DOI 10.34019/1980-8518.2021.v21.33160
Revista Libertas, Juiz de Fora, v. 21, n.1, p. 180-200, jan. / jun. 2021 ISSN 1980-8518
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Crise urbana, desigualdades sociais e a
pandemia do novo coronavírus no Brasil
Urban crisis, social inequalities and the
new coronavirus pandemic no Brazil
Ivaneide Duarte de Freitas
*
Resumo: O artigo resgata alguns elementos
determinantes do processo sócio-histórico que
marcam o desenvolvimento das cidades no
Brasil. Com isso, busca analisar quais os
rebatimentos da crise urbana na vida da classe
trabalhadora no contexto atual da pandemia do
novo coronavírus. Trata-se de uma pesquisa de
abordagem qualitativa de revisão bibliográfica,
ancorada na perspectiva teórico-crítica da
realidade social que busca, a partir da
interlocução com autores/as que tratam sobre a
temática, contribuir com o debate sobre a
produção da segregação social e espacial no
território urbano, a luta de classes pelo direito à
cidade, e, os desafios emergentes da crise
capital-pandêmica. Conclui-se que o advento e
espraiamento do Sars-Cov-2 em terras
brasileiras agudizam e aprofundam as
desigualdades sociais já existentes em nosso
território, tornando-se urgente a necessidade de
organização política dos(as) trabalhadores(as)
na luta pelo direito à vida e pela construção de
uma nova ordem social.
Palavras-chaves: questão urbana; pandemia;
desigualdades sociais.
Abstract: The article retrieves some
determinant elements of the socio-historical
process that mark the development of cities in
Brazil, thus seeking to analyze the
repercussions of the urban crisis in the life of the
working class in the current context of the new
coronavirus pandemic. This is a research with a
qualitative approach to bibliographic review,
anchored in the theoretical-critical perspective
of social reality, which seeks, through dialogue
with authors who deal with the theme, to
contribute to the debate on the production of
social segregation and spatial in urban territory,
the class struggle for the right to the city and the
challenges emerging from the capital-pandemic
crisis. It is concluded that the advent and spread
of Sars-Cov-2 in Brazilian lands aggravate and
deepen the social inequalities that already exist
in our territory, making the urgent need for
political organization of workers in the struggle
for the right to life and for the construction of a
new social order.
Keywords: urban question; pandemic; social
differences.
Recebido em: 07/01/2021
Aprovado em: 30/03/2021
*
Assistente Social Centro de Referência em Assistência Social CRAS/Parnamirim/RN; graduada em Serviço
Social (Estácio Ponta Negra); especialista em Políticas Sociais Integradas (Estácio); mestranda em Serviço Social
pelo PPGSS/UFRN
Crise urbana, desigualdades sociais e a pandemia do novo coronavírus no Brasil
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Introdução
A produção e reprodução das cidades se constitui como elemento histórico da expansão
do capital na sociedade capitalista. O suposto progresso das cidades no Brasil e no mundo revela
a marca de um sistema de produção excludente, que por sua natureza aglutina elementos de um
desenvolvimento desigual e combinado. Se por um lado a construção de grandes metrópoles
forjaram espos de lazer, produção e consumo, por outro lado, também geram um processo de
despossessão (HARVEY, 2012) que excluiu desses espaços a grande massa de trabalhadores e
trabalhadoras.
Na cada de 1980 os movimentos sociais e as organizações da sociedade civil
conquistaram juridicamente direitos inéditos na história do país, os quais se expressam na
constituição de 1988. Apesar da promessa legítima de efetivação da função social da terra na
carta constitucional e das conquistas posteriores no Estatuto das Cidades e em outros
mecanismos legais, o que se percebe é que uma luta constante e desigual para a efetivação
do direito à cidade. Sem desconsiderar os avanços jurídicos, na prática a classe trabalhadora
tem sofrido sucessivas derrotas que se manifestam no contínuo crescimento das áreas
irregulares e ilegais que formam as periferias, bem como na segregação socioespacial das
cidades, o que nos revela que os direitos constitucionais ainda carecem de efetivação.
Como bem afirmou Harvey (2012: 73) “vivemos num mundo onde os direitos de
propriedade privada e a taxa de lucro se sobrepõem a todas as outras noções de direito”. Desse
modo, na sociedade capitalista as necessidades humanas de imensos contingentes que vivem
nas periferias urbanas, sem emprego e sem meios de sobrevivência são essencialmente
relegadas a um segundo plano, priorizando-se a todo custo as necessidades de reprodução do
capital, o que impacta profundamente nas conquistas democráticas da década de oitenta, as
quais tem sido, além de minadas, progressivamente descontruídas.
O direito à cidade transcende o acesso à moradia, se expressando como direito coletivo
a um espo ambientalmente saudável que propicie qualidade de vida às gerações presentes e
futuras, bem como o acesso a bens e serviços construídos em conjunto. Também é direito, a
construção de espaços de organização política, os quais tornam-se mais do que nunca
indispensáveis para fazer frente aos obstáculos que tem perpassado a vida cotidiana das
populações urbanas na atualidade. Portanto,
Ocupar a cidade como espaço público e acessá-la em sua totali-dade significa
a ultrapassagem de um ato meramente pessoal/indivi-dual para um processo
político, coletivo e de resistência às formas discriminatórias e ao complexo
universo da desigualdade social, que produz e legitima lugares para
determinados indivíduos; que obstacu-liza a diversidade humana e que
naturaliza a exploração do trabalho e as pticas de dominação ideológica e
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cultural. (SILVA; SANTOS, 2015: 507).
O que não deixa de ser um desafio nos dias que correm, tendo em vista que a pandemia
do novo coronavírus chega como algo inesperado, avassalador e destrutivo, sobretudo para os
segmentos mais pauperizados. Segundo os dados oficiais do Ministério da Saúde, são mais
de 300 mil mortes em um intervalo temporal de pouco mais de um ano, isso sem contar as
subnotificações. As perspectivas são assombrosas, recessão econômica, crescimento da fome e
do desemprego, além da ampliação das desigualdades sociais, processos que se expressam
no cotidiano da vida do povo brasileiro.
Na perspectiva de contribuir com o tema, elencamos alguns elementos para reflexão, na
certeza de que estes não esgotam o debate, mas que podem auxiliar na compreensão de algumas
questões e no levantamento de novas indagações. Para tanto, o artigo está dividido em duas
partes, na primeira, buscamos fazer um breve resgate histórico sobre o desenvolvimento das
cidades no Brasil, apontando algumas considerações sobre a luta dos movimentos sociais e as
conquistas jurídicas expressas na constituição de 1988, e, no Estatuto da Cidade através da Lei
nº 10.257/2001.
Também indicaremos alguns desafios para efetivação do direito à cidade, destacando
alguns aspectos relacionados à crise urbana que envolvem segregação, desigualdades sociais,
econômicas e de gênero, levando em consideração a conjuntura de aprofundamento de crise do
capital que se desdobra a partir da década de 1970. Na segunda parte, trataremos mais
especificamente da pandemia do Sars-Cov-2, e suas implicações para a classe trabalhadora,
sobretudo para as populações mais vulneráveis que vivem em áreas periféricas da cidade.
Desenvolvimento urbano no Brasil e a luta pelo direito à cidade
A princípio as cidades surgem e se constituem enquanto espos essencialmente
administrativos e subordinados ao campo, passando posteriormente a se situar como lugar
referencial de comercialização de mercadorias. (Lefebvre apud SODRÉ; MARTINS, 2016: 55).
Com o desenvolvimento da sociedade capitalista, sobretudo a partir da revolução industrial, as
cidades passaram a se constituir geograficamente como lugar de produção e reprodução social.
Harvey (2012) situa a urbanização como um fenômeno histórico de classes, cuja concentração
e extração de mais-valor, bem como a contínua expano da produção de excedentes se
perpetuam até os dias atuais.
Os grandes investimentos em obras de infraestrutura urbana e engenharia civil são,
segundo Harvey, alternativas para aplicação de “excedentes ociosos” de capital e de força de
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trabalho. O autor argumenta que o processo de urbanizão, assim como gastos militares,
desempenhou um papel particularmente ativo no processo de reprodução do capital e cita
exemplos como a reconstrução de Paris na década de 1850 e Nova York pós-1945, sinalizando
suas grandes obras de infraestrutura e a transformação da estrutura urbana em grandes centros
industriais de consumo e de lazer, os quais além de absolver um enorme quantum de capital e
trabalho, também foram responsáveis pela produção de uma certa estabilidade social”. As
transformações realizadas nas cidades se deram por intermédio de instituições financeiras e da
criação de um sistema de crédito, o que resultou na expansão da dívida urbana. Ademais, a
urbanização delas trouxe consigo o aumento/crescimento de subúrbios em suas imediações,
segregando as camadas sociais mais pauperizadas que trabalharam e construíram os centros
urbanos, mas que não tiveram acesso ao direito à cidade.
No Brasil, o processo de urbanização assume características peculiares devido às
particularidades de sua formação sócio-histórica de base colonial escravocrata, forjada a partir
de um modelo político patrimonialista e de uma economia agroexportadora. De acordo com
Maricato (2010) a urbanização em terras brasileiras teve início culo XIX, e foi possível a
partir de dois processos, o da suposta abolição da escravidão, e, da privatização das terras
mediante a Lei das Terras de 1850. Entretanto, foi apenas nas primeiras décadas do século XX,
com advento da industrialização, que se de perceber efetivamente a expansão dos centros
urbanos a partir de um desenvolvimento desigual, excludente e combinado.
O rápido crescimento populacional urbano forjado a partir da chegada dos imigrantes,
da libertação dos escravos, e, dos brancos empobrecidos, que buscavam reconstruir suas vidas
em cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, resultou no crescimento de cortiços e moradias
insalubres. Sem o devido planejamento em obras de infraestrutura e saneamento sico, os
centros urbanos tornaram-se locus de concentração da pobreza e proliferação de doenças.
Desse modo, a fama do Brasil por suas costas pestilentas corria o mundo prejudicando
a exportação de mercadorias, o que impulsionou o poder blico a conduzir reformas urbanas
que tiveram início no Rio de Janeiro, mas se desdobraram para demais cidades do país. Maricato
(2010: 29) afirma que as reformas urbanas eram completamente higienistas combinado
saneamento com embelezamento e segregação territorial”, e que as falias pobres eram
despejadas sem que houvesse o mínimo de diálogo, pois a pobreza, e tudo que remete a ela, não
fazia parte do projeto dominante de modernização das cidades brasileiras.
Destarte, esse modelo de desenvolvimento urbano, imbricado na segregação social e
territorial, se desenvolve no Brasil a partir do século XX e se sustenta até os dias atuais. Assim
como em Paris em 1850, cidades brasileiras como o Rio de Janeiro, em 1906, também
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realizaram obras de modernização do centro histórico com excedentes dos capitais vindos do
café. Como afirma Maricato (2010) foi sob o domínio do café que o crescimento
urbano/industrial se iniciou, e as reformas urbanas faziam parte de um leque de medidas
consubstanciavam uma nova faze histórica no país. A reforma urbana do Rio de Janeiro,
também chamada de Regeneração, foi a mais importantes da época, tendo em vista que esta
cidade, além de ser a capital federal, era um dos principais centros comerciais do país. Ela se
consuma na perspectiva de responder a crise ecomica, apaziguar os conflitos sociais, ativar
os capitais ociosos excedentes do cae extrair mais valor através da exploração da massa de
trabalhadores que até então encontravam-se desempregados.
Assim, as cidades brasileiras vão se desdobrando historicamente em grandes centros
comerciais e, vinculado a esse processo se encontra o consequente aumento/crescimento de
subúrbios, favelas, periferias e moradias autoconstruídas em áreas de preservação ambiental,
ocupadas majoritariamente pelas camadas de trabalhadores empobrecidos que, quando são
expulsos dos centros urbanos, não conseguem promover a manuteão familiar devido o
encarecimento do custo de vida, remetendo-se a um processo constante de gentrificação, ou
como diria Harvey (2012: 83) “acumulação por despossessão
1
”. O temo usado pelo autor parte
da compreensão de que o processo de “acumulação primitiva” mediante a expropriação de
terras e das condições necessárias a manutenção autônoma da vida pelos trabalhadores, bem
como da expansão geográfica para realização do valor é constante e necessário para a ampliação
do capital, nesse processo o Estado moderno atua tanto na formalização dessa prática, bem
como na criação de novas formas expansionistas de acumulação na contemporaneidade.
Harvey (2012) se utiliza do exemplo do método de Haussmann para apontar como a
burguesia e o Estado, seja através da violência ou de mecanismos legais, retira dos trabalhadores
a posse de suas terras sob a justificativa da modernização das cidades, deslocando-os para as
suas margens. De acordo com o autor, a produção de espaços e lugares dando origens a novas
geografias urbanas resultam inevitavelmente no deslocamento e na despossessão de massas de
trabalhadores empobrecidos, o que o autor vai chamar de “reflexo feio da absorção de capitais”.
(HARVEY, 2011: 146). Obviamente que esse processo não se dá sem variadas formas de
resistências, das quais os movimentos sociais urbanos são cada vez mais expressivos na disputa
por uma geografia urbana socialmente mais justa.
Nesse movimento contraditório, as cidades tornam-se cada vez mais alvo de objetivação
pelo capital enquanto negócio lucrativo, reverberando na negação das necessidades
1
Para compreender melhor o conceito de despossessão trabalhado por Harvey consultar: HARVEY (2011).
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habitacionais das massas. A burguesia e o poder público se unificam para valorização do espaço
urbano e mercantilização deste, atendendo aos interesses de reprodução do capital. Por seu
turno, desde o início do século XX, a questão urbana já se expressava como sequela da questão
social, os parcos salários dos trabalhadores refletiam a precariedade de suas condições de vida
e moradia, provocando descontentamento das massas e suscitando na emersão de movimentos
sociais e organizações de greves que, apesar de ter como resposta do Estado a dura repressão,
culminou também na conquista de alguns direitos, como a Consolidação das Leis Trabalhistas
(CLT), previdência, salário mínimo, entre outros, alcançados no governo populista de Getúlio
Vargas. (MARICATO, 2010).
Conforme a autora supradita, foi a partir do governo populista de Vargas que se deu
início, ainda que timidamente, à construção de uma política habitacional no Brasil. Contudo, o
que se percebe no decorrer da história é que nem o mercado e nem o Estado resolveram os
problemas habitacionais do país, muito menos as desigualdades sociais que se perpetuam no
desenvolvimento das cidades brasileiras, mesmo porque essas desigualdades são estruturais e
inerentes a esse sistema de prodão. E, portanto, “a escassez de moradia não é um acaso; é
uma instituição necessária que pode ser eliminada, com repercussões sobre a saúde, etc.,
quando a ordem social da qual ela se origina for revolucionada desde a base. (ENGELS, 2015:
31).
Assim sendo, a classe dominante vai criando alternativas necessárias à reprodução e
ampliação do capital sem necessariamente resolver suas contradições, desviando-se dos
problemas conjunturais e atuando na imediaticidade dos problemas cotidianos gerados pela
formação das cidades capitalistas. Por exemplo, a necessidade de mão de obra nas indústrias e
centros urbanos promoveu o desenvolvimento de transportes coletivos, assim os trabalhadores
eram, e o, empurrados para áreas cada vez mais longínquas, atendendo às necessidades de
extração de excedente sem, contudo, ofuscar o brilho das cidades, relegando-se a pobreza da
convivência habitacional dos centros urbanos.
Por conseguinte, com o desenvolvimento das forças produtivas e com o advento da
industrialização pesada no período autocrático burguês, a produção de bens duráveis
(automóveis, aparelhos domésticos), e, a migração da população do campo para as capitais e
regiões metropolitanas, em busca de melhores condições de vida, fazem surgir nas cidades
novas organizações de modos de vida. Nesse sentido, estas refletiram em mudanças culturais,
econômicas e sociais, além de aprofundar as desigualdades entre centro e periferia.
De acordo com Brito (2006), foi no contexto histórico da década de 1960 que a
população das cidades ultrapassou a do campo, ocorrendo um célere crescimento populacional
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no espaço urbano mediante um intenso fluxo migratório que se intensificou a partir de 1970.
Maricato (2020) aponta ainda que essa população que veio para a cidade não foi recebida por
nenhuma política pública e foi se instalando como pôde, ocupando áreas de proteção ambiental,
áreas de risco, de drenagem de água de chuva etc., forjando o que se conhece atualmente por
cidade ilegal.
Por seu turno, durante o período do Regime Militar, que se estendeu entre os anos de
1964 até 1985, houve um misto de repressão e concessão possibilitando o atendimento de
algumas demandas populacionais por parte do Estado, o qual buscara de certo modo algum tipo
de legitimidade política e governamental. Conforme o CFESS (2016), nesse período o Estado
impulsionou o setor de construção civil a partir da criação do Banco Nacional de Habitação
(BNH), possibilitando a ampliação da construção de casas e conjuntos habitacionais. Contudo,
essas possibilidades não atingiram as camadas sociais mais pobres, ademais, o controle dos
gastos públicos e a prestação de contas careciam de maior transparência.
Maricato (2000) aponta que a conjuntura anteposta favoreceu a expansão imobiliária
privada com moradias baseadas em edifícios e apartamentos, remodelando as imagens das
cidades. Essas habitações, em larga medida, eram destinadas às famílias de classe média e alta
através do crédito financeiro, o que favoreceu também a especulação imobiliária. A autora
também menciona situações resultantes desse processo de desenvolvimento urbano, como a
concentração da pobreza urbana, os impactos ambientais, a concentração populacional em
regiões de alagados, morros, várzeas e amesmo planícies marcadas pela pobreza homogênea,
além do crescimento da violência urbana, sobretudo a partir da década de 1980.
No contexto em tela, a partir do aprofundamento da questão social, vários movimentos
sociais emergiram na cena política brasileira. Entre eles, movimentos urbanos, movimentos de
bairros, movimentos de luta por moradia, associações de moradores, Movimento dos
Trabalhadores Sem Terra, entre outros, que reivindicavam tanto a restituição da democracia
como também o acesso à terra, ao trabalho, à moradia digna e aos demais direitos necessários
ao exercício da cidadania.
É, portanto, nessa conjuntura que o debate sobre o direito à cidade é travado a partir da
luta dos brasileiros pela reforma urbana, ou seja, pelo acesso à moradia e à terra urbana de
forma democrática (CFESS, 2016). Com o esgotamento do Regime Militar, os resultados das
disputas políticas pós reabertura da democracia se expressaram na inclusão dos artigos 182 e
183 na carta constitucional de 1988, os quais versam sobre a política urbana, promovendo de
forma inédita as bases legais para o possível cumprimento da função social da terra urbana.
O Estatuto da Cidade Lei 10257 de julho de 2001, que regulamenta os artigos 182 e
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183 da constituição, traz inúmeros avanços ao tratar do uso do solo urbano, expressando em
suas diretrizes: a garantia do direito a uma cidade ambientalmente sustentável e mais igualitária,
tanto para quem nela vive hoje como para as gerações futuras, a partir de uma gestão
democrática e participativa, garantindo os serviços de infraestrutura que seus cidadãos
necessitem. Ademais, aponta instrumentos indispensáveis como a gestão orçamentária
participativa e o Plano Diretor, Lei municipal que permite o desenho e materialização dos
objetivos da reforma urbana, entre outros.
Esses instrumentos jurídico-normativos abrem caminhos para que a população possa
finalmente participar dos rumos da política urbana no Brasil, com intencionalidades de imprimir
a esta os interesses da maioria, ou seja, da grande massa de trabalhadores, os quais, em larga
medida, são os mais prejudicados na divisão territorial do espaço urbano. Contudo, trilhar esse
caminho nunca foi fácil, e nem é, principalmente porque existe uma luta de classes que permeia
esse processo. Ademais, o solo urbano tem sido cada vez mais visto como a galinha dos ovos
de ouro do capital, espaço de sua reprodução e ampliação.
Cabe ressaltar que a partir da década de 1970, o capital adentra em uma crise estrutural
que se arrasta até os dias atuais, sendo esse fenômeno comum a todos os países em escala global,
ainda que em períodos históricos e geograficamente distintos. Como resposta do capital a mais
uma de suas crises, se processa uma combinação entre restruturação produtiva, advento
ideológico e dominante do ideário neoliberal, e, a hegemonia do capital financeiro, culminando
no aprofundamento da questão social.
No Brasil, país periférico de economia dependente, a crise do capital chega com mais
força a parir da década de 1980, sendo esta considerada por muitos como a década perdida para
a economia. Isto soa contraditório justamente pelo fato de que, diante desse aprofundamento de
crise, se consumou constitucionalmente uma gama de direitos sociais e até mesmo universais,
como é o caso da saúde pública. É nesse movimento contraditório de luta de classes por
interesses distintos que se formam as bases para entrada dos postulados neoliberais no Brasil,
situado historicamente a partir da década de 1990, consolidando a “estratégia de dominação da
classe burguesa e de seus aliados para responder à crise vivida na década de 1980” (BRETTAS,
2017: 60).
Com base nas análises da autora supradita, não houve, portanto, um movimento de
desmonte dos direitos sociais no Brasil como ocorrera nos países europeus que consolidaram o
Estado Social (Welfare State). Pelo contrário, o que há aqui é um emaranhado de lutas políticas,
historicamente desiguais, onde ao mesmo tempo em que se pretende afirmar os direitos sociais
e colocá-los em prática a partir de mecanismos legais, tamm se busca, por outro lado, minar
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sua efetivação e desmontar juridicamente o que já foi constituído, sob uma perspectiva
ideológica de que tais direitos promovem excessos de gastos à esfera estatal. As análises de
Brettas o cruciais para entendermos a conjuntura pós constituição de 1988, bem como os
limites e possibilidades para implementar os pressupostos elencados no Estatuto das Cidades.
Diz a autora,
Não podemos desconsiderar os limites trazidos pela luta de classes para a
implementação deste projeto de restauração burguesa. O neoliberalismo não
se deu por uma aplicação direta e mecânica de um receitrio vindo de fora.
Ele esbarrou em lutas e resistências da classe trabalhadora que, apesar de ter
sentido fortemente uma desarticulação, havia resultado em uma Constituição
Federal com definições que não puderam ser ignoradas e foram, de alguma
maneira, implementadas. (BRETTAS, 2017: 62).
Como mencionado anteriormente, as lutas políticas entre classes são incontestavelmente
desiguais, dado que a burguesia, não à toa chamada de classe dominante, possui, além dos meios
de produção sob sua tutela, também o apoio do Estado. Sendo este, compreendido aqui como
capitalista, cuja função é manter as bases de dominação e exploração na ordem do capital.
Assim sendo, a classe trabalhadora não conseguiu barrar as medidas de reestruturação do
capital, sendo implementadas no âmbito social verdadeiras contrarreformas que têm impactado
significativamente nas diversas políticas sociais. Como afirma Brettas (2017: 62) as tensões dos
trabalhadores não foram capazes de ofuscar a força do projeto burguês e oEstado dependente
brasileiro, em sua fase neoliberal, acentua sua capacidade de tornar lucrativas as ações privadas
na prestação de serviços públicos”. Ou seja, os direitos sociais, como o acesso à moradia,
tornam-se cada vez mais direcionados para a esfera privada sendo estes oferecidos no âmbito
do mercado sob respaldo financeiro do Estado.
Para compreender melhor essa questão e a disputa de interesses que permeiam o solo
urbano é preciso identificar as necessidades sociais e econômicas que envolvem as classes em
conflito. Maricato (2010) nos expõe essas questões de forma bastante didática ao apontar que
para a classe trabalhadora o solo urbano tem valor de uso, para o capital, sobretudo o
imobiliário, este mesmo solo tem valor de troca.
Dito de outro modo, os trabalhadores necessitam da cidade para moradia, transporte,
lazer, serviços de infraestrutura, acesso a equipamentos de saúde, assistência, educação, entre
outros serviços básicos necessários à manutenção de sua subsistência. o capital imobiliário
tem interesses na expansão de seus lucros e a cidade como mercadoria, fonte de expansão
do valor, seja pela produção e mercantilização de imóveis ou meramente pela especulação
imobiliária.
Isto posto, uma terceira esfera que atua na mediação desses dois polos, o Estado. Mas
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este, por sua natureza, tende a atender com mais frequência os interesses do capital, desse modo
a luta política na esfera estatal se faz constante, pois as obras de infraestrutura
hegemonicamente realizadas por ele, bem como as normas de regulamentação do solo urbano,
podem valorizar determinado espaço. Assim, a variedade de preço dos imóveis está
intimamente ligada à sua localização e às oportunidades que ele oferece a partir dos serviços
coletivos existentes na localidade (MARICATO, 2010). Os iveis, ainda que construídos com
materiais da mesma qualidade, variam de preço em tempo e espaço, sendo, portanto, a
segregação um instrumento importante para o capital.
A segregação urbana ou ambiental é uma das faces mais importantes da
desigualdade social e parte promotora da mesma. À dificuldade de acesso aos
serviços e infra-estrutura urbanos (transporte precário, saneamento deficiente,
drenagem inexistente, dificuldade de abastecimento, difícil acesso aos
serviços de saúde, educação e creches, maior exposição à ocorrência de
enchentes e desmoronamentos etc.) somam-se menos oportunidades de
emprego (particularmente do emprego formal), menos oportunidades de
profissionalização, maior exposição à violência (marginal ou policial),
discriminação racial, discriminação contra mulheres e crianças, difícil acesso
à justiça oficial, difícil acesso ao lazer. (MARICATO, 2003: 152).
Além da segregação pelas condições econômicas, ainda a segregação devido à
orientação sexual e identidade de gênero, tão bem apresentada por Silva e Santos (2015) em um
artigo intitulado “O sol não nasce para todos”. As autoras expõem um panorama que reflete
cidades doentes, que violam direitos, que agridem e violentam os sujeitos por o fazerem parte
de uma tal “heteronormatividade”.
Ademais, sem respeitar a diversidade sexual existente na sociedade, criam-se espaços
segregados de consumo que possam atender as demandas da população LGBT
2
, o que as autoras
o chamar de “cidade do consumo” para um determinado “mercado Gay”, forjado a partir de
uma “cultura de guetização” estabelecida pelo capital para satisfazer suas necessidades de
acumulação. Assim, os sujeitos com maior poder aquisitivo podem frequentar boates,
restaurantes, cafés, lojas de moda e outros espaços sem temer a insegurança de conviver em
espos coletivos que não lhes imprimam pertencimento.
As autoras também apontam inúmeros contrassensos entre a cidade que se pretende e a
cidade que se tem, dos quais são expressão: as dificuldades de participação política e coletiva
no desenvolvimento urbano, dificuldades de acesso a equipamentos públicos, falta de acesso a
transporte público de qualidade e a preço acessível, e, o crescimento dos chamados
2
A sigla engloba: Lésbicas, Gays, Bissexuais e Travestis, todavia existem sujeitos que se identificam com outras
categorias. Atualmente a sigla mais usada é LGBTQIA+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Queer,
Intersexo, Assexual, + outros grupos e variações de sexualidade e gênero), sua amplião se deu na perspectiva de
alcançar um maior número de sujeitos, aumentar a representatividade do movimento e de suas bandeiras de luta.
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assentamentos ilegais, ou seja, moradias construídas em locais sem regularização, muitas vezes
em áreas de preservação ambiental ou em locais perigosos por serem áreas suscetíveis a
desmoronamentos, enchentes e outros desastres naturais. Cabe ressaltar que a apropriação de
terra irregular ainda é muito comum no Brasil, tendo em vista que a carência habitacional,
sobretudo para os segmentos mais pobres, ainda é gritante e os trabalhadores, muitas vezes sem
alternativas, acabam por se apossar de terras e autoconstruir suas moradias. Assim,
As cidades contemporâneas o verdadeiras bombas prestes a explodirem pela
via da violência, pela segregação dos espaços; pela situação dratica em que
se encontram os indivíduos que estão sem teto; pelas práticas dos
especuladores imobiliários; pelo acirramento da violência contra a mulher; da
homofobia, transfobia e lesbofobia que obstaculizam o direito à cidade da
população LGBT e pelo contínuo processo de aumento do desemprego; de
demolição dos direitos e dos valores éticos-morais. (SILVA; SANTOS, 2015:
513).
Desse modo, os desafios enfrentados pela classe trabalhadora no cotidiano da vida
urbana o imensos. A reestruturação do capital e o desenvolvimento das forças produtivas
agudizam ainda mais as desigualdades sociais atingindo todas as esferas da vida social, política,
econômica, cultural e ambiental. Apesar de alguns avanços conquistados nos governos petistas,
como a criação do Ministério das Cidades e as Secretarias Nacionais de Desenvolvimento
Urbano, a construção da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano, o fortalecimento da
gestão democrática e participativa, a criação e fortalecimento de programas como Bolsa
Família, Minha Casa Minha
3
Vida, Benefício de Prestação Continuada (BPC), entre outros,
embora relevantes, o foram suficientes para resolver os problemas de carência habitacional,
nem reduzir as desigualdades sociais existentes no país.
Como afirma Silva e Santos (2015: 509) “As determinações classis-tas evidenciam a
desigualdade social e o não direito à cidade”. Progressivamente os interesses do capital vão se
sobrepondo às necessidades sociais, despontando em uma crise de valores humanitários sem
precedentes. A pandemia do Sar-Cov-2, que avassala o mundo nos dias que correm, põe em
evidência o que verdadeiramente importa para a classe dominante, a reprodução do capital em
detrimento das vidas humanas. Assim, a combinação entre crise do capital e pandemia traz
resultados catastróficos para a vida da classe trabalhadora, assunto sobre o qual nos
debruçaremos com mais atenção no item a seguir.
3
Existem críticas contundentes ao programa “Minha Casa Minha Vida” pelo fato deste se centrar muito
restritamente a construção de moradias. Além disso, ainda que se direcione em certa medida as camadas populares,
o programa não coadunava com as questões referentes a mobilidade urbana e ao acesso aos equipamentos
provenientes do espaço urbano provocando uma rachadura com o direito à cidade. (CFESS, 2016).
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Pandemia, crise urbana e o esgaamento da questão social.
Entende-se por pandemia a disseminação de uma doea em escala global, evidenciada
por um surto que começa em determinada região, mas que se espalha devido ao tráfego de
pessoas, por todos os países ou na maioria deles. De acordo com a Organização Mundial de
Saúde (OMS) a COVID-19 é a doença infecciosa causada por um novo coronavírus Sars-
Cov-2, identificado pela primeira vez em dezembro de 2019, em Wuhan, na China. O
espalhamento rápido desse vírus e as proporções que ele atingiu a nível mundial fez com que o
diretor-geral da referida instituição, Tedros Adhanom, declarasse no dia 11 de março de 2020,
que estamos vivenciando mais uma pandemia. (PAHO, 2020).
No Brasil, o primeiro caso de COVID-19 registrado oficialmente pelo Ministério da
Saúde (MS) foi em 26 de fevereiro de 2020, um homem de classe média com 61 anos de idade,
residente da cidade de o Paulo, que tinha feito uma viagem para Itália. Já a primeira morte
registrada pelo MS foi de uma diarista de 57 anos chamada Rosana Aparecida Urbano,
moradora de uma das regiões mais pobres da cidade em tela.
Nesse contexto, não é mera coincidência que no mundo globalizado em que vivemos
doenças viróticas se espalhem com freqncia, dado o fluxo contínuo de pessoas pelas diversas
partes do globo, assim como não é coincidência que essa propagação se inicialmente por
pessoas de maior poder aquisitivo, cuja condição econômica possibilita o intercâmbio
internacional. Assim sendo, o Sars-Cov-2 desembarca em terras brasileiras tendo a burguesia
como seu principal hospedeiro, se espraiando no território e, por conseguinte, contaminando a
classe trabalhadora, atingindo com robustez os segmentos mais pauperizados.
Cada país buscou lidar com a pandemia de forma específica, entretanto, o que se percebe
é que a natureza metabólica e estrutural da sociedade capitalista, onde impera a ganância e a
cede incontrolável pelo lucro, não permite que as nações respondam de forma positiva às
necessidades econômicas, sociais e sanitárias da grande massa da população. Como
mencionado, a crise que se arrasta desde 1970, provocou mudanças de ordem estrutural, as
quais rebatem profundamente nas respostas dadas à emergência de saúde blica que se
estabeleceu nos dias que correm. O desemprego, o aprofundamento das desigualdades sociais
e a destruição dos direitos expressam a face pandêmica do capital (Antunes, 2020).
É inadmissível que os Estados Unidos da América, maior potência econômica do
mundo, seja o país com o maior número de mortos e um dos mais atrasados na resposta
assistencial à saúde de seus habitantes. Isso revela o sistema de saúde excludente do país, bem
como a postura política e econômica adotada, que se reflete negativamente na vida dos
segmentos mais empobrecidos da classe trabalhadora, dentre os quais, negros, mulheres,
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migrantes, entre outros, que morreram em casa por não terem condições financeiras de ir aos
hospitais em busca de assistência à sde. Felizmente, a partir da gestão de Joe Biden, que se
iniciou em janeiro de 2021, o país tem mostrado alguns avanços no que concerne as medidas
sanitárias de combate ao vírus e tem tentado reverter positivamente o cenário crítico em que se
encontra a nação.
No Brasil, os reflexos da pandemia assumem proporções devastadoras, escancarando
o só a crise econômica, política e cultural em que o país se encontrava, e ainda se encontra,
mas também a desigualdade social gritante que impera historicamente no nosso território.
Antunes (2020) afirma que a aglutinação entre crise e pandemia provocam, além dos altíssimos
índices de mortalidade, a ampliação da miserabilidade e o empobrecimento da classe
trabalhadora. Segundo o autor, antes da pandemia mais de 40% dos brasileiros viviam na
informalidade laboral, o que se agrava profundamente com a recessão provocada pela crise
pandêmica, que atinge não só o Brasil, mas todos os países em escala global.
A princípio, com a inexistência de vacinas e de medicamentos comprovadamente
eficazes no combate à COVID-19, as principais medidas de enfrentamento e controle da
propagação do novo coronavírus, indicadas pelas autoridades sanitárias, foram o
distanciamento social, a higienização corriqueira das mãos com água e sabão ou álcool em gel,
e, o uso de máscaras. Desse modo, com a propagação aligeirada do vírus no Brasil, assim como
em outros países, se fez necessário tomar medidas que evitassem aglomerações, expressas
principalmente na ampla redução da produção e de serviços não essenciais, culminando no
fechamento de estabelecimentos comerciais, indústrias, shoppings centers, bares e restaurantes,
cinemas, teatros, casas de show, entre outros, agravando a situação de desemprego, que como
apontou Antunes, já era trágica.
A crise que se abate na conjuntura atual aprofunda também a crise política, colocando
em evidência as ões destoantes entre governo federal, governos estaduais e até mesmo os
municipais. Além dos problemas sanitários, econômicos e sociais que o país enfrenta, o governo
fascista e ultraliberal, comandado pelo presidente Jair Bolsonaro, responde a realidade a partir
de um discurso negacionista e obscurantista, se utilizando de frases como “é apenas uma
gripezinha”, “todos vamos morrer um dia”, temos que deixar de ser um país de maricas”,
“vamos deixar de mimimi” e tantas outras. Assim, ele revela uma postura anticiência, contrária
ao isolamento social e claramente direcionada, ainda que isso custe muitas vidas, ao retorno
imediato dos trabalhadores ao mercado para retomada das atividades econômicas e comerciais.
Apesar do processo de imunização ter se iniciado no Brasil desde o mês de janeiro do
corrente ano, de acordo com a logística do governo federal, esse processo se estenderá
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praticamente até o final de 2021, ademais estamos vivenciando atualmente o pior momento da
pandemia em decorrência da nova variante do vírus que circula no país, o que nos indica que
distanciamento social ainda é a medida mais segura para evitar o contágio e salvar vidas.
A tragédia da realidade capital-pandêmica se expressa na contradição entre fazer
isolamento social e morrer de fome, ou sair para trabalhar correndo o risco de se contaminar e
acabar morrendo pela doença, além da possibilidade de transmitir aos seus familiares. É isso
que Antunes (2020: 14) vai chamar de trabalho sob o fogo cruzado.” O autor, então, questiona
“como ficarão em isolamento social os/as desempregados/as, os/as informais os/as
trabalhadores/as intermitentes, os uberizados, os subutilizados e os terceirizados...?”, nos
provocando a refleo de quão vulnerável e desprotegida se encontra a classe trabalhadora
brasileira, quem sofrido duros golpes expressos na Reforma Trabalhista, Reforma da
Previdência, Lei da terceirização total, e, a Emenda Constitucional 95 de 2016, que congela os
gastos com saúde, educação e assistência por vinte anos.
O contexto reverbera também na intensificação do trabalho daqueles que ainda
conseguem manter seus empregos, notadamente são ampliadas as formas de trabalho mediadas
pelas Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs), expressas em larga medida no trabalho
remoto, em home office e, principalmente, por intermédio de empresas de aplicativos. Antunes
(2020) afirma que a expressão das TICs na vida da classe trabalhadora é a ampliação da
precarização do trabalho e da burla dos direitos sociais, tenncia que se esparrama para todas
as esferas das cadeias produtivas, atingindo atualmente com mais profundidade o setor de
serviços.
Sob um olhar mais específico no âmbito da saúde, compreende-se que a pandemia está
imbricada no intercâmbio entre as esferas biológica e social, emergindo como resultado da
aglutinação de vários processos que se expressam nos Determinantes Sociais de Saúde (DSS),
resultantes da estrutura dinâmica do modo de produção capitalista.
Souza (2020) cita alguns elementos que estão presentes no processo de unificação da
determinação social da saúde, do qual emerge a pandemia da COVID-19, dentre os quais
podemos citar a prioridade da esfera econômica retardando as respostas de saúde pública,
fragilização dos sistemas públicos de saúde, reflexo do subfinanciamento; priorização do
Estado na ajuda financeira ao capital em detrimento da população economicamente mais
vulnerável; intensificação da disseminação de informões falsas na mídia, em especial via
internet, o que se convencionou chamar de fake news; a desigualdade econômica entre as classes
sociais; e, por fim, a ética burguesa do individualismo agudizada nos moldes neoliberais.
Conforme o autor supracitado a pandemia não é responsável pela calamidade pública
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instaurada, mas sim o próprio modus operandi da sociedade capitalista e sua natureza
destrutiva, sendo o Sars-Cov-2 apenas mais um elemento soerguido das bases objetivas do
capital mundializado. Destarte, o que se evidencia no Brasil é a incapacidade de respostas às
necessidades sicas da população, expressas no campo da saúde pela insuficiência de
profissionais capacitados, bem como pela escassez de materiais sicos como EPIs, scaras
e luvas, além de leitos de UTI e respiradores, reflexo da corrosão e desfinanciamento do SUS
nos últimos anos.
Cabe ressaltar que a crise pandêmica atinge com mais profundidade as populações mais
vulnerais que vivem no espaço urbano, o que não quer dizer que a COVID-19 não atinja a
população da zona rural, mas que as cidades, sobretudo as metrópoles, possuem
particularidades problemas p-existentes que se aprofundam e se agudizam com a chegada
do vírus. Uma das preocupações que se tornou evidente, sendo exposta corriqueiramente na
mídia, foi a situação vivenciada pela população que mora nas favelas.
Essas comunidades possuem alta densidade populacional e vivenciam carências sicas
como falta de água potável, saneamento básico, serviços de infraestrutura prerios,
insuficiência no acesso às políticas púbicas, além de moradias com cômodos pequenos e grande
mero de moradores, tornando essa população mais exposta ao coronavírus (COSTA, 2020).
Diante dessa realidade, como dizer para esses sujeitos que eles têm que fazer isolamento social
e higienizar as mãos com frequência?
Ademais, com o advento e espraiamento da pandemia no país, os serviços de transporte
urbano tornaram-se ainda mais prerios e reduzidos, sobretudo, e contraditoriamente, a partir
da intensificação das medidas de isolamento social, restando como opção aos trabalhadores(as),
vivenciar os riscos oferecidos pela aglomeração em transportes públicos lotados que certamente
ficaram ainda mais demorados, ou arriscar perder o emprego, sua única fonte de sobrevivência.
Como afirma Maricato (2020) os problemas de mobilidade urbana o são novos, sua
precariedade se reflete atualmente em poluição ambiental, meros exorbitantes de acidentes
de trânsito
4
, alto custo das passagens e tempo de vida perdido dentro desses transportes, tendo
em vista que a distância percorrida entre moradia e trabalho nos faz perder horas no trânsito.
Outro elemento importante é o adoecimento psicológico e as agressões nos
domicílios, tendo como principal motivação o machismo (estrutural). António
Guterres, chefe da ONU, atestou preocupação diante desses fenômenos, como
consequência do isolamento social, em que ele observa o aumento de casos de
violência contra mulheres e crianças, suicídio, depressão, ansiedade. A
escassez de delegacias especializadas em violência contra a mulher aprofunda
4
Existem estudos que apontam que durante o período mais intenso do isolamento social foram reduzidos tanto os
índices de poluição ambiental como os acidentes de trânsito.
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o problema (no Brasil), já que são apenas 21 e apenas Rio de Janeiro e São
Paulo possuem esses estabelecimentos fora da capital. (COSTA, 2020:165-6).
O autor afirma ainda que a letalidade do COVID-19 é maior entre os negros, os quais
moram predominantemente nas favelas e periferias das cidades. Essa população historicamente
oprimida, além de sofrer os impactos da pandemia, tem sido alvo de toda sorte de violação de
direitos. Chacinas e violência policial nos morros e favelas não são mais novidades no
noticiário midiático, muito menos a morte de crianças e adolescentes em operações policiais.
Ademais, tem se ampliado os casos de vítimas fatais atingidas por bala perdida e por inúmeras
situações de vioncia vivencias nesses espaços, refletindo o descaso do poder público e a
ausência do Estado nas favelas e periferias das cidades. Nas palavras de Costa (2020: 166) A
violência contra as favelas expressa o DNA escravista brasileiro ainda presente na sua estrutura
republicana”.
Outro segmento muito vulnerável à situação de pandemia é a população que vive em
situação de rua, grupo populacional heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema,
vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional
regular, utilizando-se dos logradouros públicos e das áreas degradadas como espaço de moradia
e de sustento, de forma temporária ou permanente, bem como das unidades de acolhimento para
pernoite temporário ou como moradia provisória (BRASIL, 2009). Como dizer para essa
população ficar em casa? Os desafios enfrentados por esses sujeitos são imensos, sobretudo
pela carência e dificuldade de acesso a emprego e a serviços socioassistenciais. Muitos não m
sequer documentos de identidade pessoal, muito menos comprovantes de residência fixa, os
quais o exigidos para consultas em unidades de sde e/ou na inserção em programas
assistenciais.
São milhares de pessoas s ou com familiares morando nas ruas, calçadas,
praças, marquises, baixos de viadutos ou em outros locais, sem nenhuma
proteção física adequada, sujeitas a riscos de assassinatos, doenças, agressões,
discriminação e outras situações de violação da dignidade humana. Há que se
considerar também a diversidade de grupos que compõem a população em
situação de rua. Se, por um lado, a condição de estar sem moradia a torna
homogênea, por outro, esconde um conjunto diferenciado de grupos
particulares que possuem características, necessidades, condições e
perspectivas diferentes. Há idosos que não conseguio mais entrar no
mercado de trabalho, não possuem proteção previdenciária e que necessitam
de uma moradia permanente. Há grupos de famílias com filhos que demandam
cuidados e serviços específicos. Há pessoas com sofrimento mental que
precisam de tratamento de saúde e moradias especiais. Há outros grupos
como: dependentes químicos; com necessidades especiais como os
deficientes; de mulheres sós e grupos com diversas orientações sexuais, como
os que fazem parte dos grupos LGBT (KOHARA E VIEIRA, 2020).
Os autores apontam ainda que a situação de vida dessa população converge para a
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fragilização da saúde tornando-as mais suscetíveis ao adoecimento. Ademais, o populações
socialmente estigmatizadas tanto pela comunidade em geral, como pelos próprios agentes
blicos que nem sempre estão preparados para lidar com esses sujeitos. Um exemplo notório
e recente do trato repugnante do poder público com a população em situação de rua foi a
expulsão de forma violenta dos indivíduos que vivem na Cracolândia na cidade de São Paulo,
tanto o atual prefeito, Bruno Covas, quanto o governador do estado, João Doria, protagonizaram
medidas desumanas que mais se aproximam de políticas higienistas dessa população do que
propriamente do combate ao uso de crack e outras drogas.
Cabe ressaltar que as políticas de saúde, previdência e assistência social, as quais
compõem o tripé da seguridade social no Brasil, foram imprescindíveis nesse momento de
pandemia. Apesar do processo de desmonte que vinham sofrendo, seria impensável passar por
esse momento sem suporte dessas políticas na consumação dos direitos sociais inerentes à vida.
Milhares de brasileiros, por exemplo, solicitaram o seguro-desemprego e acionaram
mecanismos de proteção social disponíveis aos segurados da previdência. E o SUS, ainda que
com todas as suas carências, possibilitou assistência à saúde a milhões de usuários, em especial
aos trabalhadores empobrecidos e aos desempregados.
A assistência social, por sua vez, promoveu um trabalho fundamental e mais do que
nunca se mostrou indispensável na vida dos segmentos mais vulneráveis do nosso território,
esteve presente na organização e viabilização do acesso ao Auxílio Emergencial
5
programa
instituído pelo governo federal a partir do mês de abril de 2020, destinado a garantia de um
benefício financeiro no valor de R$600,00 aos sujeitos que correspondessem aos critérios
estabelecidos na proposta, passando ao valor de R$300,00 reais nos quatro últimos meses, com
data de vigência prevista até dezembro de 2020. Em 18 de março de 2021 foi instituído um
novo Auxílio Emergencial
6
, serão 04 parcelas disponibilizado a partir do mês de abril que irão
variar entre 150,00 e 375,00 a depender da composição familiar. A redução progressiva do valor
do auxílio representa um retrocesso, tendo em vista que vivenciamos o prior momento da
pandemia e o acirramento da crise econômica em todo país.
Apesar de insuficiente, o Auxílio Emergencial teve um peso bastante significativo para
5
Informações sobre critérios de adesão, acessar o DECRETO 10.316, DE 7 DE ABRIL DE 2020, que
regulamenta o auxílio emergencial de que trata o art. 2º da Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020. Disponível em: <
https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/decreto-n-10.316-de-7-de-abril-de-2020-251562799> Acesso em: 10 dez
2020.
6
As regras para adesão ao novo Auxílio Emergencial estão presentes na Medida Provisória 1.039, de18 de
março de 2021. Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/medida-provisoria-n-1.039-de-18-de-
marco-de-2021-309292254#:~:text=Art.%201%C2%BA%20Fica%20institu%C3%ADdo%20o,abril%20de%
202020%20e%20do> Acesso em: 29 mar 2021.
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suprir as necessidades de reprodução social de uma extensa camada da classe trabalhadora.
Muitos desafios foram produzidos na distribuição desse subsídio, como a geração de filas
quilométricas nas agências da Caixa Econômica Federal, o que acabou expondo os brasileiros
à contaminação pelo vírus. Além disso, houve grandes dificuldades de acesso pelos segmentos
paupérrimos que, em larga medida, o tinham expertise no manuseio e/ou acesso às
tecnologias necessárias à solicitação do benefício. Desse modo, tamm provocando,
ampliação das demandas nos Centros de Referência em Assistência Social (CRAS), pela busca
de repostas pela negação do benefício, bem como pela necessidade de solicitação deste.
Os trabalhadores e trabalhadoras dessas políticas, que por hora ganharam visibilidade
inclusive pela mídia, sempre estiveram na linha de frente e não mediram esforços no
enfretamento das mazelas da questão social, as quais foram aprofundadas no contexto de
pandemia, se afastando, inclusive, de suas famílias e arriscando cotidianamente suas vidas para
dar respostas às necessidades mais fundamentais da humanidade, que se expressam sobretudo
no direito à vida.
Desse modo, portanto, não podemos aceitar as palavras do ministro da economia, Paulo
Guedes, ao dizer, em uma fala infeliz, na reunião ministerial do dia 22 de abril, que colocou
uma “granada no bolso do inimigo
7
”, se referindo à retenção do ajuste salarial do funcionalismo
blico por dois anos. Assim como não podemos aceitar essa deformação que se materializou
com a Emenda Constitucional 109
8
aprovada em março de 2021, que ativa gatilhos para
contenção de gastos públicos, vedando a contratação de novos servidores, progressões salariais,
benefícios, abonos, etc., congelando os salários dos trabalhadores federais, estaduais e
municipais, por até 15 anos, sucateando ainda mais funcionalismo blico, algo impensável
para o momento de crise que vivenciamos, donde os brasileiros necessitam ainda mais de
políticas públicas afetivas para o atendimento de suas necessidades econômicas, sociais e de
saúde.
Portanto, juntemo-nos às rias iniciativas de movimentos sociais e organizações da
sociedade civil que tem se unido em solidariedade de classe com vistas a superar os desafios
postos pela crise capital-pandêmica. A tulo de exemplo temos as mobilizações organizadas
pela Frente Brasil Popular e pela Frente Povo Sem Medo
9
, cujas propostas, além de prover
7
Reunião ministerial. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=nfgv7DLdCqA>
8
A EC. 109 segue na mesma esteira da PEC 95, congela gastos com o funcionalismo público, pondo a conta do
novo Auxílio Emergencial nas costas dos servidores, para maior aprofundamento acessa:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc/emc109.htm>.
9
Fazem parte dessas frentes um conjunto de organizações compostas por: partidos políticos, sindicatos,
movimentos sociais, entidades estudantis, entre outros. A campanha “Vamos Precisar de Todo Mundo” está
disponível no site: <https://todomundo.org/?page_id=161>
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acesso à alimentação e materiais de higiene para aqueles que mais precisam, buscam, a partir
de articulações políticas, denunciar o descaso do Estado e exigir medidas concretas que
possibilitem o acesso aos direitos sociais.
Considerações finais:
O desenvolvimento das cidades no Brasil carrega em seu âmago a segregão territorial
e o aprofundamento das desigualdades sociais entre ricos e pobres. As cidades passam a ser
cada vez mais um lugar privilegiado de uma minoria que se utiliza desse espaço como fonte de
acumulação de riqueza e reprodução ampliada do capital. O uso e a ocupação do solo perpassam
por questões econômicas, políticas e culturais que estão impregnadas na raiz da formação
patrimonialista do Estado Brasileiro.
Portanto, apesar dos avanços constitucionais e jurídicos que preveem a função social da
terra, na prática, há uma grande dificuldade em se efetivar o direito à cidade e uma divisão mais
justa e igualitária do espaço urbano. Desse modo, historicamente os sujeitos que vivenciam
situações de pauperização, sobretudo negros(as), mulheres, imigrantes, LGBTs e outras
minorias sociais que vem sendo expelidos para áreas periféricas, empurrados para as franjas
das cidades e obrigados a se virar sem o suporte do Estado.
A pandemia do novo coronavírus, além de escancarar as desigualdades existentes
provocadas pelo próprio sistema de produção, tamm as agudiza, resultando nãona morte
de milhares de vidas brasileiras, mas na ampliação da pobreza, da miséria, do desemprego e da
precarização das condições de vida dos trabalhadores. Felizmente, desse cerio tamm tem
brotado esperanças como movimentos de mulheres, de negros, movimento dos trabalhadores
por aplicativos, movimentos de bairros, associações de moradores, entre outros, que tem se
organizado politicamente e se mobilizado nas comunidades em ações de solidariedade de classe
na luta contra o vírus e contra a fome.
Como afirma Antunes (2020: 22), “A questão crucial imediata dessa era das trevas é a
preservação da vida”. Portanto, é urgente colocar como pauta fundamental na agenda de lutas
da classe trabalhadora, a construção de uma nova ordem societária, sem exploração e opressão
de classe, etnia e gênero, pois não há possibilidades de desfecho positivo pós pandemia diante
da manutenção da sociabilidade do capital.
Referências:
ANTUNES, Ricardo. Coronavírus: o trabalho sob fogo cruzado. 1 ed. São Paulo: Boitempo,
2020.
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________. Ministério da Saúde. Disponível em: <https://www.gov.br/pt-
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dez. 2020.
________. DECRETO 10.316, DE 7 DE ABRIL DE 2020, que regulamenta o auxílio
emergencial de que trata o art. da Lei 13.982, de 2 de abril de 2020. Disponível em: <
https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/decreto-n-10.316-de-7-de-abril-de-2020-251562799>
Acesso em: 10 dez 2020.
________. Emenda Constitucional nº 109, de 15 de março de 2021. Institui novo ajuste fiscal.
Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc/emc109.htm> Acesso
em: 29 de mar 2021.
________. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.039, DE 18 DE MARÇO DE 2021. Institui o Auxílio
Emergencial 2021 para o enfrentamento da emerncia de saúde pública de importância
internacional decorrente do coronavírus (covid-19). Disponível em: <
https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/medida-provisoria-n-1.039-de-18-de-marco-de-2021-
309292254#:~:text=Art.%201%C2%BA%20Fica%20institu%C3%ADdo%20o,abril%20d
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