DOI 10.34019/1980-8518.2023.v23.40576  
Expropriação em tempos de capitalismo: o  
trabalho reprodutivo e o impacto na vida das  
mulheres  
Expropriation in times of capitalism: reproductive work and the impact on  
women's lives  
Priscilla Brandão de Medeiros*  
Resumo: O artigo apresenta o debate acerca das  
marcas da expropriação na vida das mulheres  
em tempos de capitalismo, colocando como  
central o prisma histórico da submissão do  
trabalho feminino, entendido mediante uma  
análise feminista marxista, como fundamental  
na geração do valor. Metodologicamente,  
caracteriza-se como um estudo bibliográfico,  
ancorado pelo materialismo histórico-dialético,  
por entender que aparência – por mais  
importante que seja no desvelamento dos  
fenômenos – não traduz a essência do real.  
Conclui-se que o capitalismo, juntamente com o  
patriarcado e o racismo, sustentam um pilar  
Abstract: The article presents the debate about  
the marks of expropriation in women's lives in  
times of capitalism, placing as central the  
historical prism of the submission of female  
work, understood through a Marxist feminist  
analysis, as fundamental in the generation of  
value. Methodologically, it is characterized as a  
bibliographical study, anchored by historical-  
dialectical materialism, for understanding that  
appearance – however important it may be in  
unveiling phenomena – does not translate the  
essence of reality. It is concluded that  
capitalism, together with patriarchy and racism,  
support an intertwined pillar of oppression,  
exploitation, domination and precariousness  
that plague women's lives, since they have in  
reproductive work, which is performed free of  
charge by women - in its majority -, and treated  
as something innate to female existence and  
alien to capital, is fundamental for the condition  
of maintenance and subsistence of the main  
commodity that generates capital: the  
workforce.  
imbricado  
de  
opressões,  
explorações,  
dominações e precarizações que assolam a vida  
das mulheres, uma vez que tem no trabalho  
reprodutivo, o qual é realizado gratuitamente  
pelas mulheres – em sua maioria –, e tratado  
como algo inato a existência feminina e alheio  
ao capital, é fundamental para a condição de  
manutenção  
e
subsistência da principal  
mercadoria que gera o capital: a força de  
trabalho.  
Palavras-chaves:  
Trabalho  
reprodutivo;  
Keywords: Reproductive work; Capitalism;  
Capitalismo; Mulheres.  
Women.  
Recebido em: 14/03/2023  
Aprovado em: 18/05/2023  
*
Bacharela em Serviço Social pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). Especialista em  
Docência no Ensino Superior pela Universidade Potiguar (UNP) e em Gestão Pública da Organização em Saúde  
pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Mestra em Serviço Social e Direitos Sociais pela Universidade  
Estadual da Paraíba (UEPB). Doutoranda pelo PPGSS/UFRN. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2183-6141  
Revista Libertas, Juiz de Fora, v. 23, n.1, p. 205-227, jan./jun. 2023. ISSN 1980-8518  
Priscilla Brandão de Medeiros  
Introdução  
A história das mulheres é atravessada por um construto de invisibilidades e  
naturalizações. De um lado, há relações que fincam a submissão e a secundarização do trabalho  
feminino não remunerado; de outro, há a invisibilidade quanto ao reconhecimento delas como  
sujeitos de direitos.  
Com o advento do capitalismo e as várias formas de expropriação da existência  
humana, as mulheres foram também apropriadas e expropriadas material, política e  
socialmente, uma vez que, apoiado no patriarcado, que é secular, o capitalismo utilizou do  
binômio dominação/exploração e intensificou a opressão de classe, gênero e, com o racismo,  
de raça dentro da classe trabalhadora.  
O trabalho reprodutivo – aqui compreendido como as esferas do cuidado, a sustentação  
emocional cobrada às mulheres, as atividades domésticas, a procriação e a criação –, o qual não  
é remunerado, tornou-se parte do cotidiano das mulheres como sendo uma atribuição  
naturalizada socialmente e como estratégia direta do capital e, por isso é visto como não  
trabalho, sendo tratado como “função social das mulheres”, portanto, sem valorização.  
É importante apresentar que não há a produção do valor na realização do referido  
trabalho, mas há diretamente uma relação quando as mulheres contribuem para a reprodução  
da parcela da força de trabalho que estão inseridas nos espaços produtivos, o que coloca a  
importância de aprofundar os estudos acerca da reprodução social realizada por estas como  
parte fundamental na geração desse valor e de sua valorização.  
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Diante disso, o presente artigo tem como proposta discorrer e analisar, criticamente,  
sob os aspectos que afetam a vida das mulheres a partir do contexto da expropriação da vida e  
utilização da sua condição de gênero, classe e raça para ser responsabilizada pela reprodução  
humana – e na sociabilidade vigente é a responsável pela reprodução da mercadoria mais  
especial para o engendro do capital.  
Como percurso metodológico, esse estudo apresenta uma direção de análise qualitativa  
de cunho bibliográfico, guiada pelo método do materialismo histórico dialético, por  
compreender que a aparência da realidade – um aspecto fundamental para desvelamento dos  
fenômenos – não apresenta os determinantes que a traduzem, sendo, portanto, necessário  
investigar e compreender a essência enquanto totalidade crítica.  
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Expropriação em tempos de capitalismo: o trabalho reprodutivo e o impacto na vida das mulheres  
Por fim, ressaltamos a relevância social desse artigo por compreender o realce na  
discussão acerca da expropriação da vida das mulheres e o lugar que o trabalho reprodutivo  
assume como estratégia direta de manutenção do capitalismo, patriarcado e racismo, podendo  
oferecer uma reflexão social crítica – marxista. Academicamente, a relevância se dá no sentido  
da potencialização dos estudos feministas marxistas, de modo a impulsionar a importância  
desses para o despertar da construção do projeto societário de emancipação humana,  
coadunando com a direção social hegemonicamente assumida pelo Serviço Social.  
O capitalismo e seus elementos predatórios: as marcas da expropriação da vida da  
classe trabalhadora  
O processo de expropriação do tempo e da vida dos(as) trabalhadores(as) é inerente ao  
contexto de industrialização no capitalismo. Fontes (2018) aponta que expropriação é a  
transformação de tudo aquilo que traduz os meios de vida em capital. Ou seja, é o ocultamento  
das necessidades, desejos e afetos humanos em detrimento dos interesses do capital, uma vez  
que essa é base da relação social que sustenta o capitalismo.  
Tal fundamentação indica a amputação que tal modo de produção conduz quando as  
possibilidades de existência da humanidade, o que reflete diretamente na forma de vida e na  
própria organização política da classe trabalhadora.  
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Para corroborar com a direção crítica, é importante entender, inicialmente, o que é  
expropriação a partir do entendimento de Marx ([1867] 2017, p. 786). Segundo ele é:  
O processo que cria a relação capitalista não pode ser senão o processo de  
separação entre o trabalhador e a propriedade das condições de realização de  
seu trabalho, processo que, por um lado, transforma em capital os meios  
sociais de subsistência e de produção e, por outro, converte os produtores  
diretos em trabalhadores assalariados.  
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Ou seja, o ato de expropriar – e que no capitalismo isso ocorre efetivamente – se dá  
pela separação dos indivíduos de tudo que coaduna com as condições sociais que geram a  
produção e reprodução da vida, o que não acontece passivamente – assim como nada nesse  
modo de produção. É um processo com traços violentos e ilegítimos, os quais impactam  
diretamente na vida individual e coletiva das pessoas, das sociedades. Sobre isso, Fontes (2018,  
p. 19) traz que “o nascimento histórico e concreto do capitalismo resulta em enormes violências  
e poreja sangue”.  
Portanto, falar sobre a categoria expropriação remete-nos a perceber a centralidade  
atual que ela possui quando se vivencia tempos de perplexa instalação da barbárie e da  
descartabilidade humana, colocando os interesses econômicos/materiais como protagonistas  
diante de qualquer condição de existência. Isso fica claro quando Marx apresenta que na  
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condição do trabalho assalariado os seres humanos são reduzidos a trabalhadores(as), sem que  
sejam vistos(as) como dotados(as) de subjetividades além das necessidades mínimas e  
biológicas que garantam manterem-se vivos(as).  
Contudo, aos retirar as pessoas das suas propriedades de terra e usurpar-lhes os  
instrumentos de trabalho, o capitalismo os(as) conduz a venda da força de trabalho como sendo  
a única possibilidade de garantir a sobrevivência diante dessa sociabilidade. Tudo em prol do  
lucro e da geração exponencial da riqueza, a qual não é socialmente compartilhada.  
N’O Capital ([1867] 2017) Marx vai destacar alguns processos que exemplificam as  
brutais formas de violências sofridas pela população no que é, por ele, tratado como período da  
Acumulação Primitiva. O autor enfatiza como o capital – enquanto relação social –, para  
manter-se, precisa da existência dos(as) trabalhadores(as) e, por isso, toma-os(as) como posse  
e faz da sua força de trabalho a única mercadoria que, nas relações de trabalho, mediante sua  
venda, possibilitem sua manutenção. E de forma ainda mais esdrúxula, gera um exército de  
reserva que o serve, quando tem milhares de trabalhadores(as) buscando vender sua força de  
trabalho, uma vez que não há como acoplar todos(as), sendo essa a raiz que estrutura as relações  
capitalistas, dada a geração da mais valia e o barateamento da força de trabalho em sua relação  
de venda nesse sistema.  
A expropriação, é importante destacar, não é uma discussão que assume recortes  
“somente” com vieses pretéritos, pelo contrário. Na contemporaneidade ela se intensifica e se  
mantém tão presente dentro das relações capitalistas como qualquer outro traço caracterizador  
dessa sociabilidade, todavia, salienta-se, com aspectos mais devastadores. Mota e Tavares  
(2016) apontam aspectos advindos do neoliberalismo que evidenciam de modo concreto os  
traços da expropriação nos tempos presentes. As autoras,  
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os processos de privatização, mercantilização e as supressões de direitos  
sociais e trabalhistas são expressões dessas expropriações contemporâneas,  
revelando-se como o principal meio de utilização da reprodução capitalista.  
(MOTA; TAVARES, 2016, p. 235).  
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Para que não se perca a totalidade da discussão, faz-se necessário percorrer  
historicamente o processo de acumulação do capital, buscando compreender a expropriação, e  
para isso, faz-se imperativo analisar tais nuances.  
Sobre isso, Marx ([1867] 2017) vai tratar das relações de trabalho mediante o  
assalariamento do proletariado, de modo que a expropriação se fundará mediante a efetivação  
do contrato social (contrat social) do tipo original no período de formação das colônias.  
Contudo, é importante destacar que nas colônias ainda se vislumbrava um processo  
que não coaduna, efetivamente, com a separação entre o trabalhador e suas condições de  
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trabalho, “entre ele e sua raiz, a terra [...]”, como aponta Marx ([1867] 2017, p. 838). Ou seja,  
ainda havia traços de uma relação baseada na indústria doméstica rural.  
Daí cabe refletir: onde perceber os entornos perversos do capitalismo?  
Para essa resposta, parafraseamos Marx ([1867] 2017, p. 839) ao tratar da metáfora da  
beleza do capital:  
A grande beleza da produção capitalista consiste em que ela não só reproduz  
constantemente o assalariado como o assalariado, mas, em relação à  
acumulação do capital, produz sempre uma superpopulação relativa de  
assalariados [...] Mas nas colônias essa bela fantasia se faz em pedaços.  
Isso se justifica pelo processo de transformação dos assalariados em camponês ou  
artesão independente, o que finda numa relação de exploração mais contundente, que evidencia  
que o capital não se abstrai dessa relação.  
Assim, a tendência histórica da acumulação primitiva conduz a transformação direta  
de escravizados e servos – quando vistos os cenários históricos da escravidão e do feudalismo  
– em trabalhadores assalariados que perdem sua condição de liberdade – antes também  
apropriada a partir das relações de escravatura e servidão – só que de modo ainda mais perverso  
quando tem a expropriação concreta dos meios de subsistência, a qual repousa sob a exploração  
do trabalho alheio.  
Ou seja, é a constituição da propriedade privada dos meios de vida, o que, aponta  
Marx, é a antítese da propriedade social e coletiva, que não há condições de ser efetivada em  
tempos de capitalismo, pois o que era socialmente apropriado e compartilhado passa agora a  
ser de posse de pequeno grupo que expropria outros, a partir de um vandalismo cruel das  
relações de vida.  
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Assim, e de forma articulada a tudo que esse modo de produção faz, acresce a  
expropriação dos proprietários privados, apontado por Marx como a nova forma de  
expropriação, pois haverá a liquidez dos pequenos pelos grandes capitalistas, a partir do jogo  
das leis imanentes da produção, mediante a centralização dos capitais.  
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Com isso, vemos a lógica destrutiva e acirrada que o capitalismo impõe, restando à  
manutenção somente dos supercapitalistas, numa raiz de aguçamento também da exploração,  
opressão e precarização dos moldes de vida daqueles que a eles se sobrepõe por uma única  
necessidade: sobreviver!  
Assim, percebemos o desenvolvimento da força cooperativa do processo de trabalho  
em escala cada vez maior e avassaladora no tocante a geração de miséria, pobreza e subtração  
das formas de existência.  
Com a diminuição constante do número de magnatas do capital, que usurpam  
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e monopolizam todas as vantagens desse processo de transformação, aumenta  
a massa da miséria, opressão, servidão, degeneração, exploração [...]. sob a  
hora da derradeira da propriedade privada capitalista, os expropriadores serão  
expropriados. (MARX, [1867] 2017, p. 187).  
Com isso, é notório que o cercamento das terras e a usurpação dos meios de produção,  
consequentemente, dos meios de vida – aqui no entendimento da garantia da sobrevivência –  
marcam a instalação da propriedade privada e das formas originárias da expropriação, como  
aponta Fontes (2018).  
A subsunção real do trabalho direciona a forma de realização do trabalho não mais  
para a satisfação humana, mas para atendimento, primeiro, das necessidades do capital.  
O processo de mercadorização da força de trabalho, portanto, é o ponto de partida para  
a elevação máxima que o capitalismo gera quanto a privação dos meios de produção e dos  
produtos do trabalho humano, uma vez que “o capital só surge quando o possuidor de meios de  
produção e de meios de subsistência encontra no mercado o[a] trabalhador [trabalhadora] livre  
como vendedor[a] de sua força de trabalho [...]” (MARX, [1867] 2017, p. 245).  
O enfoque acerca desse recorte faz-se acompanhar por uma divisão social do trabalho,  
a qual marca a separação e distinção entre o valor de uso e valor de troca – categoria central no  
modo de produção capitalista – dos produtos fruto da relação de trabalho no referido modo.  
Para Marx ([1867] 2017) o processo de geração do valor da força de trabalho é  
determinado pelo tempo de trabalho necessário para a produção, assim como acontece com  
todas as mercadorias na sociabilidade capitalista, porém, há que se destacar que mesmo sendo  
uma mercadoria, há um aspecto essencial que nos diferencia de qualquer outra: a capacidade  
racional e teleológica. Essa mercadoria especial, como assim ele também trata, exige sua  
criação, procriação e reprodução social. O(a) trabalhador(a) precisa manter-se vivo(a) para  
atender os interesses de compra de sua força de trabalho.  
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Marx também observa que a lei da oferta e a da procura governa a produção  
dos homens, tanto quanto a de qualquer outra mercadoria, e que o trabalhador  
como ‘capital vivo’ é uma forma especial mercadoria que tem a infelicidade  
de ser um capital ‘carente’. Mas, como resultado da lei da oferta e da procura,  
‘suas propriedades humanas o são apenas na medida em que o são para o  
capital, que lhe é estranho’. Isso significa que as necessidades humanas só  
podem ser satisfeitas até o limite em que contribuem para a acumulação de  
riqueza. (MÉSZÁROS, 2006, p. 133 – 134).  
Sobre isso, Saffoti (2013) traz que “o trabalhador não mais produz diretamente para  
seu consumo, mas produz artigos cuja existência independe de suas necessidades enquanto  
produtor singular” (SAFFIOTI, 2013, p. 54), ou seja, o(a) trabalhador(a) vende sua força de  
trabalho para obter, nessa relação, as condições que gerem o atendimento a sua sobrevivência  
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– e aqui no sentido do atendimento biológico, uma vez que o capital nega essa condição de  
atendimento genérico – e, consequentemente, ainda produz o que é estranho a si e, por vezes,  
às suas necessidades.  
O estranhamento produzido na relação de trabalho capitalista cimenta a separação  
brutal entre o(a) trabalhador(a) e suas satisfações enquanto ser humano social e genérico, o que  
coloca como a mais perversa forma de coisificação humana em detrimento do mundo das coisas  
– que geram valor – produzindo uma liberdade falseada.  
Dessa forma, sendo o trabalho o momento que gera o privilégio da práxis, por sintetizar  
as relações entre os homens [e as mulheres] com a natureza, relação essa a qual se baseia  
unicamente para o atendimento de suas necessidades individuais e coletivas, o que também  
desperta as relações entre os próprios homens, se constitui como a via de excelência através da  
qual se procede o desvelamento da verdadeira posição que as categorias históricas ocupam na  
totalidade dialética na sociedade capitalista e das respectivas relações que elas mantêm entre si  
e com o todo social no qual se inserem.  
Assim, a partir desse fundamento, compreende-se que o alijamento dos(as)  
trabalhadores(as) de todas as suas escolhas privadas, passam agora a uma administração do que  
o processo de produção impõe no sentido de que o(a) trabalhador(a) não se perceba como gente,  
mas como coisa. E tudo o que é reflexo da condição social das pessoas é tido como “natural”  
nessa sociabilidade capitalista. A pobreza, por exemplo, é tida como condição natural e divina  
– uma vez que vale destacar a apropriação dos aspectos abstratos espirituais como forma de  
concretizar esse processo – e por uma consequência do não esforço individual do(a)  
trabalhador(a).  
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A propriedade do capital apresenta-se aos seres sociais como natural, eterna,  
necessidade econômica primeira, forma histórica indeclinável e potência  
exterior à qual precisam dobrar-se para assegurar sua subsistência. A  
propriedade do capital recobre e reatualiza todas as formas precedentes de  
propriedade, as defende de maneira nominal (juridicamente), enquanto as  
devasta em permanência. (FONTES, 2018, p. 43).  
Ou seja, as expropriações geram violências diretas ao próprio reconhecimento crítico  
da capacidade de existência, o que impacta, e é estratégico, na consciência de classe. Acerca  
disso, Fontes (2018) traz que “o latégo do capital” se abate quando há jornada de trabalho e em  
sua ausência, o que se evidencia como uma relação de cercamento da condição legítima de  
sobrevivência na ordem ditada pelo capital.  
Tal complexidade mostra o influxo do capital, quando a própria dinâmica social  
esmaga o conjunto dos(as) trabalhadores(as) e o conjunto social de suas vidas, reduzindo  
também a natureza aos seus ditames. Isso nos leva a crer como a propriedade do capital é  
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dinâmica, expropriadora.  
Dessa forma, é entendido que a expropriação é a base social que legitima a relação do  
capital, com suas relações devastadoras e que assolam todo o tecido individual e coletivo de  
modo atemporal.  
Sendo que, na contemporaneidade, esse processo se intensifica mediante a lógica  
imperialista do capitalismo, a qual reitera as bases de extração do valor a partir do trabalho e  
agora de forma mais intensificada, uma vez que os bancos e os juros são a base central.  
Esse chamado atual a capitalização, a partir da forma investimento e do  
empreendedorismo popular, desconsiderando as relações estruturais que regem a dinâmica do  
capital – sendo transcorrida como bases ilusórias de resistência da classe trabalhadora – fixam  
um aguçamento da alienação e da exploração e precarização.  
Com isso, a população pobre é a mais afetada através do incentivo aos microcréditos  
e todas as vias de endividamento, principalmente da moradia. O Estado Social – que também é  
mínimo para o social, consequentemente, para as políticas públicas –, por sua vez, e também  
como aliado direto aos interesses do capital, sucateia o conjunto das políticas sociais,  
principalmente as de Seguridade Social (previdência social, saúde e assistência social), de  
forma a alimentar o chamado a vinculação privada como sendo a mais eficaz das vias, e ainda,  
impulsionando o discurso de ausência de recursos para destinação a tais políticas. Ou seja, o  
que é direito social e investimento público, se passifica diante da falácia da responsabilização  
social.  
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As necessidades vitais são novamente tomadas pelo capitalismo sob o prisma de um  
Estado que “não pode” se responsabilizar com a proteção social, dado o discurso da crise –  
quando na verdade há um direcionamento de quase 50% do PIB para amortização dos juros da  
dívida pública, reduzindo e retirando sempre das parcelas do financiamento da saúde e  
educação, principalmente –, e com isso, tem-se uma classe trabalhadora que trabalha mais, que  
ganha menos e que agora precisa financiar o acesso às políticas sociais por necessidade direta,  
como é o caso da educação, saúde e moradia.  
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Nesse contexto, assim como tudo no capitalismo, há uma apropriação da força de  
trabalho também das mulheres, as quais têm suas condições de vida perversamente abaladas  
em solos capitalistas, uma vez que a divisão sócio – sexual e racial do trabalho se intensifica  
ainda mais em tempos de crises.  
Subordinadas ao domínio da propriedade do capital, as atividades do cuidado e da  
reprodução da vida, enquanto atividades expropriadas contemporaneamente, as mesmas tendem  
a converte-se em relação mediada pelo capital. Corroboramos com Fontes (2018, p. 58) ao tratar  
Revista Libertas, Juiz de Fora, v. 23, n.1, p. 205-227, jan./jun. 2023. ISSN 1980-8518  
Expropriação em tempos de capitalismo: o trabalho reprodutivo e o impacto na vida das mulheres  
que “a industrialização do cuidado e da reprodução não viria para emancipar as mulheres, mas  
para submetê-las ao capital”.  
Diante disso, o ponto a seguir discorrerá, criticamente, acerca de como as mulheres,  
mediante as relações fruto de uma sociabilidade capitalista – patriarcal – racista – sexista tem  
suas vidas expropriadas pela punção real do capital sobre suas vidas e sua força de trabalho.  
Do privado ao público somos expropriadas: analisando os reflexos do capitalismo  
– racismo – patriarcado na vida das mulheres  
Iniciamos do ponto de vista que o entendimento da divisão sócio – sexual e racial do  
trabalho, e sua consequente superação, é uma das pautas fundamentais para o feminismo  
marxista. Partimos da compreensão que há uma divisão do trabalho em dois tipos: o produtivo  
e o reprodutivo, sem que sejam tratados de modo separado, mas dialeticamente intrínsecos. Nós  
mulheres não produzimos valor na realização do trabalho doméstico não remunerado, por  
exemplo, mas estamos diretamente ligadas quando contribuímos para a reprodução social e  
humana da parcela da força de trabalho – majoritariamente masculina – que estão nos espaços  
produtivos. E quando estamos vendendo nossa força de trabalho, na condição de assalariadas,  
a vinculação se dá maciçamente nas profissões voltadas ao campo da reprodução social.  
Contrariamente, os espaços de produção estão vinculados aos homens, o que evidencia um  
recorte sexista na produção/geração do valor.  
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Sobre a emblemática discussão acerca da inserção das mulheres nos espaços  
produtivos, Federici (2021) traz que tal inserção nunca liberou as mulheres da responsabilização  
do trabalho doméstico – e acrescentamos do trabalho reprodutivo – pelo contrário, houve a  
intensificação da jornada de trabalho feminina e, como discorre a autora citada “significou  
menos tempo e energia para a luta” (FEDERICI, 2021, p. 30).  
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É notório que historicamente essa dicotomia na ocupação das esferas produtiva e  
reprodutiva constituiu fator importante para a submissão da mulher e a hierarquização das  
ocupações e funções destinados a ambas os sexos.  
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[...] a divisão entre esfera produtiva e reprodutiva fortaleceu a hierarquia e a  
desigualdade entre homens e mulheres. A esfera produtiva é a da valorização,  
da produção da riqueza e, portanto, é tida como um espaço privilegiadamente  
masculino. A esfera da reprodução social – aqui entendida como as atividades  
necessárias para garantir a manutenção e reprodução da força de trabalho -, é  
considerada um espaço feminino. (CISNE, 2014, p. 88).  
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É sob essa reflexão que Saffioti (2004) chama a atenção – com a qual concordamos –  
de perceber os contornos sociais numa perspectiva histórica, e acrescenta-se de totalidade.  
Defendemos que as transformações socioeconômicas e políticas têm influência notória no  
Revista Libertas, Juiz de Fora, v. 23, n.1, p. 205-227, jan./jun. 2023. ISSN 1980-8518  
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desencadear das relações sociais, já que o capital se apropria de tais como forma de intensificar  
seus interesses a partir das determinações do que vem a ser do homem e o que vem a ser mulher  
mediante uma força de hierarquização e separação. Por isso, torna-se indissociável pensar as  
relações de classe, gênero e raça de modo isolado.  
[a] divisão social do trabalho tem dois princípios organizadores: o princípio  
de separação (existem trabalhos de homens e trabalhos de mulheres) e o  
princípio de hierarquização (um trabalho de homem “vale” mais do que um  
trabalho de mulher). (KERGOAT, 2003, p. 01).  
Por mais que na realização do trabalho reprodutivo às mulheres não produzam uma  
mercadoria, sem as atividades ligadas a reprodução social não haveria a produção social, uma  
vez que o Estado se ausenta de prestar esse atendimento – aqui compreendido como proteção  
social –, como ainda, se apropria das construções patriarcais, sexistas, classistas e raciais para  
fincar o lugar que as mulheres devem assumir.  
Assim, quanto mais o Estado omite a criação de políticas públicas para atender as  
necessidades da esfera reprodutiva, mais oneroso isso se torna para as mulheres, pois se não há  
investimento na saúde pública, são as mulheres que estão se responsabilizando pelos cuidados,  
se não há educação integral, são as mulheres que educam e etc. Portanto, cria-se a naturalização  
que o trabalho reprodutivo é uma função social incumbida às mulheres e, por isso,  
desconsiderado como trabalho.  
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Ou seja, como apresenta Saffioti (2013), as mulheres nascem e crescem sob o prisma  
da “ideologia do outro”, por sermos vistas como as que servem para servir ao outro, não sendo  
tratadas como detentoras de desejos e vontades alheias a isso.  
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Dessa forma, precisamos ampliar o olhar crítico para compreensão que a casa (o lar),  
a esfera privada, não é um lugar neutro para pensar o trabalho e suas formas de explorações,  
opressões e dominações, ou seja, as “três formas canônicas” como aponta Kergoat (2010, p.  
95). É preciso fomentar essa perspectiva política de entender as nuances que atravessam o  
cotidiano das mulheres mediante a destinação de responsáveis pela reprodução social.  
Parafraseamos Federici (2021, p. 56) quando a mesma indaga: “onde as mulheres  
podem ser mais produtivas: na linha de montagem ou na linha de produção de bebês?”. Ela faz  
esse questionamento crítico justamente para despertar as amarras do capital no tocante a  
compreensão que o capital precisa das mulheres enquanto corpos de procriação, reprodução e  
manutenção de força de trabalho, como também, quando inseridas na esfera produtiva, tê-las  
como força de trabalho barata.  
Os estudos de algumas economistas feministas, como Antonopoulos (2008) e  
Razavi (2007), mostraram como essa “economia invisível”, formada por  
atividades laborais de cuidados, não remuneradas – como a preparação de  
Revista Libertas, Juiz de Fora, v. 23, n.1, p. 205-227, jan./jun. 2023. ISSN 1980-8518  
Expropriação em tempos de capitalismo: o trabalho reprodutivo e o impacto na vida das mulheres  
alimentos, o cuidado de crianças, doentes e população idosa, as atividades de  
limpeza do lar, entre outras –, desempenha um papel fundamental na  
reprodução da força de trabalho e possibilita o crescimento econômico dos  
países, representando uma espécie de “subsídio” às economias nacionais. Um  
“subsídio” que se ergue contra as próprias mulheres que realizam esse  
trabalho, impedindo-as de ampliar suas capacidades, alcançar sua autonomia  
econômica e exercer outros direitos. (BARAJAS, 2016, p. 24).  
Historicamente – porém uma história, em parte, ocultada – as mulheres assumem  
espaços e se protagonizam nas lutas e militâncias denunciando o racismo, o capitalismo, o  
patriarcado, a partir de uma construção coletiva feminista.  
Corroboramos com Kergoat (2010, p. 100) ao defender a consubstancialidade das  
categorias gênero, raça e classe, entendendo-as como um nó imbricado, como também defende  
Saffioti, pois “é o entrecruzamento dinâmico e complexo do conjunto de relações sociais, cada  
uma imprimindo sua marca nas outras, ajustando-se às outras e construindo-se de maneira  
recíproca” que faz perceber a totalidade, entendendo e enxergando os intercruzamentos e  
interpenetrações que formam o “nó”. A percepção defendida pela autora se traduz no  
rompimento da compreensão mecanicista das relações sociais, o que afeta consubstancialmente  
a totalidade social, pois ao considerar as análises com prismas geométricos, ou seja, fincadas  
sob a lógica da intersecção, adição, por exemplo, perde-se as determinações que engendram as  
referidas categorias enquanto parte de um plano real do cotidiano sob uma perspectiva  
materialista.  
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O casamento (ou contrato social) e a maternidade são os catalizadores para o  
aprisionamento da mulher, uma vez que, além de corresponderem aos interesses da família  
burguesa e do capitalismo, direcionam o destino das mulheres como únicos ao atendimento  
desses vínculos. É como se nossa existência estivesse (esteja, pois ainda vigora essa forma  
histórica cisheteropatriarcal) condicionada, como atributo de felicidade, ao matrimônio e a  
maternidade. Todavia, o que se busca, de fato, é exatamente tornar nós mulheres como  
verdadeiras “fábricas sociais” (FEDERICI, 2021) da reprodução da força de trabalho.  
A origem dessa divisão sócio sexual foi fortemente influenciada a partir do surgimento  
da família monogâmica – isso ocorre na transição para as sociedades de classes – a primeira  
estratégia é o rompimento da perspectiva coletiva pela busca da sobrevivência. Com as  
sociedades de classes, o individualismo é gerado e apregoado entre os sujeitos contrariando a  
coletividade. A colaboração “perde” lugar para a concorrência.  
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Para Gama (2014, p. 47), o cuidado é concebido “como uma atividade feminina  
geralmente não remunerada, sem reconhecimento nem valorização social”. E isso será ainda  
mais evidenciado com a constituição do modelo de família monogâmica.  
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Priscilla Brandão de Medeiros  
Vale ainda considerar que com a entrada massiva da mulher no mundo do trabalho  
produtivo – mais precisamente em meados de 1970 – ocorreu a transferência da atribuição das  
atividades domésticas para outras mulheres. Mostrando então, que o trabalho doméstico  
continua, hegemonicamente, como encargo feminino. Tal constatação é evidenciada no que traz  
Sorj (2004) quando faz uma análise da marca cultural que as mulheres carregam no tocante a  
responsabilização com a família. Em pesquisa realizada para analisar como se dava a divisão  
sexual do trabalho na esfera doméstica, a autora apresenta que:  
[...] em 96% dos domicílios pesquisados, a principal responsável pelas tarefas  
domésticas era uma mulher. Além disso, quando outra pessoa participava das  
responsabilidades pelo trabalho doméstico, em 49% dos casos tratava-se  
também de uma mulher. (SORJ, 2004, p. 112).  
E ainda sob essa análise, recai o viés de raça e classe, uma vez que a mulher que  
ocupará a função do cuidado doméstico do lar de outrem será, na sua maioria, a mulher negra  
e pobre. É importante frisar, que mais recentemente, principalmente no Brasil, esse trabalho  
doméstico realizado por essa outra mulher tem um caráter de trabalho visibilizado, uma vez que  
será remunerado e passa a constituir a lógica do mercado. Mas, o que é importante ser destacado  
é a continuidade da realização do trabalho doméstico apenas por mulheres. A delegação do  
trabalho doméstico de uma mulher para outra.  
E mais, quando há uma comparação da divisão das tarefas domésticas entre homens e  
mulheres, os dados comprovam que permanece como sendo da mulher a responsabilidade pela  
sua execução, mesmo que os homens, minimamente, se incluam nestas. Para evidenciar esse  
aspecto, segundo Cisne (2014, p. 84 - 85), com base em uma pesquisa realizada pelo PNAD –  
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e  
Estatística – em 2011, é evidente que continua mínima a participação masculina na realização  
das tarefas domésticas quando comparada com os dados de 2001. Salientando que, segundo  
Pinheiro (2016), até 2001 não havia a mensuração estatística do tempo de uso na realização de  
atividades domésticas e de cuidado entre homens e mulheres pela PNAD e IBGE. Foram  
inseridas nesse ano, mas ainda sem o teor teórico político das discussões de gênero, todavia, já  
se considera como um ganho, uma vez que instigou os movimentos sociais – feminista  
especialmente – a pensar e fomentar pesquisas e debates acerca das políticas públicas voltadas  
ao campo da reprodução social. Ou seja, é um indicador nitidamente recente, o que evidencia,  
em parte, os muitos limites em tratar esse debate como questão de política de Estado.  
Para além dessa organização social do trabalho, os indivíduos se veem imersos em  
uma divisão do trabalho que agrega condicionantes, como o gênero, raça e classe. A partir de  
determinado momento histórico, se configura uma fragmentação das tarefas para homens e  
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Expropriação em tempos de capitalismo: o trabalho reprodutivo e o impacto na vida das mulheres  
mulheres, constituindo-se, assim, a divisão sexual do trabalho.  
Nogueira (2006) vai analisar ainda que é na família que ocorrem as primeiras  
manifestações da divisão social e sexual do trabalho. Onde ela irá afirmar, calcado em Marx e  
Engels (1997), que a mulher e os(as) filhos(as), dentro do núcleo familiar, são encarados com  
“escravos” do homem, esposo e pai, respectivamente.  
Então, o espaço privado foi destinado às mulheres e, socialmente, isso passou a ser  
visto com o algo naturalizado. Foi na família que as mulheres vivenciaram suas primeiras  
formas de submissão. Na família monogâmica, constituída e oriunda junto às sociedades de  
classes, couberam as mulheres o papel de procriação, cuidado com o lar e filhos(as). Ou seja,  
“a divisão do trabalho na família havia sido a base para a distribuição da propriedade entre o  
homem e a mulher” (ENGELS, 2012, p. 203-204).  
Para compreender os ditames que perpassam a opressão feminina quanto a divisão  
sexual do trabalho “a família [torna-se] uma importante chave para o entendimento histórico da  
exploração e opressão sobre as mulheres” (CISNE, 2014, p. 81). É nela que se fixam as bases  
tidas como naturais da submissão e precarização do trabalho da mulher.  
Na verdade, o lugar da mulher sempre tinha sido em casa, mas durante a era  
pré-industrial a própria economia centrava-se na casa e nas terras cultiváveis  
ao seu redor. Enquanto os homens lavravam o solo (frequentemente com a  
ajuda da esposa), as mulheres eram manufatoras, fazendo tecidos, roupas,  
velas, sabão e praticamente tudo o que era necessário para a família. O lugar  
das mulheres era mesmo em casa – mas não apenas porque elas pariam e  
criavam as crianças ou porque atendiam às necessidades do marido. Elas eram  
trabalhadoras produtivas no contexto da economia doméstica, e seu trabalho  
não era menos respeitado do que o de seus companheiros. (DAVIS, 2016, p.  
52).  
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Assim, percebe-se que a família, mesmo diante dos inúmeros avanços políticos, sociais  
acerca dessa instituição, continua como elemento importante para a reprodução do capital e das  
bases para sua apropriação, ou como diz Cisne (2014, p. 84) “é um modo de circulação e de  
consumação de bens e serviços baseados na exploração da mulher”.  
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Ou seja, é nesse espaço que se torna evidente o processo de (in)visibilização do  
trabalho realizado pelas mulheres, sendo este tido e tratado, historicamente como natural a elas.  
O aspecto mais importante da família na manutenção do domínio do capital  
sobre a sociedade é a perpetuação – e a internalização – do sistema de valores  
profundamente iníquo, que não permite contestar a autoridade do capital [...].  
(MÉSZÁROS, 2011, p. 271).  
Ao longo das sociedades, as relações de gênero construídas foram determinando as  
tarefas, deveres e profissões para homens e mulheres, determinando, portanto, a divisão sexual  
do trabalho. As mulheres sempre trabalharam, porém, na maioria das sociedades, elas trabalham  
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