DOI 10.34019/1980-8518.2020.v20.30867
Revista Libertas, Juiz de
Fora, v.
20
, n.
1
, p.
276
291
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jun
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ISSN 1980
8518
Entrevista com Susana Cazzaniga
ENTREVISTADORAS:
Carina Berta Moljo
Faculdade de Serviço Social - UFJF
Katia Marro
Faculdade de Serviço Social - UFF\Rio das Ostras
Maria Lúcia Duriguetto
Faculdade de Serviço Social - UFJF
Entrevista realizada a Susana Cazzaniga (Professora da Universidade Nacional de Entre
Rios, Argentina). Atualmente, a Professora está aposentada mas continua ministrando Cursos
de Pós-Graduação em diversas Universidades da Argentina e da América do Sul. Entre suas
publicações podemos destacar: Intervención profesional: legitimidades en debate org (2006)
Ed Espacio, Buenos Aires, Argentina; Hilos y nudos. La formación, la intervención y lo político
en el Trabajo Social (2007) ed. Espacio, Buenos Aires, Argentina.; Derechos, políticas sociales
y problemáticas contemporáneas. Debates desde Trabajo Social org. (2014) Ed EDUNER,
Entre Rios, Argentina.
A entrevista foi realizada em agosto de 2019 no Programa de Pós-graduação em Serviço
Social da Faculdade de Serviço Social da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) pelas
docentes Carina Berta Moljo e Maria Lúcia Duriguetto (Professoras da Faculdade de Serviço
Social da UFJF) e Katia Marro (Professora do curso de Serviço Social da Universidade Federal
Fluminense Campus Universitário de Rio das Ostras). As docentes são, respectivamente,
membros dos subgrupos de pesquisa A Reconceituação na Argentina” e A relação do Serviço
Social com os movimentos e lutas sociais no Chile e na Argentina, no período de 1960-1980”,
que compõem o Projeto de Pesquisa “O Movimento de Reconceituação do Serviço Social na
América Latina (Argentina, Brasil, Chile e Colômbia): determinantes históricos, interlocuções
internacionais e memória”, coordenado pelas Professoras Marilda Vilella Iamamoto
(Professora Visitante da Faculdade de Serviço Social da UFJF) e Claudia Mônica dos Santos
(Professora Convidada do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Serviço Social da
UFJF).
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Entrevista
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Entrevista com Susana Cazzaniga
Revista Libertas, Juiz de Fora, v.
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Na Argentina, a conturbada conjuntura que se delineia a partir dos anos 1960 ao golpe
civil-militar de 1976 é marcada por uma intensificação das lutas e do crescimento das
organizações das classes subalternas que vão impactar a configuração dos regimes políticos e,
por mediações acadêmicas e de militância política, os processos de tensionamento do Serviço
Social com seus aportes teórico-metodológicos e ético-políticos conservadores.
O crescimento das lutas de classe se relaciona não apenas com a “resistência Peronista”
(principal expressão política da classe trabalhadora, que cresce com a proscrição do Peronismo
desde o ano 1955), mas também com a radicalização de uma “nova” classe trabalhadora. Esta
dará vida a um novo e combatente movimento operário e sindical (com tendências classistas e
do Peronismo combativo), que protagonizará rebeliões populares de envergadura como o
Cordobazo e o Rosariazo, de 1969, que marcariam uma inédita aproximação das organizações
operárias com o movimento estudantil. Neste período, observa-se também a multiplicação de
uma miríade de organizações que vão encorpar a militância das classes subalternas sob os
influxos de uma nova esquerda que reivindica o guevarismo; o socialismo de libertação
nacional; o anti-imperialismo, etc. Dentre as principais organizações armadas devemos destacar
os Montoneros
1
, de filiação peronista, e PRT-ERP, de filiação marxista
2
. Especificamente no
interior do movimento Peronista e em função das relações contraditórias com o seu líder, Perón,
assiste-se a uma diversificação organizativa que atravessa a realidade partidária, o movimento
estudantil, os movimentos territoriais e os sindicais. A chamada “tendência revolucionaria do
movimento Peronista” compreendia desde os Montoneros ao conjunto de organizações como a
Juventude Universitária Peronista (JUP); a Juventude Trabalhadora Peronista (JTP); a União de
Estudantes Secundários (UES); a Agrupação Evita; o Movimento de Inquilinos Peronistas
(MIP), dentre outros.
A dinâmica desta configuração organizativa dos “de baixo” vai impactar profundamente
o Serviço Social argentino, cujo vínculo de seus segmentos profissionais, acadêmicos e
estudantis com as lutas sociais se estabelecerá pela via privilegiada da militância política e/ou
universitária, que trará mudanças significativas nos referenciais teórico-políticos, na formação
1
Outras organizações armadas, como as Forças Armadas Revolucionarias (FAR) e as Forças Armadas Peronistas
(FAP), confluirão com Montoneros em ’73.
2
O PRT (Partido Revolucionário dos Trabalhadores) será fundado em 1965, incorporando-se à IV Internacional.
Identificado com o processo revolucionário de Cuba, com influências indoamericanistas e antimperialistas,
incorpora um marxismo com uma perspectiva latino-americanista e uma forte herança guevarista. No seu processo
de desenvolvimento, observam-se mudanças prático-políticas (também em função das influencias maoístas,
trostskistas e leninistas), como a fundação, em 1970, do seu braço armado, o Exército Revolucionário do Povo
(ERP).