Avaliação de um processo de implementação de práticas de prevenção ao uso de risco de álcool entre agentes comunitários de saúde

Evaluation of a process of implementation of techniques of prevention of the harmful use of alcohol in communitarian health agents

Telmo Mota Ronzani[1]

Priscila Montianéle de Castro[2]

Maria Lucia Oliveira de Souza Formigoni[3]

Resumo

O presente artigo tem por objetivo avaliar o processo de implementação de práticas de triagem para o uso de risco de álcool (AUDIT), associado a uma técnica de Intervenção Breve (IB) entre Agentes Comunitários de Saúde (ACS) para detectar os fatores que dificultaram ou não essa implementação. O AUDIT mede o padrão de uso de álcool de forma rápida. As IB preparam para a mudança de comportamento de uso de substâncias psicoativas. Participaram do estudo 63 ACS das Equipes de Saúde da Família dos municípios de Juiz de Fora - MG e Rio Pomba- MG. O processo foi avaliado por métodos quantitativo (questionários, aplicados antes do treinamento e após) e qualitativo (grupo focal, após o treinamento). Os resultados encontrados foram, de modo geral, mudanças positivas com relação à percepção das práticas de prevenção ao uso de risco de álcool. Constatou-se que o treinamento contribuiu para uma melhora no conhecimento objetivo sobre o tema, minimização da percepção de obstáculos para a realização da IB, melhora na auto-avaliação de preparo para realização da triagem e da IB e melhores expectativas e crenças em relação aos resultados da IB. Entretanto, foram detectadas dificuldades para implementação efetiva dessas rotinas, como resistências quanto à possibilidade de o trabalho de equipe funcionar e crenças negativas com relação ao usuário.

Abstract

The aim of this study was the process evaluation of screening (AUDIT) techniques’ implementation for alcohol harmful use, associated with a Brief Intervention (BI) session among the Communitarian Health Agents (CHA). Our main objective was to detect the factors that cause difficulties or not on this implementation. The AUDIT measures the standard of alcohol use in a quick way. The BI prepares the person to the behavioral changes about psychoactive substances’ use. 63 CHA of Family Health Teams participated in the study. They were from the cities of Juiz de Fora and Rio Pomba. The process was evaluated by quantitative methods (questionnaires, applied before and after the training) and qualitative (focal group, after the training). The results were, in general, positive changes in the CHA’s perception of preventive practices about alcohol harmful use. There was evidence that the training contributed to the improvement their knowledge about the theme, minimization of obstacles’ perception to accomplish the BI, improvement of the self-evaluation to do the screening and the BI, and better expectances about the results of BI. However, there were difficulties on the effective implementation of these routines, like the resistance to work as a team and negative beliefs related to the user.

Introdução

Um dos principais problemas de saúde pública é o uso abusivo de álcool. O uso de álcool gera custos econômicos e é uma substância capaz de gerar sérios danos tanto orgânicos quanto psíquicos e sociais. No Brasil álcool é a droga mais consumida pela população (CARLINI et al., 2002), tendo custos econômicos altíssimos (MELONI; LARANJEIRA, 2004) e os maiores índices de problemas decorrentes do uso (LARANJEIRA; ROMANO, 2004). Cerca de 20% a 40% dos pacientes internados em hospitais gerais apresentam problemas relacionados ao uso de álcool. Além disso, estima-se que cerca de 5% das mortes entre 15 e 29 anos, em todo o mundo, estejam relacionadas ao uso excessivo de álcool (FOXCROFT et al., 2003).

Estudos realizados em outros países indicam uma significativa prevalência de uso pesado de álcool em pacientes da Atenção Primária à Saúde (APS): cerca de 50% entre os homens e 40% entre as mulheres que freqüentam tais serviços (AALTO et al., 1999). Por tais razões, torna-se evidente a necessidade de ações de prevenção secundária para uso disfuncional de bebidas alcoólicas na APS (ANDREASSON; HJAMARSSON; REHNMAN, 2000; BABOR et al., 2003).

Algumas ferramentas e técnicas de triagem já estão sendo estudadas e utilizadas em todo mundo. Uma estratégia que tem mostrado bons resultados em termos de eficiência é a utilização do instrumento AUDIT (Alcohol Use Disorder Identification Test) associado a técnicas de Intervenção Breve (IB). O AUDIT é um instrumento de auto-retrato, composto de dez perguntas, desenvolvido para identificar vários padrões de uso de álcool, de fácil aplicação e correção e com validação transcultural. As IB são técnicas baseadas nos princípios da Entrevista Motivacional, cujo objetivo é a preparação para a mudança de comportamento de uso de substâncias psicoativas (MILLER; ROLLNICK, 2001; MARQUES; FURTADO, 2004). Elas são estratégias terapêuticas simples, acessíveis, que podem ser utilizadas por diferentes profissionais de saúde, e despendem tempo relativamente curto para aplicação, podendo ser únicas ou com até cinco sessões, com duração entre 15 e 60 minutos (RONZANI, 2005). A utilização do AUDIT associado à IB pode ser uma estratégia de prevenção útil e eficiente para a sua implantação na APS, uma vez que o AUDIT possibilita uma aproximação inicial e permite um retorno objetivo para o paciente, introduzindo os procedimentos da IB e a motivação para mudança de comportamento (BABOR et al., 2001).

Apesar da eficiência, adequação e aparente facilidade para a implantação de rotinas de rastreamento e IB, observa-se que existem várias dificuldades para sua implementação como atividade de rotina nos serviços de APS. Alguns estudos detectaram falta de engajamento dos profissionais de saúde, decorrente de atitudes negativas sobre a possibilidade de melhora dos pacientes em relação ao problema com o álcool. A crença sobre um determinado fenômeno influencia diretamente o comportamento dos indivíduos e sua forma de agir em relação a tal (BECK et al., 1993; KRUGHER, 1995).

Como já demonstrado em estudos anteriores, quando os profissionais possuem atitudes positivas em relação ao usuário de álcool, sentem-se mais preparados tecnicamente para utilizar a intervenção breve (AALTO; PEKURI; SEPPA, 2001; BENDTSEN; AKERLIND, 1999; ROCHE et al., 1995). Estratégias de mudança de atitudes, conhecimento e habilidades dos profissionais podem ser importantes na implementação de ações preventivas do uso abusivo de álcool, devendo ser contempladas nos programas de capacitação. Portanto, o treinamento de profissionais de APS deve ser pragmático e enfocar a mudança de atitudes em relação ao usuário de álcool (BABOR et al., 2001; ALLEN; REINERT; VOLK, 2001; LOCK et al., 2002).

Na dinâmica das equipes de saúde, o Agente Comunitário de Saúde (ACS) desempenha papéis que, embora muito relevantes, nem sempre são adequadamente valorizados pelos demais membros da equipe. O senso comum — conhecimento por excelência do ACS — é colocado num patamar de importância inferior. Isto provavelmente decorre do fato de que tradicionalmente as equipes de saúde se organizavam com uma clara hierarquia vertical, na qual o médico era colocado no ápice. Com o advento do Programa de Saúde da Família, houve uma mudança teórica neste paradigma, mas a sua implementação na prática ainda deixa a desejar. Muitos profissionais de saúde ainda adotam uma linguagem tecnificada e distante da população em geral (RONZANI, 2002; SOUZA, 2001).

Observa-se também significativa influência do modelo de atendimento tradicional no menor foco dado às atividades de prevenção do que às terapêuticas e intervencionistas. O “paradigma preventivo”, apesar de ser amplamente discutido, raramente é colocado em prática nos serviços de saúde (ANDREASSON; HJAMARSSON; REHNMAN, 2000; AALTO; PEKURI; SEPPA, 2001; BENDTSEN; AKERLIND, 1999; ROCHE et al., 1995). Mesmo nesse contexto, o perfil do ACS pode ser considerado um facilitador da introdução de várias práticas de promoção e prevenção à saúde, pois atuam como multiplicadores de conhecimento através da aproximação entre a comunidade e o serviço de saúde. Treinados de forma adequada, os ACS podem sistematizar e organizar o trabalho de prevenção ao uso nocivo de álcool, conseguindo uma boa abrangência e resolutividade nesse trabalho (RONZANI, 2005).

Um dos fatores que limitam a ação dos ACS é o acesso a tecnologias específicas. Alguns instrumentos disponíveis muitas vezes são utilizados como meros instrumentos burocráticos, estáticos e pouco efetivos. O treinamento de ACS no uso de instrumentos para detecção do uso abusivo de álcool associado a uma Intervenção Breve pode, potencialmente, ser fundamental na disseminação desta prática.

Nos últimos anos, a Organização Mundial de Saúde (OMS) tem incentivado a disseminação de rotinas de rastreamento e intervenção breve em serviços de APS em todo o mundo (BABOR et al., 2001). Encontra-se em desenvolvimento um estudo multicêntrico que tem por objetivos avaliar a efetividade de um modelo de prevenção secundária ao uso de risco do álcool; a viabilidade de sua implantação em grande escala nos sistemas de saúde e a efetividade de um treinamento teórico-prático na mudança de crenças e atitudes de profissionais que atuam em serviços de APS, em relação aos usuários que freqüentam tais serviços.

Baseado nesse projeto, o objetivo do presente estudo foi avaliar o processo de implementação de práticas de triagem para o uso abusivo de álcool (AUDIT), associado a uma técnica de Intervenção Breve entre Agentes Comunitários de Saúde (ACS).

Metodologia

Participaram inicialmente do estudo 63 ACS das Equipes de Saúde da Família dos municípios de Juiz de Fora- MG e Rio Pomba- MG. O critério de participação na pesquisa foi intencional, uma vez que foram convidados a participar os ACS pertencentes a equipes nas quais outros profissionais (médicos, enfermeiros ou auxiliares de enfermagem) já haviam sido treinados em ocasião anterior. Aderiram à pesquisa 52 ACS, 82,5% dos treinados, sendo o critério de adesão ter respondido aos questionários aplicados após o treinamento. A média de idade destes participantes foi de 38,13 anos, sendo que 48,1% dos participantes possuíam 2º grau completo e 90,4% eram mulheres.

O projeto geral foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo e aprovado (0145/2003). Todos os participantes do estudo assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido antes de se iniciar o processo de pesquisa.

O treinamento oferecido aos ACS foi dado dentro de seu ambiente de trabalho e foi desenvolvido em 8 horas. O método de treinamento compreendeu aulas dinâmicas com recursos audiovisuais, nas quais foram fornecidas informações teóricas sobre epidemiologia, aspectos biológicos, psicológicos e sociais a respeito dos efeitos decorrentes do uso de álcool, critérios de classificação dos padrões de uso, instrumentos diagnósticos e de triagem, importância da prevenção ao uso abusivo de álcool na APS e aplicação do AUDIT e da IB na rotina do atendimento. O conteúdo a respeito de atitudes e crenças sobre a etiologia do uso abusivo de álcool e a forma como a sociedade trata o assunto foi abordado através de perguntas diretas a cerca das crenças comuns sobre o assunto.

Após o Treinamento

Os ACS recebiam um conjunto de folhetos explicativos de fácil leitura para ser distribuído aos pacientes como instrumento de iniciar uma abordagem e para conscientização dos pacientes.

Com o objetivo de supervisionar as práticas de rastreamento e IB, após o treinamento, acadêmicos do curso de Psicologia da Universidade Federal de Juiz de Fora acompanharam, diretamente, os serviços de UBS, as ações de prevenção realizadas pelos ACS semanalmente durante dois meses. Para a avaliação do impacto do modelo proposto, foram utilizados três questionários aplicados antes do treinamento (pré-treinamento) e reaplicados entre quatro e seis semanas após o treinamento (pós-treinamento).

Procedimentos Metodológicos

O presente trabalho se caracterizou por utilizar dois tipos de metodologia científica (qualitativa e quantitativa) de acordo com os objetivos de investigação. O processo de coleta de dados qualitativos da implementação foi realizado por meio da técnica dos Grupos Focais (MINAYO, 2000).

Os instrumentos desenvolvidos e adaptados pelos pesquisadores coordenadores do projeto multicêntrico internacional foram apresentados numa linguagem coloquial para facilitar o entendimento dos ACS. Os profissionais responderam a três questionários de auto-aplicação: 1) Questionário de Avaliação do Profissional – continha 62 questões, subdivididas em sete escalas: prática profissional (quatro questões); preparo para realização da IB (dez questões); expectativas e crenças sobre a efetividade da IB (14 questões); obstáculos para realização da IB (oito questões); expectativas e crenças sobre a efetividade da triagem (nove questões); auto-avaliação de preparo para realização da triagem (dez questões); obstáculos para realização da triagem (sete questões). As proposições continham alternativas de respostas que variavam de “concordo totalmente” a “discordo totalmente” (às quais eram atribuídas pontuações de 5 a 1, respectivamente - tipo Likert); 2) Questionário de Prontidão para Mudança, com questões que permitiam classificar o estágio de prontidão dos ACS para realizar a Triagem em conjunto com IB em: a) Pré-contemplação (grau mínimo ou ausência de prontidão), b) Contemplação (grau moderado de prontidão, caracterizado por ambivalência entre reconhecimento da importância e falta de ação), c) Ação (estágio mais avançado de prontidão, autopercepção de capacidade adequada para realizar a TIB); 3) Questionário de conhecimentos específicos, que continha questões técnicas sobre o uso de risco de álcool. Para facilitar a comparação entre as escalas, os escores foram transformados em valores percentuais do escore máximo possível em cada escala.

O grupo focal seguiu um roteiro de entrevista, para fins de sistematização das informações. Foi realizado um único encontro, para cada grupo com duração de 90 minutos, entre dez a doze meses após o treinamento. Participaram dos grupos os ACS e dois pesquisadores (estudantes de psicologia), um pesquisador atuou como mediador do grupo e outro como observador. Toda a coleta das informações foi sistematizada pela anotação dos relatos dos participantes e pela gravação do encontro (em cassete e VHS). Posteriormente foi realizada a transcrição e organização dos relatos para posterior análise pela técnica de análise de conteúdo.

Os temas abordados foram: Descrição da população atendida; Execução do projeto na prática dos ACS; Obstáculos para aplicabilidade; Estratégias usadas ou propostas para superar os obstáculos; Benefícios do Treinamento; Informações recebidas sobre prevenção; Pontos Fortes; Dificuldades; Aprendizagem; Formas de reestruturação do projeto; Adequação do modelo à rotina dos serviços; Dificuldades de implantação da proposta na rotina do trabalho; Disseminação do modelo para outros serviços; Crenças sobre o alcoolismo na população atendida; e Crenças a respeito de o trabalho depender de outros.

As análises quantitativas realizadas sobre as variáveis estudadas foram descritivas (média, desvio-padrão e freqüência) e inferenciais. Para comparação das médias das escalas, antes do treinamento e após, foi utilizado o teste “t” de Student pareado, obedecendo aos mesmos pressupostos de normalidade e homogeneidade de variância. Para avaliar mudanças na Escala de Prontidão para Mudança, antes do treinamento e após, foi utilizado o teste McNemar. Estabeleceu-se o nível de significância mínimo de 5% (p < 0,05) para as comparações realizadas.

Para realização da análise qualitativa, foi utilizada a técnica tradicional de Análise de Conteúdo do tipo temática e estrutural (BARDIN, 1977). Primeiramente, foram selecionadas algumas temáticas consideradas relevantes para a obtenção de informações sobre o tema de estudo. Posteriormente foi realizada uma organização de toda a informação a partir do conteúdo expresso nas entrevistas em categorias que qualificassem a informação coletada (BARDIN, 1977).

Os temas investigados foram: descrição da população atendida, execução do projeto na prática dos ACS, obstáculos para aplicabilidade, estratégias usadas ou propostas para superar os obstáculos, benefícios do treinamento, informações recebidas sobre prevenção, pontos fortes, dificuldades, aprendizagem, formas de reestruturação do projeto, adequação do modelo à rotina dos serviços, dificuldades de implantação da proposta na rotina do trabalho, disseminação do modelo para outros serviços, crenças sobre o alcoolismo na população atendida, crenças a respeito de o trabalho depender de outros. Toda a categorização das respostas foi realizada independentemente por dois pesquisadores que posteriormente compararam as classificações até que fosse atingido um consenso quanto à categorização do conteúdo dos relatos.

O projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (0145/02) e á Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP 7484) e foi aprovado. Todos os profissionais assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido para a participação na pesquisa.

Resultados

Resultados das análises quantitativas

O gráfico 1 ilustra os resultados obtidos na aplicação das escalas, antes do treinamento e após. Segundo o questionário de Conhecimento Objetivo houve um aumento significativo do conhecimento sobre prevenção ao uso nocivo de álcool após o treinamento (de 19 ± 13% no pré-treinamento para 32 ± 16% no pós-treinamento, p< 0,001).Entretanto, na escala de expectativas e crenças sobre a efetividade da triagem, não foram detectadas diferenças estatisticamente significativas após o treinamento. De modo semelhante, os resultados obtidos na escala de prontidão para mudança revelaram que a maioria dos ACS se encontrava no estágio de “contemplação” (57%) tanto antes do treinamento como após. O treinamento não aumentou significativamente na proporção dos ACS na fase de “ação” (de 36% para 38%). Na escala de Prática Profissional, verificou-se que, antes do treinamento, os ACS realizavam poucas ações de detecção precoce ou intervenção junto aos usuários de álcool como parte de sua rotina (44 ± 9%), mantendo-se em níveis semelhantes após o treinamento (45 ± 8%). Também não foi significativa a menor percepção de obstáculos para realização da triagem após o treinamento.

Na escala auto-avaliação de preparo para a triagem, os ACS se sentiram mais preparados para realizar a triagem na rotina após o treinamento, tendo sido observado um aumento estatisticamente significante (59 ± 11% no pré-treinamento e 64 ± 14% após o treinamento, p= 0,012). Também em relação às expectativas e crenças sobre a efetividade da IB, houve um aumento significativo ao se comparar os escores pré (56 ± 6%) e pós-treinamento (57 ± 5% do escore máximo possível), p= 0,046.

Em relação à escala de obstáculos para realização da IB, após o treinamento, foi verificada uma mudança positiva, ou seja, os ACS perceberam significativamente menos obstáculos para a realização da IB (38 ± 11% no pré, e 33 ± 11% no pós-treinamento, p= 0,001). Quanto à auto-avaliação de preparo para realização da IB, verificou-se mudança positiva, após o treinamento, ou seja, os ACS passaram a se sentir mais preparados para a realização da IB (57 ± 7% no pré, e 61 ± 6% no pós-treinamento, p= 0,000).

Embora o índice de desistências tenha sido baixo (17%), foi realizada a comparação entre as médias das escalas (pré-treinamento) dos profissionais que responderam e não responderam ao questionário no pós-treinamento. O objetivo de tal comparação foi verificar se alguma característica anterior (crenças mais negativas) teria influenciado a não-reposta ao pós-treinamento. Em nenhuma comparação realizada, foi verificada diferença estatisticamente significativa entre os dois grupos. Assim, podemos inferir que o motivo da desistência dos não-respondentes não está relacionado a uma atitude “pessimista” quanto ao modelo proposto.

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Gráfico 1: Porcentagem do escore máximo possível nas avaliações das escalas de crenças e atitudes dos ACS em relação às práticas de prevenção ao uso de risco de álcool, antes do treinamento e após (média + desvio padrão). PPA (Prática Professional); PIBA: (Auto-avaliação de preparo com relação à IB); EIBA (Expectativas e crenças com relação à efetividade da IB); PTA (Auto-avaliação de preparo com relação à Triagem); ETA (Expectativas e crenças com relação à efetividade da Triagem); OIBA (Obstáculos com relação à IB); OTA (Obstáculos com relação à Triagem); CObj (Conhecimento Objetivo); Estágios de Prontidão Para Mudança (Ação: Fase de Ação, Cont: Fase de Contemplação, Pré-cont: Fase de Pré-contemplação).

# difere do próprio desempenho antes do treinamento (p< 0,05, teste T de Student Pareado)

Resultados das análises qualitativas

Percepção dos ACS sobre o perfil de uso da população atendida: a partir das entrevistas e anotações dos cadernos de campo, pudemos detectar que a impressão subjetiva de alguns ACS quanto ao padrão de uso de álcool é que existiria uma polarização da população atendida, ou seja, de um lado estariam os “dependentes” e de outro os abstêmios. Exemplo de relato de um ACS: “... só tem aqueles que bebem mesmo e aqueles que não bebem nada. Mas a maioria usa muito. Desde novo”. Outro grupo de ACS considera a dependência um fator importante a ser trabalhado, embora, segundo eles, a maioria seja caracterizada por “bebedores de fim de semana”.

Execução do projeto na prática dos ACS

O Quadro 1 apresenta os principais subtemas detectados pela técnica de análise de conteúdo dentro do tema: execução do projeto na prática dos ACS. Sobre a aplicação do AUDIT, a maioria dos ACS disse não estar utilizando o instrumento, por acreditar que a população estaria se sentindo invadida ou que os usuários mentiriam nas respostas. Além disso, alguns ACS só aplicaram o AUDIT quando percebiam que a pessoa fazia uso pesado de álcool, enquanto que outros, ao contrário, não aplicaram quando percebiam que a pessoa se encontrava naquela circunstância. O fato de que a aplicação não era um procedimento “obrigatório” também influenciou a taxa de aplicação, como pudemos observar no seguinte relato: “(...) Na prática, não tem como funcionar. Sabe por quê? Porque não é uma coisa que está implantada pra gente fazer, não é uma coisa obrigatória. (...) Mas é muito complicado, sabe, de trabalhar. Porque é um tabu. Porque, por mais que a gente esteja no século XXI, ainda é um tabu (...)”. Os ACS também se dividem quanto à perspectiva que têm em relação à prática do projeto. Alguns já percebem alguma mudança no comportamento da população atendida, no sentido de diminuição do uso ou abstinência. Outros relatam estar fazendo intervenções quando conhecem a pessoa e sabem que apresenta algum problema evidente, sem, contudo, realizar a triagem com o AUDIT. De outro lado, estão aqueles que não acreditam que o projeto possa funcionar na prática por sentirem a necessidade de mais experiência antes da execução e por depender de uma iniciativa do próprio paciente.

SUBTEMAS

CATEGORIAS

A) Perspectivas negativas sobre a prática:

Não acredita que o projeto possa funcionar na prática;

Depende de a pessoa querer se ajudar;

Pouca experiência prática para fazer o trabalho.

B) Perspectivas positivas sobre a prática:

Aplicação da proposta (aconselhamento, informações e outros);

Levou a certa mudança no padrão da população.

C) Sobre o AUDIT:

Usuários não gostam de responder ao AUDIT (sentem-se invadidos);

Não aplicou o AUDIT quando sabia que a pessoa fazia uso excessivo de álcool;

Aplicou o AUDIT somente quando sabia que a pessoa fazia uso excessivo de álcool;

As pessoas mentem na hora de responder ao AUDIT.

Quadro 1: Tema 1 - Execução do Projeto

Obstáculos para a aplicabilidade: No Quadro 2, estão apresentadas as subcategorias referentes aos obstáculos para aplicabilidade, que foram classificadas em: obstáculos externos (condições de trabalho no PSF), obstáculos internos (visão que os ACS têm dos usuários e do uso de álcool) e obstáculos com relação à aplicabilidade prática da proposta apresentada (visão crítica da aplicação em condições reais). Todos os obstáculos parecem estar associados a problemas quanto ao entendimento de qual devia ser a população-alvo da intervenção (usuários de risco x dependentes) e qual o objetivo do projeto.

SUBTEMAS

CATEGORIAS

A) Obstáculos internos:

Desânimo do ACS;

Falta integração da equipe para executar o projeto;

Muita demanda da equipe por outras questões (álcool visto como problema apenas social).

B) Obstáculos externos:

Desconfiança das pessoas sobre o motivo da triagem (tabu, invasão, discriminação, obrigação e outros);

A relação de proximidade (serem vizinhos) não é algo favorável;

O ser humano (resistências);

O próprio álcool;

Os bebedores excessivos não vão ao posto.

C) Obstáculos com relação à proposta:

Falta resolutividade na proposta apresentada;

Dificuldade em encontrar algo que sensibilize o usuário, um incentivo para tomada de atitude.

Quadro 2: Tema 2 - Obstáculos para aplicabilidade

Estratégias usadas ou propostas para superar os obstáculos: O Quadro 3 apresenta as subcategorias referentes a estratégias para superação dos obstáculos. As estratégias citadas, quando se referindo ao próprio serviço, foram, em parte, uma adaptação do treinamento com a realidade e, em parte, desconsiderando os aspectos propostos no treinamento (a triagem com o AUDIT e a utilização da IB). Outras propostas citadas foram referentes a outros níveis de atuação, incluindo desde trabalhos educativos fora do PSF e questões de política nacional (Ex: “Mudar o país, mudar em muita coisa. (...) Porque é uma coisa nacional, cultural.”) até estratégias como encaminhamento para reuniões de grupos de auto-ajuda como alcoólicos anônimos (AA) ou grupos religiosos. Isto sugere que eles estavam mais preocupados com os casos de pessoas com dependência de álcool do que com as de uso de risco.

SUBTEMAS

CATEGORIAS

A) Estratégias referentes a outro nível de trabalho:

Pessoas especializadas trabalhando no PSF;

Um trabalho integrado da lei com a educação;

Dar uma nova cultura às pessoas;

Religião;

AA (Alcoólicos Anônimos).

B) Estratégias referentes ao trabalho do PSF:

A forma de falar/ abordar/ convencer a pessoa;

Ganhar a confiança da pessoa (inicialmente, sem o questionário);

Através da família;

Trabalhar com todos (independente do padrão de uso);

Superar os próprios receios;

Trabalhar com o adolescente;

Trabalhar a auto-estima da pessoa;

Através de palestras.

C) Nenhuma (tem que partir da própria pessoa)

Quadro 3: - Tema 3: Estratégias usadas ou propostas para superar os obstáculos

Benefícios do treinamento destacados foram: a identificação do padrão de uso de álcool (sendo que consideraram mais importante a identificação do alcoolismo), conhecimento e forma de abordagem.

Informações recebidas sobre prevenção: de modo geral, os ACS as consideraram adequadas, propiciadoras de conhecimento (que deveriam ser repassadas); incentivadoras da abordagem da população atendida (Ex: “Deu pra gente ter uma abertura de chegar e falar.”); e facilitadoras da percepção das diferentes situações de uso do álcool.

Pontos Fortes: destacados pelos ACS foram: possuir um instrumento para triagem - o AUDIT; a forma de introduzir o assunto ao paciente; a identificação dos diferentes níveis de uso de álcool; o conhecimento proporcionado através do treinamento; a explicação sobre as doenças e conseqüências do abuso de álcool, ou seja, a proposta foi considerada adequada.

Dificuldades: referentes à equipe (falta de integração), referentes ao próprio trabalho (dificuldades de o ACS agir de modo preventivo, tanto na ação sobre o uso de álcool, quanto nos diversos outros trabalhos) – Ex: “(...) A gente, assim, não tem capacidade de resolver,(...) eu particularmente, não resolvo.” – e referentes ao projeto (descrença nos limites do beber normal, doses-padrão para cada tipo de pessoa e pouco suporte e supervisão por parte da equipe do projeto).

Aprendizagem: quanto ao conteúdo aprendido, as opiniões se dividiram entre aqueles que apontaram algo específico do treinamento como relevante (modos de abordagem, a necessidade do questionário, as conseqüências do abuso de álcool no organismo e quantidades de doses-padrão por pessoa) e aqueles que confundiram suas próprias crenças como sendo conteúdo do treinamento (ex: “Não beba.”, “Evite o contato com o álcool.”, “E uma coisa que não ficou bem definida é o limite.”, “É a gente ajudar o alcoólatra.”).

Formas de reestruturação do projeto: algumas das propostas de reestruturação do projeto mais citadas se pautaram em ações que não dependem deles, ou seja, transferindo as responsabilidades a outros (psicólogos no PSF ou voluntários, supervisores especialistas ou a própria implementação pelo Ministério da Saúde, tornando o projeto de caráter obrigatório).

Outras propostas não dizem respeito à reestruturação do projeto, mas a uma adaptação do mesmo à realidade que cada ACS vivencia (trabalho com adolescentes e com aqueles que ainda não bebem).

Adequação do modelo à rotina dos serviços: Os ACS conseguiram associar a realidade vivenciada com o modelo proposto, embora ainda tivessem certa resistência em usar o AUDIT. Ex: “Eu acho que a gente poderia estar fazendo o que a gente já faz. Sensibilizando, explicando, contando, mostrando exemplos. Que a gente vem fazendo desde o início do nosso trabalho”, ou “Quando eu vou na casa de alguém, que eu vejo que a pessoa está hipertensa, está precisando tomar uma medicação e eu sei que a pessoa bebe, eu falo: ‘você não pode mais beber, porque você é doente, você tem que tomar a medicação, você está com isso, com isso e com isso’.”, ou ainda “A gente faz a intervenção dentro da realidade da família ... A gente já faz o papel muitas vezes.”

Dificuldades de implantação da proposta na rotina do trabalho: Alguns citaram medo e desânimo como as principais dificuldades para implementar a proposta na rotina de trabalho, enquanto que outros acreditavam não ter dificuldades (embora não estejam dando continuidade ao projeto).

Disseminação do modelo para outros serviços: os ACS sugeriram que o treinamento fosse realizado para outras equipes de PSF do município e em outros níveis de atenção à saúde em todo o Brasil. Além disso, foi sugerida a ampliação das ações para outros setores como empresas, escolas e igrejas. Dentre as razões porque achavam importante essa disseminação, destacou-se a crença de que outras pessoas também gostariam de obter as informações que lhes foram transmitidas. Outra razão foi a própria expansão do projeto. Quanto às formas de disseminação, destacaram-se dois tipos de propostas: através de prevenção e educação (grupos de adolescentes, teatro, novos treinamentos e “conversa”); e através da mídia (divulgação do projeto e propagandas que levam à conscientização).

Crenças sobre o alcoolismo na população atendida: apesar de o treinamento ter sido a respeito da prevenção do uso abusivo e da educação para o uso de álcool com moderação, os ACS, em vários momentos, falaram sobre o alcoolismo, ora como se o foco do projeto fosse esse, ora como se devesse ser (Ex: “Foi um treinamento muito bom, (...) tivemos certeza do que é o alcoolismo e do que não é, e de ter que tomar mais cuidado pra beber. Quando a gente entra pra fazer uma visita, a gente já sabe que uma pessoa é alcoólatra, em que grau que ele está, se vai virar um alcoólatra rápido ou se bebe só por beber”). No caso do trabalho dos ACS com o alcoólatra, as crenças nem sempre são de sentido afirmativo, uma vez que identificam o problema, acreditam que esteja sob sua responsabilidade, mas não se sentem capazes de fazer esse trabalho. Outras crenças sobre o alcoolismo também foram citadas: tabu, “doença” (de um modo pejorativo), origem social e mudança através da religião e do AA. Isso nos mostra que as crenças dos ACS sobre o alcoolismo ainda são mais fortes que a consciência preventiva.

Crenças a respeito de o trabalho depender de outros: em muitos momentos, os ACS mencionaram que o trabalho deles dependia de outros profissionais da equipe, principalmente dos médicos e dos psicólogos. Isto sugere tentativa de transferência de responsabilidade para outro profissional da equipe ou uma necessidade de maior integração da equipe. De modo geral, eles esperavam que a iniciativa partisse do médico, que é visto como “o chefe” da equipe. Em outras manifestações, mencionaram a necessidade de um especialista de fora da equipe (por exemplo, um psicólogo) que pudesse trazer consigo a solução dos problemas. Ou seja, as crenças que os ACS mencionaram a respeito de seu próprio trabalho, da figura do médico, do psicólogo e de outros profissionais se mostraram muito ligadas à hierarquização do serviço. Além disso, a presença de estagiários de Psicologia durante as várias fases da pesquisa, inclusive como mediadores dos grupos focais, pode ter sido um viés sobre o fato de mencionarem a necessidade de um psicólogo nas equipes de PSF.

Discussão

Esperava-se que o treinamento dos ACS favorecesse a diminuição das resistências geradas por atitudes e crenças negativas a respeito dos usuários de álcool atendidos e uma reflexão sobre o próprio uso; propiciasse parâmetros para identificação inicial e de risco e incentivasse o desenvolvimento de ações preventivas. Observou-se que o treinamento ministrado aos ACS contribuiu para uma melhora no conhecimento objetivo sobre o tema, minimização da percepção de obstáculos para a realização da IB, melhora na auto-avaliação de preparo e melhores expectativas e crenças em relação aos resultados da IB. Apesar de não se terem sido detectadas diferenças significativas nos resultados das escalas, vale ressaltar que houve uma tendência positiva à mudança de atitudes em relação à prática da triagem e da IB na rotina de trabalho. Observamos que em todas as escalas ocorreram mudanças positivas, embora muitas vezes não significativas.

Os resultados encontrados se assemelham aos obtidos em um estudo realizado com outros profissionais das equipes do PSF de Juiz de Fora (RONZANI, 2005). Embora ainda sejam encontradas algumas resistências ao trabalho e crenças negativas com relação ao usuário, foi observada uma boa efetividade do treinamento quanto ao conhecimento sobre problemas associados ao uso de álcool em curto intervalo de tempo. Assim, as dificuldades e resistências encontradas estão relacionadas à efetivação de uma prática de maneira mais formal e sistematizada.

O problema da efetivação formal do trabalho pode estar relacionado à falta de organização dos serviços e sistemas de saúde e ao contexto cultural desfavorável às ações de prevenção, de uma forma geral. A dificuldade de efetivação e barreiras para realização de práticas de prevenção foram discutidas por Ronzani (2005) e Babor et al. (2001) de forma semelhante ao presente trabalho. Segundo os autores e nossas observações, os ACS (assim como os outros profissionais de APS) encontravam-se insatisfeitos com a política salarial, precariedade das condições de trabalho, a organização do sistema de saúde e com a falta de resolutividade dos níveis secundários e terciários. Tais dificuldades por si só geram problemas de efetivação de um modelo que é visto como uma ação isolada.

Os ACS desenvolveram ações com relação à triagem e à IB, associando a realidade ao modelo proposto: de acordo com a realidade das famílias, através de eventos envolvendo toda a comunidade e focando o tipo de população atendida (ex: adolescentes, gestantes, hipertensos, idosos). A proposição de algumas ações para melhorar a eficácia do projeto, como facilitar o acesso a especialistas para supervisões; implantação como política de saúde; ampliação para outros focos de atenção (escolas, saúde e entidades filantrópicas) e utilização da mídia (com propagandas e contrapropagandas para divulgação do projeto e para levar à conscientização) sugere que houve sensibilização para a importância do tema.

A análise qualitativa indica que houve acréscimo do reconhecimento da importância de ações preventivas sobre o uso de álcool, mesmo algum tempo após o treinamento. Tal fato pode contribuir para que, em curto e médio prazo, o objetivo de melhor efetividade possa ser alcançado com êxito.

Conclusão

Ao se falar em prevenção e educação para um padrão de uso sem risco, encontramos, por diversas vezes, o problema do alcoolismo. Ainda hoje é difícil para a população conceber a idéia de que existe um limite de beber normal e essa mentalidade não é diferente nos profissionais de APS. Essa mentalidade não foi construída de um dia para o outro, há uma série de fatores envolvidos nessa construção (fatores biológicos, psicológicos e sociológicos) (NEVES, 2004). Assim sendo, nossa pretensão neste estudo não foi esgotar o assunto, muito menos extinguir as crenças relacionadas aos padrões de uso do álcool. Antes, nosso objetivo foi avaliar, treinar, fornecer instrumentos e conhecimento e plantar uma semente inicial para intervenção do uso de risco.

Dentro do objetivo proposto, foi observado que alguns ACS adequaram, dentro de suas possibilidades, a intervenção aos usuários de álcool e apresentaram algumas mudanças positivas nas crenças, atitudes e avaliação de preparo profissional após o treinamento. Por razão das dificuldades encontradas, é preciso repensar alternativas para complementar o treinamento. Algumas dessas propostas são: o treinamento da equipe ser feito de forma mais integrada possível, aumentar a freqüência de diálogos e estimulação de trabalho preventivo, de acordo com o contexto da equipe e da comunidade, além de uma ação conjunta de reformulação do sistema de atenção primária como um todo.

As ações de promoção de mudança na saúde não podem ser ações isoladas, voltadas somente para a formação de recursos humanos. É preciso pensar em condições adequadas de políticas públicas, infra-estrutura e organização dos serviços para que as ações preventivas possam se efetivar (RONZANI et al, 2005).

A presente proposta fez parte de um conjunto de estudos e ações estratégicas de implementação de conceitos preventivos sobre o uso de álcool, que vêm sendo realizadas em Juiz de fora, em outras partes do Brasil e no mundo. Através dos atuais resultados, verifica-se a necessidade da constante avaliação do impacto de intervenções para identificar e corrigir os problemas de efetividade das propostas apresentadas. Espera-se que o presente estudo colabore para a formulação de novas estratégias de implementação de ações de prevenção ao uso de álcool nos serviços de saúde.

O problema de ênfase na cura da demanda da dependência presente nos relatos dos ACS, entre outras situações observadas, evidencia que a prática e as preocupações com as ações terapêuticas são mais enfatizadas que as próprias proposições teóricas do PSF com ênfase na prevenção. Isto provavelmente é também reflexo da demanda da população e do modo como tradicionalmente se desenvolveu a implantação dos serviços de saúde no país. Para que práticas preventivas possam ser efetivamente implantadas, torna-se necessário que ocorra antes uma real mudança de conceitos e atitudes dos profissionais das equipes de PSF com relação ao seu próprio papel na saúde preventiva.

Ressalta-se aqui a importância de contextualizar as práticas de prevenção à realidade do Brasil, de forma a não fazer uma mera transposição de técnicas. O presente trabalho torna-se um indicador inclusive dos limites e oferece um primeiro passo para outras ações na mesma direção, a da prevenção.

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[1] Universidade Federal de Juiz de Fora, Departamento de Psicologia - Juiz de Fora, MG. e-mail: telmo.ronzani@ufjf.edu.br

[2] Universidade Federal de Juiz de Fora, Bolsista da PROPESQ/BCCG - Juiz de Fora, MG.

[3] Universidade Federal de São Paulo, Departamento de Psicobiologia - São Paulo, SP.

palavras-chave

Alcoolismo

Saúde

Atenção básica.

keywords

Alcoholism

Health

Juimary health care

Enviado em 15/01/2008

Aprovado em 26/02/2008