
em planos municipais e estaduais de educação para a inclusão da proibição da temática de
gênero nas escolas, assim como a produção de certo tensionamento entre famílias e comunidade
escolar e acadêmica, acabou por fazer com que a temática de gênero fosse tratada com mais
cuidado ou até mesmo ser excluída da formação diante da “áurea” de ameaça que se
estabeleceu. Assim, mesmo que não tenha sido aprovado e com a perspectiva de que o Supremo
Tribunal Federal (STF), pelas jurisprudências conquistadas, acabe por considerar o projeto
inconstitucional, a simples existência de propostas que propõem criminalização e punição de
professores que tratem da temática de gênero e afins provocou um retrocesso cultural.
É necessário compreender que a dimensão conservadora, que marca a sociabilidade e a
estruturação do capital, não sendo uma novidade contemporânea, deve ser compreendida no
bojo de seu avanço ou mesmo de sua retomada a partir de uma perspectiva de naturalização
social, que se pauta em fake news, medo e ódio. Os projetos de educação domiciliar e escola
3
Disponível em https://www.camara.leg.br/noticias/771015-ccj-aprova-projeto-que-permite-homeschooling.
Acesso: 04 de agosto de 2021.
4
Mais informações em https://novaescola.org.br/conteudo/15818/entenda-o-novo-projeto-do-escola-sem-partido-
que-tramita-na-camara . Acesso: 06 de agosto de 2021.
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sem partido são apenas uma das expressões desse momento.
Outra expressão do conservadorismo, que ascende junto com a extrema-direita de
características protofascistas, com o governo Bolsonaro, são as intervenções nas Universidades
federais. Recuperando uma prática da ditadura empresarial militar, o governo desrespeita as
comunidades acadêmicas no processo de escolha de seus gestores máximos (reitores e reitoras),
nomeando candidatos não eleitos, mas que são simpáticos ao seu projeto de governo. As
experiências de intervenção, que já ultrapassam mais de vinte instituições de ensino, devem ser
analisadas na combinação entre a verve autoritária do governo federal, sua perspectiva
anticiência e a adesão interna a esse projeto no interior das Universidades, evidenciando, mais
uma vez, que a educação superior pública está longe de ser um espaço homogêneo do projeto
emancipador.
As intervenções nas Universidades federais devem ser analisadas junto com outros
projetos, como o das Escolas Cívicos Militares/PECIM instituído pelo Decreto 10.004, de 5 de
setembro de 2019 pelo presidente Jair Bolsonaro. Mas também devem ser analisadas sobre os
resquícios da Ditadura empresarial-militar que deixou como legado traços autoritários que não
foram extintos e que, ao contrário, nesse momento estão sendo estimulados. Nossa curta história
de redemocratização conta com uma Lei de Anistia nº 6.683/1979, que foi uma das poucas do
mundo que ao mesmo tempo em que anistiou perseguidos políticos pela ditadura também
anistiou torturadores e assassinos do Estado. Essa realidade não foi resolvida e nem mesmo
evidenciada devidamente ao longo do processo democrático, iniciado a partir de 1985. Nem
mesmo a constituição da Comissão Nacional da Verdade
5
pela Lei 12.528/2011 conseguiu
reverberar as atrocidades da ditadura como devido. Seu trabalho, que foi instituído a partir
de 2012, foi encerrado logo em 2014, evidenciando a frágil democracia conquistada no país que
não é capaz nem mesmo de lidar de forma aberta com as atrocidades de sua história.
Outra evidência do padrão autoritário que marca a sociedade brasileira são as
comemorações militares a cada dia 31 de março. A data, que para os que condenam a prática da
ditadura é ‘descomemorada’, como anuncia o Grupo Tortura Nunca Mais-RJ, é lembrada pelos
militares como de exaltação. Para uns um golpe, para uma parte dos militares, que inclusive são
base de sustentação do governo Bolsonaro, uma tentativa de manter a ordem.
Entre tantas outras expressões do autoritarismo e do conservadorismo, vale citar
também a utilização da Garantia da Lei e da Ordem (GLO), prevista na CF/88, que permite,
apenas pela convocação do presidente da república, o uso das forças armadas em determinada
5
Mais informações disponível em: http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/institucional-acesso-informacao/a-
cnv.html . Acesso: 06 de agosto de 2021.
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situação de conflito. A GLO foi utilizada pelo governo federal da presidente Dilma Rousseff
para a realização da ocupação do conjunto de Favelas da Maré em 2014 e também pelo governo
Bolsonaro em 2019 para combater as queimadas na Amazônia. A GLO, resquício de uma
estrutura militar abusiva, permite que militares atuem com poder de polícia, o que também foi
utilizado nos megaeventos esportivos sediados no Brasil.
É na esteira dos caminhos tortuosos de disputa pela democracia que a sociedade
brasileira, marcada pelo autoritarismo, revive experiências ameaçadoras às esparsas liberdades
democráticas conquistadas. Em parte pelas contradições e pela fragilidade da organização dos
trabalhadores, explica-se a fragmentada reação às intervenções nas Universidades federais.
Como demonstra o quadro abaixo, mais de 23 instituições sofreram intervenção e apenas no
CEFET/RJ foi obtida uma vitória com a reversão da intervenção através de ação judicial, as
demais se mantêm com os nomeados pelo governo federal. Após a publicação deste quadro,
ainda sofreram intervenção federal a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e
a Universidade Federal Rural do Amazônia (UFRA), totalizando 25 Universidades com
intervenção, sem contar os Institutos Federais, que pela particularidade de sua legislação
reverteram as intervenções.
Quadro de intervenção nas instituições federais de ensino (2019/2021)
Instituição de ensino
Posição da instituição
Imposição do governo federal
Universidade Federal de Sergipe
(UFS)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Na eleição realizada no
Conselho Superior, o candidato
que ficou em primeiro lugar não
havia concorrido na consulta à
comunidade acadêmica.
O MEC dissolveu a gestão e nomeou
uma professora da própria instituição que
não havia concorrido na consulta pública
e nem no conselho superior.
Universidade da Integração
Internacional da Lusofonia Afro-
Brasileira (Unilab)
Desde que foi fundada, a
universidade não tinha estatuto
aprovado e por isso todos os
reitores eram indicados pela
presidência da República.
Recentemente a universidade
aprovou o estatuto e estão em
processo de discussão sobre o
formato da consulta pública.
Interventor nomeado pelo Governo
Federal.
Os governos anteriores também
indicaram reitores temporários por conta
da ausência de um estatuto na Unilab.
Universidade Federal do Vale do
São Francisco (Univasf)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
Interventor nomeado (pró-tempore) que
não concorreu na consulta pública e nem
na eleição no Conselho Superior.
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Seção
Instituto Federal do Rio Grande
do Norte (IFRN)
Eleição realizada junto à
comunidade acadêmica.
Pela legislação dos IF não há
lista tríplice. O nome mais
votado na eleição foi enviado ao
Governo Federal.
Foi nomeado um professor que não
concorreu na eleição.
No final de 2020, o reitor eleito ganhou
processo na justiça e tomou posse.
Universidade Federal da Grande
Dourados (UFGD)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
Nomeada professora interventora da
própria instituição que não concorreu na
consulta pública.
Centro Federal de Educação
Tecnológica Celso Suckow da
Fonseca (CEFET-RJ)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
Nomeado interventor, pró-tempore, de
fora da instituição.
Após as manifestações da comunidade
acadêmica e a saída do interventor de
fora da instituição, mais dois diretores
pró-tempore foram indicados, sendo
esses do CEFET.
Universidade Federal do Estado
do Rio de Janeiro (Unirio)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
O professor nomeado pelo MEC não
participou da consulta pública e se
candidatou no Conselho Universitário,
ficando em último lugar.
Universidade Federal do Espírito
Santo (UFES)
Consulta pública à comunidade
acadêmica com duas chapas
concorrendo.
Na eleição no Conselho
Universitário cinco chapas
concorreram.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
2º lugar na lista tríplice nomeado pelo
Governo Federal.
Universidade Federal do
Triângulo Mineiro (UFTM)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
A professora nomeada como reitora pró-
tempore não havia concorrido às eleições
e nomeou como vice-reitor pró-tempore
o candidato que havia ficado em 2º lugar
nas eleições.
Posteriormente, o segundo colocado foi
nomeado pelo Governo Federal.
Instituto Federal de Santa
Catarina (IFSC)
Eleição realizada junto à
comunidade acadêmica.
Pela legislação dos IF não há
lista tríplice. O nome mais
votado na eleição foi enviado ao
Governo Federal.
Nomeado professor pró-tempore que não
concorreu no processo eleitoral.
Universidade Federal de Itajubá
(Unifei)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
2º lugar na lista tríplice nomeado pelo
Governo Federal.
Universidade Federal do Sul e
Sudeste do Pará (Unifesspa)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
3º Lugar na lista tríplice nomeado pelo
Governo Federal.
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Seção
Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
3ºLugar na lista tríplice nomeado pelo
Governo Federal.
Universidade Federal da
Fronteira Sul (UFFS)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
3º Lugar na lista tríplice nomeado pelo
Governo Federal.
Universidade Federal do
Recôncavo da Bahia (UFRB)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
3º Lugar na lista tríplice nomeado pelo
Governo Federal.
Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia da Bahia
(IFBA)
Eleição realizada junto à
comunidade acadêmica.
Pela legislação dos IF não há
lista tríplice. O nome mais
votado na eleição foi enviado ao
Governo Federal.
O Governo Federal nomeou um professor
pró-tempore que não concorreu no
processo eleitoral.
A nomeação da reitora eleita demorou 11
meses para ser efetivada e só ocorreu
depois de ação judicial.
Universidade Federal do Ceará
(UFC)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
3º Lugar na lista tríplice nomeado
pelo Governo Federal.
Universidade Federal Rural do
Semi-Árido/RN (Ufersa)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
3º Lugar na lista tríplice nomeado pelo
Governo Federal.
Universidade Federal dos Vales
do Jequitinhonha e Mucuri/MG
(UFVJM)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
3º Lugar na lista tríplice nomeado pelo
Governo Federal.
Universidade Federal da Paraíba
(UFPB)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
3º Lugar na lista tríplice nomeado. O
referido professor não teve nenhum voto
no Conselho Universitário, mesmo assim
foi nomeado pelo Governo Federal.
Universidade Federal do Piauí
(UFPI)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
2º Lugar na lista tríplice nomeado pelo
Governo Federal.
Universidade Federal de Pelotas
(UFPel)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
2º Lugar na lista tríplice nomeado pelo
Governo Federal
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Seção
Universidade Federal de São
Carlos (UFSCar)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
O Governo Federal não nomeou o
professor mais votado.
Foi nomeada a professora que estava no
segundo lugar da lista tríplice.
Universidade Federal de
Campina Grande (UFCG)
Consulta pública à comunidade
acadêmica.
Lista tríplice enviada ao
Governo Federal.
O Governo Federal não nomeou o
professor mais votado.
Foi nomeado um professor que estava no
terceiro lugar da lista tríplice.
FONTE: Dossiê Militarização do governo Bolsonaro e intervenção nas instituições federais de ensino.
(ANDES-SN, 2021, p. 27-29)
Como afirma Löwy (2020, online), um dos aspectos específicos do autoritarismo de
Bolsonaro “é seu obscurantismo, o desprezo pela ciência, em aliança com seus apoiadores
incondicionais, os setores mais retrógrados do neopentecostalismo “evangélico”. Esta atitude,
digna do terraplanismo, não tem equivalente em outros regimes autoritários”. Aspecto que em
parte ajuda a analisar a forma como a educação pública superior é tratada por este governo.
Vale ressaltar que desde o início eram anunciados como inimigos número um do projeto
bolsonarista o funcionalismo público e a educação superior pública.
As intervenções nas Universidades federais são consideradas um desrespeito à
autonomia universitária indicada no artigo 207 da CF/88, que define que “as universidades
gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e
obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão” (Brasil,
CF/88), mas são também um resquício do entulho autoritário da ditadura-empresarial militar
que implantou em 1968 a lei federal 5.540, a qual institui a lista de nomes de candidatos a
reitores para o presidente da república faça sua escolha. Essa lei foi alterada pela primeira vez
em 1995, no governo FHC, que substituiu a previsão de lista sêxtupla para liste tríplice com a
lei federal 9.192, permanecendo o resquício da política intervencionista da ditadura empresarial
militar. Em 2008, no governo Lula, com a criação dos Institutos Federais (IF) através da lei
11.892, temos um avanço, com a eliminação da lista tríplice e com a consulta pública sendo
substituída por eleição para os gestores dos institutos. Como existe uma lei federal que
regulamenta a eleição dos gestores dos IF, a intervenção nessas instituições é ainda mais ilegal
e, por isso, na maior parte dos casos, vem sendo revertida na justiça, prevalecendo o desejo da
comunidade acadêmica na escolha de seu gestor. No caso das Universidades Federais e CEFET
a lista tríplice é legal, mesmo que não seja democrática, o que dificulta, o enfrentamento,
requerendo, do campo político, maior empenho no enfrentamento das intervenções.
Os elementos perdurantes de uma estrutura hierárquica e autoritária, que marcam a
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história brasileira e se entremeiam junto às conquistas de direitos após o período da
redemocratização do país, acabam por ser exacerbadas a partir da eleição de Bolsonaro. A
mescla entre estrutura social conservadora e incentivo a elementos neofascistas combinam-se
no governo de extrema direita e reverberam na educação pública superior como um retrocesso.
Por isso, um dos desafios é desvelar os projetos conservadores e mercantilizadores da educação
pública superior, que se aproveitam do período da pandemia, para um balão de ensaio de
retrocessos com a naturalização do ensino remoto emergencial (ERE).
O balão de ensaio do período pandêmico na educação superior: promover
Andifes e o Reuni digital:
O período pandêmico evidenciou um conjunto de desafios para a educação superior
pública. Algumas amplamente refletidas como a educação mediada por tecnologia, em sua
versão mais tradicional - o ensino à distância. Ao mesmo tempo traz novos desafios, uma vez
que a educação mediada por tecnologia passou a ser a única forma possível de manter, no
período da pandemia, ainda que de forma limitada, os processos de ensino-aprendizagem. Em
uma versão ainda mais precarizada, o ensino remoto emergencial (ERE), como denominado o
ensino desde março de 2020, impôs, de uma hora para a outra que docentes, técnicos-
administrativos e discentes adaptassem-se a uma forma de trabalho e estudo para a qual não
estavam preparados, não fizeram opção para tal e para a qual, na maior parte das realidades,
não receberam instruções ou apoio técnico e de infraestrutura.
Para uma parte da Universidade pública e para os que defendem o projeto
mercantilizador da educação, o ERE constitui-se como um balão de ensaio para demonstrar que
um outro modelo de educação superior pode ser hegemônico e até mesmo que ele é inevitável
diante da realidade e da conjuntura. Diante de sucessivos desinvestimentos na educação e na
ciência; de rebaixamento da demanda pela formação da força de trabalho para um mercado de
trabalho desregulamentado e cada vez mais flexibilizado e uberizado
6
; de mercantilização da
vida e dos direitos sociais, e em uma conjuntura que se proclama a desinformação e se reivindica
a despolitização como essência de uma sociedade apassivizada, a educação pública superior
passa a enfrentar uma nova quadra histórica de desafios.
Neste período de cerca de um ano e meio de pandemia, o ERE e seus efeitos e
6
Para ver sobre a flexibilização do mundo do trabalho no século XXI ler ANTUNES, Ricardo (org). Uberização,
trabalho digital e indústria 4.0. São Paulo: Editora Boitempo, 2020 e ANTUNES, Ricardo. O privilégio da servidão
– o novo proletariado de serviços na era digital. São Paulo: Editora Boitempo, 2018.
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consequências, tem sido amplamente discutido e refletido, como podemos verificar em Farage,
Costa e Silva (2021), Farage (2021), Melim e Moraes (2021) e em tantas outras produções. Para
efeitos dos limites desse artigo, pretende-se nessa parte, apenas elencar algumas experiências
que, avaliamos, são usadas para contribuir com o processo de legitimação do ensino à distância.
Ou seja, em experimentações que podem vir a forjar o sistema híbrido de ensino, reivindicado
pelo projeto do capital e pelas diretrizes do governo de extrema direita, entre outras coisas,
justificado pela economia de verbas, pela ampliação do acesso e pela hipotética preparação para
o mercado de trabalho mediado pelas tecnologias da informação e comunicação (TIC).
Em relação ao uso das TICs, na análise dos documentos da Unesco (1998;
1999) e do BM (2003), pudemos identificar a valorização pelo uso dos
recursos tecnológicos em quatro tendências: a primeira remete à premissa da
inevitabilidade do seu uso como meio para o processo de aprendizagem, de
modo a contribuir para a construção de novas formas de socialização e de
campos de educação não formal. Valoriza, dessa forma, outros espaços e
experiências vivenciadas por cada sujeito; a segunda tendência reporta-se à
promoção de maior igualdade de oportunidade entre os indivíduos e a
democratização do acesso ao saber; a terceira afirma a promoção de maior
autonomia dos indivíduos perante seu processo de aprendizagem ao melhor
assumir a gestão de seus conhecimentos, bem como do tempo destinado a esse
processo; a quarta se refere à ênfase na importância da utilização dos recursos
tecnológicos como forma de promover melhorias no âmbito das instituições
de ensino superior, desde aspectos administrativos e de gestão acadêmica até
a própria dimensão pedagógica do processo de ensino-aprendizagem.
(NEGREIROS, 2020, p. 174)
Assim, compreende-se que o período da pandemia possibilitou a aceleração de um
projeto de pelo menos duas décadas, que caminhava de forma mais lenta do que o demandado
pelo projeto do capital. Em não se constituindo como novidade, o ensino à distância e o uso das
tecnologias para a mediação dos processos de ensino-aprendizagem, e ao encontrar resistência
organizada do movimento dos profissionais da educação nos diversos níveis, a educação
mediada pelas TIC avançou, mas não como o capital demandava. O período da pandemia passa,
então, a ser o grande laboratório de ensaio de uma realidade que se pretende hegemônica para
o próximo período, qual seja, o ensino híbrido.
Nesse processo, a experimentação de uma modalidade de ensino antes nunca vivenciada
pela maior parte das instituições públicas, como os explicitados em projetos como o Promover
Andifes
7
e o Reuni Digital/MEC, são expressões da tendência à construção do ensino hibrido.
7
A Andifes é a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior que congrega os
reitores/as das Universidades Federais. Considerada com um espaço ‘progressista’ e ao mesmo tempo institucional,
dada sua vinculação com a estrutura estatal, em sua trajetória não se apresenta como organização de fortes
posicionamentos políticos, mas sim de uma certa adaptação ao instituído. O que pode ser demonstrado em sua
frágil movimentação no que se refere as intervenções e também sobre sua posição sobre o ensino à distância, as
parcerias públicos privadas e as contrarreformas como FUNPRESP e EBSERH, que foram de aceitação e não de
oposição. Para saber mais sobre a ANDIFES ver https://www.andifes.org.br/.
Eblin Joseph Farage
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Como uma explicita subsunção do processo de conhecimento às diretrizes do projeto do
capital, a Andifes lança em janeiro de 2021 uma edição piloto do projeto Promover – Programa
de mobilidade virtual em rede, com apenas quatro Universidades. Em sua segunda edição, no
mês de maio de 2021 o programa abrangeu doze Universidades e em sua terceira edição,
entre setembro e outubro deste ano, pretende abranger todas as Universidades federais que
desejarem, segundo entrevista
8
do então presidente da Andifes Edward Madureira reitor da
UFG.
O projeto foi inspirado no Programa de Mobilidade Acadêmica da Andifes, que existe
desde o início dos anos 2000 e que previa a inscrição de discentes em outras Universidades para
cursar disciplinas presenciais por até dois semestres consecutivos, tendo sua vaga garantida na
instituição de origem. Na versão Promover, o programa consiste em possibilitar a inscrição em
até três disciplinas em outras instituições de ensino na modalidade remota. Segundo Madureira
(2021), as possibilidades são infinitas para o Promover Andifes”, programa que “é um legado
dessa pandemia”, que esse cenário negativo nos obrigou a recorrermos a tecnologias que
existiam, mas que, de alguma forma, resistíamos a utilizar(entrevista, 02 de maio de 2021).
Assim, evidencia o que Negreiros afirma sobre a Universidade pública em seu processo
de reconfiguração acelerada diante das imposições das TIC como forma hegemônica do
processo de ensino-aprendizagem.
A função social da universidade como instituição voltada à produção e
disseminação de conhecimentos que buscam a apreensão e/ou resolução de
problemáticas, com vistas ao atendimento de necessidades sociais torna-se
cada vez mais subsumida aos interesses de reprodução do capital. Seu perfil
humanista clássico se torna anacrônico, pois a principal demanda a ela
requerida é o atendimento de interesses puramente econômicos em detrimento
de sua importância social. (NEGREIROS, 2020, p. 164)
Ao analisar, mesmo que de forma rápida a grade de disciplinas ofertadas no Programa
Promover da Andifes, que preencheu, em sua segunda versão 12.200 vagas, fica explicitado
que não há busca de novos saberes e nem mesmo trocas de experiências. Em sua maioria as
disciplinas ofertadas são as mais comuns e básicas das grades curriculares, com poucas
exceções. Desta experiência em curso, vale destacar como elementos para reflexão:
i) Como garantir nova experiência e trocas com a limitada forma tecnológica em que
o ERE está sendo realizado no conjunto das Universidades públicas, em sua maioria
reduzida a computador e plataformas limitadas de recursos?;
8
Entrevista com Edward Madureira em 02 de maio de 2021. Disponível em https://www.andifes.org.br/?p=87431.
Acesso: 08 de agosto de 2021.
Contrarreforma da educação superior: aproximações ao balão de ensaio do período pandêmico
Revista Libertas, Juiz de Fora, v. 21, n.2, p. 383-407, jul. / dez. 2021 ISSN 1980-8518
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ii) Como garantir troca de experiência se a maior parte das resoluções das
Universidades não tem sequer obrigatoriedade de câmeras abertas nas atividades
síncronas? Trocar experiência sem se ver e sem ter sequer a certeza de que o ‘outro’
está online?;
iii) Pode se caracterizar como auspicioso laboratório na redução de recursos e na não
realização de novos concursos públicos, uma vez que a demanda por docentes pode
ser suprida na parceria entre as Universidades e com a oferta virtual de determinados
componentes curriculares;
iv) A naturalização do ensino remoto como forma experimental e inovadora dos
processos educativos pode contribuir para o esvaziamento do tripé ensino-pesquisa-
extensão, uma vez que se limita, cada vez mais a educação ao ensino;
v) A mobilidade virtual pode servir como uma possibilidade de ‘fuga’ dos discentes de
disciplinas com maior reprovação em sua instituição, a partir da inscrição em outras
instituições de ensino;
vi) O conteúdo específico de algumas disciplinas, como por exemplo a educação de
jovens e adultos - EJA (ofertada no Programa), requer, além de conteúdos gerais,
considerar a particularidade de cada realidade. Desvincular teoria e prática pode
comprometer a perspectiva dialógica que deve ser inerente aos processos
pedagógicos.
Entre as diversas reflexões e questionamentos que essa experiência nos possibilita, faz-
se necessário afirmar que a mediação tecnológica pode sim ser uma experiência importante e
construtiva do processo de ensino e aprendizagem, assim como pode contribuir para a troca de
experiência e possibilidades de interação, porém, desde que seja absolutamente complementar
e subsidiária da modalidade presencial como forma hegemônica e principal. Não se trata de
negar a mediação tecnológica e nem mesmo de não reconhecer suas possibilidades, mas sim de
rejeitá-la, como um projeto político e uma nova estratégia pedagógica, como salienta Negreiros
(2020).
Portanto, podemos compreender que, atualmente, as modalidades de ensino a
distância e de ensino híbrido não estão articuladas somente à necessidade de
massificação do acesso ao ensino e à sua mercantilização. Elas estão sendo
impostas como uma nova estratégia pedagógica necessária à formação de um
novo perfil profissional (NEGREIROS, 2020, p. 275 - grifo original).
No mesmo caminho caracteriza-se o Projeto Reuni Digital, lançado pelo MEC em maio
de 2021 por meio da Secretaria de Educação Superior (SESU), com o objetivo de atender as
metas de acesso à educação superior previstas no Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-
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2024, mas especificamente na meta 12. A meta prevê a elevação da taxa bruta de matrícula para
50% e da taxa líquida em 33% entre estudantes de 18 a 24 anos. A minuta de projeto,
explicitando a profundidade da proposta na reestruturação da Universidade pública, afirma:
O principal desafio está em descobrir meios para que os profissionais da área
educacional, bem como técnico-acadêmicos, consigam compreender que a
EaD é fundamental para que o país consiga ofertar cursos de nível superior
com qualidade e que ela não seja apenas um formato desvinculado das ações
atuais das IFES, mas que faça parte do cotidiano destas instituições, atendendo
demandas locais e regionais, o que nos remete ao cumprimento das missões
em cada âmbito por meio de amplo diálogo entre as universidades e demais
setores da sociedade. (Minuta Reuni Digital, 2021, p. 10)
Como meta 1 do objetivo 1 do item ‘Gestão’, já se identifica a reestruturação que se
pretende para as Universidades públicas, com a criação de documentos que orientem a
“institucionalização” (ibidem p. 11) da educação à distância, a partir da criação de marcos
regulatórios, administrativos e conceituais. Como afirma o documento “sugere-se também um
estudo sobre não separar a EaD como modalidade a parte da Educação Superior” (ibidem), ou
seja, o que hoje ainda é algo apartado do ensino regular presencial público superior deve passar
a ser a norma, deve estar imbricada na estruturação da Universidade pública, passando a ser
“diretriz curricular comum nacional para cursos superiores” (ibidem), a partir da revogação do
decreto que estabelece a EaD como uma modalidade de educação. Deixar de ser ‘uma’
modalidade para ser o próprio modelo de educação.
Toda a proposta do Reuni Digital é uma absoluta descaracterização do que compreende-
se por educação pública de qualidade e está muito distante do que temos hoje em termos de
Universidades públicas presenciais. Entre as metas, merecem destaque a proposta de “elaborar
documento norteador para flexibilização e conteúdo mínimo do currículo” (Reuni Digital, 2021,
p. 12); “proposta de uma Universidade Federal Digital” (ibidem, p. 16); “estabelecer critérios
para a contratação e qualificação dos tutores relacionados às áreas do conhecimento e temas de
formação” (ibidem, p. 19) e estabelecer ações articuladas entre setores públicos e privados
(ibidem, p.25), entre tantas outras que articulam elementos presentes nos documentos dos
organismos internacionais e no projeto do FUTURE-SE e coadunam uma perspectiva
desestruturante da educação a partir da própria lógica de refuncionalização do Estado.
Entre os resultados esperados, chamam atenção, a indicação de “aumento da oferta de
vagas na ordem de 2.700.000 vagas, sendo 1.602.000 de vagas para estudantes de 18-24 anos”
(Reuni Digital, 2021, p. 18); “atingir o percentual no mínimo de 50% dos docentes das IFES
públicas participando de cursos/atividades a distância” (ibidem, p. 21); “adesão de 100% das
IFES ao chamamento para compartilhamento de laboratórios virtuais e remotos” (ibidem, p.
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34), ou seja, nos resultados esperados também se evidencia a perspectiva da educação
mercadoria, ensaiada de forma contundente no período da pandemia e que será demandada
como a alternativa diante dos cortes de verbas e de contrarreforma da educação superior.
A minuta do projeto materializa um conjunto de ações, que combinado às
contrarreformas realizadas com a PEC 32/2020 e as orientações dos organismos
internacionais, implicará um verdadeiro esvaziamento do modelo de Universidade pública que
temos hoje no Brasil. Substituindo professores por tutores, alterando os currículos das
licenciaturas para incluir a preparação para o ensino online, preparando os discentes de pós-
graduação para estágio em docência via online, entre tantas outras alterações. Busca-se a
destituição da educação crítica que acolhe os segmentos da população historicamente mais
pauperizados e periferizados na sociabilidade capitalista, invisibilizando negros e negras,
mulheres, lgbtqia+, pessoas com deficiência, quilombolas, indígenas, ribeirinhos e jovens das
periferias. Afinal, como afirmou o ministro da educação Milton Ribeiro, em entrevista no
programa Sem Censura no dia 09 de agosto de 2021, a Universidade pública deve ser para
poucos e o investimento deve ser na formação técnica para o mercado de trabalho.
É necessário considerar que o ERE foi um mal necessário em um momento de profunda
excepcionalidade, evidenciando a impossibilidade de transposição da educação presencial para
a remota, reafirmando que no presencial é possível construir as trincheiras de luta coletiva,
que podem e devem ser facilitadas pela mediação da tecnologia, mas sem sobrepor os sujeitos
sociais.
Considerações Finais:
A realidade de profunda crise explicitou-se na pandemia, revelando a relação simbiótica
entre projeto internacional do capital adesão nacional das frações da burguesia –,
mercantilização dos direitos sociais, acrescido, em nossa quadra histórica, da perspectiva
fundamentalista, anticiência, miliciana e militarizada que sustenta a extrema-direita no poder
no Brasil.
Nessa realidade, tornaram-se comuns discursos que criticam a hipotética politização das
forças armadas, da pandemia e da vacina, do Supremo Tribunal Federal, como se existissem
espaços na vida que o são direcionados/disputados por projetos políticos. Esse discurso,
fortemente repetido na grande imprensa, coaduna com a despolitização da sociedade e contribui
na difusão da ideologia que lê o mundo pelas lentes do senso comum. Reafirmar os espaços da
política como de disputas de sentidos e de sociabilidade é uma das tarefas centrais da educação.
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Política não é partido e provocar essa confusão é propício aos setores sociais que expandem a
cultura do medo, do ódio e da desinformação. Os que defendem o projeto do capital aprenderam
rápido essa chave e buscam de todas as formas conquistar corações e mentes para o projeto de
apassivamento da classe trabalhadora.
O poder da cultura é tão forte que constrói consensos e conformações, difundindo ideias
como a do empreendedorismo que leva os trabalhadores a pensarem que ser patrão de si mesmo
é melhor do que ter direitos trabalhistas, que não ter horário de trabalho é melhor que bater
ponto e que é possível ser livre na ordem do capital. Essa cultura, construída ideologicamente,
expandiu-se da mesma forma como se expande hoje a cultura da educação mediada pela
tecnologia. O projeto do capital para a educação é absorvido pelos que defendem a
mercantilização da educação e também por parte de setores que defendem a educação como
direito social, mas foram capturados pela lógica da inovação, do acesso ampliado, da
necessidade de modernização e de adaptação aos novos tempos. As Universidades públicas
estão cheias de bons exemplos do ‘sucesso’ do ERE, mesmo com sua precariedade, mesmo com
os exclusivos esforços e recursos de docentes e discentes, mesmo com a impossibilidade de
estabelecer uma relação dialógica e coletiva nos processos de ensino-aprendizagem.
Como dizia o poeta, “o pior analfabeto é o analfabeto político (...) Ele não sabe que o
custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio
dependem das decisões políticas” (poema O Analfabeto Político Bertold Brecht), daí nosso
desafio de politizar a vida para construir uma outra sociabilidade.
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