Cromatografia líquida de alta eficiência aplicada ao controle da qualidade de cis-permetrina em loção capilar

High-performance liquid chromatography applied to the control of the quality of cis-permethrin in capillary lotion

Nádia Rezende Barbosa[1]

Francelis Oliveira Santos[2]

Aline Siqueira Ferreira2

Resumo

Doenças ectoparasitárias como a escabiose, a pediculose, a tungíase e a larva migrans cutânea são epidêmicas em inúmeras comunidades carentes no Brasil e seu controle efetivo é um desafio para a Saúde Pública. Embora a permetrina seja um dos medicamentos aprovados pelo Food and Drug Administration para o tratamento da pediculose, não há um método oficial disponível para a realização do controle da qualidade deste produto em loção capilar de uso humano. Assim, o objetivo deste trabalho foi desenvolver e validar um método analítico sensível, específico, preciso e exato para esta análise, seguindo os critérios descritos na Resolução no 899/2003 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). A cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC) com detector diode array (λ= 235nm) foi empregada na determinação de cis-permetrina em loção capilar, visando implementar um sistema de controle da qualidade em laboratórios analíticos. A cis-permetrina e a substância utilizada como padrão interno (PI), o cloridrato de nafazolina, foram separados em coluna analítica S5W (4,6 x 150mm) Waters Spherisorb® e eluídos isocraticamente (fluxo de 1,2mL/min). A cis-permetrina e o PI foram caracterizados pelos tempos de retenção de 1,52 e 8,66 minutos respectivamente. O método mostrou-se linear na faixa de 1,6 a 127,5µg/mL e, nos estudos de precisão intra e interensaio, foram obtidos coeficientes de variação inferiores a 5%, calculados a partir dos resultados. A exatidão média do método foi de 103%. Os limites de detecção e quantificação foram 1,6µg/mL e 2,4µg/mL respectivamente. A cis-permetrina manteve-se estável por 24 horas à temperatura ambiente; por 15 dias a 4ºC e 30 dias a -20ºC. O método mostrou-se simples e apropriado para a determinação de cis-permetrina em loção capilar.

Abstract

Parasitic skin diseases such as scabies, pediculosis, tungiasis, and cutaneous larva migrans are epidemic in numerous communities in Brazil and their effective control is a major challenge to public health. Permethrim is one of the medications approved by the Food and Drug Administration to treat pediculosis. However, official methods of quality control for permethrin’s use as hair lotion are currently unavailable. Thus, a specific and accurate method was validated using high performance liquid chromatography (HPLC) with a diode array detector (λ = 235 nm) in order to determine cis-permethrin in hair lotion, aiming to establish a system of quality control in analytical laboratories. Cis-permethrin and naphazoline chloride (internal standard - IS) were separated in an analytical S5W column (4.6 x 150 mm) Waters Spherisorb® and isocratically eluted (flow rate =1.2 mL/min). Cis-permethrin and IS were characterized by their retention times: 1.52 and 8.66 minutes, respectively. The accuracy of this method was 103%. A linear range was detected from 1.6 to 127.5 μg/ml and CV < 5% calculated from intra and inter-essay precision results. LOD and LOQ were 1.6 µg/mL and 2.4 µg/mL, respectively. Cis-permethrin remained stable for 24 hours at room temperature; for 15 days at 4ºC and 30 days at -20ºC. The method was considered simple and suitable for determination of cis-permethrin in hair lotion.

Introdução

A pediculose, enfermidade que atinge mais de 100 milhões de pessoas no mundo, vem sendo descrita desde os tempos mais remotos até os dias de hoje, sendo considerada um sério problema de Saúde Pública em todas as Américas e na Europa (BAINBRIGDE et al., 1998; CHOSIDOW, 2000; BARBOSA; PINTO, 2003). É importante salientar que qualquer pessoa independente da classe social, sexo, raça, credo ou cor pode ser infestada por piolhos, embora freqüentemente a infestação esteja associada a péssimas condições ambientais (BARBOSA et al., 1998). A pediculose pode levar a um quadro anêmico, devido à hematofagia feita pelos piolhos, ou até mesmos a quadros de miíases. Um outro quadro também observado em crianças com pediculose é a infecção por gânglios retroauriculares, devido às reações imunológicas dos hospedeiros (BARBOSA; PINTO, 2003). Apesar disso, programas de controle para estas doenças são raros, e as mesmas estão comumente sendo negligenciadas tanto pelos profissionais e autoridades de saúde quanto pela população afetada (Helkelbach et al., 2003).

O homem pode ser parasitado por três tipos de piolho: Pediculus humanus capitis, piolho da cabeça; Pediculus humanus corporis, vulgarmente conhecido como muquirana e Phthirus pubis, piolho da região pubiana, vulgarmente chamado de chato. Eles são insetos sem asas (ápteros), dificilmente visíveis, transmitidos facilmente de pessoa para pessoa, através do contato direto interpessoal e do compartilhamento de objetos pessoais (LIMA, 1996). Estudos de Reinhard e Biskstra (2003) assinalam a existência de Pediculus humanus infestando múmias do Peru. Recentemente, Araújo et al. (2000) encontraram ovos de Pediculus humanus capitis em múmias no Piauí que datam de 10.000 anos.

A permetrina foi aprovada pelo Food and Drug Administration (FDA) para o tratamento da escabiose e da pediculose (BAINBRIDGE et al., 1998; BUSCHIAZZO; CAÑAS, 2001). É um inseticida sintético do grupo dos análogos das piretrinas do ácido crisantêmico, o qual atua sobre a membrana celular nervosa do inseto, provocando um aumento transitório da permeabilidade dos canais de sódio nas membranas das células nervosas. Isso origina retardamento da repolarização das membranas, paralisia subseqüentemente e morte do inseto (ZANINI et al., 1998). Atualmente, este piretróide sintético pode ser encontrado nas formas farmacêuticas de creme, loção, loção-gel e xampu para o tratamento da pediculose. A permetrina apresenta dois diasteroisômeros com propriedades química, física e toxicológica diferentes, sendo a cis-permetrina o isômero ativo. A baixa toxicidade relacionada a esta substância é uma característica relevante para a sua aplicação terapêutica (GARCIA; GARCIA; BARBAS, 2001). Porém, sinais crescentes de resistência à permetrina têm surgido, devido às falhas durante o tratamento com o emprego de métodos, doses e tempo de aplicação inadequados. Por isso, existem hoje associações de piretrinas e agentes potencializadores, como o butóxido de piperonilo. Este agente sintético com baixa atividade inseticida potencializa o efeito neurotóxico das piretrinas, porém, em doses elevadas, pode ocasionar vômitos e diarréias (BAINBRIGDE et al., 1998).

Entre os métodos analíticos empregados para determinação dos teores de permetrina, tem-se a cromatografia em camada delgada (CCD) (KISENKO; GIRENKO, 1984), cromatografia gasosa (CG) (LUBS; HAMANN; HEESCHEN, 1983; TYLER, 1987), cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC) (LEIDY; SHEETS; NELSON, 1986; EL-DIN; ABUIRJEIE, 1992; MARTÍNEZ GALERA et al., 1996) e, mais recentemente, a cromatografia gasosa acoplada ao espectrômetro de massa (CG-MS) (BONWICK et al., 1995) e a microextração em fase sólida (SPME) (GARCIA; GARCIA; BARBAS, 2001; KOMATSU; VAZ, 2004). A maioria deles é destinada à análise de múltiplos resíduos de piretróides em diferentes e complexas matrizes, o que justifica o pré-tratamento das amostras.

Entretanto, não há disponível um método oficial para a realização do controle da qualidade de preparações farmacêuticas de uso humano que contenham este princípio ativo. Dessa forma, o objetivo deste trabalho foi o desenvolvimento e a validação de uma metodologia analítica que emprega a cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC) e atenda à legislação brasileira regulamentadora (BRASIL, 2003) para a determinação da cis-permetrina em loção capilar e que possa ser aplicada ao controle da qualidade destes produtos.

Material e métodos

Solventes e reagentes

Cis e Trans-permetrina - Riedel de Häen (Madri, Espanha), distribuídos por Chem Service, atropina, boldina, cafeína, cloreto de benzalcônio, cloridrato de nafazolina, escopolamina – padrões de referência oficial da USP (The United States Pharmacopeia) distribuído por Pharmacopeia CIL Brasil. Metanol e acetonitrila (grau HPLC) – Merck; acetato de sódio p.a. – Reagen.

Amostras

Cinco amostras de loção capilar de diferentes fabricantes comercializadas na cidade de Juiz de Fora – MG foram submetidas ao procedimento analítico otimizado e analisadas quanto ao teor de cis-permetrina contido no produto acabado (loção capilar contendo 1% de cis-permetrina). As amostras foram analisadas em triplicata.

Métodos

Otimização das condições cromatográficas para determinação de cis-permetrina

Na tentativa de otimização das condições cromatográficas, durante a fase de desenvolvimento do método para a determinação de cis-permetrina em loção capilar a 1%, foram avaliados os seguintes parâmetros: colunas cromatográficas, comprimentos de onda, volumes de amostra e de injeção e estabelecimento do padrão interno a ser usado.

Foram pesados 12mg de loção capilar contendo cis-permetrina e diluídos em 25mL de metanol (solução estoque - SE). Retirou-se uma alíquota de 4mL da SE e acrescentou-se metanol em quantidade suficiente para 25mL em balão volumétrico (solução intermediária - SI). As SE e SI foram aliquotadas e mantidas em freezer a -20°C. Foram realizadas diluições seriadas em metanol partindo-se da SI, a fim de se obter calibradores nas concentrações 4,8 a 76,8µg/mL. Após a preparação dos calibradores, 40µL de padrão interno foram adicionados a cada calibrador. As análises cromatográficas foram realizadas empregando-se sistema cromatográfico de alta eficiência (HPLC – Shimadzu, Japão) composto por módulo de mistura e dispensação de fase móvel multicanal FCV-10ALvp com eluição isocrática, sistema controlador SCL-10Avp, auto-injetor SIL-10AF, detector diode array SPDM10 AVP, degaseificador on line DGU-14A. Os picos cromatográficos foram analisados através do programa computacional Class VPTM versão 6.1. A fase móvel foi filtrada através de membrana de 0,22µm e degazeificada antes do uso.

Validação do método analítico

A validação do método analítico foi realizada segundo a recomendação da Resolução nº 899 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) (BRASIL, 2003). A curva de calibração foi elaborada a partir de amostras de soluções de trabalho (calibradores), contendo o fármaco nas concentrações de 4,8 a 76,8µg/mL. Foi construída, projetando-se no eixo das abcissas as concentrações do fármaco (µg/mL) e no eixo das ordenadas as relações de áreas obtidas entre os picos da cis-permetrina e do padrão interno (PI). A análise de regressão linear foi efetuada para obtenção da equação da reta. Os ensaios foram realizados em duplicata.

O limite de detecção (LOD), considerado como a menor concentração em análise que pode ser detectada, foi obtido por diluições sucessivas das soluções de trabalho da cis-permetrina. O limite de quantificação (LOQ), considerado a menor concentração onde o coeficiente de variação obtido foi inferior a 10%, em cinco determinações, foi obtido por diluições sucessivas das soluções de trabalho da cis-permetrina.

Para avaliação da região linear de resposta do detector a diferentes concentrações do fármaco, foram avaliadas diferentes concentrações da cis-permetrina através da curva de calibração nas concentrações de 1,6 µg/mL a 127,5µg/mL. Os ensaios foram realizados em duplicata.

A precisão intra-ensaio foi realizada em três concentrações: baixa (6,4µg/mL), média (19,2µg/mL) e alta (38,4µg/mL), em quatro réplicas, sendo realizada no mesmo dia. Na precisão interensaio, foi realizada com doze réplicas para cada concentração citada, durante três dias alternados, contemplando o intervalo linear do método.

A exatidão do método foi averiguada através da comparação dos resultados das análises das amostras adicionadas obtidos pelo método proposto com a média dos resultados obtidos por diferentes pesquisadores. A exatidão foi realizada em três concentrações: baixa (6,4µg/mL), média (19,2µg/mL) e alta (38,4µg/mL), em triplicata. A análise foi realizada pelo investigador principal e concomitantemente por outros investigadores que estiveram “cegos” para a identificação e concentração do fármaco. A análise cromatográfica foi realizada, independentemente, pelos investigadores e os resultados foram comparados ao final do ensaio. Os cálculos pertinentes a cada análise foram realizados de acordo com o descrito em Brasil (2003) e foram consideradas as devidas análises estatísticas.

A estabilidade da cis-permetrina foi avaliada em três diferentes condições: sob temperatura ambiente, em geladeira e em freezer a –20ºC, testadas no tempo “zero”, após 1, 15 e 30 dias de preparo das soluções, em duas concentrações de estudo (19,2 µg/mL e 38,4 µg/mL). Nestas condições de teste, as amostras analisadas não devem apresentar variações superiores a 10% do teor em relação à concentração original (tempo “zero”). Todas as amostras foram mantidas ao abrigo da luz.

A robustez foi determinada através da capacidade de o método não sofrer interferências por pequenas e deliberadas modificações dos seus parâmetros. Foram avaliados os seguintes parâmetros: composição da fase móvel, força iônica do tampão (pH) e alteração na vazão.

Teor de cis-permetrina em loção capilar

As amostras (n = 5) de loção capilar foram adquiridas no comércio local e submetidas ao procedimento analítico otimizado e analisadas quanto ao teor de cis-permetrina contido no produto acabado (loção capilar) e comparado com o descrito no rótulo do produto. Foi considerada a densidade do produto acabado, trabalhando-se com o equivalente a 1% de cis-permetrina. Avaliou-se a concordância entre o valor declarado e o valor encontrado, tendo sido consideradas de acordo aquelas amostras que demonstrassem valores médios entre 90% e 110% (faixa de especificação interna desenvolvida). As amostras foram analisadas em triplicata.

Resultados

Condições cromatográficas otimizadas para determinação de cis-permetrina

Foram realizados diversos ensaios preliminares na tentativa de otimização das condições cromatográficas, entretanto foram estabelecidas como ideais as seguintes: fase móvel composta por metanol: acetonitrila: tampão acetato de sódio 0,050 M (80: 5: 15, v/v/v) pH = 8,0; fluxo da fase móvel: 1,2mL/min; detector diode array (λ = 235 nm), coluna analítica S5W (4,6 x 150mm; partícula interna 5µm - Waters Spherisorb®); volume de injeção: 25µL; PI: 40µL solução cloridrato de nafazolina (1000µg/mL de metanol).

Na Figura 1, está ilustrado o perfil cromatográfico obtido, após a otimização das condições analíticas. O cromatograma ilustra a especificidade do método para a análise de cis-permetrina e a resposta adequada do padrão interno utilizado. Os tempos de retenção observados para a cis-permetrina e para o PI foram 1,52 e 8,66 minutos respectivamente.

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Figura 1 – Perfil cromatográfico (HPLC) referente à amostra de cis-permetrina e PI nas condições analíticas otimizadas.

Validação do método analítico

Na Tabela 1, estão indicados os limites de confiança do método de análise de cis-permetrina em loção capilar.

Tabela 1

Limites de confiança do método para a quantificação de cis-permetrina em loção capilar

Parâmetro

Cis-permetrina

Limite de detecção (µg/mL) (n=5)

1,6

Limite de quantificação (µg/mL) (n=5)

2,4

Curva de calibração (µg/mL) (n = 2)

4,8 – 76,8

y = 0,0349x + 0,0614; r = 0,9993

Exatidão* (%)

38,4µg/mL

19,2µg/mL

6,4µg/mL

107,70

98,23

93,00

Precisão (CV%)

38,4µg/mL

19,2µg/mL

6,4µg/mL

Intra-ensaio (n = 4) e Interensaio (n = 12)

0,12 0,94

1,09 2,91

1,66 4,96

r = coeficiente de correlação linear, CV = coeficiente de variação

*resultado médio obtido pelos pesquisadores (n=3) para cada concentração analisada

O estudo da influência dos excipientes foi verificado através da aplicação do método ao placebo. Os cromatogramas obtidos com a análise da matriz sem a adição de cis-permetrina (placebo) não apresentaram picos interferentes na região de retenção, nas condições empregadas. A trans-permetrina também não foi detectada, o que demonstra a seletividade do método proposto.

Na Tabela 2, estão apresentados os tempos de retenção da cis-permetrina e dos demais fármacos testados para aplicação como padrão interno. Entre os fármacos testados, somente o cloridrato de nafazolina se mostrou adequado, visto que os demais apresentaram tempos de retenção muito próximos ou co-eluíram com a cis-permetrina. Estes resultados permitiram selecionar o cloridrato de nafazolina como PI em função de possuir um tempo de retenção (8,661min) superior ao da permetrina (1,525min).

Tabela 2

Tempos de retenção da cis-permetrina e alguns fármacos testados como possíveis padrões internos

Fármaco

Tempo de retenção (min)

Cis-permetrina

1,525

Trans permetrina

ND

Cloridrato de nafazolina

8,661

Atropina

ND

Boldina

1,557

Cafeína

1,845

Cloreto de benzalcônio

1,472

Escopolamina

1,376

ND = não detectado no intervalo de 0 a 30 minutos.

Durante o ensaio de estabilidade, as amostras analisadas contendo cis-permetrina, nas concentrações testadas, não apresentaram variações superiores a 10% do teor em relação à concentração original, apresentando-se estáveis durante 24 horas quando armazenadas à temperatura ambiente; durante 15 dias à temperatura de 4ºC e 30 dias sob temperatura de –20ºC.

O método proposto não sofreu grandes interferências provocadas por pequenas e deliberadas modificações dos seus parâmetros: força iônica do tampão (pH) e alteração na vazão.

Teor de cis-permetrina em loção capilar

Na Tabela 3, são apresentados os valores referentes ao teor de cis-permetrina nas cinco amostras do produto final acabado analisado. Os resultados estão expressos como a média de três determinações. A concentração final do produto acabado está compreendida dentro do intervalo preconizado de 90% a 110% para todas as amostras analisadas. Portanto, todas as amostras apresentaram os teores dentro dos limites de especificação.

Tabela 3

Teor de cis-permetrina nas amostras de loção capilar submetidas ao método analítico proposto

Amostras de loção capilar

Teor de Cis-permetrina* (%)

A

97,3

B

95,6

C

98,7

D

92,5

E

93,7

* Resultados expressos como média de 3 determinações.

Discussão

A literatura acerca do desenvolvimento e validação de metodologias analíticas para a determinação de cis-permetrina em produtos farmacêuticos é escassa e a maioria delas é destinada à análise de múltiplos resíduos de piretróides em diferentes e complexas matrizes, o que justifica o pré-tratamento das amostras (MARTÍNEZ GALERA et al., 1996; GALERA; GARCÍA; VALVERDE, 2006; Vázquez; Mughari; Galera, 2008). O método aqui proposto dispensa a etapa de preparação da amostra, oferecendo ao analista uma vantagem metodológica em relação aos métodos supracitados.

García, García e Barbas (2001) desenvolveram e validaram uma metodologia empregando a cromatografia líquida de alta eficiência para o controle da qualidade de loções e xampus contendo a permetrina como princípio ativo. No trabalho deste grupo (GARCÍA; GARCÍA; BARBAS, 2001), os isômeros cis e trans-permetrina foram separados e identificados na mesma corrida cromatográfica, o que tornou possível a quantificação de cada isômero. No entanto, segundo estes mesmos autores, somente o isômero cis é considerado ativo para o uso pretendido. Desta forma, a especificidade do método aqui proposto para a cis-permetrina não prejudica a análise. Adicionalmente, uma vantagem observada no método apresentado é a redução do tempo de análise, tendo 10 minutos como o tempo total da corrida cromatográfica, comparados com os 20 minutos necessários por aqueles autores. Este menor tempo de análise propicia menor custo analítico, fato este importante para os laboratórios analíticos e para as indústrias.

A validação do método foi executada avaliando-se os principais parâmetros, seguindo recomendações descritas pela ANVISA (BRASIL, 2003), entre eles os limites de detecção e de quantificação. Choi, Rose e Hoddgson (2002) obtiveram 9,39 e 19,17μg/mL como limites de detecção e de quantificação, respectivamente, ao trabalharem com amostra de fluido biológico. Estes valores são significativamente maiores quando comparados com os encontrados neste trabalho (LOD = 1,6µg/mL e LOQ = 2,4µg/mL), o que evidencia a necessidade de validação ao variar a matriz da amostra.

Ainda em relação aos limites de confiança do método para a quantificação de cis-permetrina em loção capilar, tem-se que o valor médio obtido para o ensaio de exatidão, avaliado nas concetrações de 6,4 a 38,4 a µg de cis-permetrina/mL de amostra, foi de 103% (93,0 a 107,7%). Tal valor é similar aquele encontrado por Wang, Moorman e Burleson (2003) que é 98,8% (94,6 a 103%). Comparativamente aos resultados do ensaio de precisão intra-ensaio realizado por Wang, Moorman e Burleson (2003), no qual foi encontrado o valor do coeficiente de variação de 0,43%, a média dos valores dos coeficientes de variação obtida no método proposto foi superior (0,96%). No entanto, esta diferença não compromete a precisão do método validado, uma vez que o valor recomendado pela ANVISA é de até 5% (BRASIL, 2003).

Segundo a Resolução no 899/ 2003 (BRASIL, 2003), a validação deve garantir, por meio de estudos experimentais, que o método atenda às exigências das aplicações analíticas, assegurando a confiabilidade dos resultados. Para tanto, deve apresentar especificidade, linearidade, intervalo, precisão, sensibilidade, limite de quantificação, exatidão, adequados à análise. Analisando os valores encontrados neste estudo, pode-se afirmar que a variabilidade encontrada no método está de acordo com os valores preconizados pela ANVISA e que o mesmo é de fácil execução, já que não requer prévio tratamento da amostra.

Conclusão

Um método analítico para a quantificação de cis-permetrina foi desenvolvido e validado, demonstrando linearidade adequada, precisão, exatidão e sensibilidade satisfatórias de acordo com a Resolução no 899/ 2003 da ANVISA. Este método pode ser aplicado para o controle da qualidade de loções capilares contendo cis-permetrina como princípio ativo.

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[1] Universidade Federal de Juiz de Fora - Juiz de Fora, MG. e-mail: nadiafox@gmail.com

[2] Universidade Federal de Juiz de Fora - Juiz de Fora, MG.

palavras-chave

Permetrina

Cromatografia líquida

Preparações para cabelo

Infestações por piolhos

keywords

Permethrin

Chromatography, liquid

Hair preparations

Lice infestations

Enviado em 28/09/2007

Aprovado em 17/02/2008